Encenação e tédio: Ministro Moro no Roda Viva

Ministro Sérgio Moro no Roda Viva.

Por Luciane Soares da Silva

O Barão de Itararé dizia mais ou menos assim “de onde menos se espera daí é que não sai nada”. Esta sentença foi ontem reatualizada na entrevista do ainda ministro da Justiça Sérgio Moro. Lendo os comentários e repercussões do programa Roda Viva comprovamos que nenhuma das análises feitas precisava da fala de Moro para ser publicada. Que ele foge ao enfrentamento das questões? Nenhuma novidade. Que ele defende o presidente? Como seria diferente? Que ele minimiza as declarações do Intercept? Ele pode ser limitado, mas não é burro. Que ele se omitiu a fazer uma crítica contundente as declarações de Ricardo Alvim? Por que faria, se este governo tem caráter fascista transpirando diariamente?

Em resumo, o placar é zero a zero porque não poderia ser negativo. Ah, vamos dizer que  Moro ficou no zero e o Roda Viva marcou gol contra.  Mas há uma novidade interessante para destacar neste jogo sonolento travado ontem: como um discurso nazista (que foi tema da entrevista em uma questão sobre Ricardo Alvim) é possível e quais são seus efeitos na mídia nacional? Para fazer justiça, já que o ministro não faz, os jornalistas não estão nada contentes com o Jair. Faz sentido, já que o presidente cruza as fronteiras do decoro como quem atravessa uma rua de Italva. Ele ataca a mãe dos jornalistas, ele ofende o pai de Felipe Santa Cruz, Fernando Santa Cruz, torturado e morto durante a Ditadura. O presidente incentiva e promove o ódio, não suporta especulações sobre filhos e amigos de condomínio.

“Mas ele não chegou ontem”. Isto tem sido dito por vários analistas. Bolsonaro tem declarado ser a favor da tortura e da morte há muito tempo. Mas se pensava que ele era um tipo … folclórico?

Pois bem, agora a perseguição está posta e Moro é ministro. Ele sabe que aquele programa é uma tarefa chata a cumprir para manter uma certa imagem (quem se importa?) de democrata. Ele sabe que não será agredido além daquela encenação típica dos programas de luta livre que víamos na televisão nos anos 80. Golpes que eram apenas teatro.

A declaração de Eduardo Bolsonaro “basta um cabo e um soldado para fechar o STF” é de longe a mais eloquente deste governo e de suas crenças nas infinitas possibilidades da violência. Eles sabem quem são os juízes e os jornalistas. Eles sabem pois conhecem de longa data o caldeirão de ódio à esquerda que possibilita a eleição de seu grupo. Eles sabem como os acordos acontecem e como o verniz de combate a corrupção é volátil.

Sérgio Moro encarna com brilhantismo o combate volátil a corrupção. Onix se arrepende, é louvável, diz o ministro ao falar de Caixa 2. Investigar os ministros do STF não pode, ou depende de como é feito. As declarações de Alvim são algo bizarro. Mas como juiz, ele sabe que apologia ao nazismo é crime.  Se não emprega a expressão não é por falta de conhecimento. É uma opção de deixar a janela sempre aberta.

Não sabemos se houve algum saldo positivo no picadeiro do Roda Viva. Agora, que todos estão nus, uns mais do que outros, resta a parte do jornalismo arrependido, buscar bem lá no fundo da alma alguma decência. Mas a verdade é que não há mais nada a salvar nem alma a lavar. Moro manteve sua frivolidade porque é natural de homens como ele, o uso do cinismo como estratégia política. E certamente para Bolsonaro, insultar os jornalistas já virou parte de sua forma de governar.

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 Luciane Soares da Silva é docente do Laboratório de Estudos da Sociedade Civil e do Estado (Lesce) da Universidade Estadual do Norte Fluminense, e também participa da diretoria da Associação de Docentes da Uenf (Aduenf).

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