Presidente do IBAMA revoga instrução que previa destruição de equipamentos usados em práticas ilegais, mas “esquece” de apontar novas diretrizes

equipamentos

O Diário Oficial da União traz hoje a curiosa (na ausência de melhor palavra) Instrução Normativa  Nº 6,  de 6 de março de 2023 que a Instrução Normativa nº 3, de 23 de janeiro de 2018, que estabelece os procedimentos para a aplicação da medida cautelar de destruição ou inutilização de produtos, subprodutos ou instrumentos utilizados na prática da infração ambiental, no âmbito das ações de fiscalização ambiental.

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O problema é que a nova instrução não traz nenhuma instrução sobre será feito com os equipamentos que vierem a ser encontrados dentro de unidades de conservação e terras indígenas sendo usados na prática de crimes. O ideal é que a anulação de uma instrução já trouxesse novas diretrizes na nova, mas não foi o que aconteceu.

Como existem muitas pressões sendo feitas sobre o governo Lula por parte de membros de sua própria base parlamentar para que não haja a devida repressão contra crimes ambientais, a situação criada pela remoção da Instrução Normativa nº 3, de 23 de janeiro de 2018 deverá ser acompanhada de perto. É que se não for colocado nada que explicitamente puna a presença desses equipamentos dentro de terras protegidas, o que teremos é a continuidade da boiada passando para alegria completa de Ricardo Salles e seus antigos colegas do governo Bolsonaro.

Porta-aviões brasileiro afundado pode despejar mais de 300 toneladas de substâncias tóxicas no mar

A decisão de afundar a embarcação, além de prejudicial ao meio ambiente, viola tratados internacionais e ignora parecer do Ibama. A recuperação energética de resíduos, tecnologia que transforma o lixo não reciclável em energia, é uma alternativa ambientalmente mais correta e segura para tratar grandes quantidades de materiais perigosos.

são paulo

O afundamento do casco do porta-aviões São Paulo, realizado na última sexta-feira (3), pela Marinha do Brasil, é visto com grande preocupação pela Associação Brasileira de Recuperação Energética de Resíduos (ABREN).O motivo é que a embarcação pode despejar mais de 300 toneladas de substâncias tóxicas no mar, ignorando, inclusive, parecer do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama), que apontou os riscos ambientais de tal atitude.

Em um primeiro momento, o governo da Turquia havia comprado o porta-aviões, de 265 metros de comprimento, para que fosse reciclado, mas devido a uma série de questões, em agosto de 2022 ele foi devolvido ao Brasil. No entanto, a Marinha brasileira se recusou a dar permissão para o navio atracar com segurança em uma base naval e tomou a decisão de afundar o navio no Oceano Atlântico.

A embarcação, carregada de amianto, pode conter mais de 300 toneladas de materiais carregados de Bifenilos Policlorados (PCB), um Poluente Orgânico Persistente (POP), que pode causar sérios danos à vida marinha devido à sua toxidade crônica. Com o afundamento do navio, o Brasil viola, inclusive, a Convenção sobre a Prevenção da Poluição Marinha por Despejo do Protocolo de Londres de Resíduos e Outras Matérias, de 1996, bem como a Convenção de Estocolmo sobre Poluentes Orgânicos Persistentes.

Para tratar os PCBs, assim como os POPs, de forma ampla, uma das alternativas mais recomendadas em todo o mundo é a incineração por meio de altas temperaturas, a fim de destruir os contaminantes. Esse método possibilita lidar com grandes volumes desse tipo de material contaminado, de maneira segura e eficiente.

No Brasil, inclusive, é recomendada a incineração para resíduos sólidos permeáveis com concentrações acimada de 50 partes por milhão (PPM), desde que seja devidamente licenciado, com Eficiência de Destruição e Remoção (EDR) mínima de 99,9999%.

Atualmente, uma das soluções mais sustentáveis é o tratamento térmico por meio das Usinas de Recuperação Energética de Resíduos (UREs), que podem facilmente lidar com esse tipo material e ainda gerar energia elétrica, de forma limpa e sustentável, para uma grande parcela da sociedade.

Porém, ao contrário do resto do mundo, o Brasil ainda está atrás quanto à utilização dessa metodologia para transformar o lixo não reciclável em energia. Enquanto há mais de 2,5 mil URE’s em todo o mundo, o país está em processo de construção de sua primeira usina, localizada em Barueri (SP). A planta tem previsão de entrar em operação a partir de 2025.

Governo Lula realiza suas primeiras ações de repressão ao desmatamento ilegal na Amazônia

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Por Jake Spring para a Reuters

URUARA, Brasil, 19 Jan (Reuters) – As primeiras incursões do Brasil contra o desmatamento ilegal na floresta amazônica sob o presidente Luiz Inácio Lula da Silva estavam em andamento na quinta-feira, após a promessa do novo líder de acabar com a destruição que aumentou sob seu antecessor Jair Bolsonaro.

A Reuters acompanhou exclusivamente as incursões lideradas pela agência ambiental Ibama no estado da floresta tropical do Pará para impedir que madeireiros e fazendeiros derrubassem ilegalmente a floresta. A agência também lançou batidas esta semana nos estados de Roraima e Acre, disse a coordenadora de fiscalização ambiental do Ibama, Tatiane Leite.

Cerca de 10 agentes do Ibama partiram em caminhonetes na quinta-feira de sua base no município de Uruara, no Pará, juntamente com uma dezena de policiais federais, em direção a uma reserva indígena onde imagens de satélite mostraram madeireiros e fazendeiros trabalhando recentemente na derrubada ilegal da floresta. A missão visa deter ou afugentar madeireiros para evitar novas incursões na floresta e multar quem for flagrado com madeira ilegal.

O governo Bolsonaro reduziu o número de funcionários e fundos para fiscalização ambiental do Ibama em seus quatro anos de mandato, enquanto o ex-presidente criticou repetidas vezes o órgão por emitir multas a fazendeiros e mineradores.

Bolsonaro deu aos militares e depois ao Ministério da Justiça autoridade sobre as operações de combate ao desmatamento, deixando de lado o Ibama , apesar da vasta experiência e sucesso da agência no combate à destruição da Amazônia.

Uma área maior que a Dinamarca foi desmatada sob Bolsonaro, um aumento de 60% em relação aos quatro anos anteriores.

Lula na campanha eleitoral do ano passado prometeu colocar o Ibama de volta no comando do combate ao desmatamento com financiamento e pessoal reforçados. Ele assumiu o cargo em 1º de janeiro, então dinheiro adicional e equipe ainda não chegaram aos policiais da linha de frente. Mas agentes do Ibama disseram à Reuters que já se sentiam mais fortalecidos por Lula anunciar a proteção ambiental como prioridade máxima.

O governo de Bolsonaro negou vários pedidos da Reuters para acompanhar as missões do Ibama durante seu governo 2019-2022. Seu governo instituiu uma liminar proibindo os agentes do Ibama de falar com a imprensa, que, segundo os agentes, já foi revogada no governo Lula.

“Divulgar batidas para dissuadir criminosos ambientais já é uma grande mudança. Isso não acontecia no governo anterior, cujo objetivo era mostrar que não estávamos fazendo nada”, disse Givanildo dos Santos Lima, agente que comanda a missão Uruara do Ibama.

Lula assumiu o cargo pela primeira vez em 2003, quando o desmatamento da Amazônia estava próximo de seu recorde histórico, e por meio da estrita aplicação das leis ambientais o reduziu em 72%, para um nível quase recorde quando deixou o cargo em 2010.

Jake Spring é  Correspondente Global de Clima e Meio Ambiente, baseado no Brasil. Os interesses incluem ciência, florestas, geoengenharia, criosfera, política/diplomacia climática, responsabilidade e reportagens investigativas. Seu trabalho sobre a destruição ambiental sob o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, recebeu prêmios da Covering Climate Now e da Society of Environmental Journalists. Anteriormente baseado na China, ele é fluente em português e chinês mandarim.


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Este escrito originalmente em inglês foi publicado pela agência Reuters [Aqui!].

Dossiê mostra ataques de Bolsonaro contra transparência pública e acesso a dados ambientais

Quinto relatório da série Dossiê Bolsonaro revela uma política deliberada do governo para ocultar dados socioambientais e fundiários em prol de interesses privados; casos relatados incluem negativas de acesso à informação, uso da Lei Geral de Proteção de Dados para esconder nomes de latifundiários e perseguição a servidores

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Por Mariana Franco Ramos e Bruno Stankevicius Bassi

Confira o novo relatório da série Dossiê Bolsonaro.

O caráter antidemocrático do governo de Jair Bolsonaro (PL) não se expressa apenas nas violências sistemáticas cometidas contra os profissionais da comunicação. A sonegação de informações e o esfacelamento dos mecanismos de transparência representam uma outra faceta da empreitada bolsonarista contra o interesse público.

Entre a imposição de sigilo de 100 anos a dados solicitados via Lei de Acesso à Informação (LAI) – 65 casos, segundo levantamento do Estadão – e a perseguição empreendida contra servidores públicos e jornalistas, De Olho nos Ruralistas mapeou os principais episódios de censura ocorridos no país durante os últimos quatro anos.

Os dados são apresentados ao público no relatório Um país sob censura, o quinto da série Dossiê Bolsonaro, que narra o histórico de violações do governo, relativas à pauta socioambiental e à captura do poder público pelos interesses corporativos. Confira os quatro primeiros dossiês aqui.

Com capa ilustrada pelo cartunista Renato Aroeira, o dossiê expõe o uso, cada vez mais frequente, da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) para negar acesso a dados de relevante interesse público, como a lista de nomes dos indivíduos e empresas autuados por crimes ambientais ou por trabalho análogo à escravidão. O próprio observatório recebeu essa justificativa em duas ocasiões, ao solicitar dados via LAI: primeiro em um pedido, feito no dia 25 de julho, da lista de fazendeiros multados na operação Abafa, conduzida pelo Corpo de Bombeiro Militar (CBM) em 2022; e depois, na tentativa de acessar a base de dados mais atualizada do Sistema de Gestão Fundiária (Sigef) do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), que retirou o nome dos proprietários de terra dos arquivos.

O silenciamento de servidores e de profissionais de imprensa, aliado à ocultação de dados sobre os últimos quatro anos de governo, faz parte de uma estratégia mais ampla de Bolsonaro – e dos aliados no setor privado – para esconder seus crimes e privar as futuras gerações de parte importante de nossa história recente.

Você pode acessar o dossiê completo [Aqui!].

Sob o comando de Salles, Ibama e Icmbio restringiram dados

Uma análise da plataforma Fiquem Sabendo nos microdados de pedidos de informação divulgados pela CGU mostrou que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) recusou mais informações e dificultou o acesso a processos em 2019, 2020 e 2021.

O principal motivo citado foi justamente o de que a informação solicitada estaria classificada como sigilosa nos termos da LAI (32% das negativas), seguido por “pedido exige tratamento adicional de dados” (15%), que é quando o órgão alega não ter capacidade de processar toda a informação pedida. Conforme o levantamento, a proporção de pedidos negados mais do que duplicou desde o início da vigência da lei.

Ricardo Salles deu início à “lei da mordaça” nos órgãos ambientais. (Foto: Reprodução)

Entre as perguntas não respondidas, há solicitações que pedem acesso a dados sobre operações contra o desmatamento na Amazônia Legal, número de ações de fiscalização realizadas pelo órgão, gastos do Grupo Especializado de Fiscalização do Ibama e o relatório da Petrobras sobre as manchas de petróleo no litoral nordestino.

Sob o mesmo argumento, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) negou acesso até mesmo aos dados básicos das pessoas físicas e jurídicas autuadas em Unidades de Conservação. “Eles mandaram uma lista, mas tirando os nomes das empresas, com o argumento de que a LGPD protegia”, relatou Luiz Fernando Toledo, diretor da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) e cofundador da Fiquem Sabendo. “É um problema de administração pública somado à burocracia comandada pelo governo atual, que não incentiva a transparência”, complementa.

Essa diretriz de impossibilitar o acesso a dados relevantes sobre temas ambientais foi, em grande parte, traçada pelo ex-ministro Ricardo Salles, hoje candidato a deputado federal em São Paulo, pelo PL. “Quando o presidente Bolsonaro entrou, o Salles começou a fazer ataques violentos e, ainda em janeiro de 2019, ele deu uma entrevista para a Folha dizendo que os dados não eram suficientemente precisos”, conta Ricardo Galvão, ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Essa visão é corroborada por uma servidora do ICMBio que, temendo represálias, pediu para não ser identificada: “É uma tentativa de censura muito desmedida, que vem desde 2019”.

Galvão foi demitido do órgão em agosto de 2022, após a divulgação de dados de desmatamento na Amazônia que desabonavam o discurso que Bolsonaro e Salles tentavam emplacar internacionalmente. Hoje candidato à Câmara pelo PV-SP, o ex-diretor do Inpe deseja criar uma “bancada da ciência”, conforme noticiado pelo observatório: Candidatos defendem ambiente e alertam para as mudanças climáticas“.

Incra removeu dados de sua base fundiária

No Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a situação não é diferente do que ocorre no Ibama e no ICMBio. Em agosto deste ano, o órgão retirou o nome dos proprietários de terra de sua base de dados mais atualizada, o Sistema de Gestão Fundiária (Sigef).

Incra impossibilitou acesso aos nomes de proprietários de terras no Sigef. (Foto: Reprodução)

Informações que eram públicas até então, como código do imóvel, número do processo, data e área, não estão mais disponíveis no site Acervo Fundiário, frequentemente acessado por pesquisadores e jornalistas. Um servidor da autarquia, que pediu para não ser identificado, apontou também a falta de divulgação interna dos atos normativos e a ausência de comunicação direta com a imprensa por parte das assessorias das superintendências regionais como problemas.

“A gente descobriu que em agosto de 2021 o órgão revogou diversas normas sem divulgação interna”, destacou. “No máximo acontece a publicação no Diário Oficial da União (DOU), ou seja, se você não abrir todos os dias, não vai ficar sabendo”. De acordo com ele, em outros momentos a publicação era bastante divulgada por e-mail e na rede eletrônica interna. “Há um avanço no fato de os processos serem eletrônicos, mas há um cerceamento da informação”.

Ainda segundo o funcionário, antigamente as superintendências produziam informações para os repórteres de forma direta. No atual governo, entretanto, os jornalistas que estão nas regionais espalhadas pelo Brasil não podem se comunicar com os veículos de imprensa. “Tudo o que forem falar, sobre qualquer pauta, tem de passar pela direção do Incra”.

“Você tem uma coisa desproporcional da interpretação da lei, de tirar informações massivas de interesse público que não têm relação com propaganda política, sobre a atuação do Estado, por conta de uma possibilidade daquilo ser mal interpretado”, comenta Danielle Belo, da plataforma Open Knowledge. “Você não pode negar o acesso a um processo administrativo inteiro por conta de um dado pessoal”.

Governo promove perseguição de jornalistas

Em junho de 2022, numa audiência pública no Senado, profissionais da comunicação denunciaram o crescimento dos ataques durante o governo Bolsonaro. De acordo com a ONG Repórteres sem Fronteiras (RSF), entre 2018 e 2021, o Brasil caiu oito posições no ranking mundial de liberdade de imprensa, ocupando a 110ª posição entre 181 países analisados. Além disso, o país se tornou o 2º local mais letal para jornalistas no continente, atrás apenas do México.

Foram ao menos trinta assassinatos de profissionais na última década. Apenas no primeiro semestre de 2021, a RSF registrou 330 ataques, um aumento de 74% em relação ao ano anterior. Na avaliação de Bia Barbosa, coordenadora do Intervozes, os posicionamentos de Bolsonaro, de seus filhos e de autoridades próximas corroboram com os dados. “Nós monitoramos hashtags de hostilidade de ataques a jornalistas e comunicadores numa rede social e, em três meses, coletamos mais de meio milhão de postagens”.

Conforme a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Bolsonaro foi responsável pela maior parte das agressões a profissionais da imprensa em 2021, com 147 das 430 ofensivas denunciadas no período, que incluíram episódios de censura (140 casos) e de tentativas de desqualificar a informação (131 casos). Em relação a 2018, quando foram registrados 135 casos, o aumento foi de 218%.28

Mariana Franco Ramos é jornalista. |

|| Bruno Stankevicius Bassi é coordenador de projetos do observatório. ||

Imagem principal (De Olho nos Ruralistas): Tereza Cristina, Aline Sleutjes, Jerônimo Goergen, Bia Kicis, Kim Kataguiri e Coronel Tadeu tomam frente da censura ao material didático


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Este texto foi originalmente publicado pelo “De olho nos ruralistas” [Aqui!].

Após determinação da Justiça Federal, Ibama inicia processo de reavaliação do “bee killer” Fipronil

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Após determinação da 9a. Vara da Justiça Federal do Rio Grande do Sul, o IBAMA publicou no dia 12 de setembro o Comunicado Nº 13577989, DE 8 DE SETEMBRO DE 2022 dando conta que irá proceder com a reavaliação do famigerado inseticida Fipronil, conhecido mais por sua capacidade de exterminar em escala massiva as populações de abelhas do que qualquer outro benefício mais efetivo.

O Comunicado diz ainda que os produtos à base do ingrediente ativo Fipronil que, na data da publicação do Comunicado, já dispuserem de resultado da avaliação do Potencial de Periculosidade Ambiental (PPA) emitido pelo IBAMA, mas cujo registro não tenha sido expedido pela autoridade competente, serão igualmente reavaliados e estarão sujeitos às mesmas exigências mencionadas no item anterior.

Além disso, o IBAMA reitera, por meio desse comunicado, a vigência das proibições e orientações relativas à aplicação de produtos agrotóxicos à base do neoniconinóide Tiametoxam e do Fipronil dispostas na Instrução Normativa Conjunta SDA/Mapa/Ibama n.°1, de 28 de dezembro de 2012 e Instrução Normativa Conjunta SDA/Mapa/Ibama n.°1, de 31 de dezembro de 2014. 

Finalmente, o IBAMA informou que estão suspensas as tramitações dos pleitos de avaliação para fins de registro e alteração de registro referentes aos incisos I,II,III,V do § 4º do art. 22 do Decreto n.º 4.074, de 04 de janeiro de 2002 dos produtos formulados contendo o ingrediente ativo Fipronil já apresentados a este Instituto e dos que venham a ser protocolados.

O agrotóxico que matou 50 milhões de abelhas em Santa Catarina em um só mês  - BBC News Brasil

Veja aqui a lista completa de produtos baseados (que atinge o incrível número de 158 agrotóxicos) no Fipronil que já se encontram sendo vendidos no território nacional.

Essa reavaliação é uma boa notícia, mas só a intensa participação de organizações da sociedade civil e da própria população neste processo de reavaliação que este perigoso veneno agrícola será banido no Brasil.

Observatório BR-319 se posiciona após Ibama liberar Licença Prévia para obras na rodovia sem consulta aos povos da floresta

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Agosto começa com um dos maiores desafios que a questão socioambiental que a BR-319 já enfrentou nos últimos tempos: a liberação da Licença Prévia (LP) para o Trecho do Meio da rodovia. A medida, ao mesmo tempo que é o maior avanço que o processo de licenciamento da rodovia teve nos últimos 15 anos, também é um dos maiores retrocessos em termos de respeito aos direitos dos povos da floresta e à democracia. Isso porque a LP foi emitida sem a consulta prévia, livre e informada às populações mais vulneráveis aos impactos da repavimentação da BR-319, os povos indígenas e comunidades tradicionais, extrativistas e ribeirinhas.

A LP foi expedida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama), na quinta-feira (28/07), para a criação de projetos para obras no Trecho do Meio (entre os quilômetros 250 e 655,7) da BR-319.

“Salta aos olhos a violação dos direitos dos povos da floresta no processo de licenciamento das obras da BR-319. A gestão pública não pode cometer os mesmos erros do passado, na década de 1970, e ignorar indígenas e comunidades tradicionais. Isso coloca em risco o bom andamento do processo e abre brechas para judicializações e mais atrasos”, avalia a secretária executiva do Observatório BR-319 (OBR-319), Fernanda Meirelles. “Além disso, vemos com grande preocupação a emissão da Licença Prévia neste momento de disputa eleitoral, a decisão tem evidente motivação política e eleitoreira”, completa Meirelles.

O diretor da WCS Brasil, organização membro do OBR-319, Carlos César Durigan, diz que é impossível concordar com a viabilidade ambiental anuída pela LP. “Ainda existem pontas soltas no processo todo e, neste caso específico, basicamente não temos garantias das agências ambientais sobre as ações de fiscalização, controle e monitoramento, nem da obra em si e seus impactos diretos. Muito menos dos tantos problemas já registrados e relatados às instituições envolvidas, como tem sido o caso de abertura de ramais, ocupação de terras públicas destinadas – Unidades de Conservação (UCs) e Terras Indígenas (TIs) – e não destinadas, que têm levado a uma explosão da degradação e desmatamento em toda a área de influência da BR-319”, diz Durigan.

Ele alerta que a pressa sempre foi a inimiga do processo de licenciamento das obras na BR-319 e razão pela qual tem demorado tanto. “Ao longo de todo o processo, e nos últimos anos, o que temos visto é uma resistência dos órgãos envolvidos em fazer acontecer as etapas de levantamento de informações e as consultas prévias, livres e informadas aos povos indígenas e comunidades locais, como é preconizado pela Convenção nº169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)”, recorda. “Essas, inclusive, têm sido as principais causas de travamento do processo de asfaltamento e manutenção. Fazer direito já demandaria muito tempo e paciência, mas fazer de modo capenga vai levar a mais questionamentos e não deve agilizar o asfaltamento, e sim gerar aberturas a processos jurídicos. Além do que, irá repercutir de forma negativa no cenário nacional e internacional”, avalia Durigan. 

É importante deixar claro que o Observatório BR-319 não é contra a reconstrução da rodovia, mas se posiciona na defesa de um processo de licenciamento transparente, democrático e inclusivo, que ouça e dê voz a quem mora em territórios tradicionalmente ocupados ao longo da rodovia e que sofrerá as piores consequências de um processo marcado por violações. 

Também é importante que a sociedade não se deixe levar por narrativas enganosas, que colocam ambientalistas, cientistas e outros como vilões e inimigos do progresso. Entra governo e sai governo, a gestão das obras da BR-319 é deliberadamente confusa, irresponsável e incompetente, por isso elas atrasam, porque não cumprem a lei e deixam brechas para a judicialização do processo. Para deixar claro e embasado o que pensa o Observatório BR-319, o coletivo emitiu uma nota de posicionamento que explica pontos fundamentais dessa situação.

Leia a nota completa aqui[Aqui!] e saiba mais sobre o assunto no Informativo Observatório BR-319 [Aqui!]

Sobre o OBR-319 

O Observatório BR-319 é formado pelas organizações Casa do Rio, CNS (Conselho Nacional das Populações Agroextrativistas), Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), FAS (Fundação Amazônia Sustentável), FVA (Fundação Vitória Amazônica), Greenpeace Brasil, IEB (Instituto Internacional de Educação do Brasil), Idesam (Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia), Opan (Operação Amazônia Nativa), Transparência Internacional Brasil, WCS Brasil e WWF-Brasil. 

Mais de 45 mil empresas brasileiras cometeram alguma infração ambiental,aponta Datahub

Levantamento com foco em normas de compliance revela ainda que quase 6 mil negócios possuem embargo junto ao IBAMA. 
Atualmente, 92 empregadores foram flagrados utilizando mão de obra em condições análogas à escravidão
 
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São Paulo, novembro de 2021 – Atualmente, o Brasil possui 45.352 empresas que cometeram alguma infração relacionada à legislação ambiental e foram autuadas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA). O dado faz parte de um levantamento realizado pela DataHub, plataforma de inteligência de dados multi-mercado, que visa explorar as informações de compliance no país.

Segundo a empresa, transgressões à Lei de Crimes Ambientais são classificadas em cinco tipos, sendo: Crimes contra a Fauna; Crimes contra a Flora; Crimes de poluição e outros Crimes contra o Ordenamento Urbano e o Patrimônio Cultural e Crimes contra a Administração Ambiental.

O levantamento também aponta que 5.868 empresas possuem embargo junto ao órgão. Desse montante, 22,6% deles estão espalhados pelos estados do Rio de Janeiro (6%), São Paulo (5,7%), Santa Catarina (4,9%), Minas Gerais (4,2%) e Distrito Federal (1,8%). O impedimento tem o objetivo de permitir que aconteça a regeneração do meio ambiente e a recuperação da área degradada.

Outro dado fornecido pela plataforma é que 92 empregadores foram flagrados utilizando mão de obra em condições análogas à escravidão. O número representa o total de processos após decisão administrativa final relativa ao auto de infração. Segundo o Código Penal, o crime pode ser enquadrado quando seres humanos estão submetidos a trabalhos forçados, jornadas tão intensas que podem causar danos físicos, condições degradantes e restrição de locomoção em razão de dívida contraída com empregador ou preposto.

Pessoas expostas politicamente

Também conhecidas como PEPs, Pessoas Politicamente Expostas são indivíduos que passam por um processo de monitoramento diferenciado das suas movimentações financeiras e fiscais, com objetivo de prevenir a corrupção e crimes como lavagem de dinheiro. A DataHub levantou que, atualmente, existem 139.092 titulares expostos politicamente. O montante representa pessoas que desempenham ou tenham desempenhado, nos últimos 5 anos, cargos, empregos ou funções públicas relevantes, bem como seus parentes de segundo grau – ou pessoas com relacionamento próximo.

PEPs podem ser classificadas em dois níveis: primários, que são também conhecidos como titulares (Presidentes, Secretários de Estado, Deputados, Prefeitos, Vereadores, etc) e secundários, que são os relacionadas aos titulares: parentes de linha direta até o segundo grau, sócios, entre outros.

A pesquisa realizada pela plataforma de inteligência de dados multi-mercado mostra a sequência de classificações de PEPs secundários, sendo: irmão (224.601 pessoas); sobrinho (222.526); filho (144.909); primo (123.485) e tio ou tia (82.898). Em seguida, aparecem 75.228 pessoas classificadas como cunhado ou cunhada; mãe (69.447); cônjuge (48.572) e sócio (47.714).

Empresas inidôneas e suspensas

O levantamento também revela que 15.264 pessoas físicas e jurídicas possuem sanções vigentes, impedindo-as de realizar qualquer participação em licitações ou em celebração de contratos com a Administração Pública. Desse montante, 61% dos casos se adequam à sanção relacionada à Proibição – Lei de Improbidade, 8% a Impedimento – Lei do Pregão, 7% referente à Suspensão – Lei de Licitação, 7% Inidoneidade – Lei de Licitações, 5% à Inidoneidade – Legislação Estadual e 11% a outros temas.

Atualmente, ocorreram 48.977 condenações por Improbidade. Esse dado leva em consideração processos já julgados, que identificam entidades jurídicas ou pessoas físicas que tenham sido condenadas por improbidade, nos termos da Lei no 8.429/92 – Lei de Improbidade Administrativa (LIA).

Outro dado exibido pelo levantamento realizado pela DataHub mostra que 6.397.975 de contribuintes estão com Dívida Ativa da União (DAU). Esse indicador reúne pessoas físicas e jurídicas que possuem qualquer débito, vencido e não pago, podendo ser débitos de natureza tributária e não-tributária.

O que é compliance

Implementadas no Brasil por volta de 1992, no governo Collor, e cada vez mais em evidência no país, após as fortes ações contra esquemas de corrupções, as normas de compliance passaram a ser mais presentes no mundo empresarial. A expressão é oriunda do inglês “to comply”, que significa “estar em conformidade”. Na prática, é um conjunto de regras que oferecem segurança às empresas e instituições, a fim de garantir a execução de regimentos, normas e legislações específicas internas e externas.

Quando tais normas não são cumpridas, essas instituições passam a integrar a Lista Restritiva, conhecida como conjunto de informações que assinalam empresas e indivíduos que já se envolveram ou ainda estão envolvidos em práticas ilícitas ou criminosas. “Empresas de big data, realizam a coleta desses dados não sensíveis, a partir das listas públicas restritivas nacionais e internacionais, para que outras empresas resguardem-se de iniciar relacionamentos comerciais com empresas e entidades suspeitas. Nosso papel é fundamental na tomada de decisões de pessoas físicas e jurídicas, uma vez que com esses dados, diversos problemas futuros são evitados”, explica José Renato Raposo, COO da DataHub.

Metodologia

Existem 300 fontes de dados públicos, onde são capturados os dados e criam novos indicadores a partir dos já existentes. A Datahub faz uso da tecnologia para gerar inteligência nos negócios de empresas parceiras.

Os dados sobre a atuação e embargos do IBAMA e mão de obra em condições análogas à escravidão são referentes ao mês de agosto de 2021. Os dados sobre Pessoas Politicamente Expostas (PEPs), empresas inidôneas e suspensas, condenações por Improbidade e contribuintes que estão com Dívida Ativa da União (DAU) são referentes ao mês de setembro de 2021.

Sobre a Datahub

Fundada em 2004, a DataHub ocupa uma forte posição no mercado de Dados e Informações, unindo tecnologia de ponta, inovação e novas fontes de dados. O propósito é criar novas formas de resolver desafios complexos apresentados pelos clientes, de maneira coerente e clara, sem caixa preta e sem segredos. A empresa faz parte do ecossistema nuvini , e oferece ao mercado um hub de dados com milhões de informações (B2B e B2C), para empresas que posicionam os dados no centro da sua estratégia de crescimento, como um dos pilares das áreas de Marketing & Vendas e Risco & Compliance.

IBAMA não responde pleito da AHOMAR pela anulação do licenciamento da ExxonMobil

Manifestacao-ExonnMobilMobilização contra a ExxonMobil em Sergipe

Como decorrência da audiência pública virtual ocorrida em 14/09/2021, a AHOMAR, entrou em 04/10/2021, com requerimento junto ao Ibama onde pede a anulação da audiência pública virtual e a realização de audiências públicas presenciais em todos os estados impactados, inclusive no Rio de Janeiro.

A situação é no mínimo inusitada uma vez que todas as outras organizações e/ou pessoas que fizeram questionamentos foram respondidos, somente a AHOMAR, aguarda manifestação do IBAMA, sendo que a regulamento da Audiência Pública atribuia o prazo de 20 dias para resposta formal.

Na data de hoje a AHOMAR fez novo requerimento onde solicita a análise de seu requerimento e a manifestação da procuradoria do IBAMA.

No último domingo (24/10), o Fórum dos Povos e Comunidades Tradicionais de Sergipe, a 350.org, a Associação de Homens e Mulheres do Mar da Baía de Guanabara (AHOMAR) e membros da comunidade acadêmica protestaram contra a tentativa de licenciamento de 11 poços exploratórios na bacia marítima de Sergipe-Alagoas pela ExxonMobil

Além da ausência de consulta aos moradores, o próprio Relatório de Impacto Ambiental da ExxonMobil mostra que cerca de 80 municípios estão sujeitos aos impactos potenciais da atividade de exploração que a empresa quer realizar.

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Este texto foi originalmente publicado pela AHOMAR [Aqui!].

Luz verde para crimes ambientais

O governo brasileiro usa métodos criminosos para destruir a natureza. Uma conversa com Eliane Gomes-Alves e Cristiane Mazzetti

destruição amazonia

A destruição da Amazônia continua

Por Ute Evers para a OXI e publicado pelo Neues Deutschland

Eliane Gomes-Alves está fazendo seu doutorado nas áreas de clima e meio ambiente. Ela está atualmente trabalhando como cientista no Instituto Max Planck de Biogeoquímica em Jena.

Cristiane Mazzetti é Gerente Ambiental pela Universidade de São Paulo (USP) e mestre em Meio Ambiente e Desenvolvimento pela London School of Economics and Political Sciences (LSE). Como especialista ambiental, ela trabalha com questões como desmatamento e uso do solo, principalmente por meio de campanhas e lobby. Atualmente, ela faz parte da equipe do Greenpeace Amazon como ativista sênior. A entrevista foi conduzida por Ute Evers.

Você pode nos explicar brevemente sobre o que é sua pesquisa?

Eliane Gomes-Alves: É sobre plantas, gases e clima! As plantas produzem gases comumente conhecidos como odores de plantas. Esses cheiros são, por ex. B. responsável por atrair polinizadores ou afastar predadores. Cumprida essa função ecológica, os gases permanecem no ar e passam por reações químicas que levam à produção de partículas, que por sua vez atuam como núcleos de vapor d’água, que se condensa e inicia a formação de nuvens de chuva. Portanto, há uma conexão entre o cheiro da floresta e a formação de nuvens. Minha pesquisa visa entender como as plantas liberam esses gases / cheiros e como isso varia ao longo do ano.

Você está se concentrando na Amazônia?

Eliane Gomes-Alves: Sim! A Amazônia é a maior floresta tropical do mundo e um importante reservatório de carbono; a preservação da floresta contribui enormemente para a regulação do clima regional e global. Quando comecei a olhar para o meio ambiente em geral, comecei a me preocupar com questões como aquecimento global e mudanças climáticas. Então, eu queria entender como essa floresta afeta o clima.

A floresta tropical brasileira ganhou destaque internacional nos últimos anos devido aos incêndios devastadores e à política climática do presidente Jair Bolsonaro. Qual é o maior dano causado pelo atual governo?

Cristiane Mazzetti:A destruição de uma política pública que levou anos para ser construída e exigiu enormes recursos financeiros para ser projetada e implementada! O plano de ação do PPCDAm (plano de ação para prevenção e controle do desmatamento na Amazônia legal), que conseguiu reduzir as taxas de desmatamento entre 2004 e 2012, incluiu medidas como a criação de áreas protegidas e terras indígenas ou o estabelecimento de medidas de controle. No governo de Bolsonaro, as autoridades de controle (Ibama e ICMBio) foram incapacitadas pela militarização de seus quadros, cortes orçamentários e perda de liderança na implementação dos objetivos. Nenhum projeto apresentado pelo governo brasileiro inclui a criação de novas áreas protegidas, embora existam cerca de 50 milhões de hectares de florestas públicas não designadas,

Além disso, o governo tem incentivado o crime ambiental por meio de medidas provisórias e projetos de lei que visam relaxar a proteção ambiental e legalizar o crime ambiental. Essa combinação dá luz verde à destruição, que não é facilmente reversível. Por exemplo, a ocupação ilegal e a invasão de terras públicas aumentaram porque a aplicação das leis é muito baixa, associada a propostas para abrir terras indígenas para mineração ou para flexibilizar os critérios de regularização fundiária. Os infratores sabem que não apenas não serão punidos, mas também devem ser recompensados ​​pelas mudanças no aparato jurídico.

Entre 2004 e 2012, muitos sinais foram dados para não tolerar crimes ambientais. O que foi conquistado naquela época se perde dia a dia hoje.

É assim que você vê do ponto de vista científico, Eliane?

Eliane Gomes-Alves: Com certeza! Eu vejo três razões para isso. A primeira é que o Brasil já teve uma queda nos investimentos em pesquisa, mas só piorou a partir de 2018. O valor das bolsas de pós-graduação e auxiliares de pesquisa foi reduzido, o que diminui o número de pesquisas. No Brasil, grande parte da pesquisa científica é realizada por pós-graduados. São os doutorandos e pós-doutores que constituem uma parte significativa das publicações científicas. Se o número de bolsas diminuir, diminui o número de pessoas que trabalham e produzem ciência no Brasil.

Além disso, muitos jovens são desestimulados a seguir a carreira científica na área ambiental, visto o quanto está sendo destruído e desconsiderado. Há um sentimento de impotência diante de tanta negligência e ataque à ciência. Embora o mundo todo já tenha entendido por meio da ciência que as mudanças climáticas são um fato e que afetarão gravemente a vida de muitas pessoas, o Brasil vai contra a corrente. O Brasil tem excelentes cientistas. Mas a ciência não tem valor e, portanto, não há incentivo. Dedicar-se às ciências ambientais aqui exige um certo ativismo, que nem todos estão dispostos a assumir.

Como resultado, muitos pesquisadores deixam o Brasil. Sou um exemplo disso: como brasileiro, trabalho para um instituto alemão e posso ser mais ativo cientificamente do que no Brasil. Tudo isso tem implicações de médio e longo prazo, pois a ciência só pode progredir com investimento em recursos financeiros e humanos e com o reconhecimento de sua importância.

Depois dos incêndios devastadores na floresta amazônica no ano passado, eclodiram os protestos da economia internacional. Em junho de 2020, CEOs de empresas brasileiras e internacionais, bem como participantes do setor, ameaçaram em uma carta ao governo que retirariam seus investimentos se a destruição da floresta amazônica não fosse interrompida. Quão credíveis são essas ações se entre os signatários está a gigante agroquímica alemã Bayer, que é famosa pelas exportações de venenos para o sul global?

Cristiane Mazzetti: A política anti-ambiental do governo Bolsonaro provocou reações negativas de muitos atores internacionais – alguns com críticas mais ou menos credíveis à destruição contínua de florestas e degradação ambiental.

A falta de recursos é uma das principais linhas de defesa do governo federal para justificar sua inação, mas não é verdade. Há dinheiro disponível que poderia ser desembolsado para conter o desmatamento e prevenir incêndios florestais. Um exemplo é o Fundo Amazônia com cerca de três bilhões de reais. Organizações da sociedade civil e partidos políticos já apelaram do seu congelamento ao Supremo Tribunal. O Fundo Amazônia já financiou atividades relacionadas à gestão de áreas protegidas e monitoramento ambiental.

Além disso, a Lei do Orçamento de 2021 apresentou o menor valor para o meio ambiente em 21 anos. Bolsonaro somou seu veto à já ruim proposta do Executivo e cortou ainda mais o orçamento para as autoridades ambientais. O problema não é a disponibilidade de recursos, mas a vontade política. Deixar de usar os recursos existentes e cortar orçamentos é uma forma de minar a proteção ambiental e matar os órgãos ambientais (como o Ibama e o ICMBio) por inação. Em relação à Bayer e outras empresas exportadoras de agrotóxicos proibidos da União Européia para o Brasil, a posição de várias organizações da sociedade civil é clara. Nenhum produto pode ser exportado para outros países, cujo uso é proibido no bloco econômico!

A Amazônia como “pulmão verde do mundo” é um mito popular. Como cientista, o que você acha disso?

Eliane Gomes-Alves: Dizer que a Amazônia é o pulmão do mundo é colocar todo o seu significado em uma formulação errada e simplista. Há pesquisas suficientes para mostrar que a maior parte do oxigênio global é produzida pelo fitoplâncton (algas) nos oceanos. Mas as pessoas querem respostas simples para problemas complexos. Mas a ciência não nos dá respostas simples e imutáveis. Freqüentemente, há situações em que novas descobertas derrubam as antigas, e quanto mais ciência é produzida, mais complexo se torna o seu entendimento. Existem muitas pesquisas que mostram a importância da Amazônia em termos de biodiversidade e distribuição de água. Isso de forma alguma o coloca em um nível menos importante, como se ele fosse o pulmão do mundo (o que ele não é). As razões para a conservação da floresta são inúmeras e não podem ser substituídas por um slogan que leve à desinformação. Uma imprensa de boa reputação tem a obrigação moral e ética de investigar e não divulgar informações falsas.

Quão ativos podem ser os movimentos civis pelo clima e os ativistas políticos nos tempos de Bolsonaro?

Cristiane Mazzetti: No passado (antes do governo Bolsonaro), o governo federal via a sociedade civil como um ator estratégico na formulação de políticas públicas e nas ações que ajudavam a reduzir o desmatamento. A moratória da soja foi até citada em relatórios do PPCDAm como uma medida para conter o desmatamento. Esta promessa do setor privado, assinada por comerciantes de soja, foi em resposta à pressão de campanhas da sociedade civil destacando a ligação entre soja e desmatamento florestal na Amazônia.

Atualmente, o governo não apenas interrompeu o diálogo com ONGs, movimentos rurais e povos indígenas, mas também reduziu e eliminou a participação de representantes da sociedade civil nos conselhos. Além disso, um dos rascunhos do plano de enfrentamento ao desmatamento na Amazônia continha a intenção de controlar 100% das ONGs que atuam na área. Já houve casos de denúncias, intimidações e (in) ações judiciais contra ativistas e ambientalistas. A medida tornou-se absurda quando o serviço secreto brasileiro (Abin) foi utilizado para monitorar a sociedade civil durante a conferência do clima em Madri (2019).

Eliane, você passou um tempo na Amazônia. Houve algum momento decisivo que influenciou sua abordagem de pesquisa?

Eliane Gomes-Alves: Com certeza. O conhecimento tradicional das pessoas que moram perto dos locais de teste contribuiu muito para minha pesquisa. São os locais que sabem identificar as plantas com que trabalho, que sabem se locomover na floresta e que conhecem o clima do ponto de vista empírico. Foi meu contato com o povo amazônico que me ensinou sobre a floresta, o que estudar e como fazer minhas pesquisas. Seus conhecimentos tradicionais influenciam o desenvolvimento de projetos experimentais de pesquisa e as adaptações de dispositivos que são construídos apenas para uso em regiões de latitude média, como a Europa.

Que desafios você tem que enfrentar como jovem na pesquisa?

Eliane Gomes-Alves:Os desafios são principalmente resultado do patriarcado. Eu faço pesquisas em uma área, as geociências, que ainda é dominada pelos homens. Em várias expedições, fui a única ou a única parte de um grupo muito pequeno de mulheres que participaram como cientistas. Tenho enfrentado situações caracterizadas por discriminação e preconceito, por ex. Por exemplo, não me deixar dirigir porque sou mulher, para situações reais de assédio sexual. Infelizmente, ainda é comum eu ouvir comentários que às vezes reduzem minhas habilidades cognitivas por meio do preconceito contra as mulheres; que as mulheres são vistas como menos capazes e, às vezes, degradando minha humanidade na forma de uma falta de respeito pelo meu corpo e intelecto.

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Esta entrevista foi produzida pela OXI – Thinking Business Different. OXI, que é um jornal mensal economicamente crítico que está incluído no »nd DIE WOCHE, e foi publicada pelo Neues Deutschland [Aqui!].

Novo recorde em alertas mostra que crime ditará taxa de desmate

Com Ibama desmontado, ICMBio ameaçado de extinção e ministro correndo da polícia, dados do Inpe mostram pior maio da série

Por Observatório do Clima

Os alertas de desmatamento na Amazônia em apenas 28 dias de maio atingiram a marca de 1.180 km2, um aumento de 41% em relação ao mesmo mês de 2020. É a maior área de alertas desde o início da série do sistema Deter-B, do Inpe, em 2016, e a primeira vez que o número ultrapassa 1.000 km2 para esse mês.

O dado é preocupante, porque o mês de maio marca o início da estação seca, quando a devastação se intensifica, em grande parte da região amazônica. A permanecer a tendência nos próximos dois meses, a taxa oficial de desmatamento de 2021 (medida de agosto a julho) poderá terminar com uma inédita quarta alta consecutiva. O comportamento da curva dependerá exclusivamente de quem hoje dá as cartas na região: o crime ambiental.

O regime Bolsonaro se dedica há dois anos e meio a desmontar as políticas de controle de desmatamento, enterrando o único plano que conseguiu reduzir a destruição, o PPCDAm (Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia). A fiscalização do Ibama foi manietada; como mostraram neste ano documentos produzidos pelos próprios agentes, a gestão do antiministro Ricardo Salles virtualmente parou as operações do órgão — cuja cúpula acaba de ser afastada por suspeita de operar para madeireiros.

O Instituto Chico Mendes, que fiscaliza as unidades de conservação federais, está ameaçado de extinção. A fracassada Operação Verde Brasil 2, do general Hamilton Mourão, saiu de cena em abril e não deixou nada no lugar. O plano de Salles de criar uma espécie de milícia na floresta usando homens da Força Nacional foi interrompido pelo fato prosaico de que o ministro, com dois inquéritos contra si no STF, dedica seu tempo hoje a fugir da polícia.

No acumulado desde agosto, vem caindo rápido a diferença entre a área recorde de alertas do ano passado e a deste ano: em janeiro o desmatamento em 2021 era 21% menor que em 2020. Agora a diferença é de 8%, e ainda pode cair mais.

Nesse quadro de ausência completa do governo federal, os R$ 270 milhões que o Congresso conseguiu na semana passada para a fiscalização dificilmente produzirão resultado. “O grande problema da fiscalização e do combate ao desmatamento não é apenas falta de dinheiro; o que falta é governo”, afirma Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima.

O combate ao desmatamento está quase exclusivamente nas mãos dos Estados. O problema é que alguns governadores parecem estar do lado dos desmatadores. Em Rondônia, o Coronel Marcos Rocha (PSL), aliado de Jair Bolsonaro, deu em maio um presente aos grileiros ao reduzir duas unidades de conservação no Estado.

“O desmatamento neste ano será o que os madeireiros ilegais, garimpeiros criminosos e grileiros quiserem que seja. E, neste momento, eles não têm nenhum motivo para se controlar, já que o próprio governo federal, que deveria coibir a ilegalidade, os incentiva com atos e discursos”, conclui Astrini.

Sobre o Observatório do Clima: rede formada em 2002, composta por 68 organizações não governamentais e movimentos sociais. Atua para o progresso do diálogo, das políticas públicas e processos de tomada de decisão sobre mudanças climáticas no país e globalmente. Site: http://oc.eco.br.
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Este texto foi originalmente publicado pelo Observatório do Clima [Aqui!].