Inimigos do alimento saudável: deputados financiados pelo agro seguram projetos que regulam os ultraprocessados no Brasil

ultra 1

Por Nayara Felizardo para o “The Intercept Brasil”

Ao menos 20 empresários do agronegócio desembolsaram, juntos, R$ 2,1 milhões para financiar as campanhas de nove parlamentares que agora são membros da Comissão de Saúde na Câmara dos Deputados. O levantamento feito pelo Intercept considerou apenas as doações a partir de R$ 50 mil. A quantia e o número de membros favorecidos, portanto, pode ser ainda maior.

Recriada este ano a partir da separação da Comissão de Seguridade Social e Família, a Comissão de Saúde é responsável por analisar projetos de lei e outras propostas legislativas relacionadas ao tema. Os principais financiadores dos parlamentares que discutem  como alimentação e nutrição, SUS e patentes lucram com venda de açúcar, batata frita, ultraprocessados e até cachaça. Não por acaso, propostas como a maior tributação desses alimentos ou a regulamentação de publicidade do setor têm encontrado resistência para serem aprovadas.

Quem mais deu dinheiro para a campanha de titulares da comissão foi o empresário Robert Carlos Lyra, que atua no ramo sucroalcooleiro em Minas Gerais. Foram R$ 400 mil, divididos igualmente entre o atual presidente da comissão, Zé Vitor, do PL, e o deputado Pinheirinho, do PP.

Em 2009, quando ainda era sócio da Usina Caeté, em Alagoas, Lyra foi denunciado pelo Ministério Público Federal, o MPF. A investigação apontou que a empresa teria cometido 16 crimes ambientais desde 2001 e foi autuada seis vezes pelo Ibama entre 2005 e 2007, mas nunca obedeceu às ordens para interromper o desmatamento e recuperar a área degradada. Ao todo, teriam sido devastados 28 hectares para plantar cana-de-açúcar em área de preservação permanente na Unidade de Conservação Federal Reserva Extrativista, no município de Jequiá da Praia, a 61 quilômetros de Maceió. 

Inicialmente Lyra e os outros réus foram absolvidos, mas o MPF recorreu, de acordo com a assessoria de imprensa do órgão. Em 2021, o processo retornou à primeira instância para análise das provas. O MPF reiterou o pedido de condenação de todos eles e o processo está em andamento.

A usina Caeté faz parte do Grupo Carlos Lyra, que até 2012 incluía também as usinas de Minas Gerais. Depois de uma cisão naquele ano, as usinas de Alagoas continuaram como parte do grupo, e Lyra ficou com as do Sudeste, dando origem a uma nova empresa, a Delta Sucroenergia.

Segundo a revista Forbes, 11 anos após seu surgimento, a Delta figura entre as 100 maiores do agronegócio brasileiro. Com a produção de açúcar para exportação e para o mercado interno, além de etanol e bioenergia, a empresa tem uma receita anual de R$ 2,14 bilhões. Em 2022, a Federação das Indústrias de Minas Gerais elegeu Lyra o industrial do ano.

Além dos deputados Zé Vitor e Pinheirinho, Lyra também ajudou financeiramente a campanha de Jair Bolsonaro em 2022, com uma doação de R$ 300 mil, e de mais sete deputados mineiros que não estão na Comissão de Saúde. O empresário ocupa o 22º lugar no ranking de doadores, com mais de R$ 1,8 milhão desembolsados.

O segundo maior doador para campanhas de deputados que agora ocupam a Comissão de Saúde foi Renato Romeu Sorgatto, produtor de tomate e dono de uma fábrica de processamento que fornece polpa para o mercado de molhos, ketchup e pratos congelados. Ele desembolsou R$ 320 mil para Célio Silveira, do MDB de Goiás. A quantia representa mais da metade de todas as doações de pessoas físicas e deixa o deputado em segundo lugar entre os membros que mais receberam financiamento do agronegócio, atrás apenas do presidente da comissão, Zé Vitor, que recebeu mais de R$ 900 mil.

Deputado Zé Vitor, presidente da comissão de Saúde. Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Agrados ao presidente da comissão

Em razão do seu posto, cabe ao deputado Zé Vitor indicar os relatores dos projetos de lei que tramitam na Comissão de Saúde, além de definir o que entra na pauta de votação ou fica engavetado. Por isso, é relevante saber quem são seus financiadores e que interesses eles defendem. Considerando apenas as doações a partir de R$ 50 mil, o parlamentar do PL recebeu R$ R$ 925.489,10 mil de 10 empresários, principalmente do ramo sucroalcooleiro. O valor representa 47,7% de todas as doações de pessoas físicas.

Assim como Robert Carlos Lyra, João Emílio Rocheto foi um dos maiores financiadores de campanha do deputado: doou R$ 200 mil. O empresário é fundador da Bem Brasil, uma fabricante de batatas pré-fritas congeladas que tem uma série de redes de fast food entre seus clientes. 

Zé Vitor está no segundo mandato e atualmente faz parte de 10 frentes parlamentares relacionadas à saúde, mas sua trajetória sempre esteve ligada ao agronegócio. Ele também é membro da Frente Parlamentar da Agropecuária e sócio-administrador da empresa Campo Brasil, do ramo de alimentos e fertilizantes. 

Gráfico: Rodrigo Bento/Intercept Brasil

O deputado Zé Vitor não respondeu o e-mail que enviamos. Exceto o Grupo Cerradinho, que não conseguimos contato para enviar os questionamentos, todas as empresas cujos donos financiaram a campanha do parlamentar receberam nossos e-mails, mas não responderam até o fechamento dessa reportagem. 

Projetos contra alimentos nocivos emperram

O dossiê “Big Food: como a indústria interfere em políticas de alimentação”, lançado em 2022 pela ONG ACT Promoção em Saúde e pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, mostra quais são as estratégias do setor, incluindo as grandes corporações do agronegócio, para alterar, atrasar ou anular políticas públicas que poderiam melhorar a qualidade de vida dos consumidores, mas ameaçam o lucro das empresas. 

A interferência se dá, entre outras formas, por meio de lobby direto ou indireto com os parlamentares, financiamento de políticos e partidos ou mesmo ameaça de retirada de incentivos. As doações de campanha são uma das maneiras de influenciar diretamente os deputados, para que eles votem de acordo com os interesses dos seus financiadores.

Segundo um levantamento da ONG, ao menos 11 projetos de lei que tramitam na Câmara de Deputados contrariam interesses do agronegócio – oito deles passaram, já estão ou ainda vão passar pela Comissão de Saúde. Desses, três dispõem sobre comércio e publicidade de bebidas com baixo teor nutricional e alimentos ultraprocessados ou com quantidades elevadas de açúcar, gordura saturada, gordura trans e sódio. Outros três projetos tratam da rotulagem desses produtos e de bebidas industrializadas, para alertar sobre os riscos do consumo em excesso. Por fim, dois projetos propõem aumentar os impostos para bebidas não-alcoólicas, ou produtos com adição de açúcar, edulcorantes e aromatizantes. 

‘O agronegócio influencia diretamente a agenda regulatória da saúde.’

Paula Johns, diretora executiva da ACT e membro do comitê gestor da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, afirma que o agronegócio influencia diretamente a agenda regulatória da saúde, seja por meio das entidades representativas do setor, como o Instituto Pensar Agro, ou de forma institucional, por meio da Frente Parlamentar Agropecuária. 

Segundo ela, está mais difícil aprovar na Comissão de Saúde projetos de lei que antes passariam facilmente, diante de evidências científicas que justificassem a importância de determinada regulação – a exemplo dos alimentos ultraprocessados, cujo consumo está associado ao aumento de problemas de saúde como obesidade, hipertensão e diabetes. 

Gráfico: Rodrigo Bento/Intercept Brasil

“Acompanho o Congresso há 20 anos. Havia uma certa garantia de que a gente conseguia avançar com as propostas regulatórias na Comissão de Saúde. Os projetos normalmente paralisavam na Comissão de Assuntos Econômicos. Agora, aumentou o grupo de resistência”, afirmou Johns. 

Osmar Terra recebeu R$ 300 mil

Cinco empresários do Grupo Alibem, produtor de carne bovina e suína, além de ultraprocessados, doaram para a campanha de outro membro da Comissão de Saúde, o deputado Osmar Terra, do MDB do Rio Grande do Sul. Médico de formação, ele se destacou como um negacionista durante a pandemia. Em 2020, chegou a propor um projeto de lei contra o isolamento de pessoas que já tivessem contraído o vírus da covid-19, como se não fosse possível se contaminar novamente e transmitir o vírus para outras pessoas.

Nada disso foi relevante para os empresários Eduardo Shen Pacheco da Silva, José Roberto Fraga Goulart, Lee Shing Wen, Maximiliano Chang Lee e Michele Shen Lee. Juntos, eles desembolsaram R$ 250 mil para o negacionista de uma pandemia que causaria mais de 700 mil mortes no Brasil. O valor representa 45% de todas as doações feitas ao deputado por pessoas físicas. 

O Grupo Alibem foi alvo de uma operação da Polícia Federal em 2015, que investigou casos de corrupção envolvendo empresas do agronegócio gaúcho e a Superintendência Federal da Agricultura no Rio Grande do Sul. De acordo com a denúncia, a Alibem teria oferecido propina para o então superintendente Francisco Signor, para que ele a favorecesse com fiscalizações menos rígidas em seus frigoríficos. Seis anos após a operação, em 2021, o Ministério da Agricultura multou a Alibem em R$ 159,2 milhões com base na Lei Anticorrupção. O Ministério da Agricultura não respondeu se a multa foi paga. 

Em julho de 2018, quando a investigação ainda estava em andamento, o deputado Osmar Terra acompanhou o empresário Roberto Fraga Goulart em uma reunião com o então secretário executivo do Ministério da Agricultura e Pecuária no governo de Michel Temer, Eumar Roberto Novacki. O órgão também não respondeu qual foi a pauta do encontro, assim como Terra e Goulart. As perguntas foram enviadas por e-mail.

Outro empresário que se interessou em financiar a campanha de um negacionista foi Gilson Lari Trennepohl, dono da Stara Máquinas Agrícolas. Logo após o primeiro turno da eleição de 2022, a empresa enviou uma carta aos fornecedores, comunicando que reduziria sua base orçamentária em 30%, caso Lula ganhasse. Ele doou R$ 50 mil para a campanha de Osmar Terra e a mesma quantia para o deputado Pedro Westphalen, do PP, que é o terceiro vice-presidente da Comissão de Saúde. Já Bolsonaro recebeu R$ 350 mil. 

Assim como Terra, os empresários do agronegócio que financiaram sua campanha não responderam o contato que fizemos por e-mail.

Gráfico: Rodrigo Bento/Intercept Brasil

Apenas o deputado Ruy Carneiro respondeu nosso contato e disse que integra a Comissão de Saúde há muito tempo. Ele acrescentou também que nunca integrou a bancada do agronegócio e até apresentou um projeto que contraria os interesses do setor – o PL do Bem-estar Animal, que disciplina o abate de animais pela indústria agropecuária. “Com relação às doações, todas foram realizadas seguindo rigorosamente o que determina a lei e de forma transparente”, rebateu.

Com exceção da Cachaça Pitu e do Grupo Vale do Verdão, que não conseguimos contato para enviar os questionamentos, todas as empresas receberam nossos e-mails, mas não responderam nossos questionamentos.

Johns defende a necessidade de a sociedade civil formar uma frente ampla que envolva as questões de saúde, de justiça social e ambiental para enfrentar o lobby do agronegócio. “Se a gente não descobrir uma maneira de impedir a escalada dessa influência, vamos ficar patinando. ‌Hoje, não conseguimos avançar com nenhum tema, ou avançamos a passo de cágado”.

Esta reportagem foi produzida com o apoio do Instituto Serrapilheira.


compass black

Este texto foi orginalmente publicado pelo site “The Intercept Brasil” [Aqui!].

Brasil é o 4º país com a maior taxa de desemprego no mundo

País tem uma das maiores taxas do ranking, em 4ª posição no G20 e na América Latina

desemprego

Com 9,4 milhões de desempregados, o Brasil é o 4ª país com mais desempregados do G20.

Somente a África do Sul, Espanha e Turquia ficam a frente do Brasil, que possui 8,8% de desempregados.

Na ponta oposta, Singapura é o país com a menor taxa de desemprego, com apenas 1,8%.

É o que revela um estudo divulgado pela plataforma de descontos CupomValido.com.br sobre os dados de desemprego.

Ao comparar com países da América Latina, o Brasil também fica na 4ª posição, atrás do Haiti, Costa Rica e Colômbia.

Já a Guatemala é o país que tem a menor taxa de desemprego na América Latina, com 2,2%.

Cenário de Desemprego no Brasil

Com 12,2% de desempregados, o Nordeste é a região com a maior taxa de desempregados do Brasil.

O valor é mais que duas vezes o valor da região Sul, com 5,0%, sendo a região com a menor taxa.

O Centro-Oeste, Sudeste e Norte, estão respectivamente com as taxas: 7,0%, 8,6% e 9,1%.

No Brasil existem 97,8 milhões de pessoas ocupadas (que exerce atividade profissional, seja formal ou informal), e o valor expressivo de 9,4 milhões de desempregados.

Um outro número que impressiona, é a quantidade de desalentados (pessoas que desistem de procurar emprego). Atualmente existem mais de 3,9 milhões de desalentados no Brasil.

Uma combinação nefasta: PL 490 e Marco Temporal ameaçam os direitos dos indígenas 

Além das perdas para as comunidades tradicionais, decisões colocam em risco a segurança climática da Amazônia e do país 
marco temporal

Um estudo inédito produzido pelo IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) alerta para um potencial de destruição futura da vegetação nativa na Amazônia Legal – abrangendo também parte do Cerrado e Pantanal -, caso sejam aprovados o projeto de lei (490/2007 na Câmara dos Deputados, encaminhado como 2903/2023 no Senado Federal), que restringe a demarcação de terras indígenas, e a fixação do marco temporal pelo Supremo Tribunal Federal. A estimativa é que entre 23 milhões de hectares e 55 milhões de hectares de áreas nativas sejam desmatados e possam desaparecer, resultando na emissão de 7,6 a 18,7 bilhões de toneladas de carbono, equivalentes a 5 e 14 anos de emissões do Brasil, ou a 90 e 200 anos de emissões dos processos industriais, respectivamente.

“Além de serem totalmente descabidas à luz da Constituição Federal, que protege o direito dos povos indígenas às suas terras, o projeto de lei e a tese do marco temporal ainda colocarão em risco o equilíbrio climático da região Amazônica, afetando o país como um todo. Podemos dar adeus à meta de desmatamento zero do atual governo e ao compromisso do país em reduzir as emissões de carbono. Nos aproximaremos perigosamente do “ponto sem retorno” que dezenas de cientistas vêm preconizando; estas iniciativas esdrúxulas ameaçam a segurança nacional”, afirmou Paulo Moutinho, pesquisador sênior do IPAM e coordenador do estudo.

A análise do IPAM levou em consideração 385 terras indígenas, cujo decreto de homologação foi assinado após a Constituição Federal de 1988.

Os pesquisadores levantaram dois cenários para as TIs existentes: I. grave, com previsão de desmatamento futuro de 20% nas terras indígenas na Amazônia e de 50% para Cerrado e Pantanal; e II. muito grave, com desmatamento de 50% nas terras indígenas da Amazônia e de 70% para Cerrado e Pantanal.

O avanço da destruição da vegetação nativa, previsto pelo estudo, trará implicações para o regime de chuvas na região, com consequentes alterações nas condições climáticas em todo o país. Os impactos na agricultura, pecuária e geração de energia poderão ser particularmente relevantes. Efeitos das mudanças climáticas em curso já afetam a produção em 28% das áreas agrícolas de soja e milho no centro-oeste brasileiro. Sem adaptação, a porcentagem de agricultura fora do ideal climático no Brasil pode chegar a 50% na próxima década e a 70% em trinta anos.

“É preciso entender que respeitar os direitos originários é essencial para todos. Povos indígenas são as raízes da nossa sociedade e seus conhecimentos tradicionais são a base para mantermos o clima equilibrado. Diversos países e cientistas já reconhecem essa importância, agora o Brasil precisa fazer seu dever de casa”, acrescentou Martha Fellows, coordenadora do núcleo de estudos indígenas do IPAM.

Terras indígenas ocupam apenas 13% do território nacional e são as categorias fundiárias com as menores taxas de desmatamento (< 2%) da região amazônica, quando comparadas com o desmatamento em áreas privadas (> 30%). Porém, de 2019 a 2021, só na Amazônia, o aumento do desmatamento em terras indígenas foi de 153% em comparação com o triênio anterior. O cenário, causado, sobretudo, pelo aumento da grilagem e do desmatamento ilegal, poderá se agravar se as alterações na legislação sobre os direitos indígenas forem aprovadas.

Recomendações 

Para além da manutenção dos direitos indígenas, tanto pelo Congresso Nacional quanto pelo Supremo Tribunal Federal, o estudo recomenda providências imediatas:

– Extinguir toda e qualquer tentativa de reduzir ou retirar direitos originários;

– A demarcação e proteção de todos os territórios tradicionais que aguardam o processo de demarcação e aplicar a destinação correta das Florestas Públicas Não Destinadas de acordo com os usos, costumes e natureza de cada área;

– Fim das atividades ilegais em terras indígenas, uma vez que interesses privados elevam o grau de insegurança dentro dos territórios criando conflitos, e isso é especialmente grave em territórios onde vivem povos indígena isolados;

– Fortalecimento da Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e o recém-criado Ministério dos Povos Indígenas enquanto órgãos que têm competência para administrar uma agenda que demanda conhecimentos específicos.

– Promover mais pesquisa para compreender a interdependência dos regimes de chuva que irriga a agricultura e a cobertura florestal.
 

Confira o estudo completo aqui

9ª edição da Semana do Mar tem início em Ubatuba

O evento reúne diversas instituições que trabalham com a temática do oceano. A programação conta com palestras, exposições, contação de história, atividades culturais, show, limpeza de praia e muito mais

unnamed (9)

Começou no último domingo a 9ª edição da Semana do Mar, um evento organizado pelo Aquário de Ubatuba, Instituto Argonauta e Fundação Projeto Tamar, e que conta com o apoio da Prefeitura Municipal de Ubatuba, e ainda com a participação de diversos parceiros que trabalham com a temática oceânica. A 9ª edição do evento se estende até sábado (10), e integra a programação do 12º Festival da Mata Atlântica, que teve início no dia 22 de maio, e terá encerramento também no próximo 10 de junho.

A 9ª edição da Semana do Mar celebra além do Dia Internacional da Biodiversidade (22/5); os Dias Nacionais da Mata Atlântica (27/5) e da Educação Ambiental (03/6); e os Dias Mundiais do Meio Ambiente (5/6) e dos Oceanos (8/6).

Neste ano, os eventos marcam a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável – Agenda 2030 – Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), uma iniciativa global liderada pelas Nações Unidas que ocorrerá até 2030, com o objetivo de promover a pesquisa e ações científicas para apoiar o desenvolvimento sustentável dos oceanos, abrangendo uma ampla gama de áreas de pesquisa, incluindo o estudo dos ecossistemas marinhos, a análise dos impactos das mudanças climáticas nos oceanos, a conservação da biodiversidade marinha, a gestão sustentável dos recursos pesqueiros e a redução da poluição marinha. E marcam também a Década da Restauração de Ecossistemas 2021-2030, que tem como objetivo enfrentar a degradação ambiental e promover a restauração de ecossistemas em todo o mundo, promovendo a recuperação e a conservação de ecossistemas terrestres, aquáticos e marinhos degradados ou destruídos, com o intuito de melhorar a resiliência, a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos.

O Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado em 5 de junho, é uma oportunidade importante para destacar a importância dos oceanos e conscientizar as pessoas sobre a necessidade de protegê-los. Os oceanos cobrem mais de 70% da superfície da Terra e desempenham um papel vital em muitos aspectos, como a regulação climática, a biodiversidade, a economia, a segurança alimentar e a estabilidade dos ecossistemas globais. E, nesse contexto, a 9ª Semana do Mar busca sensibilizar, promover a reflexão e conectar toda a sociedade sobre os impactos e as condições críticas que encontram nossos mares.

A programação está repleta de atividades gratuitas, entre elas palestras, exposições, contação de história, atividades culturais, show, limpeza de praia e outras diversas atividades que envolvem temas de conscientização ambiental, pesquisa, biologia marinha e educação.

No Dia Mundial do Meio Ambiente (5), a programação teve início às 9h, com encerramento às 19h. A primeira atividade foi a Roda de Conversa “Bioma Mata Atlântica”, promovida pelo Grupo Tamoio de Ubatuba, que aconteceu na Escola Municipal Carpinetti. Às 10h e 14h aconteceu a palestra Ciência Oceânica nas Escolas: “Tubarões e Raias: mergulhando no conhecimento”, promovida pelo Aquário de Ubatuba, mas que aconteceu no Museu da Vida Marinha. Nos mesmos horários, ocorreu também no Museu a Contação de História: “Além de nós…Quem mora comigo?”, contada por Rosana Gaeta. Na Escola Municipal Professora Olga Ribas de Andrade Gil, ocorreu às 14h o Jogo “Caminho das Águas”, promovido pela APAMLN e pelo Programa PSA – Mar Sem Lixo. A programação do dia encerrou-se com a Mesa Redonda “Cultura Oceânica”, às 19h, com Andrée de Ridder Vieira (Instituto Supereco), Ronaldo Christofolleti (Maré de Ciência UNIFESP), e Helbert Ramon (Cernes e Associação dos Amigos e Remadores da Canoa Caiçara (AARCA), no Aquário de Ubatuba.

Terça-feira, dia 6, a programação teve início às 10h e se estende até às 19h. Iniciou com a Vivência dos Saberes Ancestrais, promovida pelo Sr. Higino e pelo Projeto Monitoramento Mirim Costeiro Ubatuba, no Aconchego da Barra, na Praia Barra Seca. Nos horários 10h e 14h, a palestra Ciência Oceânica nas Escolas: “O Projeto Tamar e a conservação das tartarugas marinhas” ministrada pela Fundação Projeto Tamar, acontece no Museu da Vida Marinha. Para fechar a manhã, às 11h, a atividade Cultura Oceânica: “SOS Mata Atlântica”, promovida por Lidi Keche (Tamoio de Ubatuba) e Patrícia Barros (Projeto Ribeira Viva), na Rádio Beira Mar FM 101,5MHz. A programação do dia se encerra com o bate-papo online “Os Caminhos do Lixo no Mar”, às 19h, que será conduzido por Hugo Gallo (Aquário de Ubatuba) e Alexander Turra (IO/USP), no canal oficial do YouTube do Instituto Argonauta.

Dia 7, quarta-feira, a programação começa às 10h, com última atividade prevista para às 19h. Para começar o dia, atividade Ciência Oceânica nas Escolas “Um Oceano de Vida” promovida pelo Instituto Argonauta, no Museu da Vida Marinha, programada também para acontecer no período da tarde, às 14h. Também nos mesmos horários, acontece simultaneamente a atividade “A vida de Georgina”, com Marlene Giraud do Grupo Manguezal Terra do Guaiamum, mas em local diferente, no Aquário de Ubatuba. Às 9h e às 16h, a ação Dia Mundial dos Oceanos acontece no Píer Saco da Ribeira, e será conduzida pelo Projeto Ribeira Viva, Área de Proteção Ambiental Marinha do Litoral Norte (APAMLN), Projeto PSA Mar Sem Lixo, Instituto Argonauta, Secretaria Municipal de Meio Ambiente, Tamoio de Ubatuba, Projeto Meros do Brasil e Fundação Florestal.

Ainda no dia 7, ocorre às 15h a Contação de História: “Vivi no fundo do mar”, que será contada por Gabriela Reynaldo Pereira do Projeto Meros do Brasil, no Píer Saco da Ribeira. Às 18h, acontece cinema e exposição itinerante, conduzidos por Projeto Monitoramento Mirim Costeiro Ubatuba, na Praça Capricórnio. Para encerrar o dia, às 19h a Mesa Redonda: “Unidades de Conservação e o Turismo Sustentável”, com participação de Priscila Saviolo (Parque Estadual da Ilha Anchieta/Fundação Florestal), Kellen Leite (Refúgio da Vida Silvestre do Arquipélago de Alcatrazes/ICMBio), e Márcio José dos Santos (Área de Proteção Ambiental Marinha do Litoral Norte/Fundação Florestal), no Aquário de Ubatuba.

Na quinta-feira, dia 8, acontecem duas atividades: às 14h Contação de Histórias: “Vivi no fundo do mar” com Gabriela Reynaldo Pereira (Projeto Meros do Brasil), na Fundação Projeto Tamar, e às 19h no Aquário de Ubatuba a palestra “Carbono Azul – o caso do Manguezal”, ministrada por Laís Zayas (ESALQ/USP).

No penúltimo dia, sexta-feira (9), ocorrerão também duas atividades: às 18h o cinema e exposição itinerante conduzidos pelo Projeto Monitoramento Mirim Costeiro Ubatuba, na Praça Capricórnio, e a Mesa Redonda “A conservação das espécies marinhas”, às 19h, com participação de Henrique Becker (Fundação Projeto Tamar) e Rafaela Souza (Projeto Baleia Jubarte).

O último dia da 9ª edição da Semana do Mar, sábado (10), já inicia com uma prática de yoga na Praça da Baleia, com a professora Maharani Satya (Ekomat), às 7h30. Das 8h às 13h estão programadas três atividades na Praça da Baleia: a exposição de Tendas das Instituições parceiras, limpeza de praia e do mar e a apresentação do Boi de Conchas. A partir das 18h, acontece o encerramento do evento na Fundação Projeto Tamar, com apresentação de curtas ambientais e do Coral Guarani Aldeia Boa Vista. Para fechar, às 20h, o show com Luara Oliveira e as Comadres.

Sobre o Instituto Argonauta

O @institutoargonauta foi fundado em 1998 pela Diretoria do Aquário de Ubatuba @aquariodeubatubaoficial_ e reconhecido em 2007 como OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público). O Instituto tem como objetivo a conservação do Meio Ambiente, em especial a conservação dos ecossistemas costeiros e marinhos. Para isso, apoia e desenvolve projetos de pesquisa, resgate e reabilitação da fauna marinha, educação ambiental e resíduos sólidos no ambiente marinho, entre outras atividades. O Instituto Argonauta também é uma das instituições executoras do Projeto de Monitoramento de Praias da Bacia de Santos (PMP-BS).

Seja um Argonauta!

Venha conhecer o Museu da Vida Marinha @museudavidamarinha, na Avenida Governador Abreu Sodré, 1067 – Perequê-Açu, Ubatuba/SP, aberto diariamente.

Também é possível baixar gratuitamente o aplicativo Argonauta, disponível para os sistemas operacionais iOS (APP Store) e Android (Play Store). No aplicativo, o internauta pode informar ocorrências de animais marinhos debilitados ou mortos em sua região, bem como informar ainda problemas ambientais nas praias, para que a equipe do Argonauta encaminhe a denúncia para os órgãos competentes.

Conheça mais sobre o nosso trabalho em: www.institutoargonauta.orgwww.facebook.com/InstitutoArgonauta e Instagram: @institutoargonauta

Sobre o Aquário de Ubatuba

É o primeiro privado do Brasil aberto à visitação do público e pioneiro no conceito de educação ambiental por meio do contato direto com animais. Destaca-se no país pelos projetos e realizações ao longo de 24 anos, completados em fevereiro do ano passado. Pioneiro em ter elasmobrânquios sob cuidados humanos, um tanque de águas vivas e um tanque de contato no Brasil. A instituição, ainda, possui certificado de bem-estar animal emitido pela Associação dos Zoológicos e Aquários do Brasil (AZAB) em parceria com a Wild Welfare Worldwide e é premiada e reconhecida por iniciativas práticas de conservação e por ter sido a primeira em colocar em exercício iniciativas sustentáveis. Atende, gratuitamente, estudantes de escolas públicas da cidade mediante capacitação de professores.

O Aquário de Ubatuba é aberto todos os dias, das 10h às 22h, e contém o Selo Turismo Responsável. O endereço é Rua Guarani, 859, Itaguá, Ubatuba/SP e telefone para contato (12) 3834-1382.

Conheça mais sobre o Aquário em: aquariodeubatuba.com.brhttps://www.facebook.com/aquaubatuba e Instagram: @aquariodeubatuba.oficial

Fundação Projeto Tamar

É uma instituição privada, sem fins lucrativos e que, desde a década de 1980, atua na proteção das cinco espécies de tartarugas marinhas que ocorrem no Brasil, sendo quatro espécies ameaçadas de extinção e uma dependente de ações para conservação. A Fundação Projeto Tamar tem como missão Promover a recuperação das tartarugas marinhas, através de ações de pesquisa, conservação e inclusão social. Hoje tem 22 bases em oito estados brasileiros. Em Ubatuba, recebe apoio da Prefeitura Municipal de Ubatuba.

O Centro de Visitantes do Projeto Tamar em Ubatuba funciona de quinta a terça das 10h às 17h.

Rua Antonio Atanázio, nº 273, Jrd Paula Nobre

Tel: (12) 3832-6202 / (12) 3832-7014

E-mail: tamaruba@tamar.org.br

A Margem Equatorial Brasileira e o falso dilema entre preservação ambiental e exploração econômica, e o papel das ciências do Mar

28JAN_M+T_IMG_0442Detalhe do sistema de recife de coral da Foz do Amazonas. Foto: Ronaldo Francini Filho/Greenpeace

Por Carlos Eduardo de Rezende*

Na semana que passou, precisamente no dia 31 de maio de 2023, fui convidado para falar na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara Federal em uma audiência pública sobre a exploração de petróleo na Bacia Sedimentar do Amazonas (ou Foz do Amazonas). Neste dia representei a rede de pesquisadores que compõem o Programa Ecológico de Longa Duração do Grande Sistema Recifal Amazônico (PELD GARS- CNPq) coordenado pelo Nils Edvin Asp Neto (PQ* I D do CNPq) e que faço parte como Vice-Coordenador. Como somos um grupo multidisciplinar, representei vários cientistas, a saber: Ronaldo Francini-Filho (PQ* I D do CNPq), Eduardo Siegle (PQ* I C do CNPq), Claudia Omachi e Michel Mahiques (PQ* I A do CNPq) todos da USP, e, Cristiane Thompson (PQ* I D do CNPq) e Fabiano Thomspson da UFRJ (PQ* I A do CNPq), (Figura 1).

equipeFigura 1: Equipe de Pesquisadores

Nesta audiência tivemos representações do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IBAMA), Ministério de Meio Ambiente e Mudanças Climática, Secretários Estaduais de Meio Ambiente dos estados do Amapá e Pará, da Federação Única dos Petroleiros, Instituto Brasileiro de Petróleo, Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás e Biocombustíveis, do Ministério de Minas e Energia, Petrobras e Observatório do Clima.

O debate público que vem sendo conduzido por algumas autoridades políticas tem sido realizado de forma enviesada, pois o plano de governo apresentado por Luiz Inácio Lula da Silva tinha o compromisso de cumprir, de fato, as metas de redução de emissões de dióxido de carbono que o país assumiu na Conferência de 2015, em Paris. Além desta meta, este governo se comprometeu com a transição energética e a expansão das fontes de energia limpa e renovável.

O discurso de Lula na COP27, pouco antes da posse presidencial, reafirmou seu compromisso no combate à crise climática e a escolha de Marina Silva, que possui uma longa trajetória de luta pela conservação da Amazônia, trouxe a esperança e alívio diante da catástrofe que foram os últimos anos na Política Ambiental Brasileira. A mudança do nome do ministério para Ministério do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, consolidou o caminho para o governo brasileiro voltar a focar na sustentabilidade ambiental, na conservação da biodiversidade e no combate à emergência climática.

O motivo da Audiência Pública foi a solicitação da exploração do Bloco FZA-M-59 que passou por algumas empresas até chegar as mãos da PETROBRAS. O IBAMA fez um parecer técnico extremamente detalhado apontando as lacunas desde o início do processo em 2013 até 2018, e a partir de 2019 transfere a operação para a empresa PETROBRAS.

O IBAMA apontou inúmeras lacunas no processo de licenciamento e nosso grupo aponta para inúmeras falhas na modelagem como ausência das ondas geradas pelos fortes ventos da região que podem levar o óleo para as regiões costeiras em caso de algum vazamento (agudo ou crônico). Outro problema no modelo é a resolução da grade espacial de 7 km que não reconhece as feições costeiras tais como estuários e manguezais que apresentam uma elevada sensibilidade (mais de 80% da área com sensibilidade máxima) identificadas pelas cartas de sensibilidade os derrames de óleo para toda região (cartas SAO).

Neste ponto, ressaltamos a importância da região que possui a maior área contínua de manguezais do país e a segunda do planeta. Os manguezais e estuários possuem uma relevância ecológica e social que tem sido negligenciada durante esta e outras discussões envolvendo o licenciamento de atividades industriais no Brasil. Ignoram que a bioeconomia representa grande importância para as populações tradicionais da região (ex.: a cadeia da pesca do Pargo no Município de Bragança movimenta 100 milhões por ano) e para o país (ex.: produtos naturais marinhos como biofármacos). A região costeira dos estados do Amapá e Pará possuem espaços territoriais protegidos (ex.: Unidades de Proteção Integral e Uso Sustentável, Terras Indígenas e Território Quilombola) e foram negligenciados nos estudos de licenciamento.

Outro ponto que chama atenção é a mudança de posição de alguns políticos que defendiam pautas ambientais e compromissos internacionais e agora afirmam que a exploração e produção do petróleo seriam a grande solução para todas as dificuldades sociais enfrentadas na região, ignorando totalmente as questões ambientais, como se não tivéssemos nenhum risco. Aliás, é importante recordar que a Petrobras teve várias licenças de exploração aprovadas recentemente pelo IBAMA e, portanto, não é uma indisposição do órgão das demandas da empresa. A Petrobras tem experiência anterior na região e sabe que não é uma situação como em outras regiões onde vem operando como na Bacia de Campos e Santos. Na região Amazônica, em 95 poços perfurados no passado, em áreas rasas da Plataforma Continental até 1000 m de profundidade, 27 poços foram abandonados por acidentes mecânicos, 54 sem indícios de óleo e 14 abandonados por logísticas exploratórias. Essas informações, da própria ANP, ressaltam as dificuldades operacionais e mesmo com todas as limitações do modelo, em caso de acidente, a exploração nesta região mais profunda (~ 2800 m) o óleo atingiria rapidamente áreas costeiras internacionais da Guiana Francesa, Suriname, Guiana e chegando até outros países no sul do Caribe.

Ainda sobre a região, a Plataforma Amazônica abriga um extenso sistema de recifes mesofóticos, que são pouco conhecidos e sensíveis: o Grande Sistema Recifal da Amazônia (Francini-Filho et al, 2018; Moura et al, 2016). Os Estudos de Impacto Ambiental realizado pelas empresas não são consistentes e o negacionismo científico junto com notícias falsas estão sendo espalhadas para convencer as partes interessadas sobre os possíveis benefícios econômicos da exploração do petróleo na Margem Equatorial brasileira (Banha et al, 2022). Esse sistema recifal está interconectado com a Floresta Amazônica, estuários e manguezais da região, formando um “megabioma” de extrema importância para milhares de comunidades tradicionais e indígenas locais.

Concluindo, nesta Década das Ciências do Oceano para o Desenvolvimento Sustentável, seria importante que nosso congresso estivesse discutindo ações baseadas no conhecimento científico e respeitando os órgãos governamentais responsáveis pelas políticas ambientais que são fundamentais para a credibilidade da política nacional. Toda esta discussão que envolve este falso dilema, mostra o grande descompasso do investimento nas Ciências do Mar Brasileira, pois enquanto a Petrobras detém tecnologia para exploração em águas profundas e ultraprofundas, as ciências marinhas não possuem condições necessárias para estudar a tão conclamada Amazônia Azul embora possua cientistas altamente qualificados.

Observação: PQ significa pesquisador de Produtividade Científica do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações.

Referências

Banha et al (2022) The Great Amazon Reef System: A fact. 10.3389/fmars.2022.1088956

Francini-Filho et al (2018) Perspectives on the Great Amazon Reef: Extension, Biodiversity, and Threats. 10.3389/fmars.2018.00142

Moura et al (2016) Na extensive reef system at the Amazon River mouth. 10.1126/sciadv.1501252


Carlos Eduardo de Rezende é professor titular do Laboratório de Ciências Ambientais da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, e Bolsista de Produtividade 1B do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)

Desmatamento no Cerrado e crise hídrica no Brasil: mais um dano causado pelo avanço descontrolado do “ogronegócio”

O jornal “Folha de São Paulo” trouxe ontem uma matéria em que são apresentados dados correlacionando o avanço do desmatamento no Cerrado com o ressecamento de rios em bacias hidrográficas importantes, incluindo a do Rio São Francisco.  A questão é que apesar de exercer um papel fundamental na regulação hídrica no Brasil, a vegetação do Cerrado sequer é conisderada uma floresta, permitindo assim que o desmatamento avance quase livremente em todo o bioma, ainda que concentrado atualmente no chamado Matopiba (ver figura abaixo).

desmatamento cerrado

O fato é que apesar de não ser tão valorizado quanto a floresta amazônica, o Cerrado é altamente biodiverso e possui características que propiciam a acumulação de água subterrânea que acaba favorecendo a recarga hídrica em toda a extensão do bioma. 

Mas agora com o avanço da monocultura da soja no Matopiba, inclusive sob a facilitação de governos do PT como é o caso da Bahia, o Brasil corre o risco de ver grandes rios se transformando em leitos secos, o que seria uma crise de proporções apocalípticas, visto que o impacto sobre o abastecimento de água irá alcançar áreas fora do Cerrado.

Aliás, como já informado aqui mesmo, em janeiro deste ano, um artigo do qual sou um dos co-autores foi publicado pela revista científica Sustainability mostrando os graves impactos que o desmatamento do Cerrado está causando no fluxo de água de 81 bacias hidrográficas dentro do bioma.  Ali alertamos para as tendências atuais e os riscos de falta de água que o avanço das monoculturas estão causando. Entretanto, até agora, os dados ali apresentados não parecem ter gerado nenhum senso de urgência, apesar das estimativas críticas que apresentamos (ver figura abaixo).

cerrado fluxo rios

E tudo isso para quê? Aparentemente para alimentar o “ogronegócio” que desmata e polui em troca de um modelo de acumulação de riqueza que só favorece um punhado de latifundiários do “ogronegócio’ brasileiro.

O futuro do “Die Linke” na Alemanha: a questão de classe é o que há de mais moderno

O processo de entendimento estratégico e unificação da esquerda deve ser concluído até o congresso do “Die Linke” em novembro

die linkeFoto: DIE LINKE/Martin Heinlein

Por Heinz Bierbaum e Michael Brie para o “Neues Deutschland”

Na noite de 26 de setembro de 2021, ficou claro que muito poucos cidadãos da República Federal acreditam que ainda precisam do Die Linke como seu representante no Bundestag. Não foi utilizado posteriormente para a formação do novo governo, embora a campanha eleitoral visasse justamente a participação governamental nacional. E a perda dramática de membros do partido mostra que mesmo muitos deles não precisam mais deste partido, mesmo que não seja porque se desesperam com ele. Um partido que não é necessário aos cidadãos, nem ao sistema político, nem mesmo aos seus próprios membros, está em crise existencial.

Desde 1990 houve duas grandes tentativas de construir um partido socialista à esquerda da social-democracia. A primeira tentativa foi do PDS. O partido do socialismo democrático foi formado a partir do partido estatal comunista da RDA. Conseguiu afirmar-se, com dificuldade, porque era clara a sua utilidade – um partido popular regional de esquerda que deu voz aos alemães orientais, ajudou a moldar a adesão à República Federativa a nível local e estadual, defensor da os assalariados das empresas da RDA que ficaram desempregados e os que perderam suas propriedades, lares políticos para os do SED que continuaram comprometidos com o socialismo. Com Gregor Gysi, Lothar Bisky e outros, havia um forte grupo de liderança que transmitia as contradições do projeto de uma maneira voltada para o futuro.

A segunda tentativa foi feita pelo WASG (Work & Social Justice – The Choice Alternative) empreendido, combinado com uma reorientação do PDS e a eventual fusão de ambos para formar o Partido de Esquerda (o Die Linke). A agressiva Agenda 2010 neoliberal de Gerhard Schröder levou a uma profunda alienação do SPD e dos sindicatos. A Agenda 2010 foi um ataque aberto aos direitos sociais duramente conquistados pelos assalariados. Isso foi precedido por uma ruptura na questão da paz com a guerra contra a Sérvia. Mais uma vez, o triplo valor da utilidade ficou claro: o Partido de Esquerda se opôs ao neoliberalismo e ao capitalismo do mercado financeiro, bem como à agenda imperial dos EUA com sua própria agenda de política social e de paz, colocou alternativas como o salário mínimo e pensões à prova de pobreza no agenda. Deixou claro seu valor prático em municípios e estados e tornou-se sede política de uma esquerda plural com origens muito diversas. Por alguns anos, a dupla Gysi-Lafontaine incorporou o novo terreno comum, apoiado por muitos sindicalistas experientes e ativistas da esquerda política e social.

Desde meados da década de 2010, a agenda política mudou novamente. O neoliberalismo perdeu força. A grande crise financeira e económica de 2007 a 2009, a crise na União Europeia, o aumento da migração como resultado das guerras e guerras civis no Próximo e Médio Oriente e Norte de África, provocadas não menos pelos EUA e seus aliados, a pandemia, a manifestação da destruição climática e agora a guerra no solo da Ucrânia exigem uma reestruturação abrangente da economia, sociedade, política interna, externa e de segurança. A iniciação de um Novo Pensamento e de uma Nova Política (Gorbachev) e de uma »Revolução Global« de sustentabilidade (Clube de Roma), rejeitada pelo Ocidente em 1989, volta a vigorar 30 anos depois. Trata-se fundamentalmente de definir o curso em todos os níveis da crise atual, catástrofe e capitalismo de guerra, combinados com mudanças globais fundamentais no poder. Essa nova agenda também determina a política na República Federal.

Quatro partidos de tamanho médio determinam a política parlamentar alemã federal: O SPD voltou-se mais uma vez para os sindicatos e está se destacando como a voz da moderação em tempos de capitalismo de guerra e da reestruturação ecológica iniciada. Os Verdes estão comprometidos com uma agenda capitalista verde e laços estreitos com os EUA e seu novo bloco de confronto. A CDU/CSU aproveita moderadamente as fragilidades alheias e segue em busca de seu próprio papel. A AfD estabeleceu-se firmemente como um partido de ressentimento de direita contra a política dominante, combinado com revisionismo histórico, racismo cultural e um consistente nacionalismo econômico orientado para o mercado. Eles querem expandir a Alemanha como uma fortaleza nas próximas tempestades. O FDP desempenha o papel de guardião dos mercados e representante de um negócio como sempre para carros e energia nuclear. O Partido de Esquerda, por outro lado, quase só é notado quando se despedaça. Que valor prático pode ter hoje um partido socialista de esquerda na República Federal? O partido DIE Linke ainda não encontrou uma resposta adequada para esta questão.

A Esquerda só tem uma chance se, após as tentativas de 1990 e 2003, iniciar consistentemente uma terceira tentativa de renovação da esquerda política para além do SPD e provar nas eleições europeias de 2024 que será bem-sucedida. O ponto de partida deve ser a localização do partido nas novas convulsões sociais. Uma dupla transformação está em pauta hoje – a da economia sob as palavras-chave da neutralidade climática e da revolução tecnológica digital e a das condições geopolíticas. A questão não é se essas transformações ocorrerão, mas apenas como e no interesse de quem . Isso traz à tona a questão de classe, e a alternativa socialista torna-se novamente atual.

Sociedade de classes capitalista em convulsão novamente

Primeiro, os desafios ecológicos existenciais questionam fundamentalmente a forma como o capitalismo produz e consome. A produção baseada em energias fósseis não tem mais futuro. São necessários processos de transformação abrangentes na economia e, sobretudo, na indústria. E, de fato, tais processos de transformação estão em curso, ocorrendo nas condições contraditórias de um desenvolvimento capitalista que repetidamente leva a crises e anda de mãos dadas com velhas e novas desigualdades e polarizações sociais. A sociedade de classes capitalista está mais uma vez em convulsão. O trabalho assalariado está aumentando, está sendo moldado ainda mais fortemente pela proporção crescente de mulheres e migrantes, pela divisão em »vencedores« e »perdedores«. O medo do rebaixamento está se espalhando.

O Partido de Esquerda deve provar a si mesmo como uma força sócio-política que se concentra na conexão entre o social e o ecológico do ponto de vista dos assalariados. Ao mesmo tempo, essa conexão exige uma transformação no capitalismo além dela – uma mudança de sistema. A questão do socialismo está se tornando atual novamente. A esquerda está bem ciente disso. No entanto, os esforços da última década para colocar novas questões, como a conexão entre problemas sociais e ecológicos, tiveram até agora apenas um sucesso muito limitado. O Partido de Esquerda deve demonstrar de forma convincente seu valor prático sócio-político para os cidadãos, com base na nova agenda, ter uma influência efetiva sobre o equilíbrio de poder e os projetos no sistema político e de uma nova maneira se tornar o lar político dos grupos internos do partido e novos atores que atualmente estão em desacordo entre si até o fratricídio. Se as perguntas são feitas do ponto de vista de interesses e utilidade classistas, o foco não está mais no que separa, mas no que une.

Em segundo lugar, estamos lidando com mudanças geopolíticas fundamentais. Os EUA estão lutando para manter seu papel hegemônico em declínio no mundo. A República Popular da China é apontada como a principal e rival do sistema. Uma Guerra Fria ideologicamente aquecida está em andamento, o que aumenta muito o perigo de confronto militar aberto, incluindo guerra nuclear. A OTAN e a UE estão do lado dos EUA. Ao contrário dos EUA, a China luta por uma ordem multipolar, assim como a Índia e toda uma série de países da América Latina (Brasil) e da África (África do Sul), combinada com seu próprio rearmamento e projeção de poder. Conflitos militares e guerras estão ocorrendo em todo o mundo e novas alianças militares ameaçadoras, como Aukus (Austrália, Reino Unido, Estados Unidos) estão surgindo. A guerra na Ucrânia faz parte dessa luta geopolítica. Tem diferentes dimensões: é uma guerra de agressão da Rússia e uma guerra de defesa da Ucrânia, na qual o Ocidente quer enfraquecer permanentemente a Rússia geopoliticamente. É sobre a segurança dos estados da UE e seus vizinhos e sobre a estabilidade na região do Mar Negro e na Ásia Central. A esquerda, que se vê como um partido da paz, ainda não se posicionou de forma convincente nessa disputa, mas parece vaga. 

Ulrike Eifler, Susanne Ferschl e Jan Richter reclamam com razão que a esquerda está preocupada com questões sociais, mas não tem orientação de classe suficiente e perdeu a bússola de classe. Isto anda de mãos dadas com uma orientação insuficiente para o mundo do trabalho e trabalhadores dependentes e seus sindicatos. (cf. Eifler et al. “A esquerda precisa de uma bússola de classe”, in: Sozialismus 12-2022, p. 39)

A classe assalariada é dominada pelas pressões da concorrência no mercado de trabalho e mantida dependente do capital. As diferenças de qualificação, entre os setores de trabalho, atribuições de gênero, idade, cultura, orientação sexual ou origem ou local de residência criam desequilíbrios de poder e diferentes oportunidades de vida. Friedrich Engels já sabia que a competição entre os trabalhadores é “o pior lado da situação atual” (Engels 1844), porque expõe repetidamente à divisão precisamente aqueles que são capazes de se levantar dignamente em solidariedade mútua uns com os outros. É precisamente o alto grau de heterogeneidade da classe assalariada que torna necessário desenvolver o que eles têm em comum. Este terreno comum revela-se sobretudo quando se olha o ponto de vista daqueles que são particularmente vulneráveis, experimentam dependências mais do que outros, a classe olha como um todo. Ela tem que fazer suas perguntas com base no cotidiano da classe assalariada, na realidade de seu trabalho, em suas experiências de aluguel ou inflação, nas experiências de seus filhos em escolas superlotadas, em pensões.

Por mais inesperado que seja, os debates existenciais mais atuais estão em curso sobre os rumos das transformações radicais no mundo do trabalho, da produção e do cuidado, da vida e das relações com a natureza, das pessoas e dos estados e povos uns aos outros. Por mais novas que sejam, as questões relacionadas à esquerda são antigas. Nesta crise fundamental do capitalismo de hoje, ele deve se reconstituir como uma força socialista com consciência de classe – ou irá fracassar e perecer. Deve analisar a sociedade em sua forma moderna com vistas às classes, colocar a questão de seu próprio valor de uso a partir da classe assalariada e com o objetivo de fortalecer sua agência solidária.O que há de mais conservador na esquerda, a questão de classe, é também o que há de mais moderno, o contemporâneo!

A Esquerda nunca pode se conformar com o sistema

As profundas divisões no partido Die Linke tornaram-se particularmente evidentes quando conflitos violentos se apoderaram da sociedade da Alemanha Ocidental – tendo em vista a migração, a pandemia e agora a guerra na Ucrânia. Mesmo quando é preciso sobretudo uma posição de esquerda convincente, há posições completamente opostas e a maioria do partido aparece como um mero corretivo moderador da política social ou de paz. Em partes do partido, as questões de classe ficaram em segundo plano, de modo que as tendências libertárias e libertárias de esquerda estão se espalhando. Isso é favorecido quando a política é amplamente limitada a correções da política vigente e a moralidade toma o lugar da análise material, quando os interesses de grupos individuais ou mesmo de estados não estão no contexto das condições capitalistas ou imperiais, não são abordadas em relação às relações de classe. Lutar por mudanças reais no sistema existente requer uma perspectiva de classe. Sem isso, ocorre uma adaptação ao “mainstream”. Um partido como o Die Linke nunca pode se conformar com o sistema, mas deve sempre ser crítico do poder, do capitalismo e da elite e não deve perder de vista a perspectiva socialista. Trata-se de uma »realpolitik revolucionária« (Rosa Luxemburgo), que libera impulsos socialmente transformadores a partir do aqui e agora. Isso exige que ela esteja ciente das contradições reais, não para confortavelmente contorná-las ou dividir a esquerda em falsos opostos divergentes. Lutar por mudanças reais no sistema existente requer uma perspectiva de classe. Sem isso, ocorre uma adaptação ao “mainstream”. 

Um partido como o Die Linke nunca pode se conformar com o sistema, mas deve sempre ser crítico do poder, do capitalismo e da elite e não deve perder de vista a perspectiva socialista. Trata-se de uma »realpolitik revolucionária« (Rosa Luxemburgo), que libera impulsos socialmente transformadores a partir do aqui e agora. Isso exige que ela esteja ciente das contradições reais, não para evitá-las confortavelmente ou dividir a esquerda em falsos opostos divergentes. Lutar por mudanças reais no sistema existente requer uma perspectiva de classe. Sem isso, ocorre uma adaptação ao “mainstream”. Um partido como o Die Linke nunca pode se conformar com o sistema, mas deve sempre ser crítico do poder, do capitalismo e da elite e não deve perder de vista a perspectiva socialista. Trata-se de uma »realpolitik revolucionária« (Rosa Luxemburgo), que libera impulsos socialmente transformadores a partir do aqui e agora. Isso exige que ela esteja ciente das contradições reais, não para confortavelmente contorná-las ou dividir a esquerda em falsos opostos divergentes. mas deve ser sempre crítico do poder, crítico do capitalismo, crítico da elite e não deve perder de vista a perspectiva socialista. Trata-se de uma »realpolitik revolucionária« (Rosa Luxemburgo), que libera impulsos socialmente transformadores a partir do aqui e agora. Isso exige que ela esteja ciente das contradições reais, não para evitá-las confortavelmente ou dividir a esquerda em falsos opostos divergentes. mas deve ser sempre crítico do poder, crítico do capitalismo, crítico da elite e não deve perder de vista a perspectiva socialista. Trata-se de uma »realpolitik revolucionária« (Rosa Luxemburgo), que libera impulsos socialmente transformadores a partir do aqui e agora. Isso exige que ela esteja ciente das contradições reais, não para evitá-las confortavelmente ou dividir a esquerda em falsos opostos divergentes.

É um contraste tão falso quando um partido popular, no qual muitos cidadãos veem seus representantes e seu porta-voz político, se opõe a um “partido de filiação de movimento”. Os bem-sucedidos partidos socialista, comunista e dos trabalhadores sempre foram ambos, extraindo força da capacidade de combinar os dois. Também é uma falsa contradição separar as identidades de diferentes grupos e a questão de classe como terreno comum.

Desde 24 de fevereiro de 2022, um partido enfraquecido, Die Linke, tornou-se um partido em aberto processo de desintegração. Não conseguiu desenvolver uma posição comum convincente sobre a guerra na Ucrânia, muito pelo contrário. As tentativas de evitar os conflitos associados exacerbaram-nos ao ponto de serem insuportáveis. Uma guerra sempre domina a agenda. Todas as questões sociais, culturais, ecológicas e internacionais são feitas sobre sua relação com esta guerra. Não se pode ser vago sobre a questão da guerra e da paz e ao mesmo tempo praticar a política de esquerda. A classe dependente e assalariada pergunta com razão: que tipo de política nos é útil nesta situação concreta? A classe média baixa está cada vez mais difícil de pagar as contas, que são ainda mais baixas mais do que nunca são dependentes do estado de bem-estar ou são dependentes do Tafel. Isso é particularmente pronunciado na Alemanha Oriental, onde a esquerda perdeu em grande parte seu papel de sucesso de longa data como defensora desses interesses específicos e sua ancoragem na sociedade civil. O futuro parece cada vez mais ameaçador para muitos cidadãos – em relação às empresas de cujo bem-estar e miséria dependem os trabalhadores assalariados, em relação à capacidade do Estado de fornecer segurança, em relação à crise climática ou à insegurança e fuga global.

A “velha” questão da classe deve ser colocada de volta na mesa

O Partido de Esquerda deve finalmente se perguntar qual é sua função adequada nesse feixe de conflitos e contradições, e só pode fazê-lo ativando sua bússola de classe. A velha questão de classe tem que ser colocada de volta na mesa: quem se beneficia com a política do governo com suas crescentes entregas de armas, sanções e espera por uma nova ofensiva militar? A esquerda deve opor-se resolutamente a esta política. Deve centrar-se nesta questão de interesses no como da transformação industrial, nas áreas da educação e assistência, na integração de refugiados e migrantes, em todas as questões candentes do dia. A base para isso é uma aliança de classe média que une a classe dos assalariados, que

Do ponto de vista das classes trabalhadoras de todos os países, as reivindicações hoje devem ser »Deponham as armas«, um cessar-fogo, negociações com a perspectiva de uma nova ordem de paz, segurança e desenvolvimento no Leste e Sudeste da Europa e a prevenção de uma Guerra Fria catastrófica. A guerra na Ucrânia não começou em fevereiro de 2022 e suas causas não estão apenas na Rússia, mas também nos EUA e na UE, bem como na própria Ucrânia, portanto, as soluções só podem ser encontradas em conjunto. Pressionar o governo federal, a população nacional, a mídia, as empresas que estão lucrando com a guerra, para conseguir uma mudança na política é a principal tarefa da esquerda em casa. Esta é a única forma de defender com sucesso os direitos sociais,

O partido precisa de um centro estratégico convincente

O partido Die Linke só encontrará saída para sua crise existencial se conseguir determinar sua utilidade como partido socialista da justiça na nova situação de convulsão global e alta incerteza e, a partir disso, finalmente agir de maneira estrategicamente unida novamente . Isso é impossível sem estabelecer liderança no nível federal. Ainda não existe um centro estratégico convincente capaz de superar as contradições erradas e formular a contradição certa para a política vigente. Sem tal centro de liderança, o Partido de Esquerda não tem chance nesta terceira tentativa. O centro estratégico do partido Die Linke não pode ser formado por maiorias mais ou menos estreitas nos congressos do partido, que também conferem influência excessiva aos funcionários do partido. A liderança consiste precisamente em agrupar as várias abordagens legítimas da esquerda, reunindo-as e traduzindo-as em política interventiva. Se as abordagens essenciais da esquerda são permanentemente ignoradas, repelidas ou mesmo denunciadas, seus partidários se retiram, deixam o partido ou ocorrem cisões. O que é necessário não é a fundação de um novo partido além do Die Linke, mas sua renovação construtiva.

O congresso do partido em novembro de 2023 marca a data em que esse processo de entendimento e acordo estratégico deve ser concluído. Isso será usado para medir se o partido criou um centro estratégico integrador e com capacidade de liderança para o partido, sem o qual ele não pode existir. No caminho, trata-se de reunir, análise e entendimento estratégico de classe, o desenvolvimento de projetos apoiados conjuntamente que incorporem o valor prático de uma esquerda na terceira tentativa. Sem “apesar de tudo”, sem a coragem de desafiar os governantes, as estruturas de poder do capitalismo, os belicistas, não funcionará.

Cerrado pede socorro. Fontes que servem comunidades têm resíduos de até nove agrotóxicos

Dado é de uma pesquisa envolvendo a Fiocruz, Comissão Pastoral da Terra (CPT) e Campanha Nacional em Defesa do Cerrado, entre outras entidades, em localidades no Tocantins, Goiás, Maranhão, Piauí, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Bahia

nascente-contaminadaCada vez mais espremido pelo agronegócio, o Cerrado tem nascentes e cursos d’água totalmente contaminados

Por Cida de Oliveira, da RBA

São Paulo – Considerado o berço das águas no Brasil, o Cerrado está contaminado pelos agrotóxicos presentes em nascentes, rios, lagoas, açudes, represas, cacimbas e até em poços residenciais. Na região onde nascem os rios importantes como o Paraguai, Paraná, São Francisco, Parnaíba,Tocantins, Araguaia, Tapajós e Xingu, entre outros, as comunidades estão bebendo águas poluídas por diversos ingredientes ativos altamente tóxicos despejados sobre os latifúndios de commodities.

A gravidade da situação é tamanha que, dependendo da localidade, é possível encontrar na água de abatecimento um mix de até nove ingredientes ativos. Não bastasse a variedade, amostras demonstram também que se tratam de substâncias altamente tóxicas, em altíssimas concentrações.

Estas são algumas das conclusões de uma série de testes de qualidade da água coletada em sete diferentes regiões do bioma Cerrado. Ou seja, em localidades nos estados do Tocantins, Goiás, Maranhão, Piauí, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Bahia, em zonas de transição ecológica com a Amazônia e o Pantanal. O trabalho conjunto envolvendo a Fiocruz, Comissão Pastoral da Terra (CPT) e Campanha Nacional em Defesa do Cerrado, entre outras entidades, culminou com o relatório Vivendo em territórios contaminados: Um dossiê sobre agrotóxicos nas águas do Cerrado, lançado esta semana.

Fruto de uma “pesquisa-ação” implementada entre 2021 e 2022, análises toxicológicas e ambientais, o relatório mostra dados no mínimo preocupantes. Na comunidade quilombola Cocalinho, em Parnarama, Maranhão, uma única amostra continha resíduos de Atrazina, Ciproconazol, Difenoconazol, Epoxiconazol, Glifosato, Metolacloro, Picoxistrobina, Piraclostrobina e Trifloxistrobina. Ou seja, nove dos 13 ingredientes ativos encontrados no conjunto das amostras. Entre eles, a Atrazina, Ciproconazol, Epoxiconazol e o Picoxistrobina estão banidos na União Europeia por desencadearem diversos tipos de câncer, malformações fetais e diversas alterações no organismo.

A gente precisa do Cerrado vivo, diz vítima dos agrotóxicos

Na comunidade vivem 170 famílias, cujos antepassados chegaram à região entre o final do século 18 e começo do século 19. Antes de se fixarem ali, percorreram diversos pontos em busca de cursos d’água que ainda estivessem fora dos domínios dos coroneis da época. A cultura praticada ali em pequenas roças é variada: milho, arroz, mandioca, cana-de-açúcar, feijão, maxixe, quiabo, abóbora, melancia, melão, fava, chuchu, pimenta-malagueta, cebolinha, coentro, alface, couve, inhame e batata doce.

Entre elas está a da agricultora Raimunda Nepomuceno. Nesta quinta-feira (1º), em debate na Câmara, ela relatou a grave situação de quem convive com a pulverização de venenos. “Quando falamos dos venenos, falamos de algo muito perigoso que está destruindo as nossas vidas, a natureza. As pessoas sofrem muito, com câncer, doenças de pele. Tomar água com agrotóxicos todo dia, se alimentar de alimento contaminado. É muito difícil pra nossa gente. A gente precisa de ajuda para sobreviver. Com agrotóxicos não temos território, não temos água. A gente precisa do nosso Cerrado vivo. E para isso precisamos proteger”, disse Raimunda, em um apelo.

Um dos cursos de água poluída por agrotóxicos que servem a comunidade Cocalinho. Foto: CPT

O racismo ambiental a que estão as comunidades de Cocalinho e outras inseridas na pesquisa foi alvo de da petição da Campanha Nacional do Cerrado ao Tribunal Permanente dos Povos, em novembro de 2019. No ano passado, o Estado brasileiro foi condenado pelo ecocídio do Cerrado e o genocídio de 15 povos tradicionais e originários do bioma. Foram condenados também governos estaduais, organizações multilaterais e governos internacionais, empresas brasileiras e multinacionais. Inclusive fundos de investimento envolvidos na destruição ambiental e das condições de vida das comudades.

Outros agrotóxicos encontrados nas amostras de água

  • Glifosato– detectado em todos as amostras. A substância foi proibida pela Autoridade Europeia para Segurança dos Alimentos (EFSA) devido à ausência de evidências suficientes para estabelecer limites de segurança para exposição crônica, mas segue autorizada no Brasil.
  • Metolacloro– além de ser proibido na União Europeia, é suspeito de ser desregulador endócrino e sua exposição está associada ao aumento da incidência de tumores, em particular hepáticos. Além disso é considerado perigoso para o meio ambiente.
  • Fipronil – tem como alvos primários o sistema nervoso, a tireoide e o fígado. Foi classificado pela USEPA como um possível carcinógeno humano, devido à ocorrência de tumores na tireoide. Esse ingrediente ativo também está associado a milhares de casos de intoxicação, inclusive graves.
  • Atrazina– o terceiro agrotóxico mais detectado nas análises, presente em todos os estados em ao menos um ciclo de coleta de amostras, exceto no Mato Grosso. No Maranhão, os níveis de atrazina detectados na comunidade de Cocalinho foram mais de 2 vezes superiores ao valor máximo permitido segundo as normativas brasileiras. Dos oito agrotóxicos identificados e quantificados, quatro estão entre os 10 mais comercializados no Brasil em 2021. O glifosato está na primeira posição. O segundo é o 2,4-D, seguido pela atrazina e o metolacloro, na décima posição.

compass black

Este texto foi originalmente publicado pela Rede Brasil Atual [Aqui!].

Mais de 800 milhões de árvores amazônicas derrubadas em seis anos para atender à demanda por carne bovina

Investigação envolvendo o The Guardian mostra perda florestal sistemática e vasta ligada à pecuária no Brasil

pecuaria guardian

Gado em uma fazenda no estado do Pará, no Brasil. A pecuária é a principal causa de desmatamento no Brasil. Fotografia: Jonne Roriz/Bloomberg/Getty Images

Por Andrew Wasley , Elisângela Mendonça, Youssr Youssef e Robert Soutar

Uma investigação baseada em dados do Bureau of Investigative Journalism (TBIJ), do Guardian, do Repórter Brasil e do Forbidden Stories mostra a perda sistemática e vasta de floresta ligada à pecuária.

A indústria de carne bovina no Brasil sempre se comprometeu a evitar fazendas ligadas ao desmatamento. No entanto, os dados sugerem que 1,7 milhões de hectares (4,2 milhões de acres) da Amazônia foram destruídos perto de frigoríficos que exportam carne bovina em todo o mundo.

A investigação faz parte do projeto Bruno e Dom do Forbidden Stories. Ele continua o trabalho de Bruno Pereira, um especialista em povos indígenas, e Dom Phillips, um jornalista que foi colaborador de longa data do Guardian. Os dois homens foram mortos na Amazônia no ano passado.

O desmatamento em todo o Brasil disparou entre 2019 e 2022 sob o então presidente Jair Bolsonaro, sendo a pecuária a principal causa. A nova administração de Luiz Inácio Lula da Silva prometeu conter a destruição.

Queima de floresta em Lábrea, estado do Amazonas, em agosto de 2020.
Queima de floresta em Lábrea, no Amazonas, em agosto de 2020. Fotografia: Christian Braga/Greenpeace

Pesquisadores da consultoria AidEnvironment usaram imagens de satélite, registros de movimentação de gado e outros dados para calcular a perda florestal estimada ao longo de seis anos, entre 2017 e 2022, em milhares de fazendas próximas a mais de 20 matadouros. Todos os frigoríficos pertenciam às três grandes operadoras e exportadoras de carne bovina do Brasil – JBS, Marfrig e Minerva​.

Para encontrar as fazendas com maior probabilidade de abastecer cada matadouro, os pesquisadores analisaram as “zonas de compra”; áreas com base em conexões de transporte e outros fatores, incluindo verificação por meio de entrevistas com representantes da fábrica. Todos os frigoríficos exportam amplamente, inclusive para a UE, Reino Unido e China, o maior comprador mundial de carne bovina brasileira.

A pesquisa se concentrou em frigoríficos nos estados de Mato Grosso, Pará e Rondônia, importantes fronteiras de desmatamento associado à pecuária. É provável que o número geral de desmatamento nas fazendas que fornecem JBS, Marfrig e Minerva seja maior, porque elas administram outras fábricas em outras partes da Amazônia.

Todas as três empresas dizem que operam procedimentos de conformidade rígidos, de maneira aberta e honesta, para garantir que estão cumprindo suas metas sustentáveis.

O comércio de carne bovina tem sido associado a um desmatamento significativo nos últimos cinco anos. Localização de abatedouros e desmatamento em ‘zonas de compra’ em Rondônia, Mata Grosso e Pará

arco

A Nestlé e a empresa alemã de carnes Tönnies, que forneceu a Lidl e a Aldi, estavam entre as que aparentemente compraram carne das fábricas apresentadas no estudo. Dezenas de compradores grossistas em vários países da UE, alguns dos quais abastecem as empresas de restauração que servem escolas e hospitais, também apareceram na lista de compradores.

A Nestlé disse que dois dos frigoríficos não fazem parte de sua cadeia de suprimentos e acrescentou: “Podemos examinar as relações comerciais com nossos fornecedores que não desejam ou não conseguem resolver as lacunas em conformidade com nossos padrões”.

Tönnies disse: “Essas empresas brasileiras processam muitos milhares de animais por ano para exportação”, e afirmou que não estava claro se a empresa era o destinatário de produtos de plantas ligadas ao desmatamento. Lidl e Aldi disseram que pararam de vender carne bovina brasileira em 2021 e 2022, respectivamente.

Parte da carne enviada para a UE pode violar novas leis destinadas a combater o desmatamento nas cadeias de abastecimento. Os regulamentos adotados em abril significam que os produtos trazidos para a UE não podem ser vinculados a nenhum desmatamento ocorrido após dezembro de 2020.

Alex Wijeratna, diretor sênior da organização de defesa Mighty Earth, disse: “A Amazônia está muito perto de um ponto crítico. Portanto, esses tipos de números são muito alarmantes porque a Amazônia não pode se dar ao luxo de perder esse número de árvores … isso tem implicações planetárias.”

A eurodeputada Delara Burkhardt disse que as descobertas reforçam a necessidade de uma maior legislação global para combater o desmatamento: “A destruição da Amazônia não é apenas um assunto brasileiro. É também um assunto de outras partes do mundo, como a UE, o Reino Unido ou a China que importam o desmatamento da Amazônia. É por isso que os países consumidores devem promulgar leis de cadeia de abastecimento para garantir que a carne que eles importam seja produzida sem induzir o desmatamento. Espero que a nova lei da UE contra o desmatamento importado seja um modelo para outros grandes importadores como a China seguirem.”

Fazenda em Marabá, no Pará
Uma fazenda em Marabá, no estado do Pará. Fotografia: Bloomberg/Getty Images

A Aidenvironment apurou que 13 frigoríficos da JBS estavam ligados a fazendas onde houve desmatamento, derrubadas ou queimadas. Para Marfrig e Minerva foram seis e três plantas respectivamente.​

De acordo com uma análise separada do Guardian para o projeto Bruno e Dom, os matadouros amazônicos pertencentes a essas empresas processaram gado no valor de mais de US$ 5 bilhões (£ 4 bilhões) ainda no Brasil em 2022: mais valor será agregado ao longo da complexa cadeia de suprimentos, e por uma margem esmagadora o valor econômico dessa indústria está sendo percebido fora do Brasil, em pratos de restaurantes em Pequim e Nova York. Eles foram repetidamente criticados pelo desmatamento em suas cadeias de abastecimento na última década.

Outras empresas também são conhecidas por adquirir gado das mesmas zonas de compra.

Nos casos em que foi possível mapear toda a cadeia de fornecimento de carne bovina, o estudo estimou que, desde 2017, houve mais de 100 ocorrências de perda de floresta em fazendas que abasteciam diretamente as fábricas da empresa.

Mais de 2.000 hectares de floresta foram aparentemente destruídos em uma única fazenda entre 2018 e 2021 – a fazenda São Pedro do Guaporé, em Pontes e Lacerda, no estado do Mato Grosso – que vendeu cerca de 500 cabeças de gado para a JBS, embora a empresa tenha dito que a fazenda estava “bloqueada”. ‘ quando suas devidas diligências identificaram irregularidades com eles. A fábrica de carne da JBS que processou esse gado vendeu carne bovina para o Reino Unido e outros lugares nos últimos anos.

Uma fazenda em Pontes e Lacerda
Fazenda em Pontes e Lacerda, 2015. Foto: Carolina Arantes

A fazenda também estava conectada ao fornecimento indireto de mais de 18.000 animais nos três frigoríficos entre 2018 e 2019, de acordo com a Aidenvironment. Todas as três empresas disseram que não estavam sendo abastecidas pela fazenda.

As empresas de carnes há muito dizem que monitorar os movimentos entre as fazendas em suas complexas cadeias de suprimentos é muito difícil. Os críticos dizem que isso permite a “lavagem de gado”, onde os animais de uma fazenda de desmatamento “suja” são transportados de caminhão para uma fazenda supostamente “limpa” antes do abate, disfarçando sua origem. Uma fazenda limpa é aquela sem histórico de multas ou sanções por desmatamento, mesmo que seu proprietário tenha feito desmatamento em outras fazendas.

TBIJ e Repórter Brasil trabalharam com Dom Phillips e The Guardian para relatar um exemplo de lavagem de gado em 2020. Então, a equipe apareceu para mostrar que vacas de uma fazenda sob sanções por desmatamento ilegal haviam sido movidas em caminhões da JBS a um segundo, “ fazenda limpa”. Após a publicação da matéria, a JBS parou de comprar do dono das duas fazendas.

No entanto, nossa investigação descobriu que o proprietário agora fornece Marfrig, outro dos três grandes frigoríficos do Brasil. Uma de suas fazendas, a Estrela do Aripuanã, no Mato Grosso, ainda está sob sanções, mas continua fazendo parte da cadeia internacional de produção de carne bovina.

Registros parecem mostrar que, entre 2021 e 2022, cerca de 500 animais foram transportados pela rota exata que o TBIJ investigou em 2020. O gado foi parar na mesma segunda fazenda “limpa”, Estrela do Sangue, que não tem embargos ou outras sanções ambientais .

Documentos separados parecem mostrar dezenas de animais que se deslocam da fazenda Estrela do Sangue para o frigorífico da Marfrig em Tangará da Serra.

No ano passado, outra investigação do TBIJ associou a Usina Tangará da Serra à invasão da Terra Indígena Menku, em Brasnorte.

De acordo com registros de embarque, a fábrica vendeu mais de £ 1 bilhão em produtos de carne bovina desde 2014 para China, Alemanha, Espanha, Itália, Holanda e Reino Unido.

Trabalhadores em um abatedouro da Marfrig

Trabalhadores de um abatedouro da Marfrig. Fotografia: Ricardo Funari/Lineair/Greenpeace

Em nota, a Marfrig confirmou ter recebido gado do proprietário, afirmando: “A cada transação que realiza, a Marfrig verifica a situação das propriedades fornecedoras de gado. No momento do abate, a fazenda em questão atendia aos critérios socioambientais da Marfrig, ou seja, a propriedade não estava localizada em área de desmatamento, embargo ou trabalho forçado, nem em unidade de conservação ou em terras indígenas.”

Acrescenta: “A Marfrig condena a prática denominada ‘lavagem de gado’ e quaisquer outras irregularidades. Todos os fornecedores aprovados pela empresa são verificados regularmente e devem atender aos critérios socioambientais obrigatórios descritos na política vigente da empresa.”

A Minerva disse que “rastreia as condições das fazendas, garantindo que o gado adquirido pela Minerva Foods não seja originário de propriedades com áreas desmatadas ilegalmente; possuam embargos ambientais ou estejam sobrepostos a terras indígenas e/ou comunidades tradicionais e unidades de conservação”.

A JBS questionou a metodologia de “zonas de compra” usada na pesquisa, afirmando que “a estimativa determina a zona de compra máxima potencial e não necessariamente a zona de compra efetiva”. Disse também que bloqueou a fazenda São Pedro do Guaporé “assim que qualquer irregularidade foi identificada”. Questionado, não especificou a data.


compass black

Este texto escrito originalmente em inglês foi publicado pelo jornal “The Guardian” [Aqui!]. 

Justiça Federal embarga obras de tirolesa no Pão de Açúcar

Ação do Ministério Público Federal apontou corte ilegal de rocha e dano ao patrimônio mundial
tirolesa

Rio de Janeiro (RJ), 10/04/2023 – Reprodução da simulação antes e depois do projeto de construção de uma tirolesa no Parque Bondinho Pão de Açúcar, que ligará o Morro Pão de Açúcar ao Morro da Urca. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

A Justiça Federal do Rio de Janeiro concedeu liminar em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) para determinar que a empresa Companhia Caminho Aéreo Pão de Açúcar se abstenha, imediatamente, de promover cortes ou perfurações em rocha ou executar qualquer intervenção nos morros do Pão de Açúcar, Urca e Babilônia que implique demolição ou construção de novos elementos ou ainda construção de edifício em terreno vazio, sob pena de multa.

A decisão acolheu o pedido de liminar feito pelo MPF, em ação que busca impedir a consumação de grave dano ambiental causado a um dos mais importantes bens do patrimônio cultural brasileiro e mundial. Segundo apurou o MPF, entre 15 de setembro de 2022 e 17 de janeiro de 2023, a empresa operadora do bondinho cortou 127,83 metros cúbicos de rochas dos morros do Pão de Açúcar e Urca, sem autorização e conhecimento do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), com o objetivo comercial de instalar uma tirolesa entre ambos os morros. O MPF apurou, também, que, em vez de embargar administrativamente e autuar a empresa, o Iphan, em 6 de fevereiro de 2023, autorizou a continuidade das obras, tornando-se, com isso, corresponsável pelos danos causados ao patrimônio paisagístico e geológico.

Um dos mais conhecidos e visitados cartões-postais do Brasil, os morros da Urca e Pão de Açúcar são bens de propriedade da União tombados em nível federal e reconhecidos, desde 2012, como patrimônio mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), na categoria ‘Paisagens Cariocas: entre a Montanha e o Mar’.

Descaracterização do bem tombado

A proposta de instalação de uma tirolesa no local causou grande mobilização social contrária e a manifestação do comitê brasileiro do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (Icomos), órgão consultivo da Unesco para a implementação da Convenção do Patrimônio Mundial.

Segundo parecer do Icomos juntado na ação do MPF, “a aprovação desta intervenção compromete a autenticidade e integridade do bem em questão, e abre precedentes para outras descaracterizações em bens tombados naturais em seu entorno. Como agravante, não se trata de obra de adaptação de instalações de interesse público – necessárias à sua conservação, ou manutenção, mas sim de uma obra voluptuária, realizada como opção exclusivamente comercial (para além daquela já intensa, existente no local), e que para realizá-la impõe não só a mera utilização de um patrimônio público natural – bem da União, mas seu corte (mutilação), sendo a rocha um recurso natural não renovável”.

Ainda de acordo com a manifestação do Icomos, a implementação do projeto pode conduzir à inclusão do sítio na lista de patrimônio mundial em perigo, ou mesmo, à posterior penalidade de exclusão da paisagem do Rio de Janeiro da lista de patrimônio mundial.

Recuperação da área e indenização

Além do embargo imediato às obras, o MPF também pede, na ação proposta, que a empresa apresente plano de recuperação da área degradada pelas obras e proposta de Plano Diretor para toda a área objeto da concessão de uso, ficando vedada, desde logo, qualquer ampliação da área construída ou modificação dos usos reconhecidos quando do tombamento federal e da concessão do título de patrimônio mundial da Unesco.

O MPF também pede que, ao final, sejam a empresa e o Iphan condenados, solidariamente, a indenizar a coletividade pelos danos irreversíveis causados ao patrimônio geológico e paisagístico, em valor não inferior a R$ 50 milhões.

Para o procurador da República Sergio Gardenghi Suiama, responsável pela ação, é lamentável que o Iphan tenha convalidado um projeto comercial que implica a mutilação de um recurso milenar não-renovável, acréscimo de área construída e modificação dos usos reconhecidos pelo ato de tombamento, em prejuízo de uma das mais belas e conhecidas paisagens do país.

Ação Civil Pública nº 5062735-09.2023.4.02.5101

Decisão liminar

Consulta processual