Observatório dos Agrotóxicos: Em contradição com o discurso da vitória, governo Lula dá continuidade à liberação desenfreada de venenos agrícolas

agrotoxicos

Venho dizendo que a questão dos agrotóxicos e a política  de liberação de produtos banidos em outras partes do mundo por sua alta periculosidade é um dos principais desafios do governo Lula, na medida em que explicitará tensões internas e pressões vindas do latifúndio agro-exportador para que a farra de liberações continue intacta.

Pois bem, a edição desta segunda-feira (13/02) do Diário Oficial da União confirma que, apesar do discurso do presidente Luis Inácio Lula da Silva no dia em que venceu as eleições presidenciais de 2022 de que em seu novo mandato a agroecologia seria priorizada para a criação de uma nova agricultura no Brasil, as coisas continuam como dantes no Quartel de Abrantes. É que com a publicação dos atos 5 e 6 de 2023 foram liberados mais 48 agrotóxicos (22 formulados e 26 produtos técnicos), dando continuidade ao processo de inserção de produtos altamente perigosos na agricultura brasileira.

Da mesma forma que ocorreu ao longo dos quatro anos do governo Bolsonaro, o “Observatório dos Agrotóxicos” do Blog do Pedlowski irá divulgar em breve as duas planilhas contendo as informações sobre cada um dos venenos liberados. Uma primeira leitura dos atos 5 e 6 mostra a persistência das mesmas características daquilo que ocorreu nos últimos 4 anos, com a presença de produtos banidos na União Europeia e a predominância de empresas chinesas no fornecimento dos “novos” agrotóxicos.

O que fica claro já no início do terceiro mandato do presidente Lula é que vai ser preciso continuar acompanhando e documentando a escalada de aprovação de venenos agrícolas, de modo a instrumentalizar e apoiar grupos de pesquisas e organizações sociais que estejam envolvidos na luta pela erradicação de agrotóxicos da produção agrícola brasileira. Apoiar a luta por uma agricultura de base ecológica continuará sendo uma das tarefas prioritárias que este blog seguirá cumprindo.

E a explicação para a prioridade acima é relativamente simples: se essa enxurrada de aprovações de agrotóxicos continuar, o Brasil será palco de uma grave crise social, econômica e sanitária nos próximos anos.

Sufocado por agrotóxicos perigosos, Brasil tem de avançar na transição agroecológica

País que já era líder no consumo desses produtos recebeu de Bolsonaro a liberação de mais 2.030, 34% proibidos na Europa. Para pequenos agricultores, agroecologia é a salvação, mas requer investimentos

aspersão

A maioria dos 2030 “novos” agrotóxicos são destinados ao agronegócio exportador, que lucra e deixa o passivo ambiental, doenças e mortes

Por Cida de Oliveira, da RBA

São Paulo – Líder no consumo de agrotóxicos, o Brasil tem como um dos legados de Jair Bolsonaro (PL) a liberação de 2.030 “novos” produtos. Segundo os ruralistas, que têm interesse econômico nesse processo e que por isso o apoia, trata-se de insumos mais modernos. E que a agricultura brasileira depende deles para ser ainda mais produtiva e dar conta e “alimentar o mundo”.

No entanto, esses agrotóxicos não têm nada de novo nem de moderno. São moléculas antigas, muitas delas lançadas há mais de 40 anos, e que nos países da União Europeia nem sequer chegaram a ser liberados. E os que foram, acabaram banidos depois, justamente pela alta toxicidade à saúde e ao meio ambiente.

São substâncias capazes de causar diversos tipos de câncer, malformações fetais, alterações no sistema endocrinológico que, por sua vez, causam outros problemas sérios no organismo. Há ainda mudanças até no sistema reprodutivo, adiantando a fase reprodutiva, segundo estudos. Sem contar as intoxicações agudas e crônicas, que afetam sobretudo os trabalhadores rurais. E populações expostas às nuvens de veneno das pulverizações aéreas que se espalham por quilômetros a partir da aplicação.

Observatório dos agrotóxicos

O professor e pesquisador Marcos Pedlowski, da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf), acompanha essas liberações desde 2019, no início do governo Bolsonaro. Até o final de 2022, sempre sob a batuta da então ministra da Agricultura e Pecuária, Tereza Cristina, a “musa do veneno”. Seu atento trabalho de monitoramento resultou no Observatório dos Agrotóxicos. Clique aqui para acessar a base completa.

Pedlowski compilou dados sobre as formulações, fabricantes, aplicação e posição quanto à liberação em outros países. Além disso, o observatório organiza os atos promulgados pela pasta de Tereza Cristina. Tudo para informar a população e pesquisadores da economia política dos agrotóxicos em nível global e no Brasil. E principalmente, de seus efeitos sobre a saúde humana e o meio ambiente.

Segundo o observatório, 34% desse total de produtos liberados são proibidos na União Europeia. Ou seja, 705 não têm registro ou foram banidos. Há ainda 58 “novos” agrotóxicos compostos por um mix de substâncias, em que parte são autorizadas pelos europeus e parte não, o que elevaria esse percentual.

Classificação da toxicidade é obscura no Brasil

Na avaliação de Pedlowski, esse quesito é de suma importância. E não só porque tal fato se tornaria um problema para a agricultura brasileira. É um tiro no pé dos próprios ruralistas, já que certamente será um entrave futuro para muitas exportações para esses e outros países, já que em sua ampla maioria, os mais de 2 mil venenos aprovados são destinados ao latifúndio exportador de soja e milho, entre outras commodities. Mas há a questão do perigo à saúde e meio ambiente. E isso está camuflado segundo os dados oficiais nos quais o pesquisador se baseou.

Para entender melhor: pela tabela do observatório, a partir de dados oficiais, 141 seriam classificados como “extremamente tóxicos” e 93 como “altamente tóxico”. Na classe “moderadamente tóxico” estariam 279. Entre os “pouco tóxico”, 282. E entre os “improváveis de causar danos”, 554. O restante, segundo o observatórios, seriam aqueles sem classificação ou com o chamado perfil equivalente ao produto de referência.

“Embora a União Europeia também sofra pressões da indústria, a aprovação dos produtos por lá ainda é um parâmetro para analisar as liberações de Bolsonaro, das quais mais de 30% são proibidos lá. Seria um critério mais correto para ter uma ideia da toxicidade do que avaliar pela classificação que a Anvisa passou a adotar. A toxicidade mesmo deixou de ser lida por esse padrão da legislação brasileira, adotada de forma errada em relação ao padrão que dizem que estão adotando”, diz Marcos Pedlowski à RBA, referindo-se à medida do governo brasileiro que, na lei, “rebaixou” a periculosidade dos venenos agrícolas. Ou seja, a “passada de pano” para a lucrativa indústria do setor.

Critérios para periculosidade foram afrouxados

Segundo o professor da Uenf, após a flexibilização da legislação, a classificação ficou ainda mais obscura, o que explicaria a grande quantidade de produtos aprovados na categoria “não classificados”. “Nela eles incluem os produtos que consideram pouco tóxico. Não quer dizer que não tenha sido analisado. Além disso há informações incompletas, como “equivalente ao produto técnico de referência”. Mas qual é esse produto? Não aparece. Qual é a toxicidade do produto de referencia? O que eles fizeram foi uma esperteza contra a população, para não sabermos afinal qual a toxicidade desses produtos técnicos”, critica.

Enquanto o Brasil afrouxa os níveis de exigência para os critérios de toxicidade de um produto usado na produção de alimentos, e capaz de contaminar rios e aquíferos, a União Europeia vai no sentido oposto. Conforme Pedlowski, os órgãos reguladores europeus estão constantemente ajustando padrões de segurança e observando datas limites de permissão de determinados agrotóxicos. Isso significa que alguns habilitados para o uso poderão ser proibidos.

“O agronegócio exportador fica com os lucros e benesses. Agrotóxicos são isentos de agrotóxicos. Na exportação, há incentivos, sem pagamento de impostos devido à Lei Kandir. Para a população fica a contaminação da comida, da água, do meio ambiente, do solo, a intoxicação pela exposição e doenças crônicas”, observa.

Embora haja entre as liberações 292 produtos para controle biológico, ele avalia como insuficiente. “Não modifica o modelo. Para resolver a grave situação é preciso implementar o modelo agroecológico, com reforma agrária. Sem isso é só mudar um pouco a ‘cara da química’ usada no país.”

Mudança requer soluções além das palavras de ordem

A transição do atual modelo de produção agrícola brasileiro para a agroecologia, aliás, é uma das estratégias para desenvenenar o Brasil defendidas pelo Movimento do Pequenos Agricultores (MPA). Para a agricultura familiar, que verdadeiramente coloca a comida no prato do brasileiro, é preciso acabar com a monocultura em latifúndio banhada em agrotóxicos. Mas isso depende de mudanças além de discursos e palavras de ordem.

O coordenador do MPA Frei Sérgio Görgen diz que são três as estratégias básicas: promover políticas para a transição agroecológica, aprovar e implementar legislação que controle o uso de agrotóxicos em todo o país e estimular os bioinsumos. “O agronegócio enfrenta problemas sérios com os agrotóxicos. Há resistência dos insetos, das plantas, enfim, de todos os alvos desses produtos. As fábricas não conseguem novas moléculas. Por isso estão trazendo de volta muitos produtos, para usar em outras culturas, com outras finalidades. É o caso do 2-4, D, um dos mais antigos”, disse Frei Sérgio, referindo-se ao produto que entrava na composição de uma arma química chamada “agente laranja”, usada na Guerra do Vietnã. E que hoje tem indicação para plantações de arroz, cana de açúcar, milho, café e pastagens entre outras.

Ingrediente de arma química do Vietnã agora em lavouras

Esse “agente laranja” constitui um veneno considerado o pior existente, a dioxina TCDD. De grande atividade biológica, é reconhecidamente cancerígeno para humanos conforme a Agência Internacional de Pesquisas do Câncer (IARC, da sigla em inglês International Agency for Research on Cancer) e pelo Departamento de Saúde dos Estados Unidos.

Além disso, é teratogênico, capaz de produzir alterações embrionárias e anomalias no desenvolvimento fetal. E também mutagênico, podendo danificar o DNA das células, o que não é reparado no momento da replicação celular e é transmitido para as próximas gerações. Para complicar, é de difícil degradação ambiental. Pode persistir no ambiente por mais de 100 anos.

Conforme a liderança, por princípio a agricultura familiar é contrária ao uso dos agroquímicos. Mas se vê no dilema de, em muitas situações, necessitar de algum insumo agrícola. E não ter à disposição alternativas biológicas.

Embrapa e universidades têm de criar alternativas limpas

“Então como pedir para o pequeno produtor não usar nada se ainda não temos uma alternativa biológica? A Embrapa e as universidades têm de intensificar estudos para avançar nessa tecnologia e ampliar o acesso a ela. Já existem alguns, mas não em escala suficiente para todos. Só a denúncia não resolve. É preciso apresentar alternativas de soluções”, afirma Frei Sérgio.

Segundo ele, uma delas está no Projeto de Lei (PL) 3.668/2021, apresentado pelo senador Jaques Wagner (PT-BA). Estabelece regras para a produção, o registro, comercialização, uso, destino final dos resíduos e embalagens, o registro, inspeção e fiscalização, a pesquisa e experimentação, e incentivos à produção de bioinsumos para a agricultura.

Estão na categoria dos bioinsumos todo produto, processo ou tecnologia de origem vegetal, animal ou microbiana destinados ao uso na produção, no armazenamento e no beneficiamento de produtos agropecuários, nos sistemas de produção agrícolas, pecuários, aquícolas e florestais, que interfiram positivamente no crescimento, no desenvolvimento e no mecanismo de resposta de animais, plantas, microrganismos e de substâncias derivadas.

Veneno chega na frente

Entre eles, promotores de crescimento de plantas, biofertilizantes, produtos para nutrição vegetal e animal, extratos vegetais, defensivos produzidos a partir de microrganismos benéficos para o controle de pragas, parasitas e doenças, entre outros.

O coordenador do MPA critica o fato de que medidas em prol da redução do uso de agrotóxicos se arrastem. É o caso da Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pnara), cujo PL 6.670/2016 está pronto para votação desde 2018. E que outras, em sentido oposto, caminhem em passos mais largos, como o Pacote do Veneno. Aprovado no final do ano em comissão especial no Senado, está pronto para votação em plenário.

Para ele, as forças do agronegócio no Ministério da Agricultura deverão pressionar pela aprovação, embora o próprio presidente Luiz Inácio Lula a Silva seja contrário. E haverá pressão do Congresso, ainda mais conservador que antes. “Não dá para aceitar que sejam aprovados agrotóxicos sem a tríplice avaliação. A aprovação não é uma simples questão agronômica, para que somente o Ministério da Agricultura decida sozinha. Com tantas implicações, a Anvisa e o Ibama não podem ficar de fora, como pretende o texto do Pacote do Veneno.”


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Este texto foi inicialmente publicado pela Rede Brasil Atual [Aqui!].

Uso indiscriminado de agrotóxicos: desafio para o governo Lula

cana agrotóxicosA cana-de-açúcar, juntamente com a soja e o milho, são as três principais culturas agroindustriais que mais utilizam agrotóxicos em sua produção. No Brasil, juntos, eles usam 80% de todos os pesticidas aplicados. Crédito da imagem: Andrés Garzón/Flickr , sob licença Creative Commons (CC BY 2.0)

 Por Washington Castilhos para a SciDev

[RIO DE JANEIRO]. Um dos grandes desafios de Luís Inácio Lula da Silva, que assumiu a presidência do Brasil em 1º de janeiro, será reduzir o uso indiscriminado dos chamados “defensivos agrícolas”, intensamente promovidos pelo governo de seu antecessor.

Só nos últimos quatro anos, 1.800 agrotóxicos foram introduzidos no mercado brasileiro, a maioria (59%) de origem chinesa, segundo dados de um novo estudo publicado na revista Third World Quarterly .

Um primeiro passo para o novo governo enfrentar essa situação seria revogar o decreto presidencial de 2021 , que antecipa disposições contidas no projeto de lei 6.299 , ainda em tramitação no Congresso Nacional, conhecido como “Lei do Veneno”.

É o que aponta ao SciDev.Net a toxicologista Karen Friedrich, pesquisadora do Centro de Estudos em Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana da Escola Nacional de Saúde Pública/Fiocruz.

Ela garante que, se o projeto for aprovado, parte da legislação atual que proíbe o registro de substâncias que causam câncer, mutações ou distúrbios hormonais será eliminada e reduzirá o poder de órgãos de controle, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Para o geógrafo Marcos Pedlowski, as alternativas ao uso de agrotóxicos seriam a reforma agrária e o incentivo à agricultura familiar e à policultura.

“Estamos priorizando as monoculturas de exportação altamente dependentes de agrotóxicos. Precisamos sair dessa dependência do ciclo do veneno”, diz Pedlowski, pesquisador da Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) no Rio de Janeiro e um dos autores do estudo junto com pesquisadores da Universidade de Helsinki, ao SciDev. Net . Finlândia.

E Friedrich complementa: “O país precisa adotar um novo modelo agrícola baseado nos valores agroecológicos e na produção orgânica”.

Se forem considerados países com o mesmo padrão agrícola e dimensões territoriais comparáveis, e com base na razão de quilos de agrotóxicos por hectare (kg/ha), que é a metodologia utilizada pela Agência das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), o Brasil –com 2,77 kg/ha– ocupa o segundo lugar entre os maiores consumidores do mundo, precedido apenas pela China (10,93 kg/ha) e seguido pelos Estados Unidos (2,38 kg/ha) e Argentina (2,37 kg/ha).

O uso de agrotóxicos no Brasil passou de 16 mil toneladas por ano para quase 500 mil em cinco décadas, segundo o referido estudo.

“Uma das consequências do uso dessa quantidade de agrotóxicos altamente nocivos é o aumento da exposição das pessoas a resíduos de produtos conhecidos por causarem diversos tipos de doenças ”, destaca Pedlowski.

Pesticidas e a UE

Do conjunto de agrotóxicos aprovados pelo governo anterior, um terço são proibidos na União Europeia. No entanto, muitos alimentos brasileiros tratados com agrotóxicos proibidos pela UE chegam ao mercado europeu, para o qual o Brasil é um dos mais importantes fornecedores de produtos agrícolas.

Pedlowski explica que a UE tem critérios muito mais restritivos para limites de resíduos em alimentos do que o Brasil, então, quando esses resíduos ultrapassam o permitido, os governos emitem alertas ou até suspendem a entrada de alimentos altamente contaminados. E lembre-se que há alguns anos a Rússia emitiu um alerta sobre o excesso de glifosato na soja brasileira.

Em seu relatório anual de 2022 sobre resíduos de pesticidas em alimentos, a Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos revelou que metade das frutas e vegetais no mercado europeu está contaminada com resíduos de pelo menos um pesticida, enquanto um quarto deles contém um coquetel de até 15 resíduos de agrotóxicos.

“Em breve, os parlamentos nacionais europeus terão que ratificar uma lei muito mais restritiva em relação aos alimentos contaminados com agrotóxicos. Essa será uma questão para a qual o Brasil deve se preparar”, prevê o pesquisador.

No entanto, entre os agrotóxicos introduzidos no Brasil nos últimos quatro anos, 4% vêm de empresas europeias. Ou seja, embora esses produtos sejam proibidos em países com regulamentações mais exigentes, eles continuam sendo vendidos em países do hemisfério sul com economias baseadas em grandes áreas de monoculturas de exportação, como Argentina e Brasil.

É o caso do glifosato e da atrazina, herbicidas que, apesar de proibidos na Europa, são os mais utilizados nos países tropicais “onde ocorrem 99% das intoxicações agudas associadas”, revela o estudo.

O efeito devastador do uso indiscriminado de agroquímicos na agricultura é retratado no minidocumentário argentino O custo humano dos pesticidas , que mostra as mutações genéticas e outras condições associadas à exposição ao glifosato que afetaram populações em várias províncias desse país.

Oito intoxicações diárias

No Brasil, de acordo com o Sistema de Informação de Agravos de Notificação Obrigatória (SINAN ), 25.106 pessoas foram intoxicadas por agrotóxicos entre 2007 e 2014, uma média de oito intoxicações por dia.

E de acordo com o mais recente relatório da rede ambiental Friends of the Earth – Europe, a cada dois dias no Brasil uma pessoa morre por envenenamento por agrotóxicos. 20 por cento das vítimas são crianças e adolescentes até 19 anos de idade.

Os casos de intoxicação se concentram no centro e sul do Brasil, justamente onde estão as principais culturas do agronegócio, como soja, milho ou cana-de-açúcar. Juntas, essas três culturas usam 80% de todos os pesticidas aplicados.

Vários estudos nessas regiões apontam maior incidência de câncer, problemas reprodutivos, infertilidade masculina e malformações em bebês, principalmente devido à exposição ocupacional de trabalhadores rurais.

“A população em geral consome agrotóxicos tanto na água quanto nos alimentos. Estamos comendo e bebendo nossa dose diária de veneno.”

Karen Friedrich, Centro de Estudos em Saúde Ocupacional e Ecologia Humana, Escola Nacional de Saúde Pública/Fiocruz

Karen Friedrich, que não participou do estudo do Third World Quarterly , lembra que pesquisas recentes encontraram vestígios de pesticidas não apenas nos alimentos, mas também na água, por meio da contaminação do solo e das águas subterrâneas.

“A população em geral consome agrotóxicos tanto na água quanto nos alimentos. Estamos comendo e bebendo nossa dose diária de veneno”, disse Friedrich ao SciDev.Net.

A pesquisadora alerta que corremos o risco de consumir alimentos que contenham agrotóxicos em doses acima do permitido (que são calculadas para cada agrotóxico), bem como um grande número de substâncias diferentes em um mesmo alimento.

“Ao longo do tempo, doses repetidas desses coquetéis constituem um alto risco à saúde da população”, acrescenta o médico biomédico.

Segundo os pesquisadores, a crença de que sem agrotóxicos é impossível manter o nível de produtividade agrícola exigido pela população humana é um mito.

“Trata-se mais de uma mudança na forma de produção do que de proteção contra pragas”, destaca Pedlowski. “Além disso, os altos custos desses insumos impactam na produção de alimentos”, conclui.

Link para o resumo do artigo no Third World Quarterly


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Este artigo escrito originalmente em espanhol foi produzido pela edição América Latina e Caribe de  SciDev.Net e publicado [Aqui!].

O retorno da Syngenta ao mercado de ações e seus muitos riscos ambientais e à saúde humana

Os pesticidas afetam a saúde humana e o meio ambiente globalmente. Tendo como pano de fundo o anunciado IPO da Syngenta na China, um estudo encomendado pela Public Eye mostra pela primeira vez como esses impactos representam riscos para os negócios da Syngenta – e, portanto, para potenciais investidores e credores. Isso inclui riscos climáticos que podem afetar seus negócios de fertilizantes sintéticos opacos. No total, nos próximos anos a empresa sediada na Basileia pode sofrer impactos financeiros da ordem de bilhões ou três dígitos
syngenta
Por Carla Hoinkes para a PublicEye

Pouco depois de a Syngenta ter sido adquirida em 2017 pela estatal chinesa Chem China, por US$ 43 bilhões, ela foi retirada da SIX Swiss Exchange. No entanto, os novos proprietários prometeram que voltaria ao mercado de ações em cinco anos. Agora, isso pode acontecer pouco antes do final deste período – a empresa anunciou uma Oferta Pública Inicial (IPO) na Bolsa de Valores de Xangai STAR Market antes do final de 2022. A capitalização de mercado buscada, ou seja, o valor total das ações que serão colocar em circulação, é de aproximadamente US$ 45 bilhões. O Mega IPO seria um dos maiores do ano a nível internacional.

Nesse ínterim, a Syngenta tornou-se parte de uma ‘megaempresa’. O Grupo Syngenta surgiu em 2020 a partir da fusão da Syngenta AG com a produtora israelense de agrotóxicos Adama e o ramo agrícola da gigante química chinesa Sinochem. A Syngenyta tinha um faturamento anual de US$ 28 bilhões e uma sede global em Basel. Em 2021, a proprietária chinesa da Holding, a ChemChina, por sua vez, foi fundida com a controladora da Sinochem. Essa fusão deu origem à Sinochem Holding Corporation, atual maior conglomerado químico do mundo .

O Syngenta Group, sediado na Basileia, deve agora retornar ao mercado de ações – pelo menos para reduzir os bilhões em dívidas que acumulou desde a aquisição. Além disso, o CEO da Syngenta, Erik Fyrwald, deu a entender em uma entrevista ao jornal NZZ am Sonntag em maio que o Grupo pretende buscar uma segunda listagem, provavelmente na SIX Swiss Exchange.

Os riscos ocultos associados

Antes de serem listadas na bolsa de valores, as empresas devem informar os potenciais investidores sobre os riscos comerciais em um prospecto. Em seu prospecto (disponível apenas em chinês), a Syngenta cita, por exemplo, os riscos de processos judiciais e outras questões legais. Estes são estimados em mais de US$ 6 bilhões. Numerosos casos em andamento são mencionados pela empresa, mas não incluídos na estimativa. Eles incluem 2.000 reclamantes nos EUA e no Canadá que consideram o herbicida Paraquat da Syngenta responsável por causar o mal de Parkinson. A empresa pode ser obrigada a pagar bilhões em compensação neste caso legal altamente controverso. O mesmo vale para as demandas feitas pelos apicultores canadenses, que consideram o inseticida Thiamethoxam, da Syngenta, responsável por dizimar suas populações de abelhas. E novamente para as famílias de fazendeiros indianos que abriram processos judiciais contra a Syngenta em um tribunal em Basel em relação a intoxicações graves e em parte fatais por pesticidas.

O prospecto também menciona os riscos associados à regulamentação mais rígida de seus produtos ou ao não cumprimento de normas de saúde, segurança e meio ambiente. A empresa descreve esses e outros fatores, mas se abstém completamente de fornecer informações sobre as possíveis ramificações financeiras.

No entanto, existem riscos materiais associados ao atual modelo de negócios da Syngenta, que podem afetar o sucesso do negócio. Analistas financeiros do instituto de pesquisa holandês Profundo  chegaram a essa conclusão em um estudo encomendado pela Public Eye no contexto do próximo IPO em Xangai. De acordo com as descobertas, em particular o modelo de negócios da empresa agroquímica, que depende em grande parte da venda de produtos químicos altamente perigosos e desatualizados, os custos de saúde causados ​​por pesticidas e um negócio de fertilizantes sintéticos opacos na China que é prejudicial ao clima, podem ser uma exposição significativa. As estimativas também mostram que:

Embora os números comerciais estejam atualmente no azul, no fundo o atual modelo de negócios da empresa de agroquímicos com sede em Basel não é sustentável nem adequado para o futuro.

Altamente perigoso e de alto risco

Os produtos da empresa são confrontados com um ambiente regulatório global em rápido desenvolvimento” – é assim que a Syngenta descreve o risco da regulamentação de pesticidas. De acordo com o prospecto, os defensivos respondem por 66% do faturamento de todo o grupo. Com uma participação de mercado estimada em 24%, a Holding é líder de mercado global.

O negócio da Syngenta está particularmente sob pressão em relação ao seu chamado negócio de agrotóxicos altamente perigosos . Em 2019, a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) emitiram um relatório afirmando que essas substâncias principalmente de “geração mais antiga” “constituem uma parcela relativamente pequena de todos os pesticidas registrados globalmente”, mas podem causar “o mais danos”. Eles pediram que a agricultura global fosse “desintoxicada” de agrotóxicos altamente perigosos. No entanto, a resistência da indústria e de alguns países significa que pode demorar algum tempo até que isso aconteça.

Este não é o caso dos agrotóxicos que já foram proibidos na UE por razões ambientais ou de saúde. Essas substâncias comprovadamente nocivas estão sendo proibidas em cada vez mais países fora da Europa. A UE, onde estão sediados muitos grandes produtores, também anunciou a intenção de proibir a exportação desses agrotóxicos. Além disso, quer deixar de tolerar resíduos dessas substâncias que podem ser detectados em alimentos importados. A utilização destes agrotóxicos na produção de alimentos que são importados para a UE – grande importadora de produtos agrícolas – deixará de ser possível.

Se as substâncias proibidas na UE forem retiradas do mercado global, o Grupo Syngenta pode perder 20% de sua receita com agrotóxicos (mais de US$ 3,5 bilhões). Este é o cálculo da Profundo com base na participação estimada nas vendas de agrotóxicos de cada produto para Adama e Syngenta AG, com sede em Basel.

A potencial queda nas receitas poderia reduzir o lucro (EBITDA) em US$ 630 milhões, além de ativos imateriais e ativos fixos tangíveis que teriam que ser baixados (US$ 2,5 bilhões).

O impacto nos lucros e ativos seria quase o dobro se a venda de todos os agrotóxicos classificados como altamente perigosos tivesse que ser interrompida.

Poluição da água, câncer e Parkinson

Um relatório divulgado recentemente pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) estabelece que os agrotóxicos causam “vários resultados adversos à saúde”, incluindo “cânceres e efeitos neurológicos, imunológicos e reprodutivos”. Eles também causam cerca de 385 milhões de casos de intoxicações não intencionais  todos os anos, incluindo 11.000 mortes. Além disso, 168.000 suicídios ocorrem anualmente como resultado da ingestão de agrotóxicos – o que representa aproximadamente um quinto de todos os suicídios. O Paraquat da Syngenta é um dos agrotóxicos que mais causa intoxicações e mortes em todo o mundo.

Esses impactos fazem parte dos custos gerais causados ​​pelos agrotóxicos, que geralmente são suportados pelo público em geral. O instituto de pesquisa francês Le Basic calculou recentemente esses custos sociais – incluindo o tratamento de problemas crônicos de saúde resultantes e o tratamento de água potável após envenenamento por pesticidas – em um estudo abrangente para a Europa. Os custos sociais que são diretamente atribuíveis apenas aos pesticidas são calculados em 2,3 bilhões de euros por ano.

Profundo calculou o impacto financeiro global no Grupo Syngenta de um cenário em que o Grupo seria responsabilizado por pelo menos uma fração desses custos no futuro. O Profundo limitou seu cenário à Syngenta assumindo os custos do tratamento da água potável e do tratamento de duas doenças ocupacionais reconhecidas entre os trabalhadores agrícolas que são diretamente atribuíveis aos agrotóxicos – Parkinson e Linfoma Não-Hodgkin. (Isto é menos de 2% de todos os custos sociais que o estudo Le Basic atribui aos pesticidas). Globalmente, nos próximos dez anos, a Syngenta poderá incorrer em custos associados de US$ 7,2 bilhões (cenário de baixo risco) até US$ 14,4 bilhões (cenário de alto risco).Muitos outros custos, como os causados ​​pelos milhões de casos de intoxicações agudas por agrotóxicos, são atualmente difíceis de quantificar e por isso não foram incluídos.

Atualmente, o público em geral arca com a maior parte desses custos. No entanto, a Syngenta e seus concorrentes estão sendo cada vez mais responsabilizados – até o momento principalmente por meios legais.

Após uma batalha legal em 2012, a Syngenta teve que concordar em pagar aos fornecedores de água estatais nos EUA US$ 105 milhões pelo tratamento de água potável após a poluição causada por seu herbicida Atrazina. A atrazina é muito persistente na água e está proibida na UE devido à contaminação das águas subterrâneas. Depois que a Bayer teve que compensar inúmeros queixosos que tinham câncer presumivelmente causado pelo glifosato nos EUA, a Syngenta está enfrentando acusações legais devido a alegações de que o Paraquat causou o mal de Parkinson entre os usuários. O glifosato é um dos herbicidas mais vendidos da Syngenta.

©Atul Loke/ Panos Pictures
Purshottam Khadse mostra o restante do pesticida Polo em sua casa na vila de Injala em Yavatmal.
©Atul Loke / Panos Pictures

Todos os anos, até 44% dos trabalhadores agrícolas sofrem envenenamento por agrotóxicos. A grande maioria dos casos envolve agricultores e trabalhadores agrícolas em países de baixa renda, onde as regulamentações costumam ser mais fracas e os trabalhadores têm pouca proteção

Assassino climático oculto

Em campanhas de imagem cada vez maiores (incluindo uma estrela do esqui como embaixadora da marca ), a Syngenta está promovendo seu engajamento em favor do meio ambiente e principalmente do clima. No seu prospecto, a empresa refere as formas como está a contribuir para o combate e adaptação da agricultura às alterações climáticas. A Syngenta se comprometeu a reduzir pela metade suas próprias emissões até 2030.

No entanto – isso se aplica à Syngenta AG, ou seja, o negócio de agrotóxicos e sementes com base em Basel, mas ainda não para o grupo chinês Syngenta, que vende fertilizantes sintéticos em escala. De acordo com o prospecto, em 2020, o Grupo obteve 14% de sua receita global com a venda de nutrição agrícola, ou seja, fertilizantes. A Syngenta é líder no mercado chinês de fertilizantes e isso quer dizer algo – mais de um quarto de todos os fertilizantes nitrogenados são usados ​​na China.

Apesar da relevância comercial, o Grupo Syngenta é taciturno quanto ao impacto de seus fertilizantes no clima. Isso provavelmente não é sem razão – com base nas emissões estimadas da indústria de fertilizantes, Profundo calculou que, de 2016 a 2050, o negócio global de fertilizantes da Syngenta teria causado quase nove vezes mais emissões de gases de efeito estufa do que o negócio de agrotóxicos e sementes da Syngenta AG.

Usando a precificação do carbono da UE como proxy, Profundo calculou possíveis consequências financeiras devido aos danos climáticos. Assumindo que as atividades da Syngenta AG europeia foram afetadas por um preço de emissões, custos acumulados de US$ 13,8 bilhões poderiam surgir de 2016 a 2050 – desde que a Syngenta AG atinja suas próprias metas de redução de emissões até 2030 e até mesmo introduza uma meta zero líquido até 2050 .

Se no futuro as emissões de todo o grupo – incluindo o negócio de fertilizantes – fossem precificadas na Europa ou na China, os custos poderiam chegar a US$ 127,4 bilhões.

Impactos de bilhões de números de dois a três dígitos

Ao todo, o Profundo estima os possíveis impactos financeiros para a Syngenta em US$ 28 bilhões (cenário de baixo risco) até US$ 155 bilhões (cenário de alto risco). Isso é significativo em comparação com a cobiçada – e em comparação com o concorrente da Syngenta, alta – capitalização de mercado de US$ 45 bilhões – e coloca um grande ponto de interrogação sobre se o atual modelo de negócios da empresa é adequado para o futuro.


IPO da Syngenta: investimento de alto risco

Gerard Rijk, Profundo (2022)

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Este texto escrito originalmente em inglês foi publicado pela ONG Public Eye [Aqui!].

Conselhos estaduais e federal de Nutrição alertam sobre os impactos do “Pacote do Veneno” para a saúde e o meio ambiente

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O Sistema Conselhos Federal e Regionais de Nutricionistas (CFN/CRN) enviou uma nota técnica aos parlamentares (leia aqui) e manifesta preocupação com a possível aprovação do Projeto de Lei (PL) 6299/2002, também conhecido como “Pacote do Veneno”. A matéria está em tramitação no Senado Federal e pretende flexibilizar ainda mais a liberação e o uso de agrotóxicos no Brasil. Uma proposta nociva para a saúde da população brasileira e para o meio ambiente. 

A visita do Sistema CFN/CRN ao Senado Federal, no dia 22 de fevereiro, visou sensibilizar os parlamentares sobre os danos que a aprovação do PL 6299/2002 pode gerar à saúde da população e ao meio ambiente. O órgão se empenha para que o projeto de lei seja encaminhado pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD/MG), às comissões de mérito para ser discutido com mais aprofundamento, já que o texto recebeu um grande volume de alterações na Câmara Federal, além de nove emendas. 

Preocupam também as alterações nas regras de tempo para aprovação do uso de determinados agrotóxicos no país, que diminuíram de 8 para 2 anos, e a redução para a aprovação dos produtos somente pelo Ministério da Agricultura. Anteriormente, a aprovação era dada após pareceres da Anvisa e Ministérios da Agricultura e Meio Ambiente.

Veneno na comida

O uso indiscriminado de agrotóxicos não está somente ligado à produção ou seu uso na agricultura. Esses venenos que, com o texto do PL 6299/2002, passam a se chamar de “pesticida” e perdem a referência ao ícone da caveira nas embalagens (símbolo universal de produtos perigosos), também contaminam o ar, as fontes de água, degradam a qualidade dos solos e comprometem a biodiversidade. E o mais grave: contaminam os alimentos consumidos diariamente pelos brasileiros (sejam in natura, processados ou ultraprocessados) e até mesmo o leite materno. 

A literatura científica revela que entre os problemas que afetam a saúde estão más-formações de fetos, disfunções reprodutivas, infertilidade, neurotoxicidade e hepatotoxicidade, desregulação hormonal, cegueira, paralisia, depressão, contribuição para a formação de cânceres e até mesmo a morte. 

A aprovação do PL, diante do cenário da fome, de grave insegurança alimentar e nutricional vivida por boa parte do povo brasileiro e à crescente prevalência de morbimortalidade por doenças crônicas não transmissíveis é alarmante. É a violação do direito à saúde e ao direito humano à alimentação adequada e saudável.

UE planeja proibir uso de agrotóxicos em parques e outros espaços públicos

Reino Unido instado a seguir o exemplo enquanto Bruxelas elabora proposta para reduzir o uso geral dos produtos químicos em 50%

parks pesticidesA Comissão Europeia diz que vários estados membros da UE não cumpriram as orientações anteriores sobre a redução do uso de controle químico de pragas. Fotografia: Martin Jenkinson/Alamy

Por Daniel Boffey em Bruxelas, para o “The Guardian”

O uso de agrotóxicos sintéticos em parques e outros espaços públicos verdes em áreas urbanas deve ser proibido na União Europeia (UE), com os estados membros obrigados a reduzir o uso geral em 50%, de acordo com um projeto de regulamento vazado.

A medida é considerada necessária pela Comissão Europeia devido ao fracasso de vários estados membros da UE em agir de acordo com as orientações anteriores sobre a redução do uso de controle químico de pragas.

As autoridades dizem no projeto de regulamento que, como resultado das propostas, “os consumidores da UE podem ver o aumento dos preços dos alimentos, o que pode levar ao aumento das importações de países terceiros com regulamentação menos rigorosa do uso de agrotóxicos”.

Mas as autoridades disseram que examinarão maneiras de mitigar o impacto, acrescentando que a UE precisa “mudar para um sistema alimentar justo, saudável e ecológico”. Sob o regulamento, os agrotóxicos também seriam proibidos em áreas de proteção da natureza.

Cerca de 70 cidades do Reino Unido estão tomando medidas para reduzir o uso de agrotóxicos, mas não há proibição legal. Um porta-voz da Pesticide Action Network UK (PAN UK) pediu ao governo britânico que siga o exemplo de Bruxelas.

Ele disse: “A PAN UK vem pedindo essa medida há muitos anos e ver a Comissão Europeia apresentar planos para acabar com o uso desnecessário de agrotóxicos em áreas urbanas é muito bem-vindo. Será um enorme benefício para os cidadãos e o ambiente da UE. A PAN UK gostaria de ver o Reino Unido seguir o exemplo e acabar com o uso de pesticidas em nossas cidades.”

O projeto de regulamento da UE, que precisará ganhar o apoio dos Estados membros e do Parlamento Europeu, recebeu uma reação mista de ativistas ambientais na Europa continental.

Preocupações foram levantadas sobre a falta de restrições impostas aos agricultores para usar métodos como rotação de culturas e capina mecânica. Potenciais lacunas em torno da meta de 50% também foram identificadas, relacionadas à falta de confiança na coleta de dados precisos.

Sarah Wiener, uma eurodeputada dos Verdes, disse temer que o regulamento se traduza em promessas vazias. Ela disse: “A proposta da comissão sobre o uso sustentável de agrotóxicos na UE é tudo menos estanque. Por um lado, a comissão reconhece que a antiga diretiva dá muita margem de manobra aos Estados membros e, consequentemente, quer transformá-la em regulamento. Por outro lado, a comissão enumera apenas medidas insuficientes para implementar essa ideia basicamente boa.

“Não apenas isso, mas a comissão não quer nem mesmo tornar obrigatório o básico do manejo integrado de pragas, que seria o mínimo absoluto para alcançar um menor uso de agrotóxicos e proteger a saúde humana e a biodiversidade”.

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Este texto foi escrito originalmente em inglês e publicado pelo jornal “The Guardian” [Aqui! ].

Poluição por agrotóxicos: especialista explica perigos de venenos agrícolas para o meio ambiente

Agrotóxicos podem atingir o solo, água e ar, afetando a saúde humana e o meio ambiente

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Em 2021, o Governo Federal liberou o registro de 500 agrotóxicos no país, configurando um novo recorde da série histórica iniciada em 2000 pelo Ministério da Agricultura. Além dos possíveis malefícios para a saúde, o uso excessivo de agrotóxicos também interfere no meio ambiente, aumentando o nível de poluição e afetando o ecossistema da região.

Isso acontece porque quando os agrotóxicos entram em contato com a terra, podem contaminar o solo e, consequentemente, reduzir o número de nutrientes. Já quando estes produtos atingem os lençóis freáticos, contaminam as águas subterrâneas. Por essa razão se comemora nesta terça-feira (11) o Dia do Combate à Poluição por Agrotóxicos.

“Estes efeitos ocasionam diversos problemas nas cadeias do meio ambiente. Por exemplo, a poluição por agrotóxico pode gerar mortes de insetos polinizadores e os inimigos naturais das pragas. Logo, possibilita o surgimento de novas pragas e, por consequência, a necessidade de utilizar mais agrotóxicos, gerando este efeito dominó”, explica o doutor em meio ambiente e professor da Rede UniFTC, Anderson Alves.

Anderson também explica que, além do solo e das águas, o ar também pode ser impactado com a poluição causada pelos pesticidas. “Veja bem, o que acontece é que esses produtos ficam circulando na atmosfera e podem desencadear uma série de intoxicações nas pessoas e de outros organismos vivos que respiram o ar contaminado”.

Danos invisíveis

Segundo o especialista, uma das coisas que torna o efeito dos agrotóxicos mais preocupante é porque ele causa problemas invisíveis. “Por exemplo: os peixes contaminados por agrotóxicos podem ser consumidos por pessoas, propagando um efeito em cadeia de disseminação do inseticida. O ser humano que consome hortaliças contaminadas também acumula veneno por meio do consumo de alimentos”, pontua.

Governo Bolsonaro reforçou agricultura dependente de agrotóxicos com novo recorde de aprovações em 2021

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Como já mostrado ao longo deste ano através das publicações do “Observatório dos Agrotóxicos”, o governo Bolsonaro quebrou um novo recorde de aprovações de agrotóxicos em 2021, tendo ultrapassado o total de 500 novas liberações.  E o pior é que dos agrotóxicos liberados até o início de dezembro, 94% (ou seja 470) eram de produtos genéricos, com uma quantidade significativa de substâncias banidas em outras partes do mundo por causa de sua alta periculosidade para seres humanos e o meio ambiente. Na prática, esses dados desmentem as alegações do governo Bolsonaro de que a tsunami de agrotóxicos se destinava a modernizar o portfólio existente e a baratear o custo desses produtos. É que nem uma das duas coisas aconteceu.

Mas se engana quem acha que os setores mais interessados nessa verdadeira tsunami de agrotóxicos altamente perigosos estão satisfeitos com a “agilidade” demonstrada pelo governo Bolsonaro. É que a aliança formada por produtores de venenos agrícolas e grandes latifundiários envolvidos na exportação de commodities agrícolas querem fazer aprovar em 2022 o chamado “Pacote do Veneno (o PL 6.299/2002) cujo objetivo é praticamente abolir a regulação existente para a produção e utilização de venenos agrícolas. Se aprovado, o Pacote do Veneno causará uma aceleração ainda maior no consumo de agrotóxicos, o que deverá contribuir para um aumento da contaminação de alimentos, águas e solos, além de expor os trabalhadores rurais que manuseiam esses produtos a taxas ainda maiores de adoecimento.

Há que se dizer que o uso massivo de agrotóxicos no Brasil decorre da implantação de grandes áreas de monoculturas de poucas commodities, que incluem a soja, o algodão, a cana de açúcar e o milho. Todas essas monoculturas contribuem para mais de 80% do consumo de agrotóxicos no Brasil. Desta forma, qualquer alegação de que esse abusivo de agrotóxicos se destina a garantir a produção de alimentos para a mesa dos brasileiros não passa de uma mentira grosseira. 

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Aliás, falando sobre a relação existente o uso de agrotóxicos e o consumo de alimentos pelos brasileiros, é importante lembrar que a recente a publicação dos resultados do Programa Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes em alimentos (PNCRC) mostrou um grave processo de contaminação não apenas por agrotóxicos, mas também por metais pesados. Isto objetivamente coloca em risco a saúde dos brasileiros que estão hoje submetidos a um modelo agrícola totalmente dependente de substâncias altamente perigosas para produzir.

Assim, dentre as muitas questões importantes a serem tratadas em 2022 está a aprovação do “Pacote do Veneno”, pois se esta questão for deixada apenas no âmbito do congresso nacional, a aprovação será inevitável

Ministério da Agricultura produz portaria para permitir “licenciamento fast food” de agrotóxicos

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Apesar dos recordes de liberação de agrotóxicos, muitos deles banidos em outras partes do mundo, a sede por veneno não parece  nem um pouco próxima de ser saciada. Isso é o que indica a chamada de uma consulta pública pelo Ministério da Agricultura (MAPA) para permitir a aceleração dos processos de registros de agrotóxicos, utilizando o que eu classifico como uma estratégia de “licenciamento fast food”, na medida em que a segurança dos trabalhadores e os riscos ambientais e para a saúde humana serão secundarizados em nome de se beneficiar o combate a um determinado número de ditas pragas agrícolas que estão acometendo as grandes áreas de monoculturas de exportação.

Um dos detalhes mais pitorescos (na falta de melhor palavra) é o fato que “os pleiteantes de processos de registro de agrotóxicos já protocolados poderão, no período de 30 dias da publicação dessa Portaria, candidatar até 20 processos para o processo de seleção de prioridades de que trata essa Portaria.”. Em outras palavras, serão  os produtores de veneno que ditarão as prioridades de liberação, a despeito da existência de produtos similares no mercado ou, mais importante ainda, do grau de toxicidade das substâncias que deveriam ser analisadas para liberação. 

E o que fica mais evidente ainda é que a análise das prioridades ficará a cargo apenas do Ministério da Agricultura, sem que sejam ouvidos outros órgãos como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária e o Ibama. Este medida já parece ser uma consequência direta dos termos estabelecidos pelo Decreto 10.833 assinado pelo presidente Jair Bolsonaro no dia 08 de outubro de 2021, e que já foi condenado em nota técnica assinada por uma série de pesquisadores e organizações da sociedade civil.

A verdade é que esta portaria do MAPA adota uma forma bem draconiana de auto licenciamento em uma área em que o Brasil já lidera o mercado mundial em termos do uso de substâncias altamente perigosas para o ambiente e a saúde humana.  Com isso, os problemas que serão disparados com o uso intensivo e disseminado de substâncias causadoras de diversos tipos de doenças deverão aumentar exponencialmente. E tudo isso em nome do aumento das taxas de lucros aviltantes que os controladores do mercado mundial de grãos já auferem.

Enquanto isso investir em sistemas agroecológicos que dispensem o uso de quantidades gigantescas desses venenos agrícolas continua a ser prioridade zero para Jair Bolsonaro e para a ministra Tereza Cristina. 

Por fim, uma curiosidade. Ao consultar a página do Ministério da Agricultura e abrir a janela das chamadas “Consultas Públicas“, não encontrei nenhuma que se refira à Portaria Nº 451.

Vejam abaixo o que diz na Portaria Nº 451, de 19 de novembro de 2021l

Art. 1º Determinar o rito de seleção de processos de registro que comporão a lista de prioridades do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Art. 2º O Departamento de Sanidade Vegetal e Insumos Agrícolas da Secretaria de Defesa Agropecuária publicará no site do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento a lista de pragas prioritárias.

§1º O Departamento de Sanidade Vegetal e Insumos Agrícolas escolherá 10 pragas da lista de pragas prioritárias;

§2º As pragas selecionadas serão elencadas em ordem numérica de acordo com prioridade estabelecida pelo Departamento de Sanidade Vegetal sendo ordenadas de acordo com o Anexo II;

Art. 3º Os pleiteantes de processos de registro de agrotóxicos já protocolados poderão, no período de 30 dias da publicação dessa Portaria, candidatar até 20 processos para o processo de seleção de prioridades de que trata essa Portaria.

§1º Os processos e respectivas pontuações deverão ser entregues ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento por meio do Formulário contido no Anexo III;

§2º Erros de preenchimento e cálculo no Anexo poderão inabilitar a pleiteante ao processo de seleção;

§3º Empresas que não houverem comercializado no ano anterior ao menos a metade dos agrotóxicos dos quais seja titular de registro terão seus produtos inabilitados.

§4º A pleiteante deverá concordar com a divulgação pública do requerimento de registro contido no processo que vier a ser priorizado.

Art. 4º Os processos apresentados conforme Artigo 3º serão ordenados pela pontuação obtida a partir da fórmula constante no Anexo I e a lista deverá ser publicada pela Coordenação-Geral de Agrotóxicos e Afins do Departamento de Sanidade Vegetal e Insumos Agrícolas em sítio eletrônico do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.

Art. 5º Os produtos com maior pontuação serão distribuídos na planilha do anexo II de acordo com os seguintes critérios:

§1º O produto com maior pontuação será vinculado à praga prioritária de maior importância controlada por ele;

§2º Os demais produtos serão distribuídos sob mesmo critério do §1º até a completude da planilha;

§3º Produto com mesmo ingrediente ativo de produto selecionado com maior pontuação não será escolhido para a mesma praga prioritária;

§4º Produtos já listados não serão incluídos mais de uma vez independentemente de conterem recomendações para outras pragas prioritária;

§5º Em caso de empate na pontuação serão escolhidos os produtos com maior número de pragas-alvo controlada;

§6º A Coordenação-Geral de Agrotóxicos e Afins auditará o cálculo dos Pontos de Produto dos produtos selecionados;

§7º Erros de cálculo ou informações inverídicas poderão implicar na inabilitação de todos os processos da pleiteante;

§8º Casos omissos serão resolvidos pela Coordenação-Geral de Agrotóxicos e Afins;

Art. 6º Cada produto formulado priorizado automaticamente priorizará no máximo 1 (um) produto técnico para cada ingrediente ativo contido na sua formulação.

Parágrafo único. Quando o produto formulado priorizado selecionado contiver mais de um produto técnico por ingrediente ativo, a empresa pleiteante deverá indicar ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento qual produto técnico deseja priorizar

Art. 7º Serão selecionados no máximo 30 produtos formulados para priorização.

Acesse aqui o documento completo. 

Observatório dos Agrotóxicos: aproveitando o caos causado pela pandemia, governo Bolsonaro acelera a aprovação de agrotóxicos

Com mais 39 liberações, governo Bolsonaro alcança 1.139 agrotóxicos liberados desde janeiro de 2019

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Em meio ao avanço catastrófico da COVID-19 e toda a agitação política em torno dos supostos malfeitos cometidos pelo presidente Jair Bolsonaro na condução da resposta governamental à pandemia, os braços executivos do governo federal continuam operando com a agilidade conhecida, especialmente em se tratando da liberação de agrotóxicos. Assim é que , em meio à situação caótica imperando no Brasil neste momento, o Ministério da Agricultura fez publicar no Diário Oficial da União do dia de ontem (13/04), o Ato No. 19 de 07 de abril de 2021 por meio do qual foram liberados mais 39 produtos no mercado brasileiro, totalizando 1.139 liberações desde janeiro de 2019.

Esse ritmo de aprovações não possui nenhum paralelo no que foi praticamente anteriormente, pois essas 1.072 liberações feitas em apenas 26 meses representam 35% de todos os produtos disponíveis no mercado (i.e., 3.197), evidenciando um ritmo para lá de frenético na hora de liberar agroquímicos proibidos em outras partes do mundo por causa dos graves danos que causam à saúde humana e ao meio ambiente.

A propensão de aprovar produtos banidos em outras partes do mundo fica evidente quando se verifica que 28% dos produtos liberados  pelo Ato No. 19 de 07 de abril de 2021 estão proibidos na União Europa. Dentre eles se destacam os conhecidos Fipronil, Acefato, Ametrina e Atrazina. Em conjunto, esses grupos já foram confirmados como causadores de diferentes tipos de câncer e também capazes de alterar substancialmente o sistema glandular humano.

Who's killing the bees? New study implicates virtually every facet of  modern farming - ExtremeTech

Além disso, o Fipronil que é conhecido por causar o extermínio de espécies não-alvo e que são essenciais para a agricultura por serem polinizadores (como é o caso das abelhas) teve mais três versões aprovadas, sendo que agora passamos a ter 24 variações do Fipronil liberadas para comercialização direta ou para emprego na formulação de outros produtos. Em outras palavras, o governo Bolsonaro prepara, apenas com as liberações de Fipronil, uma verdadeira hecatombe para as populações de abelhas no Brasil.

Civil Society Calls on the EU to Prohibit Exports of Banned Pesticides -  Slow Food International

E o mais peculiar é que o grosso dos agrotóxicos estão sendo liberados para uso nas grandes monoculturas destinadas a produzir grãos e outras commodities para exportação, como é o caso da soja, do milho, do algodão e da cana-de-açúcar, reforçando o caráter do Brasil de ser um grande latifúndio operando para servir os interesses das grandes cadeias que controlam o mercado global de commodities.

Quem desejar acessar a base de dados relativa ao Ato No. 19 de 07 de Abril de 2021, basta clicar [Aqui!]. Para os que desejarem baixar a base contendo os 1.139 liberados desde o início do governo Bolsonaro, basta clicar [Aqui!].