Agrotóxicos escapam de estações de tratamento de água e chegam às casas, mostra estudo

pesticidas Costa Rica

[IGUALA DA INDEPENDÊNCIA, MÉXICO, SciDev.Net] A poluição da água por agrotóxicos é geralmente associada a áreas agrícolas, mas um estudo na Costa Rica sugere que as cidades latino-americanas enfrentam um desafio pouco discutido: suas águas residuais tratadas também podem estar carregando essas substâncias em níveis tóxicos.

Pesquisadores do Centro de Pesquisa sobre Contaminação Ambiental (CICA) da Universidade da Costa Rica e do Instituto de Aquedutos e Esgotos confirmaram a presença de 29 compostos que fazem parte de fórmulas utilizadas diariamente em residências, empresas e indústrias.

Esses contaminantes foram encontrados tanto nas entradas quanto nas saídas de água de quatro estações de tratamento no Vale Central, região que abriga a maior parte da população do país e onde está localizada a capital.

“As estações de tratamento são projetadas para águas residuais ‘comuns’, não para produtos químicos derivados de agrotóxicos.”

Rosalía Cruz, pesquisadora do Departamento de Recursos da Terra da Universidade Autônoma Metropolitana, México.

Os cinco ingredientes ativos mais preocupantes encontrados foram cipermetrina, diazinon, cinerina II, diuron e terbutrina. Em todas as detecções, esses agrotóxicos excederam os limites de segurança para a vida aquática, sugerindo um perigo contínuo nos corpos d’água que recebem os efluentes.

Além disso, a presença dessas substâncias tem implicações para a saúde humana , uma vez que pertencem a famílias químicas que têm sido associadas na literatura científica a danos ao sistema nervoso e alterações nos processos hormonais.

Outra descoberta relevante foi que cinco dos pesticidas detectados (cinerina II, flubendiamida, diclorano, bifenil e 1,4-dimetilnaftaleno) nunca haviam sido relatados anteriormente em águas residuais urbanas.

Víctor Castro Gutiérrez, um dos autores da pesquisa, explicou ao SciDev.Net que “o uso urbano da cinerina II corresponde a inseticidas naturais para jardins e pomares urbanos, bem como para o controle de mosquitos, moscas e baratas em nível doméstico. A flubendiamida também é usada como inseticida, e sua presença em águas residuais urbanas pode estar associada ao uso ornamental”.

Ele explicou que o diclorano é um fungicida usado para controlar o mofo em plantas de interior, enquanto o bifenil é usado como conservante em frutas cítricas. Por outro lado, o 1,4-dimetilnaftaleno é usado em desinfetantes em spray.

Para avaliar o impacto real desses resíduos, a equipe aplicou duas ferramentas complementares: um quociente de risco, que compara as concentrações encontradas com os níveis considerados seguros para a vida aquática, e experimentos de toxicidade em três organismos sentinela: a pulga-d’água Daphnia magna , a bactéria luminescente Aliivibrio fischeri e as sementes de alface Lactuca sativa .

A análise, publicada em 15 de novembro na versão impressa da revista Environmental Pollution , pesquisou 442 ingredientes ativos de agrotóxicos, uma metodologia nunca antes vista na América Latina.

Individualmente, 17 compostos apresentaram alto risco ambiental . No entanto, em nível de amostra, todos (tanto a água de entrada quanto a de saída) se enquadraram na mesma categoria devido ao efeito combinado da mistura de agrotóxicos.

“Este é o primeiro estudo a abordar este problema na região, com o objetivo de fornecer subsídios para futuras estratégias de mitigação do seu impacto”, comentou Castro Gutiérrez por e-mail.

Para Rosalía Cruz, pesquisadora do Departamento de Recursos Terrestres da Universidade Autônoma Metropolitana (México), que não participou do estudo, as conclusões transcendem a Costa Rica e confirmam que na América Latina existe uma limitação estrutural que não é devidamente abordada pelos órgãos governamentais.

Em entrevista à SciDev.Net, ele afirmou que “as estações de tratamento são projetadas para águas residuais ‘comuns’, não para produtos químicos derivados de agrotóxicos”, portanto não é surpreendente que os efluentes continuem a transportar esses tipos de contaminantes.

Jon Molinero — membro da ONG Yemanyá-Água e Conservação (Equador), que também não participou da pesquisa — concordou e alertou o SciDev.Net que “não existe uma única tecnologia capaz de eliminar misturas tão diversas; muitas substâncias passam sem se degradar”.

De acordo com a política nacional em vigor até 2045, menos de 15% da população da Costa Rica está conectada a estações de tratamento de esgoto. Em várias dessas instalações, Castro Gutiérrez e seus colegas notaram que a água que saía apresentava uma concentração maior de agrotóxicos, o que poderia ser devido à lixiviação desses produtos dos sólidos que chegam à estação ou à sua alteração durante o processo de tratamento.

Rosalía Cruz acredita que o desafio agora é ir além da análise. “O problema exige diálogo com aqueles que tomam as decisões sobre saneamento e planejamento urbano”, disse ela, observando que os sistemas de tratamento e a forma como as cidades são projetadas determinam o que acaba nos rios.

Para Jon Molinero, o desafio também é estrutural. A partir de seu trabalho no Equador, ele observa uma tendência que afeta a região: a rápida introdução de novas moléculas, decorrente da industrialização, em contraste com a lentidão com que elas são retiradas do mercado.

“A indústria está constantemente lançando novos compostos, e removê-los é muito difícil. Muitos são proibidos em países desenvolvidos, mas continuam sendo vendidos em nações com regulamentações mais brandas”, concluiu.


Fonte: SciDev

Codin sai das sombras para promover a ZPE do Porto do Açu, mas ainda sem pagar as indenizações das desapropriações

A injustiça permanente: agricultores protestam contra a tomada de suas terras pela Codin
Quem acompanha este blog desde suas origens, sabe que sua criação foi motivada, entre outras coisas, pelo escabroso processo de desapropriações promovido pela Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio de Janeiro (Codin) no V Distrito de São João da Barra e que atingiu em cheio centenas de famílias de agricultores pobres que ali viviam há várias gerações. As cenas de violências promovidas contra agricultores pobres, muitos deles idosos, serviram apenas para um motivo: entregar terras produtivas e que geravam sustento e reprodução social.
É importante lembrar que no período das desapropriações a Codin e seus dirigentes eram onipresentes, inclusive com o estabelecimento de um escritório local que se encarregava de gerenciar as desapropriações, muitas vezes com o uso de um amálgama de forças regulares e seguranças privados ligados ao Porto do Açu.
Passado o período de expulsão dos agricultores de suas terras e a entrega do estoque de terras familiares para as mãos de Eike Batista que posteriormente transmitiu esse espólio para o fundo internacional de private equity EIG Global Partners, a Codin tomou um chá de sumiço, enquanto os processos que ela abriu se arrastam morosamente no fórum de São João da Barra. A Codin adotou aquele lema conhecido: devo não pago, pago puder.
Há que se lembrar que durante este longo processo de negação de direitos constitucionais básicos das famílias desapropriadas, muitos dos proprietários morreram sem ver um centavo que lhe és devido pela tomada de suas terras. De quebra, ampliando o problema com a imposição de espólios que oneram os agricultores que herdam as terras sob litígio.
Tudo isso em meio a um imenso e profundo silêncio das autoridades estaduais e municipais que têm preferido bater palmas para os gestores visíveis do Porto do Açu. Essas autoridades também se omitido na produção de soluções contra a erosão costeira que consome a Praia do Açu (ver vídeo abaixo) e do uso perdulário de água doce pelos diferentes empreendimentos que estão instalados no porto fundado por Eike Batista, além da salinização que ainda afeta um número desconhecido de famílias que resistem dentro do V Distrito de São João da Barra.

Agora, meio do que do nada, o governo de Cláudio Castro, por meio da Codin, está disseminando a informação de que está promovendo a realização de um seminário reunindo especialistas e representantes dos governos federal, estadual e municipal para debater os progressos e as perspectivas da implantação da Zona de Processamento de Exportação do Açu (ver imagem abaixo).

Esse seminário seria um excelente palco para que os atingidos pelo Porto do Açu, seja pelas desapropriações e pelos efeitos desastrosos que suas estruturas estão tendo sobre o V Distrito, fizessem cobranças explícitas aos dirigentes da Codin. Afinal, como eles raramente mostram as caras, essa será uma chance de ouro para que se cobre as responsabilidades que lhes cabem.
Mas como a prefeita de São João da Barra, Carla Caputi, também está anunciada neste seminário, a ela também deveriam ser feitas cobranças no sentido da adoção de medidas emergencias para conter os processos erosivos que hoje consomem a costa sanjoanense, em especial a do Praia do Açu. É que desde o lançamento da pedra fundamental do Porto do Açu em 2006 até hoje, a Prefeitura de São João da Barra jogou um imenso tapete vermelho para o empreendimento, enquanto se colocou totalmente de costas para os que foram e continuam sendo atingidos pela sua existência.

Justificando a morte : a cor e as ações de Cláudio Castro na Operação Contenção

Por Luciane Soares da Silva

Florestan Fernandes fez muito pelo Brasil. Além de uma obra fundamental para compreender o país, nos apresentou uma frase aparentemente fácil mas extremamente profunda; ‘o Brasil tem preconceito de ter preconceito”. Vários textos contemporâneos trataram a questão explicitando um país racista sem pessoas racistas. Não leremos em placas a proibição de entrada em uma barbearia, um shopping ou no Copacabana Palace. O professor Kabengele Munanga afirmava que nossa forma de resolver a questão racial, a engenharia de nosso racismo. era mais eficaz (e um tanto mais perversa) se comparada a outros países. E esta seria nossa marca, a  disseminação ideológica da impossibilidade de ser este um país racista uma vez que a miscigenação teria abarcado todas as relações sociais e íntimas. A acomodação dos opostos nas formas mais próximas de relação que se estabeleciam na Casa Grande. E eis aí uma das teses mais interessantes e controversas de Gilberto Freire: este encontro que antes de ser separação era concertação, afeto. Contribuição da cultura africana ao Brasil “amolengando” os conflitos nas formas de apadrinhamento e miscigenação populacional.

Mas nossa construção imagética sobre um país sem racistas nos apresenta com muita frequência imagens que fundem cor e violência. Joel Zito trabalha esta ideia em seu livro e depois documentário, A negação de negro na telenovela. Mas qual a importância das imagens?

Quem já pisou em um museu com quadros africanos ou instrumentos de tortura usados na escravidão deve ter recebido imediatamente um tipo de estímulo. De pavor, dor, lamento ou raiva. Quase todos que leem este texto devem ter crescido com as representações de corpos negros sujeitos a condição do escravo ou do subalterno, ladrão, alcóolatra, boêmio, sensual, mutilado física ou psicologicamente.

Antônio Sérgio Guimarães ao discutir classe e raça, no livro Classes, Raças e Democracia, observa que no Brasil se tivemos certa dificuldade no tratamento de nossa condição de operário, conhecemos desde sempre o tratamento dispensado aos escravizados. E minha interpretação seria de que esta lembrança nos diz algo sobre continuidades históricas (o pensamento social brasileiro sempre nos lembra de nossa ausência de um processo revolucionário ( e isto merece um texto único ).

Seguindo este raciocínio não é  estranha a afirmação da existência  desta longa duração do tratamento dispensado aos descendentes de escravos quando observamos o tratamento dispensado aos moradores de favela “quase todos pretos, ou quase pretos de tão pobres”. Seguimos um debate sobre classe e raça que tem rendido importantes contribuições teóricas. E possibilitado que se avance na política de ações afirmativas, por exemplo

Durante a pesquisa nas favelas da Maré era preciso combinar um dia para poder entrar no território. Crianças sem aula por 42 dias, pessoas buscando medicação e calmantes para sobreviver à experiência do “caveirão do ar” aterrorizando moradores  frequentemente, pessoas diariamente acossadas pelas forças policiais. Com medo contínuo e aquisição de trauma coletivo semelhante a populações expostas à guerra.

Os dados apresentados sobre aceitação da operação , dizem muitas coisas. Embora façam parte de um momento dramático e de alta pressão emocional, no passado recente já houve aceitação do uso de blindados, de outras operações como a do Jacarezinho. Trago uma única variável: a cor de quem é executado. E devemos observar ainda os casos de execuções com sinais de tortura. Seria errado dizer que é isto que a população fluminense está aprovando? Execuções com sinais de tortura de pessoas que sequer foram identificadas?

Mas gostaria de estabelecer aqui uma questão sobre metodologia de pesquisa (é o que fazemos, é o nosso ofício e isto não desqualifica pesquisadores em segurança pública). As pesquisas que sempre buscam seu grau de cientificidade em bases quantitativas sempre me lembram da limitação desta técnica. Especialmente com determinados grupos. Entre eles, os moradores de favela. Vamos fazer um exercício fácil. Mudar as questões e pensar em outros resultados. Se você perguntasse sobre o grau de confiança na polícia aos mesmos grupos pesquisados no dia 10 de outubro? Se você perguntasse sobre tapas na cara e outras formas de humilhação ? Se antes da operação, você perguntasse o que acham do governador ? E qual o peso das respostas de católicos e evangélicos ? E se você morasse em área de milícia, poderia responder o que pensa ? Já fiz entrevistas em favelas nas quais a pessoa só respondia com a cabeça porque ela sabia exatamente onde estavam as facções durante a UPP. Conclusão: você pode usar a estatística para obter resultados diferentes com o mesmo grupo. Depende de quando, como e o quê deseja obter como resposta.

Existem aqueles que se indignam com a injustiça representada pelas 121 mortes até aqui. E em minha trajetória como pesquisadora eu estaria neste grupo. Mas ao seguir metodologicamente o exercício de permanecer dentro das favelas e seguir cotidianamente aprofundando os diálogos, passei da relação formal de pesquisadora  à experiência de imersão cotidiana junto aos moradores. Então tenho meus afetos a defendo que esta não é a variável que diminui nossa objetividade no fazer científico. A postura que exigiram de minha geração sempre retomava o afastamento como técnica de pesquisa para que não fosse perdida a objetividade. Os moradores de favela que entram na Universidade e que pretendo formar não serão menos capazes de manter a objetividade. Seria impossível aceitar que além de corpos estraçalhados, este exercício de manutenção da objetividade nos demandasse esquecer cada luta desde o Brasil Colônia. Que não foi outra coisa se não uma luta contra o extermínio que segue historicamente o mesmo modus operandi.

Nosso sentimento, daqueles que estão lá, têm parentes, temem pela vida de policiais expostos a estes eventos passa por tristeza, indignação. Mas não perco a objetividade quando observo os olhos de uma mãe cujo filho foi desaparecido pelo Estado. Eu ouvi mais de 30 mulheres, ouvi longamente suas histórias de vida. E muito do que tinham em comum, era comum às suas mães e avós. Um século de subemprego, um século de ausência de direitos, um século de mortes.

Esta condição vergonhosa é nosso legado, nossa face global.  Nossa estatística diária de execuções e torturas. E acredito que ao fazer o registro deste cotidiano, ao ouvir estas histórias de vida, não deixamos de fazer uma ciência relevante. Que nunca permita o esquecimento da história. E que faça justiça aos mortos pelo Estado.


Luciane Soares da Silva é professora associada da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf)

As águas da Amazônia atingem temperaturas recordes

Lagos da Amazônia 1

Um estudo recente liderado pelo Instituto Mamirauá para o Desenvolvimento Sustentável, no Brasil, revelou que os lagos da Amazônia estão aquecendo até 0,8°C por década, ultrapassando a média global. Crédito da imagem: Miguel Monteiro / Instituto Mamirauá. 

“Estava muito calor, o sol estava quente, a água estava quente, a lama estava quente, tudo estava quente. Nunca tinha visto nada igual”, recorda Silas Rodrigues, presidente da comunidade Bom Jesus, às margens do Lago Tefé.

Agora, um estudo científico confirma que o lago onde Rodríguez vive há quase quarenta anos atingiu 41°C no auge da seca. A pesquisa, liderada pelo Instituto Mamirauá de Desenvolvimento Sustentável, no Brasil, e publicada na revista Science Advances , revela também que as águas da Amazônia estão aquecendo a uma taxa sem precedentes: cerca de 0,8°C por década, bem acima da média global.

A morte de peixes e botos no Lago Tefé, na Amazônia brasileira, chamou a atenção para o aumento das temperaturas nos rios e lagos da região. Crédito da imagem: Miguel Monteiro / Instituto Mamirauá.

“Até agora, a maioria dos estudos havia sido feita em lagos temperados nos Estados Unidos ou na Europa. Mas aqui [na Amazônia] estamos falando de um processo diferente, tropical. Antes, havia apenas projeções, mas em 2023 confirmamos que se trata de um fenômeno em larga escala com muitos impactos socioecológicos”, disse Ayan Fleischmann, autor do estudo e pesquisador do Instituto Mamirauá, à SciDev.Net .

A pesquisa, que contou com a participação de especialistas internacionais, combinou observações de campo para registrar o que estava acontecendo durante a seca de 2023 com análises de imagens de satélite para compreender as mudanças ocorridas nas últimas três décadas. Além disso, utilizando modelos matemáticos, a equipe identificou as razões pelas quais as águas da Amazônia estão aquecendo tão rapidamente.

Os resultados revelaram que cinco dos dez lagos monitorados na Amazônia central registraram temperaturas diurnas superiores a 37°C. O Lago Tefé registrou o valor mais alto observado até o momento, 41°C, temperatura considerada acima do limite de tolerância para a vida aquática. “Esses valores são muito superiores às temperaturas típicas desses ecossistemas: a temperatura média da água superficial durante o dia em lagos tropicais geralmente varia entre 29°C e 30°C”, indica o estudo.

“Até agora, a maioria dos estudos havia sido feita em lagos temperados nos Estados Unidos ou na Europa. Mas aqui [na Amazônia] estamos falando de um processo diferente, um processo tropical. Antes, havia apenas projeções, mas em 2023 confirmamos que se trata de um fenômeno em larga escala com muitos impactos socioecológicos.”

Ayan Fleischmann, pesquisador do Instituto Mamirauá

Entre outras descobertas, o estudo revela que a área da superfície do Lago Tefé diminuiu 75%, e no Lago Badajós, a redução chegou a 92%. Essa diminuição significativa da área da superfície da água se deveu à queda dos níveis dos rios, e a pouca profundidade coincidiu com um aquecimento excepcional dos corpos d’água.

Além disso, dados de satélite de 24 lagos brasileiros mostraram que o aquecimento registrado em 2023 não foi um evento isolado. Desde 1990, as temperaturas da água superficial na Amazônia aumentaram em média 0,6°C por década, com tendências que chegam a 0,8°C em alguns lagos, como Tapajós, Amanã e Janauacá.

Fleischmann enfatiza que esses dados demonstram uma tendência contínua de aquecimento nos lagos amazônicos, onde ainda há muito pouco monitoramento. Andrea Encalada, pesquisadora do Painel Científico para a Amazônia, que não participou do estudo, concorda.

O cientista equatoriano especializado em ecologia de rios tropicais disse à SciDev.Net que essas descobertas mostram claramente como as mudanças climáticas estão alterando os sistemas de água doce na região tropical.

“As descobertas de Fleischmann e seus colegas são profundamente reveladoras e alarmantes. O que está acontecendo nos lagos da Amazônia não é um incidente isolado, mas um sinal claro de que os sistemas aquáticos tropicais estão atingindo limites críticos diante das mudanças climáticas”, conclui ele.

Um chamado da Amazonia

A seca de 2023 deixou cicatrizes profundas. “Muitos peixes morreram e havia um cheiro horrível. A água estava muito poluída”, conta Rodrigues. Fleischmann, por sua vez, lembra-se de quando, em setembro, os pescadores de Tefé foram ao Instituto Mamirauá para relatar a morte de botos no lago. Esse incidente marcou o início de sua pesquisa.

“Quando um rio ou lago amazônico seca, a vida das pessoas que tanto dependem dele para seu transporte , sua vida e sua cultura também seca”, reflete ele.

Os efeitos nos lagos amazônicos são um sinal claro de que os sistemas aquáticos tropicais estão atingindo limites críticos diante das mudanças climáticas. Crédito da imagem: Miguel Monteiro / Instituto Mamirauá.

Portanto, os especialistas enfatizam a importância de fortalecer a cooperação entre a ciência e as comunidades locais para lidar com os futuros eventos climáticos. Rodrigues insiste que os estudos técnicos devem ser conduzidos “em conjunto com as comunidades ribeirinhas, para evitar danos ao meio ambiente ou às pessoas”.

Fleischmann compartilha dessa visão e a levará consigo para a COP30, que está sendo realizada em Belém, no Brasil. “Precisamos investir em ciência, tecnologia e monitoramento em conjunto com as comunidades locais; não se trata de uma campanha de um ou dois anos, mas de um esforço contínuo”, alerta ele.

Para Encalada, a prioridade é fortalecer as redes de monitoramento. “A Amazônia é um sistema sentinela para o planeta. Se até mesmo seus ecossistemas aquáticos estão atingindo seus limites de resiliência, significa que já estamos perto de pontos de inflexão ecológicos”, enfatiza.


Fonte: SciDev 

Brasileiros mais expostos a riscos alimentares: Alimentos ultraprocessados estão substituindo alimentos in natura e minimamente processados

alimentos ultraprocessados, como bolachas tipo cream cracker e salgadinhos

Ultraprocessados estão mais populares e tomando espaço de alimentos in natura. Foto: Vu Nghi Thai / Unsplash

Agência BORI

Os alimentos ultraprocessados – produtos industriais ricos em açúcar, sal, gorduras e aditivos, como aromatizantes e emulsificantes – vêm ganhando espaço nos carrinhos de compras e nos pratos das pessoas ao redor do mundo. A tendência é detalhada em uma coletânea de estudos publicada na última terça-feira (18) na revista The Lancet, uma das mais respeitadas na área da saúde. Os pesquisadores alertam que o avanço desses produtos exige medidas coordenadas para reduzir seu consumo, já que o hábito está ligado ao aumento do risco de doenças crônicas e morte precoce.

A coleção temática foi produzida por um grupo internacional de 43 pesquisadores, com liderança de cientistas do Brasil, Austrália e Chile. Nomes de destaque, como Marion Nestlé, professora emérita da Universidade de Nova York (NYU) e referência mundial em nutrição, e Gyorgy Scrinis, que cunhou o termo “nutricionismo” (a ideia de reduzir os alimentos apenas aos seus nutrientes), estão entre os autores. Cada artigo da série aborda um aspecto distinto do tema. Enquanto o primeiro revisa as evidências científicas acumuladas desde a criação do conceito de ultraprocessados e sua relação com a saúde, o segundo propõe um conjunto de políticas coordenadas para regular e diminuir a produção, a publicidade e o consumo desses produtos. Já o terceiro discute como o avanço dos ultraprocessados é impulsionado por grandes corporações globais, não apenas por escolhas individuais.

A série chama atenção para o avanço expressivo dos ultraprocessados na alimentação global. Em países como Espanha e China, a proporção de energia proveniente desses produtos triplicou nos últimos 30 anos. No México e no Brasil, esse percentual passou de 10% para 23% em quatro décadas. Já nos Estados Unidos e no Reino Unido, o consumo segue alto: acima de metade das calorias ingeridas há pelo menos 20 anos. Ana Clara Duran, pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e uma das autoras do estudo, explica que o aumento é resultado de uma combinação de fatores. “A conveniência constitui um determinante estrutural fundamental, uma vez que são itens prontos para consumo ou que exigem preparo mínimo”, declara. “As escolhas também são moldadas por normas sociais, práticas familiares e reforço durante a infância, além da influência do marketing”, complementa.

Segundo os pesquisadores, a mudança global no padrão alimentar traz consequências importantes para a saúde. O alto consumo de ultraprocessados está ligado a maior ingestão calórica, pior qualidade nutricional e exposição contínua a aditivos e compostos químicos potencialmente prejudiciais. As evidências também apontam um risco elevado de diversas doenças crônicas, como obesidade, diabetes tipo 2, problemas cardiovasculares, depressão e até morte precoce. “Esses produtos são formulados para maximizar a recompensa sensorial, combinando açúcar, sal, gorduras e aditivos de maneira a torná-los extremamente palatáveis e incentivar o consumo excessivo”, destaca Duran.

A coletânea também apresenta um conjunto de estratégias para frear o avanço dos ultraprocessados e estimular escolhas mais saudáveis. “É fundamental adotar políticas públicas regulatórias que tornem o consumo desses produtos menos acessível e atrativo, como o aumento de impostos e o incentivo à produção e comercialização de alimentos in natura”, afirma a autora. Duran reforça ainda a necessidade de ampliar a transparência dos rótulos, fortalecer a regulação da publicidade – especialmente a voltada ao público infantil – e implementar políticas que limitem a oferta de ultraprocessados nas escolas. “A exposição precoce a alimentos hipersaborosos, associados à conveniência e à sensação de recompensa, molda padrões alimentares que podem se manter por toda a vida”, completa.

A equipe do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde da Universidade de São Paulo (NUPENS/USP), responsável por desenvolver a linha utilizada na produção dos trabalhos, pretende aprofundar o conhecimento sobre o tema. “O grupo seguirá trabalhando na geração de evidências que ligam o consumo de ultraprocessados a desfechos de saúde, na geração e avaliação de impacto de políticas públicas que restringem seu consumo e aumentam o consumo de alimentos in natura e minimamente processados”, declara Duran, que também reforça o objetivo de investigar a interferência da indústria de ultraprocessados na regulação de políticas alimentares.


Fonte: Agência Bori

Governo Castro desdenhou parecer técnico do TCE e colocou +R$ 1 bilhão no Banco Master

Governador diz que recuperação fiscal do Rio está bem encaminhada | Agência  Brasil

Há algum tempo sabe-se que o Banco Master se equilibrava em meio a um mar de dificuldades criadas pela gestão imprudente (e agora se sabe criminosa) de grandes somas de recursos de um número ainda desconhecido de investidores.  Apesar da situação calamitosa em que se encontrava, o governador Cláudio Castro e sua equipe decidiram colocar no Master algo em torno de R$ 1 bilhão de recursos do fundo próprio de previdência dos servidores públicos estaduais do Rio de Janeiro, o RioPrevidência.

E é importante frisar que isso foi feito à revelia de pareceres técnicos emitidos pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE/RJ) que apontavam para “graves irregularidades no processo de alocação de recursos do Rioprevidência” em letras financeiras do Master”. Apesar disso,  de acordo com os pareceres dos técnicos do TCE/RJ,  o volume de aportes entre 2024 e 2025 no grupo do Banco Master atingiu R$ 2,6 bilhões – de acordo com o TCE, o correspondente  a mais de 25% de todos os recursos aplicados pelo RioPrevidência.

Agora que a barca do Banco Master afundou fica provado que os técnicos do TCE/RJ estavam cobertos de razão em apontar para os problemas cercando os investimentos de recursos do RioPrevidência em uma instituição financeira que já exalava um forte cheiro de que iria ter um destino inglório.

Como objetivamente estamos diante de uma ação com graves e prolongados prejuízos para o RioPrevidência, ameaçando sim o pagamento de pensões e aposentadorias dos servidores públicos estaduais, há que se demandar que os culpados por essa alocação bilionária de recursos no Master sejam todos identificados e exemplarmente punidos dentro dos rigores da lei.

E agora vamos ver como se vira o governador Cláudio Castro sobre quem repousa a maior responsabilidade, já que é o chefe do executivo estadual, de ter colocado um dinheiro que pertence aos servidores públicos estaduais em uma instituição que colapsou.

Investigação revela que mais de 300 lobistas do agronegócio participam da COP30

Lobistas representando a indústria responsável por um quarto a um terço das emissões globais participaram de negociações importantes na cúpula climática da ONU 

Pessoas seguram cartazes com os dizeres "emergência climática, nós somos a resposta".

Indígenas protestam por justiça climática e proteção territorial durante a COP30, a conferência climática da ONU, em Belém, Brasil, em 17 de novembro de 2025. Fotografia: Anderson Coelho/Reuters

Por Rachel Sherrington e Nina Lakhani para “The Guardian”

Mais de 300 lobistas da agroindústria participaram das negociações climáticas da ONU deste ano, realizadas na Amazônia brasileira, onde o setor é a principal causa do desmatamento, segundo uma nova investigação.

O número de lobistas representando os interesses da pecuária industrial, dos grãos e dos pesticidas aumentou 14% em relação à cúpula do ano passado em Baku – e é maior do que a delegação da décima maior economia do mundo, o Canadá, que levou 220 delegados à COP30 em Belém, de acordo com a investigação conjunta da DeSmog e do The Guardian.

Um em cada quatro dos grandes lobistas da agricultura (77) participam da COP30 como parte de uma delegação oficial de um país, com um pequeno subconjunto (seis) com acesso privilegiado às negociações da ONU, onde os países devem elaborar políticas ambiciosas para conter a catástrofe climática global.

A agricultura é responsável por um quarto a um terço das emissões globais e os cientistas afirmam que será impossível atingir as metas do Acordo de Paris de 2015 sem mudanças radicais na forma como produzimos e consumimos alimentos.

A pecuária é o principal fator de desmatamento na Amazônia, seguida pela produção industrial de soja, utilizada principalmente para ração animal. Cientistas alertam que até metade da floresta amazônica pode atingir um ponto de inflexão até 2050 devido ao estresse hídrico, ao desmatamento e às mudanças climáticas.

“Mais de 300 lobistas do agronegócio ocupam o espaço na COP30 que deveria pertencer aos povos da floresta. Enquanto falam em transição energética, despejam petróleo na bacia amazônica e privatizam rios como o Tapajós para o cultivo de soja. Para nós, isso não é desenvolvimento, é violência”, afirmou Vandria Borari, da Associação Indígena Borari Kuximawara, do território Alter do Chão.

As revelações surgem em meio à crescente frustração com o acesso irrestrito concedido a corporações que lucram com a manutenção da dependência global de combustíveis fósseis e/ou com a destruição de florestas e outros ecossistemas vitais para mitigar a catástrofe climática.

O setor alimentício industrializado celebrou a falta de ação nas recentes cúpulas climáticas, que não conseguiram recomendar metas vinculativas para a redução das emissões, do uso de combustíveis fósseis ou do consumo de carne. Um estudo de 2020 constatou que, mesmo que os combustíveis fósseis fossem eliminados imediatamente, a manutenção do status quo no setor alimentício provavelmente inviabilizaria a meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais – e até mesmo a meta de 2°C.

Os setores de carne e laticínios enviaram o maior número de representantes, representando 72 dos 302 delegados. Esse número é quase o dobro do total de negociadores da Jamaica, a nação caribenha devastada pelo furacão Melissa no mês passado – uma supertempestade que, segundo cientistas, foi intensificada pelo aquecimento global causado pela ação humana. A Índia, um país com 1,45 bilhão de habitantes que enfrenta grandes desafios climáticos, enviou uma delegação de 87 negociadores.

Segundo uma análise recente da Friends of the Earth US, as emissões das 45 maiores empresas de carne e laticínios são equivalentes às da Arábia Saudita, o maior produtor de petróleo do mundo. A JBS, a maior empresa de carne do mundo, responsável sozinha por um quarto (24%) das emissões, tem oito lobistas na COP30, incluindo seu CEO, Gilberto Tomazoni.

Os agroquímicos – pesticidas e fertilizantes sintéticos – contam com 60 delegados, e os biocombustíveis com 38 representantes – um aumento de 138% em relação ao ano passado. A gigante dos pesticidas Bayer enviou 19 lobistas, o maior número, enquanto a Nestlé tem nove.

A maioria dos fertilizantes sintéticos é derivada de combustíveis fósseis e emite óxido nitroso – um gás de efeito estufa 300 vezes mais potente que o CO2, sendo a agricultura a principal responsável por sua emissão.

“Essas descobertas comprovam que a agricultura industrial conseguiu cooptar a convenção climática. A COP jamais alcançará ações climáticas efetivas enquanto os lobistas da indústria tiverem permissão para influenciar governos e negociadores”, afirmou Lidy Nacpil, do Movimento dos Povos Asiáticos sobre Dívida e Desenvolvimento.

A alimentação não é o foco das negociações deste ano, mas o setor tem a ganhar com vários temas importantes em discussão, incluindo decisões sobre biocombustíveis – muitos dos quais são produzidos a partir de produtos agrícolas como milho e soja, que contribuem para o desmatamento.

O Brasil está empenhado em quadruplicar o uso de biocombustíveis, que muitas vezes são comercializados como energia verde – mas um estudo recente constatou que eles podem gerar 16% mais emissões do que os combustíveis fósseis devido aos impactos do uso da terra no cultivo de monoculturas.

Outro fator crucial é o financiamento climático, do qual os maiores poluidores agrícolas do mundo – que já são grandes beneficiários de subsídios públicos – estão se posicionando para receber grandes parcelas.

“O que está acontecendo em Belém não é uma conferência climática, mas uma negociação de reféns sobre o futuro do planeta, onde aqueles que detêm os detonadores – os barões da soja, os cartéis da carne, os vendedores de pesticidas – estão sentados à mesa como mediadores honestos”, disse Raj Patel, autor de Stuffed and Starved: The Hidden Battle for the World Food System (Enchidos e Famintos: A Batalha Oculta pelo Sistema Alimentar Mundial).

“Esses lobistas da indústria alimentícia estão comprando acesso e legitimidade por meio de políticos dispostos a aceitar seus cheques enquanto o planeta queima”, acrescentou Patel, professor de pesquisa na Escola de Assuntos Públicos Lyndon B. Johnson da Universidade do Texas, em Austin.

A análise baseia-se na lista provisória da UNFCCC com 56.000 delegados da COP30 e inclui representantes das maiores corporações de carne e laticínios, pesticidas e fertilizantes, processadores de alimentos, comerciantes de commodities e sementes, varejistas de alimentos e biocombustíveis. Os números também incluem grupos comerciais globais e regionais, além de sindicatos e institutos nacionais de agricultores com vínculos corporativos e/ou histórico de lobby alinhado às demandas da indústria.

Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) , principal braço de lobby do agronegócio no Congresso, apoiou diversas leis antiambientais controversas, incluindo um projeto de lei que restringe a demarcação e o acesso à terra para populações indígenas, e tentou revogar a moratória da soja na Amazônia, um acordo voluntário histórico para bloquear a venda de soja ligada ao desmatamento.

O Instituto da Carne – que representa 350 empresas de processamento e embalagem de carne, responsáveis ​​por 95% da produção de carne e aves nos EUA – possui dois delegados. A associação comercial tem feito forte lobby contra regulamentações, incluindo a oposição a iniciativas que obrigam as empresas americanas a divulgar a extensão total de suas emissões, e contra mudanças nas diretrizes alimentares para a redução do consumo de carne vermelha.

Nos Estados Unidos, as corporações do agronegócio e os grupos comerciais gastaram bem mais de meio bilhão de dólares em lobby no Congresso entre 2019 e 2023 para obter legislação favorável, então não é surpreendente ver o agronegócio em larga escala na COP30, de acordo com Karen Perry Stillerman, vice-diretora do programa de alimentos e meio ambiente da União de Cientistas Preocupados.

“Os defensores já estão pedindo que a indústria de combustíveis fósseis e sua desinformação sejam banidas das futuras negociações climáticas, e a influência do agronegócio é igualmente tóxica… não teremos sistemas alimentares sustentáveis, justos, saudáveis ​​ou resilientes às mudanças climáticas em nenhum lugar do mundo enquanto as gigantescas empresas do agronegócio e da alimentação estiverem ditando as regras.”

A participação da agroindústria aumentou 71% em comparação com a COP27 em Sharm el-Sheikh, mas está abaixo do recorde da COP28 em Dubai, que foi a maior cúpula da ONU de todos os tempos, com 86.000 delegados, em comparação com os 56.000 inscritos no Brasil.

Um porta-voz da Bayer afirmou: “Temos sido transparentes em relação aos nossos compromissos com a COP… apoiamos firmemente as ações para evitar a crise climática. O processo exige o envolvimento de todos.”

Um porta-voz da JBS afirmou em comunicado: “A JBS, como empresa do setor alimentício, concentra-se em aumentar a produtividade agrícola, aprimorar a eficiência do sistema alimentar e reduzir as perdas e o desperdício de alimentos.”

A Nestlé, a CNA e o Instituto da Carne não responderam aos pedidos de comentários. A presidência brasileira da COP30 e a UNFCCC também não responderam aos pedidos de comentários.


Fonte: The Guardian

Presos na bolha da Inteligência Artificial

Cada vez mais dinheiro está sendo investido no setor de Inteligência Artificial (IA). No entanto, o entusiasmo atual não se reflete nos lucros das empresas que aplicam a tecnologia 

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Uma avaliação exorbitante no mercado de ações que supera em muito os lucros anuais. A Nvidia não está sozinha nessa situação, e muitas empresas de IA estão no mesmo barco.

Por Dominic Iten para o “JungeWelt”

No final de outubro, o CEO da Nvidia, Jensen Huang, foi visto com o vice-presidente da Samsung Electronics e o CEO da Hyundai Motor Company desfrutando de cerveja e frango frito no restaurante Kkanbu Chicken, em Seul – uma refeição com consequências: em poucos dias, o preço das ações de restaurantes e fornecedores de frango frito sul-coreanos disparou em até 20%. Essa anedota ilustra o que todos já sabem: os investidores estão despejando dinheiro em tudo que tenha o rótulo de IA e em qualquer coisa remotamente relacionada ao hype da IA.

Bill Gates está agora traçando paralelos com a bolha da internet que arrastou metade da economia global para baixo por volta da virada do milênio. Naquela época, os investidores também apostaram na formação de novos mercados, ganhos de produtividade e lucros correspondentes em função dos avanços tecnológicos. Então, como agora, as expectativas infladas levaram a investimentos equivocados – também em um contexto de crise de acumulação de capital: por décadas, houve um excesso de capital disponível em comparação com a escassez de oportunidades reais de investimento lucrativas.

Excesso crônico de capital

Essa configuração constitui a base de uma economia de bolha que se tornou crônica desde a década de 1980. Como a acumulação real já não é suficiente para estabilizar as taxas de lucro, o crescimento é repetidamente forçado pela especulação: primeiro com a bolha das empresas ponto-com, depois com a bolha imobiliária e, finalmente, com a bolha de liquidez inflada pelos bancos centrais durante os anos de juros zero. Em vez de resolver a crise, essas bolhas apenas adiam as consequências do excesso de capital. A inteligência artificial surge como a mais recente tentativa de mascarar esse problema estrutural com um novo mito do lucro: uma promessa final e grandiosa de que o capital fictício acumulado ainda pode ser transformado em lucros reais.

Já em meados de outubro, o Banco da Inglaterra e o Fundo Monetário Internacional alertaram para uma forte correção de mercado. Pouco depois, o jornal NZZ ( Neue Zürcher Zeitung) observou que a euforia em torno da IA ​​estava levando os investidores a um frenesi perigoso; todos estavam cientes do perigo, “mas não conseguiam sair”. Isso é verdade: é um desastre anunciado — mas enquanto o dinheiro continuar fluindo, nenhuma empresa, nenhum investidor consegue se retirar. A IA, como tecnologia do futuro, é “grande demais para ser ignorada”. Enquanto todos os outros continuarem investindo, ninguém se atreve a sair — aqueles que o fizerem podem perder a oportunidade. Essas decisões individuais forçadas vincularam, de forma fatídica, os fluxos de capital globais e toda a economia dos EUA ao desenvolvimento do setor de IA.

A bolha da IA ​​é 17 vezes maior que a bolha das empresas ponto-com e quatro vezes maior que a bolha dos empréstimos subprime, cujo estouro desencadeou a crise financeira de 2008. Oitenta por cento dos lucros gerados no mercado de ações dos EUA em 2025 foram obtidos por empresas de IA. O mercado de ações impulsionado pela IA está atraindo dinheiro do mundo todo: no segundo trimestre de 2025, fundos estrangeiros no valor de US$ 290 bilhões foram investidos em ações americanas, representando cerca de 30% do mercado – um nível não visto desde a Segunda Guerra Mundial.

Tecnicamente imaturo

Todo o mundo dos investimentos aposta que a IA aumentará a produtividade do trabalho e, consequentemente, os retornos, mas até agora há poucas evidências que sustentem essa ideia. Projetos isolados de sucesso não conseguem disfarçar o fato de que as receitas não acompanham os investimentos e que muitos sistemas ainda são tecnicamente imaturos. De acordo com um relatório recente do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), cerca de 95% das empresas ainda não observaram um aumento mensurável nos lucros ou nas receitas, apesar de investirem bilhões em IA. A consultoria de gestão McKinsey chegou a conclusões semelhantes: 80% das empresas não veem nenhuma contribuição significativa para seus lucros proveniente do uso de IA generativa.

Antes da etapa final

Nesse contexto, estabeleceu-se uma dinâmica que sugere um fim iminente, ou pelo menos uma transição para o estágio final da bolha. A especulação está presa em uma espécie de ciclo vicioso. Por meio de fundos de índice e outras estratégias passivas, quantias cada vez maiores de dinheiro fluem para algumas poucas empresas de IA. Suas avaliações estão subindo e o capital está prontamente disponível. Para sustentar essas altas expectativas com crescimento tangível, elas estão canalizando cada vez mais esse dinheiro barato em negócios entre si: estão transferindo bilhões de dólares em chips e serviços em nuvem umas para as outras – essencialmente comprando suas próprias receitas futuras.

Por exemplo, a Microsoft aumentou sua participação na OpenAI e, em troca, garantiu que a OpenAI comprasse aproximadamente US$ 250 bilhões em serviços de nuvem da plataforma Azure da Microsoft. A Amazon está adotando uma abordagem semelhante com a Anthropic: bilhões em investimentos na startup estão atrelados à promessa de obter poder computacional e chips especializados principalmente da Amazon Web Services nos próximos anos. Isso cria a impressão de um crescimento enorme, embora parte dele esteja simplesmente sendo redistribuída dentro do setor. A bolha se perpetua.


Fonte: JungeWelt

Rio de Janeiro será sede de encontro anticapitalista pelo clima e pelo fim dos genocídios

Encontro Anticapitalista pelo Clima e pelo Fim dos Genocídios

Local: Rua da Lapa, 107 (Partisan)

Programação:

20/11

10h – Marcha da Periferia no viaduto Negrão de Lima (Madureira)

18h- Mesa 1: Abertura

Cyro Garcia (PSTU), Renato Cinco (GEEM), Pedro Aranha (Coalizão pelo Clima), Bruno Cruz (Marx Carioca), Plinio de Arruda Sampaio Jr (Contrapoder), Leandro Lanfredi (MRT), José Dalmo (Emancipação Socialista), Babá (CST), Alexandre Samis (IEL) Matilde Alvim (Climáximo), Aline Castro (PCBR), Leonardo Kaplan (Asduerj), Júlio Santos (MFSR)

21/ 11

9h – Mesa 2:  Genocídios Capitalistas: da Palestina às Favelas

Osmarino Amâncio (seringueiro), José Gomes Hata (Movimento 3a Divisão – Angola), Rita Passos (IPPUR/UFRJ), Julio Condaque (Quilombo Raça e Classe)

14h- Mesa 3:  Movimentos populares e luta ambiental

Avabrum (Brumadinho), Campanha do Caô Climático, Rio sem Óleo, Jovens Defensores Populares pelo Clima na Baixada, FormigAção-ATB.

Mediação: Flavia Braga Vieira (UFRRJ)

18h –  Mesa 4:  O Colapso ambiental e a crise do capital: um diagnóstico

Luis Marques (Unicamp), Erica Andreassy (Ilaese), Marcelo Lopes de Souza (UFRJ), Rhian de Medeiros Vieira Soares (PCBR)

22/11

9h – Mesa 5:  Capitalismo Verde e negacionismo sutil

Leonardo Kaplan (Asduerj), Ivan Targino (Sindicato Metabase Inconfidentes), Renato Cinco (GEEM), Bárbara Sinedino (CST).

Mediação: Pedro Aranha

14h mesa 6: Lançamento de livros

Julio Condaque (Os Territórios Indígenas e Quilombolas na zona Matopiba), Luiz Marques (Ecocídio: Por uma (agri)cultura da vida), Eduardo Sá Barreto (Pequeno guia para a crítica ecossocialista do capitalismo), Sinan Eden (Uma Teoria Revolucionária para Interromper o Colapso Climático) Carta de Direitos Climáticos Rebio do Tinguá

19h Mesa 7:  A classe trabalhadora e o colapso ambiental: um programa anticapitalista

Eduardo Sá Barreto (UFF), Plinio de Arruda Jr (Unicamp), Jefferson Choma (Canal Ecologia e Política Marxista), Matilde Alvim (Climáximo),

Mediação: Ana Lídia

23/11

14h Marcha anticapitalista pelo clima e pelo fim dos genocídios

Concentração na praia de Copacabana em frente a rua Prado Junior

Declaração da Cúpula dos Povos rumo à COP30

Cúpula dos Povos luta por justiça climática – Radis Comunicação e Saúde

Nós, da Cúpula dos Povos, reunidos em Belém do Pará, na Amazônia brasileira, de 12 a 16 de novembro de 2025, declaramos aos povos do mundo o que acumulamos em lutas, debates, estudos, intercâmbios de experiências, atividades culturais e depoimentos, ao longo de vários meses de preparação e nestes dias aqui reunidos.

Nosso processo reuniu mais de 70.000 pessoas que compõem movimentos locais, nacionais e internacionais de povos originários e tradicionais, camponeses/as, indígenas, quilombolas, pescadores/as, extrativistas, marisqueiras, trabalhadores/as da cidade, sindicalistas, população em situação de rua, quebradeiras de coco babaçu, povos de terreiro, mulheres, comunidade LGBTQIAPN+, jovens, afrodescendentes, pessoas idosas, dos povos da floresta, do campo, das periferias, dos mares, rios, lagos e mangues. Assumimos a tarefa de construir um mundo justo e democrático, com bem viver para todas e todos. Somos a unidade na diversidade.

O avanço da extrema direita, do fascismo e das guerras ao redor do mundo exacerba a crise climática e a exploração da natureza e dos povos. Os países do norte global, as corporações transnacionais, e as classes dominantes são os maiores responsáveis por essas crises. Saudamos a resistência e nos solidarizamos com todos os povos que estão sendo cruelmente atacados e ameaçados pelas forças do império estadunidense, Israel e seus aliados da Europa. Há mais de 80 anos, o povo palestino tem sido vítima de genocídio praticado pelo Estado sionista de Israel, que bombardeou a faixa de Gaza, deslocou pela força milhões de pessoas e matou dezenas de milhares de inocentes, a maioria crianças, mulheres e idosos. Nosso repúdio total ao genocídio praticado contra a Palestina. Nosso apoio e abraço solidário ao povo que bravamente resiste, e ao movimento de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS).

Ao mesmo tempo, no mar do Caribe, os Estados Unidos intensificam sua presença imperial. Fazem-no expandindo operações conjuntas, acordos e bases militares, em conluio com a extrema direita, sob o pretexto de combate ao narcotráfico e ao terrorismo, como com a operação recém anunciada “Lança do Sul”. O imperialismo segue ameaçando a soberania dos povos, criminalizando movimentos sociais e legitimando intervenções que historicamente serviram aos interesses privados na região. Nos solidarizamos à resistência da Venezuela, Cuba, Haiti, Equador, Panamá, Colômbia, El Salvador, República Democrática do Congo, Moçambique, Nigéria, Sudão, e com os projetos de emancipação dos povos do Sahel, Nepal e de todo o mundo.

Não há vida sem natureza. Não há vida sem a ética e o trabalho de cuidados. Por isso, o feminismo é parte central do nosso projeto político. Colocamos o trabalho de reprodução da vida no centro, é isso que nos diferencia radicalmente dos que querem preservar a lógica e a dinâmica de um sistema econômico que prioriza o lucro e a acumulação privada de riquezas.

Nossa visão de mundo está orientada pelo internacionalismo popular, com intercâmbios de conhecimentos e saberes, que constroem laços de solidariedade, lutas e de cooperação entre nossos povos. As verdadeiras soluções são fortalecidas por esta troca de experiências, desenvolvidas em nossos territórios e por muitas mãos. Temos o compromisso de estimular, convocar e fortalecer essas construções. Por isso, saudamos o anúncio da construção do Movimento Internacional de Atingidas e Atingidos por barragens, pelos crimes socioambientais e pela crise climática.

Iniciamos nossa Cúpula dos Povos navegando pelos rios da Amazônia que, com suas águas, nutrem todo o corpo. Como o sangue, sustentam a vida e alimentam um mar de encontros e esperanças. Reconhecemos também a presença dos encantados e de outros seres fundamentais na cosmovisão dos povos originários e tradicionais, cuja força espiritual orienta caminhos, protege territórios e inspira as lutas pela vida, pela memória e por um mundo de bem viver.

Depois de mais de dois anos de construção coletiva e de realizar a Cúpula dos Povos, afirmamos:

  1. O modo de produção capitalista é a causa principal da crise climática crescente. Os principais problemas ambientais do nosso tempo são consequência das relações de produção, circulação e descarte de mercadorias, sob a lógica e domínio do capital financeiro e das grandes corporações capitalistas.
  2. As comunidades periféricas são as mais afetadas pelos eventos climáticos extremos e o racismo ambiental. Enfrentam, por um lado, a ausência de políticas de infraestrutura e de adaptação. Por outro, a falta de ações de justiça e reparação, em especial às mulheres, jovens, pessoas empobrecidas e não brancas.
  3. As empresas transnacionais, em cumplicidade com governos do norte global, estão no centro de poder do sistema capitalista, racista e patriarcal, sendo os atores que mais causam e mais se beneficiam das múltiplas crises que As indústrias de mineração, energia, das armas, o agronegócio e as Big Techs são as principais responsáveis pela catástrofe climática em que vivemos.
  4. Somos contrários a qualquer falsa solução a crise climática que venha a perpetuar práticas prejudiciais, criar riscos imprevisíveis e desviar a atenção das soluções transformadoras e baseadas na justiça climática e dos povos, em todos os biomas e Alertamos que o TFFF, sendo um programa financeirizado, não é uma resposta adequada. Todos os projetos financeiros devem estar sujeitos a critérios de transparência, acesso democrático, participação e benefício real para as populações afetadas.
  5. É evidente o fracasso do atual modelo de São cada vez mais recorrentes os crimes ambientais e os eventos climáticos extremos que ocasionam mortes e destruição. Isto demonstra o fracasso das inúmeras conferências e reuniões mundiais que prometeram resolver esses problemas, mas nunca enfrentaram as suas causas estruturais.
  6. A transição energética está sendo implementada sob a lógica capitalista. Apesar da ampliação das fontes renováveis, não houve redução nas emissões de gases de efeito estufa. A expansão das fontes de produção energética acabou por se configurar também como um novo espaço de acumulação de capital.
  7. Finalmente, afirmamos que a privatização, mercantilização e financeirização dos bens comuns e serviços públicos contrariam frontalmente os interesses populares. Nestes marcos, as leis, instituições de Estado e a imensa maioria dos governos foram capturados, moldados e subordinados à busca do lucro máximo pelo capital financeiro e pelas empresas transnacionais. São necessárias políticas públicas para avançar na recuperação dos Estados e enfrentar as      privatizações.

Frente a esses desafios, propomos:

  1. O enfrentamento às falsas soluções de mercado. O ar, as florestas, as águas, as terras, os minérios e as fontes de energia não podem permanecer como propriedade privada nem serem apropriados, porque são bens comuns dos povos.
  2. Cobramos que haja participação e protagonismo dos povos na construção de soluções climáticas, reconhecendo os saberes ancestrais. A multidiversidade de culturas e de cosmovisões, carrega sabedoria e conhecimentos ancestrais que os Estados devem reconhecer como referências para soluções às múltiplas crises que assolam a humanidade e a Mãe Natureza.
  3. Exigimos a demarcação e proteção das terras e territórios indígenas e de outros povos e comunidades locais, uma vez que são quem garantem a floresta Exigimos dos governos o desmatamento zero, o fim das queimadas criminosas, e políticas de Estado para restauração ecológica e recuperação de áreas degradadas e atingidas pela crise climática.
  4. Reivindicamos a concretização da reforma agrária popular e o fomento à agroecologia, para garantia da soberania alimentar e combate à concentração fundiária. Os povos produzem alimentos saudáveis, a fim de eliminar a fome no mundo, com base na cooperação e acesso a técnicas e tecnologias de controle popular. Esse é um exemplo de verdadeira solução para combater a crise climática.
  5. Demandamos o combate ao racismo ambiental e a construção de cidades justas e periferias vivas através da implementação de políticas e soluções ambientais. Os programas de moradia, saneamento, acesso e uso da água, tratamento de resíduos sólidos, arborização, e acesso à terra e à regularização fundiária, devem considerar a integração com a natureza. Queremos o investimento em políticas de transporte público, coletivo e de qualidade, com tarifas zero. Essas são alternativas reais para o enfrentamento da crise climática nos territórios periféricos no mundo todo, que devem ser implementadas com o devido financiamento para adaptação climática.
  6. Defendemos a consulta direta, a participação e gestão popular das políticas climáticas nas cidades, para o enfrentamento às corporações do setor imobiliário que têm avançado na mercantilização da vida urbana. A cidade da transição climática e energética deverá ser uma cidade sem segregação e que abrace a Por fim, condicionar o financiamento climático a protocolos que visem a permanência habitacional e, em última instância, a indenização justa para pessoas e comunidades com garantia de terra e moradia, tanto no campo quanto nas cidades.
  7. Exigimos o fim das guerras e a desmilitarização. Que todos os recursos financeiros destinados às guerras e à indústria bélica sejam revertidos para a transformação desse mundo. Que as despesas militares sejam direcionadas à reparação e recuperação de regiões atingidas por desastres climáticos. Que sejam tomadas todas as medidas necessárias para impedir e pressionar Israel, responsabilizando-o pelo genocídio cometido contra o povo palestino.
  8. Exigimos a justa e plena reparação das perdas e danos impostos aos povos pelos projetos de investimento destrutivos, pelas barragens, mineração, extração de combustíveis fósseis e desastres climáticos. Também exigimos que sejam julgados e punidos os culpados pelos crimes econômicos e socioambientais que afetam milhões de comunidades e famílias em todo o mundo.
  9. Os trabalhos de reprodução da vida devem ser visibilizados, valorizados, compreendidos como o que são – trabalho – e compartilhados no conjunto da sociedade e com o Estado. Esses são essenciais para a continuidade da vida humana e não humana no Isso também garante autonomia das mulheres, que não podem ser responsabilizadas individualmente pelo cuidado, mas devem ter suas contribuições consideradas: nosso trabalho sustenta a economia. Queremos um mundo com justiça feminista, autonomia e participação das mulheres.
  10. Demandamos uma transição justa, soberana e popular, que garanta os direitos de todos os trabalhadores e trabalhadoras, bem como o direito a condições de trabalho dignas, liberdade sindical, negociação coletiva e proteção social. Consideramos a energia como um bem comum e defendemos a superação da pobreza e da dependência energética. Tanto o modelo energético, quanto a própria transição, não podem violar a soberania de nenhum país do mundo.
  11. Exigimos o fim da exploração de combustíveis fósseis e apelamos aos governos para que desenvolvam mecanismos para garantir a não proliferação de combustíveis fósseis, visando uma transição energética justa, popular e inclusiva com soberania, proteção e reparação aos territórios. Em particular na Amazônia e demais regiões sensíveis e essenciais para a vida no planeta.
  12. Lutamos pelo financiamento público e taxação das corporações e dos mais Os custos da degradação ambiental e das perdas impostas às populações devem ser pagos pelos setores que mais se beneficiam desse modelo. Isso inclui fundos financeiros, bancos e corporações do agronegócio, do hidronegócio, aquicultura e pesca industrial, da energia e da mineração. Esses atores também devem arcar com os investimentos necessários para uma transição justa e voltada às necessidades dos povos.
  13. Exigimos que o financiamento climático internacional não passe por instituições que aprofundam a desigualdade entre Norte e Sul, como o FMI e o Banco Mundial. Ele deve ser estruturado de forma justa, transparente e democrática. Não são os povos e países do Sul global que devem continuar pagando dívidas às potências dominantes. São esses países e suas corporações que precisam começar a saldar a dívida socioambiental acumulada por séculos de práticas imperialistas, colonialistas e racistas, pela apropriação de bens comuns e pela violência imposto a milhões de pessoas mortas e escravizadas.
  14. Denunciamos a contínua criminalização dos movimentos, a perseguição, o assassinato e desaparecimento de nossas lideranças que lutam em defesa de seus territórios, bem como aos presos políticos e presos palestinos que lutam por libertação Reivindicamos a ampliação da proteção de defensores e defensoras de direitos humanos e socioambientais na agenda climática global, no marco do Acordo de Escazú e outras normativas regionais. Quando um defensor protege o território e a natureza, ele não protege apenas um indivíduo, mas todo um povo e beneficia toda a comunidade global.
  15. Reivindicamos o fortalecimento de instrumentos internacionais que defendam os direitos dos povos, seus direitos consuetudinários e a integridade dos Precisamos de um instrumento internacional juridicamente vinculante em matéria de direitos humanos e empresas transnacionais, que seja construído desde a realidade concreta das lutas das comunidades atingidas pelas violações cometidas, exigindo direitos para os povos e regras para as empresas. Afirmamos ainda que a Declaração dos Direitos Campesinos e de Outras Pessoas que Trabalham nas Áreas Rurais (UNDROP) deve ser um dos pilares da governança climática. A plena implementação dos direitos camponeses devolve o povo aos territórios, contribui diretamente para a sua alimentação, para o cuidado do solo e o esfriamento do planeta.

Por fim, consideramos que é tempo de unificar nossas forças e enfrentar o inimigo comum. Se a organização é forte, a luta é forte. Por esta razão, a nossa tarefa política principal é o trabalho de organização dos povos em todos os países e continentes. Vamos enraizar nosso internacionalismo em cada território e fazer de cada território uma trincheira da luta internacional. É tempo de avançar de modo mais organizado, independente e unificado, para aumentar nossa consciência, força e combatividade. Este é o caminho para resistir e vencer.

Povos do mundo: Uni-vos”