Quem paga pelas apostas do Lula?

lula dança

Por Douglas Barreto da Mata

Apesar de todas as minhas críticas, algumas com tom até deselegante, reconheço, uma coisa não se pode subtrair da biografia de Lula:

Sua incrível capacidade de perceber o ambiente ao seu redor, e de tomar decisões para influir nesse ambiente.

A despeito dos chavões e lugares comuns acerca da sua origem, e o quão inédito seria um migrante de pau de arara possuir tais “dons”, como se inteligência e sabedoria para viver fossem qualidades exclusivas dos ricos e letrados (mito despedaçado na ótima obra de Suassuna, O Auto da Compadecida), o fato é que o “baiano” (como era pejorativamente apelidado nos tempos de ABC) é um cabra arretado, quando se trata de sobreviver e mudar a realidade.

Talvez por isso, justamente por isso, que eu seja tão ríspido com ele, porque se ele fosse um imbecil qualquer, eu diria: “está dentro do previsto”.

Se fosse um FHC estava tudo certo, não dava para esperar muito daquele sujeito mesmo.

Mesmo toda essa genialidade política de Lula não o salvou de si mesmo.

Explico:  Lula, como todo líder genial e carismático, é ameaçado constantemente pela sua própria figura, e Lula sendo Lula, com sua origem e sua carreira política, tende a ser massacrado pelas elites, e cobrado por sua base social.

O assédio das elites é auto explicativo, ainda que Lula tenha passado boa parte de seus anos e anos de vida pública tentando convencê-los de que é “confiável”.

Já o descontentamento da sua base social é diretamente ligado ao cumprimento ou a frustração das expectativas que ele mesmo, Lula, criou em torno de si.

Então, aqui um momento de pausa dramática:

Lula não é vítima, não é um coitado incompreendido que sofre por ser rejeitado pelos ricos, e acossado pelos mais à esquerda que ele, e/ou pelos pobres e classe média ingratos, como alguns querem acreditar.

Nem tampouco, é um refém da “governabilidade” ou de um tipo de fatalismo que o coloca como um boneco imóvel no cargo que ocupa.

Seu incômodo é resultante da conta política que ele fez, ao pretender ser o eterno conciliador, e com o seu sonho de ser um JK mais contundente, ou um Vargas menos autoritário. Não deu, não foi nem uma coisa, nem outra.

Por certo, não dá para colocar a culpa só nele, sim, há contingentes históricos poderosos, mas o fato que ele é a variável principal dessa equação, inclusive para alterar a realidade que o cerca.

Nesse quesito, Lula falhou ao se adequar a esta realidade, sem ao menos tentar propor um debate de desconstrução, de ineditismo institucional, e limitou-se a fazer o permitido, e mesmo assim, teve sua sucessora golpeada, com a mão de Obama que lhe deu tapas nas costas, e que cuja administração cevou e treinou os golpistas de togas e anéis de doutores que o prenderam.

Lula renunciou ao seu fazer histórico, que pode ser (mal) definido como a nossa capacidade de entender que há coisas que nos cercam, e nos empurram para uma direção, mas que há espaço para que assumamos certo controle para mudar estas coisas.

Ceder (sempre) à “governabilidade” é uma postura cretina, porque Lula sabe que a “governabilidade” é um saco sem fundo, que se alimenta do medo dos que não querem perdê-la, enquanto ela pede mais e mais concessões.  Lula é assim, um desperdício, um desperdício calculado, porém.

Agora, nesse triste episódio no Rio Grande do Sul (RS), que era mais previsível e certo que a morte e os impostos, Lula faz uma aposta.

Como não conseguiu definir no seu terceiro mandato qualquer agenda política viável, nem mesmo a defesa de seu mandato, quando bárbaros assistidos, carinhosamente, por militares vandalizaram Brasília, Lula “entregou” a pauta à uma “defesa da democracia” para o judiciário.

O judiciário que anos antes alimentou esse mesmo pessoal, quando se omitiu na cassação de Dilma, e o sequestrou na sede da Polícia Federal no Paraná

Os militares? Bem, os militares acolheram de volta dos vândalos, logo depois dos crimes, em flagrante associação ou bando (Artigo 288 do Código Penal), e mesmo assim, nada. A cena de blindados das forças armadas impedindo os policiais de efetuarem prisões dos acampados (em frente ao Comando Militar) é o retrato trágico do governo Lula, que desde ali seria marcado para sempre, como está.

Dúbio, fraco, acovardado, acossado.

No RS, Lula enxergou a sua possibilidade de recuperar terreno.  No Rio de Janeiro também.

Está em andamento uma estratégia que passa pela cassação do governador e dos seus aliados, e Lula imagina que o PT seria maior beneficiado, ao mesmo tempo que força Eduardo Paes a “convidar” um petista para a vice na chapa à prefeitura neste ano, pois desse modo, o PT herdaria a prefeitura em 2026, quando Paes renunciaria para concorrer ao governo do estado.

Como uma parte das grandes forças não sobreviverá no RJ para concorrer ao cargo de governador tampão nestas eleições extraordinárias, com a cassação do governador, vice e presidente da Alerj, o PT apresentaria um candidato em condições de se eleger, e tentar a reeleição em 2026, ou ceder a vaga para Paes, em uma acordo que garantiria a vice-governadoria para o PT (e espaço no governo), além de uma vaga na chapa de senador.

Pois bem, no Sul a jogada de Lula parece ser outra.  É emotiva, é a pieguice com a qual Lula imagina dominar a cena. Os vídeos de Lula beijando e abraçando as pessoas no abrigo, com o fotógrafo onipresente Stuckert ensaiando os desabrigados para o melhor “take” destruíram até essa coisa cafona, porém genuína de Lula, o seu trato com os mais pobres. Ficou feio.

Esta mesma pieguice cafona, que contaminou a todos, que parece ser um fetiche do Brasil caboclo pelos seus compatriotas de sangue europeu e olhos azuis, se materializou em uma “semi intervenção” federal, com a criação de um ministério da reconstrução. Como assim? O resto do país perguntará? Está tudo certo nas terras da Amazônia? No Cerrado? No Nordeste?

Será que essas regiões precisam se auto imolar para que tenham tamanha atenção? Ué, não é o “agro” a solução de tudo?

Por que um estado que se orgulha de sua incansável capacidade de gerar riquezas, dentro da narrativa da herança de organização rigorosa alemã e italiana, de uma ética de perfeição, frente a um país de mamelucos preguiçosos e corruptos, não conseguiu impedir o cataclisma, e pior, não conseguiu planejar como sair do lamaçal onde eles mesmos se meteram?

Por que um dos estados mais “agro” do país não consegue se reerguer com as suas próprias pernas, sendo certo que os estragos foram muito mais violentos, justamente, por causa da devastação causada por essa atividade econômica?

Não seria justo debater que este setor ajude a pagar a conta com impostos de reparação?

Não seria papel do líder máximo do país ajudar, principalmente os mais pobres, e simultaneamente cobrar responsabilidades dos ricos que causaram a tragédia, ou ao menos, concorreram fortemente para que ela acontecesse?

Lula tenta suprir sua carência de afeto, alimento principal dos líderes carismáticos, com a exploração rasteira de um fenômeno que um governo chamado de esquerda, ou progressista, ou vá lá, responsável, deveria estudar, debater e propor saídas, sem repetir as velhas fórmulas popularescas de crianças no colo, algum dinheiro nas contas, e bilhões para empresas e contratos.

Até quando Lula vai seguir matando Lula?

Silêncio sepulcral nos Pampas, onde até o Minuano virou tornado.

Queda na locomoção e falhas no sistema imune: estudo mostra como agrotóxicos afetam abelhas nativas

Após 48 horas de exposição aos agrotóxicos imidacloprido, piraclostrobina e glifosato, insetos da espécie Melipona scutellaris apresentaram alterações morfológicas e comportamentais que podem levar ao enfraquecimento das colmeias, comprometendo a polinização e a produção de alimentos

51678O grupo de abelhas alimentado com solução contaminada caminhou menos, se movimentou mais lentamente e apresentou alterações morfológicas no corpo gorduroso (foto: Graziele Luna)

Julia Moióli | Agência FAPESP 

Estudo conduzido por pesquisadores das universidades Estadual Paulista (Unesp), Federal de São Carlos (UFSCar) e Federal de Viçosa (UFV) revelou como três agrotóxicos comumente utilizados na agricultura – imidacloprido, piraclostrobina e glifosato – afetam a espécie de abelha nativa sem ferrão Melipona scutellaris: sozinhos ou em combinação, os compostos modificam a atividade locomotora dos animais e reduzem suas defesas. Os resultados do trabalho foram publicados recentemente na revista científica Environmental Pollution.

O uso indiscriminado de agrotóxicos e suas consequências para a sobrevivência das abelhas são um tema cada vez mais debatido e estudado em todo o mundo. No entanto, a maioria dos trabalhos científicos relacionados envolve espécies europeias e norte-americanas. Aqui no Brasil, o foco tem sido espécies nativas sem ferrão, como a Melipona scutellaris, que desempenham papel vital na polinização de diversas plantas silvestres e culturas com relevância econômica.

Neste trabalho, conduzido no âmbito do Programa BIOTA-FAPESP e apoiado por meio de dois projetos (17/21097-3 e 21/09996-8), um grupo de pesquisadores avaliou os efeitos subletais – ou seja, que não causam a morte – dos pesticidas imidacloprido, piraclostrobina e glifosato no comportamento, na morfologia e na fisiologia da espécie. Para isso, em laboratório, expuseram oralmente os animais às substâncias de forma isolada e em combinação por 48 horas e, em seguida, compararam os resultados aos de um grupo-controle.

O perigo desses agrotóxicos para as abelhas ficou claro: o grupo alimentado com solução contaminada caminhou menos, se movimentou mais lentamente e apresentou alterações morfológicas no corpo gorduroso, órgão relacionado ao sistema imunológico desses insetos.

“Observamos que, tanto em combinação quanto isolados, os agrotóxicos interferiram seriamente no comportamento das abelhas, causaram danos no corpo gorduroso e comprometeram as atividades tanto de proteínas importantes para o sistema imune quanto para a sobrevivência celular”, conta Cliver Fernandes Farder-Gomes, pesquisador do Centro de Ciências Agrárias (CCA) da UFSCar e primeiro autor do estudo.

Segundo Farder-Gomes, tais resultados indicam que, mesmo que essas abelhas sobrevivam à exposição, elas passarão a ter sistemas imunes deprimidos, que não funcionam adequadamente no combate a bactérias, o que pode aumentar a propensão a infecções.

“A mortalidade das abelhas sempre causa um choque, mas é importante lembrar que, muitas vezes, sobreviver aos agrotóxicos pode ser ainda mais problemático porque enfraquece e diminui as colmeias, impactando não só a produção de mel como a de frutas e legumes, por conta do déficit de polinização”, destaca Roberta Cornélio Ferreira Nocelli, professora do CCA-UFSCar, coordenadora do grupo de trabalho para o desenvolvimento de métodos para testes de toxicidade em abelhas nativas brasileiras junto à Comissão Internacional para as Relações Planta-Polinizador (ICPPR, na sigla em inglês) e coautora do trabalho.

Políticas públicas

Para complementar esses resultados e estabelecer um panorama completo dos malefícios dos três pesticidas, os pesquisadores pretendem agora analisar sua influência na expressão de outras proteínas e também testar a ação das substâncias em espécies distintas de abelhas nativas.

De acordo com Osmar Malaspina, professor do Instituto de Biociências (IB) da Unesp de Rio Claro, a ideia é que, por revelar impactos com consequências de longo prazo tanto na biodiversidade quanto na segurança alimentar, o estudo realizado por Farder-Gomes dê suporte aos órgãos públicos para o estabelecimento de políticas mais restritivas, como tem acontecido nas últimas décadas com outras pesquisas do Grupo de Pesquisa em Ecotoxicologia e Conservação de Abelhas (Leca) e o Grupo de Pesquisa Abelhas e os Serviços Ambientais (ASAs), liderados por ele e por Nocelli.

“Nossos mais de 80 artigos e livros, entre outros trabalhos, têm sido utilizados ao longo dos anos, principalmente pelo Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis], para restringir o uso de agrotóxicos – foi o caso, por exemplo, do inseticida fipronil, que tem sido o maior responsável pela mortalidade de abelhas”, diz Malaspina.

Nocelli faz questão de destacar que não se trata de comprometer a agricultura brasileira – pelo contrário, a função dos estudos científicos é melhorá-la. “Nosso objetivo é sempre pensar em uma produção agrícola mais sustentável, harmonizando agricultura e conservação, pois só assim teremos segurança alimentar no futuro”, finaliza.

O artigo Exposure of the stingless bee Melipona scutellaris to imidacloprid, pyraclostrobin, and glyphosate, alone and in combination, impair its walking activity and fat body morphology and physiology pode ser lido em: www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0269749124004974?dgcid=rss_sd_all.


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Fonte: Agência Fapesp

Estará Campos preparada para a próxima grande inundação? Tudo indica que não!

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Enquanto assistia a cenas estarrecedoras de cidades inteiras sendo engolidas pelas águas dos rios no RS, me coloquei a pensar o que acontecerá aqui em Campos dos Goytacazes se tivermos uma combinação semelhantes de fortes chuvas nas bacias do Paraíba do Sul e do Muriaé nos próximos anos.  Como já se ensaiou em anos recentes com a elevação do nível dos rios e a entrada de suas águas em partes da cidade, também pudemos ver diferentes prefeitos ostentando impecavelmente limpos jalecos da Defesa Civil como se fossem uma criança indo pela primeira a um desfile de Sete de Setembro.

Mas e o orçamento destinado à Defesa Civil? E os investimentos na manutenção de diques e barragens? E a limpeza de canais com a necessária recomposição das matas ciliares? E, mais ainda, os planos para iniciar o urgente processo de adaptação climática, começando por Santo Eduardo?

Cerca de 90% da população de Santo Eduardo foi atingida pelas fortes chuvas  Folha1 - Geral

Quem assiste hoje de forma aliviada e condescendente às cenas que mostram a desgraça do povo pobre do Rio Grande do Sul deveria estar tomado com o mesmo de alarde e urgência daqueles que hoje estão com água até o pescoço ou abrigados em ginásios de esportes sabendo que não terão mais casas para onde voltar quando as enchentes finalmente retrocederem porque elas foram levadas pelas águas?

Uma coisa é certa: a desgraça dos gaúchos não é algo natural, mas foi produzido por um sistema que despreza os conhecimentos científicos e os alertas sobre a necessidade de se mudar as formas de usar a paisagem natural e de se investir na conservação ou construção de estruturas de adaptação climática.

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05/09/2023, Enchente do Rio Taquari na cidade de Lajeado (RS). Foto: marcelocaumors/Instagram

E sim, quem hoje acha que está fora de perigo precisa saber que esse é um sentimento ilusório e que nas próximas chuvas o Rio Grande do Sul poderá ser aqui.

Adaptação climática não é gestão de desastres

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Por Ima Vieira para “Liberal Amazon”

Quando abordamos as mudanças climáticas, inevitavelmente nos deparamos com dois conceitos interligados: mitigação e adaptação. Mitigação das mudanças climáticas implica em evitar e reduzir as emissões de gases de efeito estufa na atmosfera prevenindo assim, o aumento das temperaturas do planeta para níveis mais extremos. 

Por sua vez, adaptação às mudanças climáticas requer a modificação de comportamentos, sistemas e até mesmo, estilos de vida visando proteger nossas famílias, economias e o ambiente em que vivemos dos impactos adversos das alterações climáticas. 

Em um mundo em aquecimento, a experiência de um clima diferente não exige necessariamente uma mudança geográfica; o clima está se transformando em nosso próprio ambiente. Na Amazônia por exemplo, já tiveram aumentos extremos de temperatura de mais de 3° C em relação a década de 1960 na parte noroeste do bioma (nos estados de Amazonas e Roraima) e no interior do Pará.

As mudanças climáticas impactam a segurança alimentar, a disponibilidade de água e localização para construção de moradias. Além disso, nos deparamos com desafios emergentes, como a necessidade de combater temporadas de incêndios florestais mais prolongadas e intensas, gerenciar potenciais surtos de doenças até então inexistentes e incentivar o desenvolvimento urbano longe de áreas onde gostamos de viver, como nas áreas costeiras e nas margens dos rios.

As soluções de adaptação variam de lugar para lugar, sendo difíceis de prever e envolvem múltiplos compromissos. Compreender os riscos locais e elaborar estratégias para gerenciá-los devem ser os primeiros passos seguidos da implementação de sistemas de resposta aos impactos imediatos. 

A adaptação climática não se resume à gestão de desastres, mas sim a um investimento significativo na prevenção dos efeitos das mudanças climáticas nos territórios. Desde 2017, a cidade de São Leopoldo, no Rio Grande do Sul, vem realizando um trabalho preventivo; o que a tem poupado dos problemas ainda maiores com as fortes chuvas que tanto têm afetado o estado, como acompanhamos nos noticiários.

Na Amazônia, o desafio da adaptação climática assume proporções urgentes e complexas. As secas e enchentes extremas e os incêndios florestais são efeitos da crise climática e demandam respostas coordenadas em diversos níveis da federação por meio de políticas públicas abrangentes. 

Isso inclui desde a integração de iniciativas de monitoramento e prevenção de desastres, até a organização e capacitação de especialistas em crises (defesa civil, brigadistas, bombeiros e outros) e contratação de equipamentos nos municípios. Além disso, é crucial estabelecer estruturas nos municípios com maior propensão a serem afetados, atribuindo-lhes responsabilidades específicas e condições para implementação de medidas preventivas e, neste caso, os governos precisam desenvolver novas estratégias de gestão, especialmente no que diz respeito às finanças públicas.

Mas qual é a capacidade institucional dos municípios brasileiros, especialmente aqueles da Amazônia, para implementar programas de adaptação? Os municípios enfrentam outras necessidades urgentes de desenvolvimento o que os torna ainda mais vulneráveis aos eventos climáticos extremos. Isso ressalta a necessidade de incluir os planos de adaptação no planejamento municipal. É crucial incorporar essas discussões nos debates das eleições municipais no Brasil com urgência! Não podemos permanecer à mercê de tragédias iminentes sem que medidas sejam tomadas de forma planejada e preventiva.


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Fonte: Liberal Amazon

Destino da Bayer: tudo depende do glifosato

Dados trimestrais da Bayer: os preços dos herbicidas caíram. Menos, apesar da destruição de empregos. Iniciativa legislativa da multinacional alemã visa acabar com processos judiciais nos EUA

194915O grupo sediado em Leverkusen ainda enfrenta 57 mil ações judiciais de vítimas do glifosato (aplicação de glifosato no Brasil), Foto: Adriano Machado/Reuters

Por Jan Pehrke para o “JungeWelt”

Na terça-feira, o Grupo Bayer apresentou o seu balanço financeiro do primeiro trimestre de 2024. As vendas caíram 0,6%, para 13,7bilhões de euros, e os lucros caíram de 2,17 bilhõess de euros para apenas dois bilhões de euros. O CEO Bill Anderson viu isso como uma prova de sucesso. “Só em março abordei a necessidade de ação em quatro áreas. Dois meses depois fizemos progressos em todos os lados”, explicou o norte-americano. Ele havia implementado um programa de destruição de empregos na Bayer, “o novo modelo organizacional Dynamic Shared Ownership (DSO)”, e orgulhosamente apresentou números concretos pela primeira vez. “Só no primeiro trimestre cortamos 1.500 empregos, cerca de dois terços deles em níveis gerenciais”, disse o presidente da Bayer.

O declínio nas vendas se deve em grande parte aos preços mais baixos do glifosato. O lucro foi afetado principalmente pelo aumento das taxas de juro – as dívidas da empresa ascendem a 37,5 mil milhões de euros – e “em particular pelos efeitos da hiperinflação” na Argentina”. Como houve menos pagamentos de responsabilidade de produto por danos causados ​​pelos produtos químicos “Glifosato”, “PCB”, “Dicamba” e “Essure” no primeiro trimestre de 2024,  a corporação global tem novamente mais dinheiro.

De acordo com o relatório trimestral, a Bayer ainda enfrenta 57 mil ações judiciais movidas por vítimas do glifosato. No entanto, introduziu medidas para minimizar os encargos financeiros. A Bayer nomeou Lori Schechter, uma advogada, para o conselho de supervisão que limitou com sucesso os danos da crise dos opiáceos para a empresa farmacêutica McKesson. Além disso, de acordo com relatos da mídia, a multinacional sediada em Leverkusen está examinando a proposta do novo colega do conselho de supervisão de Schechter, Jeffrey Ubben, para evitar elevados custos legais através do pedido de falência parcial no estado do Texas. A legislação societária permite tal operação; nos círculos corporativos, ela é conhecida como “Texas Two-Step”.

Como se não bastasse, o gigante agrícola também desenvolve atividades legislativas.  A Bayer quer introduzir uma lei nos EUA que tornaria a classificação do glifosato como não cancerígeno pela agência ambiental estatal EPA vinculativa para os tribunais de cada estado e, desta forma, evitar futuras decisões contra ele. A Anderson & Co. já conseguiu conquistar mais de 80 associações agrícolas como organizações preliminares. “Queremos que os legisladores ouçam a voz dos agricultores americanos”, observou hipocritamente o CEO no seu discurso de terça-feira. Trata-se de “que a agricultura dos EUA é regulada por leis baseadas na ciência – e não pela indústria dos processos judiciais”.

O trabalho na Lex Bayer consumiu a maior parte do orçamento de lobby de US$ 7,35 milhões para os EUA em 2023, como disse o CFO Wolfgang Nickl à Coordenação Contra os Perigos da Bayer em 26 de abril, na assembleia geral anual da empresa. Nickl não teve problemas com tais investimentos. “A legislação e a política moldam as condições estruturais do nosso negócio. Como empresa global, temos a responsabilidade perante a sociedade como um todo de disponibilizar ativamente as nossas competências e conhecimentos e de apoiar os processos de tomada de decisão política com os nossos especialistas”, afirmou.


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Fonte: JungeWelt

Degradação ambiental, crimes e narcotráfico na Amazônia

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A forma como a violência impacta na degradação do meio ambiente e ameaça a vida dos povos amazônicos não é um problema pontual, de fácil resolução. Os dados apresentados no Cartografias evidenciam, por exemplo, o aumento da taxa de mortes violentas nos municípios da região, em patamar 45% maior do que se observa no restante do país. Além disso, o crescimento bastante evidenciado na quantidade de apreensão de drogas ilícitas – entre 2019 e 2022, por exemplo, houve o aumento de 184,4% da apreensão de cocaína realizada pela Polícia Federal. 

Até outubro de 2023, o estudo Cartografias da Violência na Amazônia, publicado pelo FBSP, foi capaz de mapear a presença de facções criminosas em pelo menos 178 dos 772 municípios da Amazônia Legal, o que corresponde a 23% dos municípios, compreendendo 57,9% da população da região. Em 80 municípios, foi possível identificar situações de disputa territorial entre duas ou mais facções.

Além do cultivo e processamento de cocaína gerarem impactos significativos na degradação ambiental, frequentemente resultando no desmatamento de áreas de preservação, o relatório do UNODC menciona que grupos organizados que se concentravam na produção e no tráfico de drogas estão diversificando sua ação para atividades altamente lucrativas relacionadas com crimes que afetam o meio ambiente.

A Bacia Amazônica é especialmente acometida devido à abundância de recursos naturais, presença limitada do Estado, corrupção, informalidade e desemprego. A corrupção facilita a mineração e o desmatamento ilegal por meio da falsificação de licenças e de documentos, trazendo implicações perigosas para o meio ambiente. Ainda, a aquisição ilegal de terras financiadas pelo tráfico de drogas tem causado tensão local a respeito da propriedade de terras, especialmente quando se trata de territórios indígenas que são afetados pela violência, dentre ameaças e assassinatos. Os grupos criminosos também estão envolvidos com outros delitos gravíssimos, como o tráfico de pessoas para fins de trabalho análogo ao de escravo e de exploração sexual. As populações mais vulneráveis são frequentemente recrutadas ou forçadas para atividades relacionadas ao crime, como garimpo ilegal, exploração madeireira, funções de cozinheiros, motoristas ou, em determinadas situações, para a exploração sexual. Das 25,1 mil de áreas garimpadas na Amazônia estão localizadas em Terras Indígenas, representando 10% do total do bioma.

Segundo dados do Caderno de Conflitos no Campo da Comissão Pastoral da Terra (CPT), a pistolagem foi o segundo tipo de violência contra a ocupação e a posse que mais teve registros de ocorrência em 2023 (264), um crescimento de 45% em relação ao ano de 2022. Os indígenas e quilombolas foram um dos mais atingidos nas ocorrências de violência, 47 indígenas e quilombolas 19. 

O avanço da presença desses grupos tem relação com as dinâmicas do sistema prisional: Entre 2012 e 2022, a taxa de pessoas privadas de liberdade por 100 mil habitantes aumentou 43,3% no Brasil. Na Amazônia Legal, esse incremento foi de 67,3% Em Roraima, essa taxa aumentou 94,7%; no Pará, o aumento foi de 48,5%

A falta ou escassez de presença do Estado, não apenas em questões relacionadas à segurança pública, mas também na ausência ou insuficiência de políticas públicas abrangentes de geração de empregos, assistência social, saúde e educação, resulta em impactos adversos para a população, que se torna mais suscetível à agência das organizações criminosas.

Por trás desse tráfico desumano, estão redes criminosas que lucram com a miséria alheia, tirando proveito da vulnerabilidade econômica e social de milhões de pessoas em todo o mundo. Essas redes não só exploram os trabalhadores, mas também contribuem para a degradação ambiental, desmatando florestas, poluindo rios e contaminando o solo em busca de lucro rápido e fácil.

Enquanto a exploração de recursos naturais e o narcotráfico continuarem a ser alimentados pela ganância e pela impunidade, a luta por justiça e dignidade para todos os seres humanos e para o planeta que habitamos será uma batalha árdua. Combater essa realidade sórdida requer uma abordagem multifacetada, que inclua não apenas a aplicação rigorosa da lei e o fortalecimento das instituições responsáveis pela proteção dos direitos humanos, mas também medidas para promover o desenvolvimento econômico sustentável, garantir o acesso à educação e saúde, e empoderar as comunidades vulneráveis para que possam resistir à exploração e construir um futuro digno e livre.

 

Desculpe Caramelo, eles “não” sabem o que fazem!

CARAMELO

Por João Anschau

Quando o “principal” assunto que domina parte das conversas virtuais se dá em torno do salvamento ou não de um cavalo ilhado em cima de um telhado, é sinal que continuamos dando errado enquanto sociedade. Nem na dor aprendemos.

Caramelo não é responsável por nada que seus olhos assustados enxergam. Não foi consultado. Tiraram seu chão e seu habitat e agora discutem se devem ou não garantir sua permanência por aqui. Esse comportamento tem nome, sobrenome e vários filhos parasitas.

E não é hora de achar culpados, lembram os mais apressados. Para não magoar ninguém, eu vou usar outra palavra. Representantes. O que acontece no Rio Grande do Sul tem representação com CNPJ e muitos vendedores que agora apelam para o pix alheio. Nada de mexer no bolso dos donos do negócio. Filho feio não tem pai.  . 

E a natureza nos oferta mais um momento – não confundir com o discurso asqueroso e escroto de coachings que convenceram muitos, durante a pandemia de COVID-19, a desafiar a lógica com a surrada “são nas dificuldades que surgem as oportunidades” -, para refletir, debater e cobrar mudanças. Elementos e eventos sobram para que paremos de brincar de Highlander e tratemos pelo nome o que acontece em nosso entorno. Se os muristas encontram “dificuldades” para pensar, eu, humildemente, sugiro ‘Os miseráveis’, de Victor Hugo, para início da prosa.  .

E como zelador do memorial da destruição, eis que o governador Eduardo Leite nos apresenta o plano Marshall bagual cheiroso. Resumindo, a proposta, além de incoerências que pipocam de direita a direita, traz um amontoado do mesmo, feito pelos mesmos de sempre, cuja sensibilidade humana opera como de costume abaixo de menos 50 graus Celsius. São péssimos escritores, porém, têm as costas quentes e contam com o apoio de seus financiadores e a sempre azeitada máquina do capital a lhe assoprar e sugerir Estado mínimo, para os outros.

A reconstrução deve – ou deveria – passar obrigatoriamente pelo discutir modelos produtivos. Desenvolvimento econômico com água tomando conta das casas não é o mesmo que desenvolvimento econômico numa cama quentinha e nove refeições por dia. Ninguém come PIB enquanto a riqueza estiver concentrada.  Na roleta russa do plantar que tudo dá a banca nunca perde. Têm-se estiagem ou excesso de chuvas, ela ganha nas duas pontas. Governador Eduardo Leite, em seus cálculos liberais, bancos e indústria vão contribuir com quantos zeros depois do primeiro ponto? Não creio que depois do senhor usar aquele colete laranja sempre limpo e bem passado que, outra vez, eu e o Caramelo seremos convocados a dar mais um passinho à frente no busão lotado.  

Quem vai produzir comida de verdade, saudável e sem agrotóxicos, é uma pergunta recorrente que faço para os meus mais chegados há muito. Vale para o governador e para o/a prefeito/a. É um assunto que envolve a nossa e a saúde do planeta, e não brotou na catástrofe mais recente. Mais do que nunca se trata de um tema de casa obrigatório para a/os gestora/es públicos. Pros que desaprenderam por falta de uso e para os que desconhecem, é hora de praticar literalmente a definição de prioridade. Temos um case de insucesso de como não agir. Deu muito ruim, senhores e senhoras. Portanto, liberem os consultores de receitas prontas para achacarem os rentistas da Faria Lima e se concentrem na base da pirâmide.  .

É cristalino que os generosos incentivos públicos não podem ser direcionados apenas e tão somente às chamadas cadeias agroalimentares. O bolo delfiniano cresceu muito e tá na hora de cortá-lo e dividi-lo com sabedoria entre os terceirizados. A natureza é generosa e, sábia, já deixou claro que ela, mesmo esgualepada, fica e se recria. Já nós… Mais com menos dá negativo para a maioria. 

Meu companheiro de jornada, Caramelo, temos uma distopia em curso e sem prazo para finalizar. Alterações no roteiro, meu amigo, dependerão em parte de nós humanos. Os coadjuvantes terão que se mobilizar e demonstrar insatisfação com os rumos da História. Mas esse levante não pode ficar na responsa de um ou dois. Eu sei, eu sei. Muitos dirão que minha sugestão é utópica. Concordo. Mas a outra opção é aprender a dormir com os olhos abertos e enriquecer ainda mais a indústria farmacêutica. Escolham.

Grande Caramelo, por falta de tempo, não percebemos que aos poucos nos tornamos ‘o Rio 40 graus purgatório da beleza e do caos’. Que daqui a pouco surgirá um “Moisés” que conduzirá famílias inteiras expulsas pelo êxodo para algum lugar seguro. Ficarão para trás histórias e memórias e voltaremos ao século XIX com cobertura em tempo real. Esse novo normal já nasce doente. Caramelo, eu poderia sugerir o Pampa sulriograndense como um local seguro para a sua vivência.

Mas hoje, apesar de bravas e bravos pelejarem para manter a casa em ordem e com sua arquitetura o mais próximo do natural, eu temo que você corra o risco de ser expulso pelo “progresso econômico” que está transformando o Bioma em uma grande lavoura. E mais Caramelo. Lá, como cá, “investimentos” são comemorados e estampam as manchetes dos jornais como se finalmente Karl Marx fosse atendido e entendido e a riqueza dividida entre todos. Não há contraponto vivo e tampouco a vida entra na pauta dos patrocinadores da extinção da biodiversidade. Finalmente nos aproximamos da civilização, gritam alguns. E outros, do mesmo grupo, comemoram a saída dos “bárbaros” preservacionistas. 

Caramelo, o plano Marshall original surgiu após uma guerra. O que o Rio Grande do Sul enfrenta atualmente não deixa de ser uma batalha. Ambas, resultado da estupidez humana. A nossa luta é por (sobre)vivência. Nas duas frentes, sabe-se quem são os inimigos da razão, mas por estas bandas, os algozes são tratados com pompa e circunstância, idolatrados e tidos como indispensáveis para a nossa continuidade. E o senso comum, adubado sem descanso, aceita e reproduz o discurso Chicó, “não sei, só sei que foi assim”.

 Força Caramelo!


*João Anschau é jornalista e Mestre em Educação nas Ciências pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. Também é criador e impulsionador do podcast “Salve, Terra!” que está disponível no Spotify.

Wladimir Garotinho: mais para imbatível ou para tigre de papel?

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Tenho publicado neste espaço reflexões de Douglas da Mata a quem nutro muito respeito por sua verve crítica e sacadas que vão muito além de que alguns coleguinhas com diploma de doutor jamais conseguirão ir.  Como um leitor ferrenho de obras complexas e dotado de um olhar que oscila entre o sardônico e o contundente, o Douglas tem em muitos anos tirado o sono de muita gente que teme suas análises e sua sinceridade. Eu, pelo contrário, sempre fui um admirador de sua capacidade analítica e, porque não, do seu jeito extremado de confrontar ideias.

Pois bem, as últimas análises do Douglas da Mata sobre a campanha eleitoral ainda não iniciada apontam para um cenário que deixa pouco espaço para dúvidas em relação ao potencial eleitoral do prefeito Wladimir Garotinho, especialmente em face de uma oposição que carece acima de tudo de um projeto político que além do desejo de ter alguém diferente sentado na cadeira de prefeito.  

Mas se falta um projeto de oposição, isso não quer dizer, em minha modesta opinião, que Wladimir Garotinho deveria sentar sobre os louros da vitória antes do tempo. É que como Jânio Quadros já mostrou para Fernando Henrique Cardoso, ninguém deve sentar antes na cadeira de prefeito antes dos votos serem apurados.

O problema para Wladimir é que ser melhor que Rafael Diniz está longe de ser algo que se possa mostrar como grande coisa. Rafael, como Douglas da Mata já mostrou, foi uma espécie de serial killer de políticas sociais que causou horror até na classe média campista, motivo pelo qual ele não conseguiu chegar ao segundo turno em 2019.  Essa derrota acachapante, se deu apesar dele deter um exército de RPAs, fato que deveria ter garantido, pelo menos, a chance de concorrer com Wladimir na segunda rodada eleitoral.

Além do fato de que ser melhor de que Rafael é pouco, um rápido olhar para a cidade de Campos dos Goytacazes indicará situações horrorosas em áreas diversas como a cultura, esportes, mobilidade urbana, educação e saúde.  Quem olha para o eternamente fechado Palácio da Cultura, para a vexaminosa situação da decrepita sede da Fundação Municipal de Esportes, para a degradante condição das duas rodoviárias do município, para a péssima situação de escolas e hospitais municipais, e para o pífio desempenho do IMTT vai achar que vivemos em um rincão abandonado em que não há dinheiro para nada, quando, de fato, vivemos em um município com orçamento bilionário.

Não posso me esquecer ainda da escandalosa situação dos caríssimos e péssimos serviços prestados pela concessionária Águas do Paraíba que tem sido explicitada pela psicóloga Karoline Barbosa e seus voos de drone por lagoas afogadas em esgoto in natura. Se a oposição usar minimamente a trilha aberta por Karoline e vasculhar os aditivos assinados pela Prefeitura de Campos, sob a batuta de Wladimir ou de sua mãe, a coisa pode ficar, digamos, mal cheirosa para Wladimir, a ponto de contaminar suas chances eleitorais. A situação fica ainda mais problemática quando se observa a dança fingida de resistência aos salgados reajustes anuais de tarifas.

Todo esses detalhes explicitam incompetência e desorganização, algo que já teria corroído completamente as chances de reeleição, tal como ocorreu com Rafael Diniz há quatro anos.  Com isso, o que eu quero dizer que discordo de Douglas da Mata quando ele projeta uma virtual reeleição de Wladimir, mesmo no primeiro turno em outubro.  O problema, e aí eu concordo com Douglas, é que a população de Campos, especialmente a mais pobre, não vai trocar de prefeito sem que haja um projeto claro de melhoria em áreas essenciais como as que eu apontei acima. Então, quanto mais cedo essa discussão for iniciada, melhor para quem quiser seriamente ter uma chance de sair do traço no momento em que os votos forem apurados.

No entanto, o que me parece evidente é que em Campos temos diante de nós uma situação curiosa de um prefeito que tem cara de imbatível, mas pode se revelar um tremendo tigre de papel se um mínimo de esforço organizado for realizado pelos que se dizem de oposição.

Bayer contra os direitos humanos: em denúncia à OCDE, organizações documentam graves violações cometidas na América Latina

283518Organizações de direitos humanos responsabilizam o Grupo Bayer pelas consequências catastróficas da agricultura industrial, como o cultivo de soja no Brasil. Foto: IMAGO/Pond5 Imagens

Por Hermann Pfeiffer para o “Neues Deutschland”

A empresa química e farmacêutica Bayer viola os princípios da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Quatro associações latino-americanas de direitos humanos estão convencidas disso. Centro de Estudios Legales y Sociales (Argentina), Terra de Direitos (Brasil), Base-IS (Paraguai) e Fundación Tierra (Bolívia) são apoiados pela Organização de Ajuda Episcopal Misereor e pela Coordenação contra os Perigos Bayer (CBG), que tem sido existente desde 1978 para a protecção ambiental e empregos seguros no grupo Leverkusen. As organizações apresentaram recentemente uma queixa da OCDE contra a Bayer AG.

“A empresa não conseguiu abordar os graves riscos ambientais e para os direitos humanos associados ao seu modelo de negócio na região”, explica Sarah Schneider, especialista em agricultura e alimentação global da Misereor. Ela critica que os efeitos do uso de sementes geneticamente modificadas e de agrotóxicos não tenham sido adequadamente monitorados.

Segundo os reclamantes, a empresa promove um modelo agrícola que leva à insegurança alimentar, escassez de água, desmatamento extremo, perda de biodiversidade, graves impactos na saúde e conflitos de terra com comunidades indígenas e agrícolas na América do Sul. Segundo a CBG, mais de 50% das terras agrícolas no Brasil, Argentina, Bolívia e Paraguai são cultivadas com sementes de soja geneticamente modificadas. A Bayer AG é líder na comercialização de pesticidas como o controverso glifosato e sementes de soja  geneticamente modificadas que são resistentes a este herbicida de amplo espectro. A denúncia da OCDE documenta quatro casos específicos na Argentina, Brasil, Paraguai e Bolívia.

“Com a denúncia mostramos que as pessoas da nossa região sofrem intoxicações e doenças graves devido ao cultivo da soja”, enfatiza Abel Areco, diretor-geral da organização Base-IS. As fontes locais de água seriam contaminadas e as comunidades indígenas seriam privadas do seu território. “Isso destrói seu modo de vida e afeta seu acesso aos alimentos”, explica.

O que é notável na abordagem das organizações é o nível original de discussão. Os críticos da Bayer referem-se aos seus princípios na sua queixa à organização das nações industrializadas OCDE, em Paris. Organizações não governamentais descobriram o procedimento de reclamação associado como uma alternativa gratuita às ações judiciais nos tribunais estaduais.

As Diretrizes da OCDE contêm recomendações abrangentes para um comportamento responsável por parte das empresas multinacionais. A gama inclui, entre outras coisas, direitos humanos e aspectos ambientais, interesses do consumidor e direito da concorrência. Um total de 51 países, incluindo os Estados Unidos e quase todos os membros da UE, incluindo a Alemanha, ratificaram as directrizes.

“Em sua natureza jurídica, é soft law”, escrevem sócios do escritório de advocacia internacional Freshfields Bruckhaus Deringer em uma análise. O escritório de advocacia voltado para negócios geralmente representa empresas e governos nacionais. Segundo o escritório de advocacia, o processo não termina com uma sentença executória. Mas o ponto de contacto nacional da OCDE, neste caso localizado no Ministério Federal dos Assuntos Económicos, em Berlim, apela às empresas criticadas para que comentem. Poderá então haver mediação.

Mesmo que as empresas não respondam, a OCDE tem um relatório final que é publicado no website do ponto de contacto. As empresas afetadas que recusam ou não têm bons argumentos correm o risco de danos significativos à sua imagem. Esta é a base do verdadeiro poder de aplicação das Diretrizes da OCDE. Além disso, os relatórios finais da OCDE podem tornar-se a base para ações judiciais. Isso aconteceu por causa do acidente na barragem de Brumadinho, no Brasil, contra a alemã TÜV Süd e por causa dos casos de envenenamento na Índia contra a fabricante suíça de pesticidas Syngenta.

O CBG já tinha aproveitado a assembleia geral virtual de acionistas no final de abril para apontar os riscos dos medicamentos da Bayer, das cadeias de abastecimento e da comercialização de pesticidas proibidos em toda a UE em países do sul global. “Em palavras e atos, reais e virtuais, o conselho de administração e o conselho fiscal foram confrontados com críticas à empresa, a fim de mostrar aos gestores os efeitos colaterais de sua busca implacável por lucros”, diz o diretor-gerente da CBG, Marius Stelzmann. Antes da assembleia geral, as organizações submeteram a reclamação à OCDE. O ponto de contacto da OCDE em Berlim tem até ao final de julho para decidir sobre a admissibilidade da queixa e iniciar a mediação.


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Fonte: Neues Deutschland

Com plástico no corpo

Em todos os lugares e onipresente. Os microplásticos também se acumulam no corpo humano

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Você vê, você não vê nada. E, no entanto, microplásticos também foram encontrados nesta amostra de água do Mediterrâneo

Por Wolfgang Pomrehn para o JungWelt

Os plásticos são uma questão prática e, portanto, onipresentes como itens de uso diário, têxteis, cosméticos e produtos descartáveis. Mas eles têm seus lados sombrios. Por um lado, a sua produção utiliza matérias-primas fósseis e liberta gases com efeito de estufa. Esta última deve-se, entre outras coisas, ao facto de o hidrogénio utilizado para produzir plástico ser produzido a partir de gás natural através da reforma a vapor, que produz muito CO2.

Por outro lado, os resíduos plásticos estão se espalhando cada vez mais pelo planeta e podem até ser encontrados no fundo do mar e nas regiões polares. Peixes, mamíferos marinhos e pássaros morrem por causa disso porque o confundem com comida e isso bloqueia seus estômagos. A longevidade e durabilidade – o serviço científico do Bundestag fala em até 2.000 anos – está se tornando um problema particular porque os plásticos até agora quase não foram decompostos por bactérias. Em vez disso, são triturados pelo vento e pelas ondas e, em última análise, espalham-se como microplásticos nos mares, na terra e no ar.

Microplásticos são partículas cujo diâmetro é de cinco milímetros ou menor. Portanto, eles podem ser pouco visíveis ou pequenos demais para o olho humano. De acordo com a definição da Agência Europeia dos Produtos Químicos ECHA, as partículas na faixa nanométrica também são consideradas microplásticos. Um nanômetro é um bilionésimo de metro. Estas partículas são criadas como abrasão de pneus de automóveis, como resultado da já mencionada decomposição de resíduos plásticos nos oceanos ou nos campos, mas também são produzidas para cosméticos. Eles podem ser encontrados em alguns cremes dentais e cremes para a pele, por exemplo. Da mesma forma em agentes de limpeza, materiais de construção e superfícies de estradas.

Pequenos resíduos têxteis, microfibras, são particularmente comuns, escreve Judith Weis na revista The Conversation. O biólogo é pesquisador emérito da Universidade Rutgers, em Newark, EUA, e tem se concentrado particularmente nos pântanos costeiros e nos estuários dos rios de Nova York e da vizinha Nova Jersey. As microfibras são produzidas em grandes quantidades quando os têxteis são lavados e acabam em estações de tratamento de esgoto junto com as águas residuais, diz Weis. Se for utilizada tecnologia moderna, 99% deles poderão ser pescados fora da água. Mas como existem tantas microfibras, o um por cento restante ainda é uma grande quantidade.

Além disso, as microfibras filtradas acabariam no lodo de esgoto. Quando estas são utilizadas na agricultura, como era prática comum neste país até recentemente, as fibras microscópicas entram na cadeia alimentar. Primeiro, são absorvidos pelas plantas, que depois são consumidas pelos animais ou diretamente pelos humanos. Na Alemanha, porém, mais de metade das lamas de esgoto são agora queimadas, segundo a Agência Ambiental. A razão são os numerosos poluentes, como metais pesados, resíduos de medicamentos e microfibras.

As microfibras problemáticas não incluem apenas as feitas de plástico, diz Weis. Os materiais naturais também podem ser significativamente contaminados com cores tóxicas, retardadores de chama e similares e, tal como as fibras sintéticas, acabar no ambiente através das águas residuais das máquinas de lavar. Além disso, as microfibras dos rios e mares – sejam feitas de plástico ou de material natural – podem tornar-se ímanes para metais pesados ​​e outros poluentes que estão na água. As micropartículas também atuam como táxis poluentes, por assim dizer.

Agora você pode tentar uma alimentação saudável, parar de comprar alimentos embalados em plástico e fazer muito mais, mas não pode evitar completamente os riscos à saúde. Especialmente não na cidade, por exemplo, em ruas movimentadas onde normalmente vivem as camadas mais pobres da população. A abrasão dos pneus dos automóveis e outras partículas finas de plástico também se espalham pelo ar e podem ser inaladas. Um estudo recente publicado na revista Environmental Advances conclui que, embora a inalação de microplásticos seja inevitável, o tipo de respiração e a forma das partículas determinam a profundidade com que podem penetrar nas vias respiratórias e nos pulmões. Ao contrário do que você imagina, as partículas penetram profundamente no corpo quando você respira lenta e calmamente.

Em princípio, tal como acontece com os microplásticos ingeridos através dos alimentos, quanto mais pequenas forem as partículas, maior será a probabilidade de ultrapassarem barreiras. As nanopartículas também podem penetrar nas células do corpo e mesmo a barreira hematoencefálica, que protege o nosso “músculo pensante” dos agentes patogénicos, não é uma parede intransponível para os nanoplásticos, como foi descoberto na Universidade de Viena em 2022. Em experimentos com ratos, descobriu-se que minúsculas esferas de plástico com diâmetro de quase 300 nanômetros chegavam ao cérebro apenas duas horas após a ingestão com alimentos. As partículas foram rastreadas usando marcadores fluorescentes.

O que os microplásticos podem fazer ao cérebro, ao fígado ou a outros órgãos ainda não foi totalmente investigado. O que está claro, entre outras coisas, é que pode danificar as paredes celulares e promover inflamação. Também é conhecido por causar ou piorar a asma nos pulmões. Finalmente, um novo estudo publicado no New England Journal of Medicine no início de março também sugere um risco aumentado de doenças cardiovasculares. 304 pacientes com artérias bloqueadas foram examinados na Itália e nos EUA. Microplásticos foram encontrados nos bloqueios de quase 60% dos participantes do teste.


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Fonte: JungeWelt