No Brasil, o número de pessoas em escravidão moderna dobrou em 2021

Os empreendimentos do agronegócio são especialmente afetados pela presença de trabalho escravo. Houve um grande aumento do trabalho forçado em domicílios particulares. 57.000 pessoas foram libertadas do trabalho escravo no Brasil desde 1995

trabalho escravo

Sob a hashtag #SomosLivres, reiteradamente se chama a atenção para as ações sociais contra o trabalho escravo. Fonte:COMUNICAR QUE MUDA
Por Anne Hellmund para o Amerika21

Brasília. O trabalho escravo continua aumentando no Brasil, pois só em 2021, o Ministério do Trabalho libertou 1.937 pessoas de condições análogas à escravidão. Esta é uma nova alta desde 2013 e um aumento de 106% em relação ao ano anterior. Acima de tudo, a indústria agrícola submete as pessoas ao trabalho forçado. 89% dos afetados trabalhavam em áreas rurais em condições análogas à escravidão. 310 pessoas só na produção de café.

Mas também há trabalho escravo em domicílios particulares. No ano passado, 27 mulheres foram libertadas. Luiza Batista, presidente da Confederação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, alerta que esse número não deve ser subestimado. Isso é um aumento de 1.350 por cento nos últimos cinco anos, de acordo com o Departamento do Trabalho. “O número ainda é muito insignificante em relação ao que realmente está acontecendo no país”, disse ela. “Muitas mulheres trabalhadoras vêm do interior do país, são menores de idade. As meninas cumprem a promessa de que vão trabalhar e estudar. Mas depois nada é assim. Os estudos não existem e o pagamento é apenas uma promessa.”

O enorme aumento no número de pessoas resgatadas pode ser explicado principalmente pelo aumento dos controles no último ano. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística mostra que 6,2 milhões de brasileiros trabalham como empregadas domésticas. Destes, no entanto, apenas 28 por cento têm emprego real. Noventa e dois por cento das vítimas de escravidão doméstica são mulheres e 68% são pessoas que se identificam como negras.

O atual governo de Jair Bolsonaro e o do presidente de fato Michel Temer tentaram desacelerar a luta contra o trabalho escravo. Temer tentou reduzir a definição de trabalho forçado à violação do “livre ir e vir”. O Supremo Tribunal Federal (STF) discordou. As regulamentações de servidão por dívida, exaustão por longas jornadas de trabalho e condições de trabalho degradantes ainda são consideradas condições análogas à escravidão (américa21relatou ). O trabalho dos fiscais dos ministérios do trabalho também foi dificultado nos governos Bolsonaro e Temer. Ambos cortaramo financiamento público para medidas de controle do trabalho forçado .

Um total de 57.000 pessoas foram libertadas da escravidão desde 1995. O trabalho escravo é proibido no Brasil desde 1888. No entanto, o legado colonial continua vivo. Acima de tudo, promete-se às crianças e jovens de famílias mais pobres que terão um melhor padrão de vida e educação superior. Mas a realidade parece diferente. Em vez de receber educação, as crianças caem na escravidão doméstica e são pagas por suas tarefas domésticas com comida, roupas e abrigo. A admissão dos filhos costuma ser camuflada sob o manto da adoção. Há um nome especial para isso: “adoção de má fé”.

Embora a escravidão seja proibidae punível de acordo com o artigo 149 do código penal brasileiro , quase não há casos conhecidos de escravidão doméstica. A rede de direitos humanos SER-DH explica as razões para isso:  É que muitos dos afetados não conhecem seus direitos e são dependentes de suas famílias. O tema da gratidão desempenha um papel particularmente importante. No entanto, nem sempre deve ser fácil para pessoas de fora descobrir casos de escravidão doméstica. As pessoas afetadas são muitas vezes mantidas escondidas e proibidas de ter contato com vizinhos ou outras pessoas.

O caso Madalena ganhou destaque no Brasil no final do ano passado. Madalena Gordiano foi resgatada da escravidão doméstica em 27 de novembro de 2021 aos 46 anos . Sua história é simbólica das experiências de muitos escravos domésticos. Aos oito anos, Madalena foi trazida para a família por uma professora sob o pretexto de adoção e melhor educação. A adoção prometida nunca aconteceu. Madalena nunca tinha permissão para ir à escola, não tinha permissão para falar com os vizinhos e não tinha outros contatos. Em vez disso, ela tinha que fazer trabalho doméstico e era paga com o que precisava para sobreviver.

Ela não recebia salário, nem dias de folga, e dormia em um quartinho sem janelas. Ela também foi casada com um homem de 78 anos em uma idade jovem. Durante sua vida, recebeu uma das maiores pensões do Brasil. Após a sua morte, o dinheiro teria ido para a Madalena. No entanto, a família que escravizou Madalena o usou para financiar os estudos médicos de sua  própria filha. Com a ajuda de um morador da casa, Madalena foi libertada. Como ela descobriu mais tarde, sua irmã gêmea teve um destino semelhante. 

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Este texto foi escrito inicialmente em alemão e publicado pelo Amerika21 [Aqui!].

ActionAid comenta aumento da sobrecarga de trabalho doméstico para as mulheres e retoma campanha pela divisão justa

‘Diante da escalada de uma tragédia sanitária e econômica, essa desigualdade se escancara’

covid-19 domesticas

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou na manhã desta quarta-feira a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) que revela o aumento da desigualdade na divisão sexual do trabalho doméstico no Brasil, numa escalada que já vem acontecendo há anos. De acordo com o levantamento, a jornada da mulher nos serviços de casa é 10h24m superior à do homem por semana, é quase o dobro.

A organização internacional ActionAid, em seu trabalho por igualdade de gênero, superação da pobreza e justiça social em 43 países, vem atuando contra essa divisão injusta do trabalho doméstico e alertando sobre a necessidade do olhar atento desses números e suas consequências. Neste momento de pandemia, em que as mulheres fazem parte dos grupos mais afetados, sobrecarregadas tanto na linha de frente do combate ao coronavírus quanto em suas próprias casas, é fundamental aprofundar o debate e defender medidas que garantam a proteção e vida digna dessas mulheres. Por isso, a ActionAid junto a 11 parceiras, como Casa da Mulher do Nordeste e Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata, além de organizações que compõem a Rede Feminismo e Agroecologia do Nordeste, retomam nesta quinta-feira (04/06) a Campanha Pela Divisão Justa do Trabalho Doméstico, que visa a levar mensagens de divisão justa e de vida livre de violência para as mulheres impactadas por suas ações, especialmente em áreas rurais e mais vulneráveis. O mote da campanha é “Ficar em casa é questão de saúde. Dividir tarefas e viver sem violência também”, tema da live que marca o lançamento, realizadnYouTub, às 15h.

“Historicamente, a materialização dos cuidados com as tarefas domésticas e com os dependentes vem sendo estrutural, cultural e socialmente atribuída a nós, mulheres. É um ‘trabalho invisível’, pouco reconhecido ou valorizado. Agora, diante da escalada de uma tragédia sanitária e econômica, essa sobrecarga em relação aos homens se escancara e coloca mães, avós, trabalhadoras informais, enfermeiras e tantas de nós na linha de frente tanto do combate ao vírus quanto dos seus impactos”, comenta Claudia Dias, assessora de Direitos das Mulheres da ActionAid.

De acordo com a Pnad, desde 2016, o tempo dedicado pelos homens ao trabalho doméstico se mantém em 11h. Há 4 anos, no entanto, a diferença de horas dedicadas entre homens e mulheres era de 9h54. Em 2019, subiu para 10h24. No Brasil, ainda segundo a pesquisa, 92% da população feminina de 14 anos ou mais realizam afazeres domésticos, enquanto 78,5% da população masculina se encarregam dessas atividades. O relatório “Quem cuida do futuro” , publicado este ano pela ActionAid, também aponta números nesse sentido: mulheres e meninas desempenham ¾ do trabalho doméstico e dos cuidados não remunerados no mundo inteiro.

“Os agravados reflexos dessa divisão injusta do trabalho doméstico vão bem além dos físicos e emocionais. Com postos de trabalho extintos, escolas fechadas e serviços públicos paralisados ou voltados ao combate da pandemia, as mulheres ficaram não somente ainda mais sobrecarregadas, mas sem condições de suprir as necessidades de suas famílias. As mulheres estão na posição mais baixa da pirâmide econômica: têm rendimentos mais baixos; vínculos empregatícios mais precarizados, compõem a maior parcela do mercado informal e correm mais risco de perderem seus empregos na pandemia, principalmente as mulheres negras. Nesse contexto, as moradoras de favelas, periferias e comunidades pobres, além de indígenas e quilombolas, são as mais vulneráveis”, explica Claudia, ressaltando a urgência de haver uma resposta à crise com olhar para as necessidades das mulheres, tanto as emergenciais quanto de longo prazo.

Entre as próximas ações da Campanha Pela Divisão Justa do Trabalho Doméstico está a distribuição de uma série de materiais de comunicação em comunidades rurais e urbanas, principalmente na região Nordeste, para conscientizar mulheres e famílias sobre a importância da divisão justa de tarefas, além de alertar para abusos e formas de prevenir e denunciar a violência doméstica.

Para pedidos de outras informações e entrevista:

Ana Carolina Morett | Assessoria de Imprensa e Conteúdo | Media & Content | Brasil, Tel: +55 21 99502-1957,  E: anacarolina.morett@actionaid.org

Depois de atacar servidores, Paulo Guedes vai para cima das domésticas para justificar alta do dólar

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O ministro da Economia Paulo Guedes definitivamente é uma pessoa que não tem medo de externar suas ideias, mesmo correndo o risco de provocar quem está quieto e apenas tentando sobreviver em um país onde a prioridade parece ser apenas canalizar dinheiro para o 1% mais rico da população.  

Em mais um daqueles encontros entre “pares”, e no melhor estilo “Caco Antibes”, Paulo Guedes resolveu criticar o tempo em que supostamente as domésticas podiam viajar para Miami por causa do câmbio favorável ao Real (ver clip abaixo).

A frase quase inaudível de Paulo Guedes traz a seguinte pérola “Era empregada doméstica indo para Disneylândia, uma festa danada”.  Curiosamente, o ministro da Economia passou suas últimas férias em Miami, o que revela a ponta do iceberg de uma forma elitista de pensar o direito de todos (inclusive as empregadas domésticas) almejarem o que ele próprio já desfruta..

A verdade é que, querendo ou não, Paulo Guedes é o espelho do que pensam não apenas os ultrarricos brasileiros, mas também daqueles que segmentos menos abastados mas que vivem nas tetas do rentismo, os quais se sentiram extremamente incomodados com o soluço de consumo ampliado que foi proporcionado pelos anos do PT na presidência da república. Para esse gente, doméstica boa mesmo é aquela que nunca volta para casa e ainda tem que pagar pela comida que ingere em horas intermináveis de trabalho.

Queiramos ou não,  Paulo Guedes nos faz o favor de explicitar o que realmente pensam os líderes do governo Bolsonaro sem nenhuma frescura ou medo das consequências. Se não fosse pelo ministro da Fazenda, ficaríamos apenas discutindo essa ou aquela asneira proferida pelo presidente Jair Bolsonaro.  Mas com Guedes abrindo sua boca para dizer o que as elites realmente pensam, cedo ou tarde as amarras da inércia das massas será destroçada pela ira que gesta por debaixo de um mar de aparente aceitação das políticas ultranaeoliberais que ele importou do Chile de Augusto Pinochet.

Por último, posto um vídeo premonitivo do humorista Marcelo Adnet que nos vem do ano de 2012. Assistam e depois reflitam sobre a atualidade de um sketch humorístico que repentinamente tem a capacidade de explicar o presente em que estamos afundados. Brilhante Adnet!