Estados, cidades e empresas aceleram progresso climático sem ajuda federal
O “sem noção em chefe”: Donald Trump, que nega as mudanças climáticas provocadas pelo homem, aponta mapas do furacão Michael em 2018. (Reuters / Jonathan Ernst)
Enquanto Donald Trump fortalece sua retórica antiambiental, os EUA deve manter o compromisso assumido no Acordo de Paris de reduzir suas emissões de gases causadores do efeito estufa em 37% até 2030. Um estudo divulgado agora explica a contradição: políticas de mitigação climática foram fortalecidas em níveis subnacionais e nas empresas.
Segundo o relatório Americas’s Pledge, o setor de eletricidade já vive o “tipping point” da transição energética, mesmo com atrasos em projetos em decorrência da pandemia do novo coronavírus. Em 2017, o presidente dos EUA revogou as iniciativas de energia limpa da era Obama e em 2018 anunciou medidas para ressuscitar a indústria do carvão. Desde então, as energias do sol e do vento tiveram crescimento rápido, com forte geração de empregos, preços cada vez mais competitivos – mesmo sem subsídios – e com fundamentos econômicos mais consistente do que as fontes fósseis.
A análise indica que as concessionárias que planejavam fazer uma transição energética do carvão para as renováveis, passando pelas térmicas a gás, partiram para um plano de descarbonização direta. Há quatro anos, apenas 1 estado e 22 cidades havia se comprometido a ter energia elétrica 100% renovável; em 2020 são 16 estados e 130 cidades. Isso significa que cerca de 33% da população dos EUA vive em uma jurisdição que será alimentada por energia 100% limpa até o final desta década. O documento destaca que a energia limpa tem conquistado apoio bipartidário. Arizona, Flórida, Texas e Virgínia, redutos tradicionais dos republicanos, só aumentaram suas metas de energia limpa desde eleição de Trump.
“Apesar da decisão do presidente de se afastar do Acordo de Paris, e apesar de quatro anos de retrocessos ambientais e negação do clima por parte do governo federal, o último relatório mostra que cidades, estados e empresas continuam a progredir trabalhando em conjunto e liderando de baixo para cima”, avalia Michael R. Bloomberg, ex-enviado especial das Nações Unidas para a Ação Climática e co-presidente da America’s Pledge. “Mas o relatório também mostra que poderíamos estar fazendo muito mais, muito mais rápido, com a liderança da Casa Branca – e é por isso que a eleição de novembro é a mais importante na luta contra a mudança climática”, afirma o executivo, que é fundador da Bloomberg Philanthropies e da Bloomberg LP.
“Com sua política de multilateralismo inclusivo, a ONU há muito incentiva cidades, comunidades, investidores, empresas privadas e sociedade civil a se envolverem nos esforços para enfrentar a mudança climática. Isto resulta em mais idéias, mais soluções, mais ação climática e se reflete também no relatório dos compromissos dos Estados Unidos”, analisa Patricia Espinosa, Secretária Executiva de Mudança Climática da ONU.
Fósseis
Além de eletricidade, a pesquisa analisou outros quatro setores com as maiores oportunidades de redução de emissões nos EUA até 2030: transporte, metano e hidrofluorocarbonetos (HFCs) e edificações. O nível de confiança no cumprimentos das metas em quatro desses segmentos cresceu, exceto em “edificações”, para o qual o nível de confiança foi apenas mantido.
Segundo o relatório, um conjunto de fatores manteria o país no rumo da mitigação das emissões de “transporte” e “metano”, com destaque para o compromissos de cidades e estados de eletrificar o transporte e reduzir os níveis de emissões para veículos médios, pesados e leves. Essa tendência foi observada mesmo com os padrões federais de economia de combustível e de emissão tendo sido enfraquecidos pela administração Trump. As vendas de veículos elétricos nos EUA dobraram nos últimos cinco anos, e espera-se uma recuperação mais rápida do que as vendas de carros a gasolina no próximo ano. E conforme o país se ajusta a um “novo normal” pós-pandemia, mudanças no comportamento em torno do trabalho remoto e do comércio eletrônico podem diminuir permanentemente as viagens de passageiros dos EUA em 10%.
Ao mesmo tempo, a indústria de petróleo e gás – principal fonte das emissões de metano do país – enfrenta um cenário com choques de preço, excesso de oferta global e redução das expectativas de demanda de longo prazo devido ao aumento do apoio político e industrial à eletrificação do transporte.
O relatório também destaca que estados e empresas estão impulsionando reduções de hidrofluorocarbonetos (HFCs) nos EUA. Essas substâncias foram uma solução climática no passado, quando substituíram os clorofluorcarbonetos (CFCs), que destroem a camada de ozônio, mas o avanço do conhecimento sobre HFCs mostrou que eles são superpoluentes climaticamente ativos e extremamente persistentes na atmosfera. Dezesseis estados americanos já aprovaram ou propuseram políticas contra o HFC, e a indústria está investindo em soluções de refrigeração e ar condicionado favoráveis ao clima, enquanto pressiona por uma legislação federal sobre o tema.