O economista e professor da Universidade do Estado Rio de Janeiro (Uerj), Bruno Barth Sobral, é uma das vozes mais lúcidas na análise da crise estrutural da economia fluminense, e vem alertando sobre a falácia de que a assinatura do chamado “Regime de Recuperação Fiscal” é uma armadilha contra o futuro do Rio de Janeiro.
No vídeo abaixo produzido pelo Blog Nocaute do jornalista Fernando Morais, ele e o professor de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) dialogam sobre os impactos que a adesão ao RRF trará para o estado do Rio de Janeiro. Em minha opinião, conhecer os argumentos apresentados pelos dois economistas é fundamental para que não se caia na ladainha de que esse acordo seria uma espécie de salvação. Muito pelo contrário, o que Sobral e Osório mostram é que esse acordo é fruto de uma análise equivocada sobre as causas da crise em que o Rio de Janeiro está imerso neste momento.
E o pior é que embutido nesse acordo há uma clara orientação de redução no número de servidores públicos em um estado onde já existe um déficit em vários setores estratégicos.
Em suma, o RRF está mais para suicídio do que qualquer outra coisa. Mas claramente salvação não é, a não ser para o (des) governador Luiz Fernando Pezão e para o presidente “de facto” Michel Temer.
A entrevista abaixo feita pelo jornalista Paulo Cappelli para a coluna Informe do Dia que é comandada por Fernando Molica no jornal O DIA lança luz sobre o que o economista e professor da UFRJ Mauro Osório chama de “irresponsabilidade coletiva” no tocante às formas de implantação e expectativas geradas em torno do chamado Complexo Petroquímico de Itaboraí (Comperj).
Eu diria que a análise do professor Osório cabe perfeitamente para outros empreendimentos iniciados no Rio de Janeiro sob a chancela dos governos federal e estadual, começando pelo Porto do Açu.
É que se olharmos de perto no Porto do Açu estão presentes os mesmos ingredientes, talvez ainda piorados, do que é abordado em relação ao Comperj. É que até agora não apareceu ninguém de porte para admitir as grosseiras violações de diretos de propriedade e dos danos ambientais que estão transformando num verdadeiro inferno as vidas de centenas de famílias que habitam o V Distrito de São João da Barra.
E eu concordo com a receita de se dar sustentação para que a Uenf e a Uerj possam elaborar politicas de desenvolvimento que nos tirem da situação em que a aludida irresponsabilidade coletiva que extrapola o Comperj nos colocou. Resta saber se o (des) governador Pezão em vez disso não terminar de sucatear o que ainda sobrou dessas duas universidades.
Mas que ninguém depois diga que todos somos cúmplices desse modelo grotesco de aumento da concentração da riqueza que estão nos empurrado para a falência financeira sem qualquer perspectiva de resgate.
Professor acredita em ‘irresponsabilidade coletiva’ no Comperj
Segundo Mauro Osório, a atual crise financeira do estado deve ser compartilhada também com as gestões municipais
PAULO CAPPELLI
Rio – Professor de Economia da UFRJ, Mauro Osório acredita ter havido uma “irresponsabilidadecoletiva” no planejamento que deu início à construção do Complexo Petroquímico de Itaboraí (Comperj) — o qual chama de “miragem”.
Segundo ele, a atual crise financeira do estado deve ser compartilhada também com as gestões municipais. O professor ressalta, no entanto, que 2016 será um ano com uma importante janela de oportunidades: entre elas, os setores de turismo, entretenimento e esportes.
Professor Mauro Osório
Foto: Uanderson Fernandes / Agência O Dia
O Estado do Rio passa por um momento muito delicado financeiramente, com crise em setores como a saúde e extrema dificuldade para conseguir quitar a folha de pagamento. O que levou à derrocada da economia fluminense nos últimos anos?
MAURO OSÓRIO: Há um conjunto de fatores. Além da crise global,no Brasil nós temos uma incerteza política muito grande, que faz com que quem tenha dinheiro para investir acabe segurando. Quem tem dinheiro para consumir a prazo também não gasta. Isto ocorre mais pela incerteza que pela falta de dinheiro. Se a gente olhar, o crescimento da inadimplência foi pequeno. Mas economia é expectativa. A Petrobras, por exemplo, tem sido muito impactada pela Operação Lava Jato, e isso afeta mais o Rio que os outros estados, pois a maior parte dos fornecedores está aqui. A redução do preço do petróleo também foi determinante na queda da arrecadação do estado.
O governo superestimou a receita dos royalties de petróleo e a criação do Complexo Petroquímico de Itaboraí?
O governo estadual, a Prefeitura de Itaboraí, a Petrobras, a imprensa… Eu acho que ali tem uma irresponsabilidade coletiva. O Comperj foi uma miragem. Lançou-se a ideia do polo petroquímico com uma base concreta muito pequena, eu diria ridícula até. A petroquímica Braskem, que pertence à Odebrecht e é parceira da Petrobras, tem uma ponta em Duque de Caxias que ainda pode dobrar. O que de fato há de possibilidade no Comperj é uma petroquímica um pouco maior que a Refinaria de Duque de Caxias (Reduc).
Quais outros erros o senhor aponta?
O governo deveria ter priorizado mais o planejamento, ter aprofundado a discussão sobre as estratégias. Temos que transformar a Uerj e a Uenf (Universidade Estadual do Norte Fluminense) em polos de reflexão sobre o estado, como fazem com a USP e a Unicamp em São Paulo. Agora, a responsabilidade tem que ser compartilhada também com as prefeituras.. Os indicadores municipais no estado do Rio ainda são muito ruins. A Baixada ganha potencial com o Arco Metropolitano, mas é preciso um Plano Marshall para aquela região. Falta água, falta esgoto, falta telecomunicação… Falta investir numa política de infraestrutura, que ainda é muito precária. São praticamente cidades-dormitório. Se você quer atrair atividade produtiva pra lá, tem que investir.
O senhor vislumbra oportunidades para 2016?
Sim. Os setores de turismo, entretenimento, cultura, cinema e vídeo têm janelas importantes. O preço do dólar está alto, e isso tende a estimular o turismo interno, e aí o Rio é a grande cidade do turismo interno brasileiro. Os cariocas e fluminenses também viajam mais por dentro do estado. Na parte de esportes, tem a Olimpíada. Temos que trabalhar a ideia do Rio como a capital do esporte na America Latina.
Há perspectiva de melhora no cenário econômico fluminense a curto e médio prazo?
Se trabalhar e aprimorar o planejamento, sim. Se ampliar o debate regional, sim. Se as universidades entrarem mais nesses debates, sim. Se as gestões municipais melhorarem muito, sim: há eleições para prefeito este ano. Se evitarmos que surjam novos prefeitos acusados de corrupção e que desfilem em Ferraris, sim.