Abelha é fundamental na polinização de diversas culturas; estudo avaliou em laboratório efeito dos inseticidas nos insetos
Um estudo desenvolvido na Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), em condições de laboratório, revela que a exposição das abelhas africanizadas aos inseticidas clorantraniliprole e ciantraniliprole reduz a sobrevivência e prejudica a capacidade de voo, fator essencial para atividades como coleta de néctar, polinização e retorno à colmeia.
Os resultados serão detalhados noartigo “Survival and flight ability of Apis mellifera after exposure to anthranilic diamide insecticides”, publicado no Brazilian Journal of Biology. O trabalho, apoiado pela Capes (Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), é resultado de uma pesquisa de mestrado da UFCG e foi orientado por Ewerton Marinho da Costa, engenheiro agrônomo, doutor em fitotecnia e docente da instituição.
Segundo o pesquisador, a ideia foi responder a uma demanda crescente dos próprios agricultores. “A principal motivação foi gerar informações para auxiliar na conservação das abelhas em áreas agrícolas. Essa é uma demanda dos produtores, que precisam de subsídios em relação aos efeitos de inseticidas sobre as abelhas para adoção de estratégias mitigadoras de risco”, afirma Costa.
A pesquisa comparou a mortalidade e as implicações motoras em abelhas expostas de duas maneiras: por pulverização direta e pela ingestão de dieta contaminada. As análises foram realizadas em laboratório. Os resultados mostraram baixa mortalidade para ambos os inseticidas, mas com diferenças importantes entre os modos de exposição. “Observamos que a exposição direta foi mais prejudicial às abelhas. Dentre os dois inseticidas, o ciantraniliprole causou os maiores percentuais de mortalidade”, relata o professor.
Além da sobrevivência, a equipe avaliou a capacidade de voo das abelhas, essencial para a polinização e para a manutenção da colônia. Costa enfatiza que impactos subletais podem comprometer todo o ciclo de produção agrícola. “A capacidade de voo das abelhas foi afetada, mesmo que de maneira sutil, após a exposição direta às gotículas da pulverização com os inseticidas”, diz. A comparação foi feita com abelhas pulverizadas com água destilada.
De acordo com o engenheiro agrônomo, estudar a capacidade de voo é crucial porque existem inseticidas que podem não proporcionar elevada mortalidade, mas podem prejudicar a mobilidade dos insetos. Qualquer prejuízo na mobilidade pode proporcionar falhas na polinização e redução drástica na obtenção de alimento.
Os cientistas também se surpreenderam com alguns resultados. “Mesmo conhecendo o mecanismo de ação dos inseticidas, surpreendeu o fato da baixa mortalidade proporcionada em ambos os modos de exposição em comparação com o controle positivo. Outro ponto que gerou impacto foi o efeito adverso na capacidade de voo”, destaca Costa. “Os resultados serão utilizados para orientar produtores sobre formas de mitigação de riscos para abelhas em condições de campo, destacando os ingredientes ativos mais prejudiciais e aqueles que causam baixa ou praticamente nenhuma mortalidade”, diz.
Apesar dos avanços, o pesquisador reforça que é necessário avaliar os inseticidas em condições reais de campo, levando em consideração fatores ambientais como temperatura, vento e horário de aplicação.
Número de espécies de abelhas selvagens em risco de extinção na Europa duplica em 10 anos
Número de espécies de borboletas ameaçadas de extinção também está aumentando em meio à destruição de habitat e ao aquecimento global, segundo estudo
Abelhas europeias voam perto de uma colmeia selvagem em um carvalho em Monmouthshire, País de Gales. Fotografia: Nature Picture Library/Alamy
Por Patrick Barkham para o “The Guardian”
O número de espécies de abelhas selvagens na Europa em risco de extinção mais que dobrou na última década, enquanto o número de espécies de borboletas ameaçadas de extinção quase dobrou.
O número de borboletas ameaçadas de extinção na Europa aumentou de 37 para 65 desde o último estudo, realizado há 14 anos. Uma espécie, aborboleta branca-grande-da-madeira ( Pieris wollastoni ), foi declarada extinta.
“ Além de sua beleza e significado cultural, polinizadores como abelhas e borboletas são vitais para nossa saúde, nossos sistemas alimentares e nossas economias – sustentando as frutas, vegetais e sementes que nos nutrem”, disse Grethel Aguilar, diretora-geral da UICN. “As últimas avaliações da Lista Vermelha Europeia revelam sérios desafios, com ameaças crescentes para borboletas e espécies cruciais de abelhas selvagens.”
As causas dos rápidos declínios recentes são a destruição ou os danos contínuos aos habitats causados pela intensificação da agricultura e pelo abandono de terras, pela drenagem de áreas úmidas, pelo pastoreio excessivo pelo gado e pelo uso de fertilizantes e agrotóxicos, incluindo neonicotinoides. A fragmentação de habitats favoráveis aos polinizadores aumenta consideravelmente o risco de extinções locais.
O aquecimento global também se revelou uma grande ameaça: 52% de todas as borboletas ameaçadas de extinção na Europa estão ameaçadas pela crise climática — aproximadamente o dobro de uma década atrás.
Até 90% das plantas com flores na Europa dependem da polinização animal, de acordo com o Dr. Denis Michez, coordenador principal da avaliação de abelhas selvagens. “Infelizmente, as populações de abelhas selvagens estão em declínio drástico e não podem ser facilmente substituídas por colônias manejadas”, disse ele. “Se as abelhas selvagens desaparecerem, muitas plantas selvagens também poderão estar em risco – das quais prados ricos em flores e belas espécies de orquídeas são apenas alguns exemplos.”
Quinze espécies de mamangabas, que desempenham um papel crucial na polinização de ervilhas, feijões, amendoins e trevos, e 14 espécies de abelhas-celofane, conhecidas por polinizar árvores como salgueiros e bordos vermelhos, estão agora classificadas como ameaçadas. Simpanurgus phyllopodus , uma abelha mineira exclusiva do continente e a única espécie deste gênero na Europa, está agora classificada como criticamente em perigo – a categoria científica mais próxima da extinção na natureza.
Borboletas encontradas apenas no topo das montanhas são particularmente vulneráveis ao aquecimento global, pois precisam se deslocar para áreas mais altas à medida que seus habitats se tornam mais quentes, mas acabam ficando sem espaço. No sul da Espanha, o tímalo-de-nevadae a borboleta azul-anômala-da-andaluzaestão entre os mais de 40% dos endemismos europeus (encontrados apenas na Europa) ameaçados de extinção.
Enquanto isso, no Círculo Polar Ártico, o aquecimento global está fazendo com que a linha das árvores se mova dezenas de metros para o norte a cada ano, com a vegetação rasteira invadindo pântanos e tundras. As condições mais quentes também impedem que as renas atravessem o gelo para pastar nas pastagens árticas e mantê-las abertas. Oito espécies de borboletas estão ameaçadas de extinção nesta região, incluindo a borboleta-de-freyja e a borboleta-anelada-do-ártico.
“ O maior habitat para todos esses polinizadores são as pastagens ricas em flores, que estão desaparecendo muito rapidamente em toda a Europa devido a todos esses fatores”, disse Martin Warren, um dos principais coordenadores da avaliação das borboletas. “O lado positivo é que muitas pessoas se importam agora e há muito mais conscientização. De acordo com alegislação de restauração da natureza da UE, todos os estados-membros precisam reverter o declínio dos polinizadores até 2030 e terão que começar a fazer algo. Há proprietários de terras interessados. Esperemos que eles consigam os incentivos que os ajudarão em seu caminho.”
De acordo com Warren, há “frutos fáceis” em termos de ação para os polinizadores que não reduzirão a produção de alimentos — e podem aumentá-la — como agricultores criando margens ricas em flores ao redor de seus campos.
Jessika Roswall, comissária da UE para o meio ambiente, resiliência hídrica e economia circular competitiva, descreveu o estado de conservação das abelhas selvagens, borboletas e outros polinizadores como “terrível”.
“ É necessária uma ação urgente e coletiva para enfrentar esta ameaça. Juntamente com os Estados-membros, a Comissão Europeia implementou um sistema de monitorização de polinizadores em toda a UE, com base no regulamento da UE para a restauração da natureza, que ajudará a acompanhar o nosso progresso. Agora, precisamos de nos concentrar na implementação e na cooperação com os Estados-membros para proteger os nossos polinizadores”, afirmou.
A publicação das avaliações sobre abelhas e borboletas ocorre após a primeira avaliação europeia sobre moscas-das-flores, outro grupo polinizador crucial. Publicada em 2022, a avaliação revelou que 37% de todas as espécies de moscas-das-flores na Europa estavam ameaçadas de extinção.
Projeção desenvolvida no Laboratório de Abelhas da UFPR mostra perda de área adequada para espécies já em 2050. Cenários evidenciam necessidade de mitigação dos efeitos das alterações no clima e da preservação do habitat dos insetos
Dezoito espécies exclusivas do continente tiveram o comportamento projetado por pesquisadores. Na foto, uma Lithurgopsis rufiventris, espécie de abelha solitária. Fotos: Adriana Tiba e Julio Pupim/Acervo Pessoal
Por Luana Lopes para o “Ciência UFPR”
Para onde irão as abelhas com as mudanças climáticas? Esta foi a pergunta que guiou uma pesquisa na Universidade Federal do Paraná (UFPR) que buscou compreender como as alterações nos padrões climáticos poderá afetar a distribuição geográfica destes insetos. Algumas espécies do sudeste da América do Sul podem deixar o Norte, onde em geral é mais calor, e se deslocar para o Sul do continente.
O estudo é fruto da dissertação de mestrado em Entomologia (estudo científico dos insetos) do biólogo Felipe Walter Pereira sob orientação do professor Rodrigo Barbosa Gonçalves, do Departamento de Zoologia da UFPR. Os pesquisadores selecionaram 18 espécies de abelhas de uma das regiões mais diversas do mundo e usaram projeções climáticas computacionais para o ano de 2050, para identificar os possíveis efeitos das mudanças climáticas na distribuição desses insetos.
De acordo com Pereira, com o aumento das emissões de carbono e das consequentes mudanças de temperatura e precipitação do planeta como um todo, essas espécies tendem a perder a parte mais ao norte do seu limite de distribuição, porque essa região deve ficar mais quente do que é atualmente.
“Esta parte Norte vai deixar de ser adequada, porque vai estar mais quente do que ela pode tolerar. As populações de abelhas devem deixar de ocorrer nesse limite norte, havendo uma região de estabilidade ‘no meio’ e ganhos de colonização ao sul. Isso porque as espécies vão tender a acompanhar seus requerimentos climáticos”, explica.
“Então, hoje é onde o clima é adequado para certa espécie, no futuro, com o aquecimento global, essa região vai estar um pouquinho mais ao Sul. Ou seja, são esperados eventos de colonização e de migração em direção ao sul”.
O professor Rodrigo Gonçalves conta que, para o trabalho, eles fizeram a seleção de espécies que vivem no Sudeste da América do Sul (Argentina, Uruguai e estados do sul do Brasil), por serem adaptadas a climas mais amenos. Também foram escolhidas espécies com modos de vida e comportamentos sociais diferentes para entender como cada uma pode reagir às mudanças climáticas.
“A partir dos registros de ocorrência de cada espécie, identificamos quais variáveis ambientais definem seu nicho, ou seja, as condições ideais para sua sobrevivência hoje. Com base nessas informações, usamos modelos para prever como essas condições vão mudar no futuro e, assim, estimar quais áreas continuarão adequadas e quais serão perdidas. Comparando esses cenários, conseguimos prever deslocamentos ou redução na distribuição das espécies”, afirma.
Embora o estudo necessite trabalhos de campo de longo prazo para a confirmação do deslocamento para o sul, há evidências de algumas espécies que deixaram de aparecer em algumas regiões devido ao clima.
É o caso da Bombus bellicosus, uma abelha das conhecidas popularmente como mamangava que era muito comum na região de Curitiba nos anos 1960. Desde a década de 90, esta espécie não ocorre mais na cidade, e atualmente seu limite norte é na região do município de Palmas, no sul do Paraná. Este fenômeno foi observado pela pesquisadora Aline Cristina Martins e pelo professor Gabriel Augusto Rodrigues de Melo, da UFPR.
“Eles constataram que as extinções locais da espécie se deram às recentes mudanças climáticas e à intensa mudança no uso do solo e na paisagem, com a destruição dos campos sulinos para dar lugar às monoculturas e criações de gado”, conta Felipe Pereira.
Além da dissertação de mestrado, o pesquisador tratou do tema no artigo “Abelhas viajando para o sul: mudanças de alcance induzidas pelo clima e perdas de habitat adequado no Sudeste dos neotrópicos”, publicado pela revista Journal of Biogeography, que tem entre os coautores os professores Rodrigo Gonçalves, Gabriel Melo e Maurício Osvaldo Moura, também da Universidade Federal do Paraná.
Como foi feita a seleção das espécies
O sudeste da América do Sul possui uma variedade muito grande de abelhas: são centenas de espécies na região. Mas para a pesquisa sobre o impacto das mudanças climáticas, Felipe Pereira selecionou 18 espécies. Um dos motivos para a seleção é que, para se construir modelos computacionais de predições ecológicas de distribuições de espécies, é necessário que os pesquisadores tenham um conhecimento amplo sobre onde elas estão, ou seja, as abelhas selecionadas precisam ser bem conhecidas. Este não é o caso da maioria dos insetos, que possuem uma variedade muito grande.
“Dessa maneira, a gente escolheu espécies com trabalhos já feitos por especialistas em taxonomia, com uma extensiva coleta na região. Assim tivemos confiança de onde a espécie está e onde ela não está, o que nos permitiu construir modelos preditivos com uma certa força de predição que torne esses modelos confiáveis”, explica Pereira.
Um outro fator para uma amostragem aparentemente baixa para a pesquisa é que o pesquisador buscou representar a fauna de abelhas na região. Como não é possível fazer predições para centenas de espécies, foram escolhidas abelhas com linhagens diferentes, que possuem atributos variados, representando assim as características conhecidas das abelhas e não só apenas um grupo.
“A gente poderia ter feito um estudo só com abelhas-sem-ferrão, por exemplo, que é um grupo evolutivo único que daria uma resposta. Não fizemos isso: tivemos, entre outras, representantes de abelhas-sem-ferrão, representantes de mamangavas, representantes de abelhas solitárias e abelhas sociais”, afirma o pesquisador.
Para a seleção de espécies que representasse essa fauna de abelhas, Felipe Pereira contou com a colaboração do professor Gabriel Augusto Rodrigues de Melo, um dos maiores especialistas em taxonomia de abelhas do mundo. Melo fez a consultoria das espécies que seriam interessantes para serem analisadas, fazendo o recorte amostral.
“Tinha uma questão de sabermos se havia uma boa quantidade de distribuição de cada uma dessas espécies. Porque, para fazer essas projeções, precisamos ter material, ou seja, os pontos de ocorrência. Não teríamos respostas sobre uma espécie extremamente rara, onde só a conhecemos de um ou dois locais diferentes”, explica. “Temos que trabalhar com espécies que têm uma quantidade razoável de material que foi coletado, que tem registro”.
O registro de onde esses espécimes se encontram distribuídos consta na Coleção Entomológica Pe. Jesus Santiago Moure (DZUP) da UFPR, em Curitiba, que possui a maior coleção de abelhas da América Latina. Na década de 1940, o entomólogo Padre Moure criou na universidade um grupo de pesquisas em abelhas e, desde então, ao longo das décadas, dezenas de pesquisadores foram acrescentando informações sobre as abelhas da região, incluindo dados sobre as condições climáticas do habitat das espécies. Gabriel Melo explica como ocorre essa coleta de informações:
“Pegamos os pontos de ocorrência de uma espécie, como se fosse uma quadrícula no mapa, e a partir disso buscamos uma série de atributos relacionados ao clima. Então olhamos, por exemplo, a precipitação média dos locais que essa espécie ocorre, a temperatura média anual, a temperatura média do mês mais quente, temperatura média do mês mais frio, precipitação anual… vários atributos climáticos em relação àquela quadrícula onde tem um ponto da espécie. Depois, pegamos o somatório de todas as quadrículas que a espécie foi encontrada e temos algo como uma média”.
A partir desta média, são feitas as projeções climáticas para o futuro:
“Desta forma, por exemplo, a quadrícula que hoje tem uma temperatura média, com o aquecimento essa temperatura vai aumentar. E esse aumento pode fazer com que aquela espécie fuja daquele intervalo que ela vive. Se ficou quente, ela não vai conseguir sobreviver ali, porque ela só sobrevive nas quadrículas cuja temperatura média é tal”, explica o docente.
Abelhas podem perder seu limite de distribuição em 2050
Apesar de cada espécie ter sua própria condição climática adequada para sobreviver em determinado local (chamada nicho climático), de modo geral as abelhas são insetos que preferem climas mais amenos, em ambientes mais secos, e são mais diversas em locais de campos abertos. Além disso, são seres ectotérmicos, ou seja, sua temperatura corporal é influenciada pela temperatura do ambiente, o que pode fazer com que estes insetos não resistam às temperaturas mais altas.
“Há trabalhos tentando ver como que a temperatura pode influenciar a sobrevivência das abelhas. Registros acima dos 40 graus já começam a afetá-las de forma que pode ter uma mortalidade muito grande. Varia muito de espécie para espécie, mas tem essa relação de que se o planeta aquecer muito, como está acontecendo esse aquecimento global generalizado, pode levar a um aumento na taxa de mortalidade. A parte fisiológica delas fica comprometida e pode ser que elas morram sem conseguir se reproduzir”, explica Felipe Pereira.
Considerando estes fatores, os pesquisadores buscaram testar a hipótese de que, com o aquecimento global, as abelhas devem buscar locais mais adequados e podem desaparecer de áreas que se tornaram menos favoráveis. Para isso, um dos primeiros passos foi construir modelos de nichos ecológicos para encontrar as áreas climaticamente favoráveis para as espécies no presente.
“O nicho ecológico é uma posição no ambiente em que as populações são viáveis, e cada grupo de espécies tem alguns fatores que são importantes. Para as abelhas, por exemplo, a temperatura, a umidade relativa e porcentagem de floresta são relevantes”, afirma Mauricio Moura, docente da UFPR e coautor do trabalho.
Os modelos de nicho ecológico criados foram projetados para 2050, utilizando um cenário definido pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, da sigla em língua inglesa). Estes cenários representam previsões de mudanças climáticas futuras com base em diferentes níveis de emissões de gases de efeito estufa, avaliando o que os governos estão fazendo para combater o problema e apresentando dados sobre temperatura, umidade e eventos extremos. No estudo sobre as abelhas, os pesquisadores selecionaram o cenário pessimista SSP585, que apresenta maiores emissões de carbono e ações nulas ou limitadas para a mitigação das mudanças climáticas.
“Para realizar este trabalho, temos determinadas as posições geográficas das espécies em latitude e longitude. Fazemos várias perguntas com as variáveis climáticas, encontrando as características do ambiente que são importantes para as abelhas. Com isso, temos um recorte de condições favoráveis para aquela abelha de hoje”, afirma Moura. “Então, entramos com o cenário futuro e perguntamos: ‘Onde essas condições vão ocorrer no próximo cenário?’ Os modelos computacionais vão nos dizer, por exemplo, que essas condições vão acontecer 20 graus para baixo. Assim caracterizamos um deslocamento de área de distribuição”.
A pesquisa concluiu que o padrão de deslocamento para o sul foi observado em todas as 18 espécies analisadas, mas também foi identificado que as espécies de abelhas eussociais da região podem ser mais afetadas pela perda de áreas adequadas para a sobrevivência do que as espécies solitárias. O artigo reforça que, além do clima, mudanças no habitat e particularidades comportamentais das abelhas podem também influenciar na vulnerabilidade dos insetos.
Políticas públicas para preservar habitat previnem contra perdas de distribuição
O estudo também destacou a importância da conservação dos habitats das abelhas para garantir a preservação da espécie, além da mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. Segundo Felipe Pereira, o artigo reforça que devem ser feitas estratégias de conservação na região pesquisada, especialmente em relação aos campos sulinos – ambientes muito vulneráveis e geralmente negligenciados em ações de preservação. Para o pesquisador, as projeções podem auxiliar a delinear as regiões que seriam prioritárias para conservação das abelhas no futuro.
“Essa vegetação de campo muitas vezes é interpretada como sendo apenas ‘um mato’ pelos leigos ou por aqueles que têm o recurso financeiro para modificar a paisagem. É muito mais fácil destruir os campos do que a floresta, por exemplo”, opina. “Então, não adianta o clima em termos de precipitação e temperatura estar adequado, se a gente não tem recursos florais para as abelhas usarem, ou solo exposto e cavidades em madeira para as abelhas construírem ninhos. Se isso não existir, não adianta de nada o clima ser bom”.
Pereira conclui que a ideia desta e outras pesquisas sobre as abelhas é juntar vozes para fortalecer a luta pela mitigação dos problemas acarretados pelas mudanças climáticas.
“Existem cenários futuros, e um deles é nós pararmos ou controlarmos ao máximo a emissão de gás de efeito estufa, mudar nosso padrão de consumo”, afirma. “Nós usamos essas vozes de conservação para pensarmos em cenários futuros adequados para produção de alimentos, para o bem-estar, para simplesmente a gente ter um planeta habitável nas próximas décadas”.
Labe-UFPR busca conscientização sobre a diversidade das abelhas
“As abelhas são essenciais para a polinização de plantas nativas e cultivadas, garantindo tanto a biodiversidade quanto a produção agrícola. Além disso, algumas espécies são criadas para a produção de mel ou por hobby, o que desperta mais interesse no tema. A crescente popularidade das abelhas pode ser uma oportunidade para conscientizar a sociedade sobre a importância da conservação da natureza”, diz o docente.
O Imidacloprid é um inseticida da classe dos Neonicotinóides que se encontra banido na União Europeia por ser um “bee killer” (ou em bom português, assassino de abelhas). Pois bem, nesta sexta-feira (22/8), o governo Lula fez publicar o Ato nº 38, de 21 de Agosto de 2025que oficializa a prorrogação da “autorização de uso do imidacloprid na cultura do pinus, nas modalidades “imersão/rega das bandejas de mudas” ou para aplicação através da rega das mudas após o transplante, conforme definido no Ato nº 71 de 29 de junho de 2022, até o dia 31 de agosto de 2027″. A razão para tal extensão é o combate à Cinara Atlântica, também conhecida como “pulgão-gigante-do pinus”.
Eu não me surpreenderia nem um pouco se essa extensão de prazo fosse prorrogada novamente em 2027, na medida em que avançam as monoculturas de árvores em todo o território nacional, incluindo espaços generosos para diferentes tipos de pinus.
Há que se lembrar que, por causa da proibição no continente europeu em 2018, o Brasil se tornou um dos principais desitnos desse agrotóxico que é mortal para polinizadores, especialmente as abelhas. Quem agradece a disposição brasileira de consumir Imidacloprid com toda a sede tropical é a multinacional alemã Bayer que fabrica este agrotóxico neonicotinóide. Há que se lembrar que das 13,2 mil toneladas de Imidacloprid exportadas pela Europa em 2021, o Brasil consumiu 6,272 toneladas (ou seja, quase a metade!).
Pesquisa do USDA aponta para vírus disseminados por ácaros resistentes a agrotóxicos, indicando uma tendência preocupante
As colônias comerciais de abelhas desempenham um papel importante na polinização de muitas plantações nos EUA, mas são ameaçadas pelos ácaros varroa, que espalham vírus letais. Joe Raedle/Getty Images
Por Joanna Thompson para a Science
Os apicultores dos EUA tiveram um inverno desastroso. Entre junho de 2024 e janeiro de 2025, 62% das colônias comerciais de abelhas melíferas nos Estados Unidos morreram , de acordo com uma extensa pesquisa. Foi a maior mortandade já registrada, logo após uma mortandade de 55% no inverno anterior.
Assim que cientistas do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) tomaram conhecimento das mortes recordes, eles entraram em ação — mas seus esforços foram retardados por uma série de cortes de verbas federais e demissõespelo governo do presidente Donald Trump . Agora, 6 meses depois, cientistas do USDA finalmente identificaram um culpado.
De acordo com uma pré-impressão publicada no servidor bioRxiv este mês, quase todas as colônias mortas testaram positivo para vírus de abelha disseminados por ácaros parasitas. De forma alarmante,todos os ácaros examinados pelos pesquisadores eram resistentes ao amitraz, o único agrotóxico — ou acaricida — específico para ácaros viável desse tipo que resta no arsenal humano.
Acompanhar o aumento da resistência aos acaricidas é fundamental, afirmam especialistas. As abelhas polinizam mais de 90 culturas comerciais nos Estados Unidos, geram entre US$ 20 bilhões e US$ 30 bilhões em receita agrícola e desempenham um papel fundamental na manutenção da estabilidade do suprimento de alimentos nos EUA.
“Há muita coisa em jogo”, afirma Danielle Downey, diretora executiva do Projeto Apis m. , a organização sem fins lucrativos que conduziu a pesquisa sobre a mortandade de abelhas. O USDA não comentou sua pesquisa à Science após várias consultas que duraram quase três semanas, com um porta-voz citando a necessidade de “adiar [a solicitação] para aprovação da agência”.
Os ácaros Varroa resistentes a acaricidas têm sido um problema crescente para os apicultores há anos, tanto que os criadorestêm buscado desenvolver variedades de abelhas resistentes a ácaros. Desde a década de 1980, os parasitas desenvolveram resistência global a pelo menos quatro classes principais de acaricidas. Infelizmente, novos compostos eficazes são notoriamente difíceis de desenvolver, e o amitraz representava um dos melhores tratamentos restantes. Mas a pré-impressão sugere que o amitraz pode em breve cair em desuso.
As descobertas do estudo são “preocupantes”, afirma Aaron Gross, toxicologista do Instituto Politécnico e da Universidade Estadual da Virgínia. Mesmo um acaricida como o amitraz, amplamente considerado uma das opções menos tóxicas para humanos e abelhas, pode enfraquecer as colônias quando aplicado em altas doses, afirma Gross, especialista em resistência a pesticidas para artrópodes que não participou do novo trabalho. Perder o amitraz pode ser um grande golpe para os apicultores, afirma ele, já que muitos outros acaricidas são mais agressivos ou menos eficazes. “Você não precisa se preocupar apenas em matar o ácaro em si; você [também] não quer prejudicar a abelha.”
Pesquisadores do USDA identificaram os ácaros e sua resistência ao amitraz examinando detalhadamente colônias de abelhas mortas. Uma equipe liderada por Jay Evans e Zachary Lamas, ambos pesquisadores de abelhas do Laboratório de Abelhas do USDA em Beltsville, Maryland, coletou abelhas mortas de 113 colônias afetadas em todos os EUA, bem como amostras de cera, pólen, mel e — quando possível — quaisquer parasitas. As amostras foram levadas para laboratórios nacionais de abelhas em Beltsville e Baton Rouge, Louisiana, onde os pesquisadores extraíram DNA e RNA e os analisaram em busca de fragmentos de material genético viral ou bacteriano. Eles também sequenciaram o DNA dos ácaros varroa recuperados e procuraram genes relacionados à resistência a acaricidas.
Matthew Mulica, do Keystone Policy Center, que lidera uma coalizão focada na saúde das abelhas, ressalta que, embora os vírus transmitidos por ácaros provavelmente tenham causado um golpe fatal em muitas colônias, outros fatores, como exposição a pesticidas ou nutrição inadequada, podem ter tornado as abelhas mais suscetíveis a doenças. Nas próximas semanas, o USDA deve publicar uma análise dos resíduos de agrotóxicos encontrados nas colônias mortas. Mas, de acordo com Mulica, este relatório inicial ainda serve como um diagnóstico inicial forte. “É bom que este estudo tenha sido publicado e encontrado algo que possamos apontar.”
À medida que os acaricidas perdem sua eficácia, os pesquisadores buscam desenvolver maneiras de atacar os vírus das abelhas diretamente, em vez de se concentrarem no controle dos ácaros Varroa. A principal ameaça dos ácaros às abelhas é a disseminação de vírus de RNA de fita simples. Em princípio, uma técnica chamada interferência de RNA poderia gerar tratamentos que desencadeiem respostas imunológicas nas abelhas e as protejam contra os vírus. Mas esses tratamentos ainda estão a anos de distância de serem implementados fora do laboratório, e Mulica acrescenta que não há antivirais existentes que atuem contra esses vírus.
Por enquanto, organizações como o Projeto Apis m . estão aconselhando os apicultores a adotarem uma abordagem abrangente para controlar os ácaros Varroa. Essas medidas incluem a rotação de acaricidas sem amitraze, a esterilização de equipamentos com álcool ou fogo e o isolamento de colônias doentes para evitar a disseminação dos ácaros.
Para alguns apicultores, no entanto, a notícia sobre os ácaros e sua resistência ao amitraz pode ter chegado tarde demais. A pré-impressão foi divulgada perto do fim da janela anual de reconstrução dos apicultores dos EUA. Após o início do verão, fica mais difícil para eles repovoarem completamente suas colônias, especialmente se não tiverem tratado suas colmeias para os problemas certos. Embora os apicultores tenham se esforçado para se preparar para o próximo ano, Downey diz que muitos terão que seguir em frente com menos colônias do que estão acostumados.
As colônias de abelhas podem se recuperar de um ou dois anos difíceis, mas muitas quedas populacionais consecutivas podem significar um desastre — o que significa que os apicultores precisarão de organizações como o USDA totalmente financiadas e a todo vapor, acrescenta Downey. “Com a vontade e os recursos certos, existem esforços tangíveis que podem evitar que isso aconteça novamente”, diz ela. “O USDA e os laboratórios universitários são componentes essenciais.”
Zonas de guerra, microplásticos e iluminação pública estão entre as ameaças emergentes à população de abelhas , de acordo com cientistas.
Especialistas em abelhas elaboraram uma lista das 12 ameaças mais urgentes aos polinizadores na próxima década, publicada em um relatório, Ameaças emergentes e oportunidades para a conservação de polinizadores globais, pela Universidade de Reading.
O aumento de guerras e conflitos em todo o mundo está prejudicando as abelhas, alertam os cientistas. Isso inclui a guerra na Ucrânia , que forçou os países a cultivar menos tipos de culturas, deixando os polinizadores sem alimentos diversos durante toda a temporada.
Os pesquisadores descobriram que partículas de microplástico estavam contaminando colmeias em toda a Europa. Testes em 315 colônias de abelhas revelaram a presença de materiais sintéticos, como plástico PET, na maioria das colmeias. A luz artificial de postes de iluminação pública reduziu em 62% a visitação de polinizadores noturnos às flores, e a poluição do ar afetou sua sobrevivência, reprodução e crescimento.
Antibióticos, usados na agricultura, chegaram às colmeias e ao mel. Descobriu-se também que afetam o comportamento dos polinizadores, incluindo a redução de sua procura por alimento e visitas às flores. “Coquetéis” de pesticidas também desempenham um papel significativo e emergente; embora alguns pesticidas sejam agora regulamentados para serem mantidos abaixo dos limites “seguros” para abelhas e outros animais selvagens, pesquisas descobriram que eles podem interagir com outros produtos químicos e causar efeitos perigosos.
O Prof. Simon Potts, da Universidade de Reading, principal autor do relatório, afirmou: “Identificar novas ameaças e encontrar maneiras de proteger os polinizadores precocemente é fundamental para evitar novos declínios significativos. Não se trata apenas de uma questão de conservação. Os polinizadores são essenciais para nossos sistemas alimentares, resiliência climática e segurança econômica. Proteger os polinizadores significa proteger a nós mesmos.”
Os autores pediram uma série de medidas para proteger as abelhas, incluindo leis mais rígidas que limitem a poluição por antibióticos que prejudica a saúde das abelhas, a transição para veículos elétricos para reduzir a poluição do ar que afeta os polinizadores, a criação de habitats ricos em flores dentro de parques solares e o cultivo de culturas com pólen e néctar aprimorados para melhor nutrição dos polinizadores.
A coautora do relatório, Dra. Deepa Senapathi, também da Universidade de Reading, acrescentou: “Será necessário um esforço de todos para enfrentar essas ameaças. Precisamos manter, gerenciar e melhorar nossos habitats naturais para criar espaços seguros para os polinizadores. Ações individuais, como fornecer alimento e áreas de nidificação em nossos próprios quintais, podem ajudar muito. Mas mudanças políticas e ações individuais devem funcionar em conjunto para que tudo, desde jardins e fazendas a espaços públicos e paisagens mais amplas, possa se tornar habitats favoráveis aos polinizadores.”
Por décadas, Mead, Nebraska, foi uma cidade rural pacífica — até que toxinas geradas pela usina de etanol da área envenenaram a terra, a água e o ar de Mead. Farm to Fuel, um documentário curto, baseia-se em reportagens investigativas do The New Lede (TNL) , copublicado com o The Guardian , que expôs como o descarte imprudente de resíduos contaminados com agrotóxicos pela usina criou um desastre ambiental . No centro da crise estão os agrotóxicos neonicotinoides, ainda amplamente usados nos EUA, apesar das crescentes evidências de seus danos.
Alex Hinton, da TNL , viajou para Mead, Nebraska, onde se encontrou com o fazendeiro Stan Kaiser e sua família, que compartilharam sua história de devastação ambiental, relatada anteriormente pelo The New Lede. Hinton falou com a Dra. Judy Wu-Smart da Universidade de Nebraska-Lincoln, cuja pesquisa inovadora foi crucial para expor os perigos dos agrotóxicos neonicotinódes, e com a ex-senadora estadual Carol Blood, que tem liderado a luta por regulamentações mais fortes para evitar que tragédias como essa aconteçam novamente.
A luta de Mead por justiça está longe de terminar. Apesar do fechamento da planta, seu legado tóxico persiste, levantando questões urgentes sobre negligência corporativa, responsabilidade ambiental e a segurança de comunidades rurais em toda a América. Enquanto isso, os neonicotinóides continuam a ser usados em milhões de hectares de terras agrícolas, infiltrando-se em ecossistemas e ameaçando polinizadores, vida selvagem e saúde humana. Hoje, os moradores de Mead ainda estão exigindo respostas, ainda buscando responsabilização e ainda vivendo com as consequências de um sistema que falhou com eles.
Stan Keiser discute as perdas de sua família devido à contaminação generalizada por agrotóxicos
Ministros estabelecem planos para proibir os neonicotinoides, mas consideram a solicitação de agricultores para usar o Cruiser S
Helena Horton, Repórter de meio ambiente, para o The Guardian
Agrotóxicos que matam abelhas serão proibidos pelo governo do Reino Unido, enquanto os ministros definem planos para proibir o uso de neonicotinoides.
No entanto, o neonicotinoide altamente tóxico Cruiser SB poderá ser autorizado para uso no ano que vem , já que os ministros estão considerando solicitações da National Farmers’ Union e da British Sugar.
Este poderoso agrotóxico envenena as abelhas destruindo seus sistemas nervosos. O Prof Dave Goulson, especialista em abelhas da Universidade de Sussex, disse que uma colher de chá do produto químico é suficiente para matar 1,25 bilhão de abelhas. Mesmo em doses não fatais, pode causar problemas cognitivos que dificultam a busca de néctar pelas abelhas, e os produtos químicos podem permanecer no solo por anos.
Os ministros dizem que identificaram opções legislativas que impediriam legalmente o uso futuro de três neonicotinoides específicos – clotianidina, imidacloprida e tiametoxam – por completo.
Paul de Zylva, defensor da natureza na Friends of the Earth, disse: “O fim da pantomima anual do governo anterior de conceder o uso ‘emergencial’ desses agrotóxicos profundamente prejudiciais já deveria ter acontecido há muito tempo. Mas ainda não estamos fora de perigo – o governo deve seguir adiante se comprometendo totalmente com uma proibição completa em janeiro. E deve ir ainda mais longe, descartando o atual e fraco plano nacional de ação sobre pesticidas e, em vez disso, produzir uma versão confiável.”
O ex-secretário do Meio Ambiente Michael Gove prometeu em 2017 que os ministros usariam o Brexit para impedir o uso de agrotóxico que destroem as populações de abelhas.
Em vez disso, a UE proibiu todas as autorizações de emergência de agrotóxico neonicotinoides, enquanto desde 2021 o governo do Reino Unido permite o uso emergencial de tiametoxame todos os anos.
Embora os agrotóxico sejam proibidos para uso geral, há autorização de emergência durante condições climáticas em que uma praga chamada vírus amarelo prospera em plantas de beterraba. Essas condições foram atendidas no Reino Unido todos os anos.
O Departamento de Meio Ambiente, Alimentos e Assuntos Rurais está sendo investigado pelo órgão de fiscalização do Escritório de Proteção Ambiental depois que o governo anterior autorizou o uso do agrotóxico neste ano.
Ativistas dizem que o próximo governo deve reduzir o uso e a toxicidade de agrotóxicos antes que seja tarde demais
Uma abelha paira sobre um tojo em Devon, no sudoeste da Inglaterra. Um projeto de ciência cidadã que monitora insetos voadores no Reino Unido encontrou um declínio de 60% entre 2004 e 2021. Fotografia: Odd Andersen/AP
Por Helena Horton para o “The Guardian”
As populações de insetos no Reino Unido estão diminuindo a taxas alarmantes e o próximo governo deve implementar planos para monitorar e reduzir o uso e a toxicidade de agrotóxicos antes que seja tarde demais, dizem especialistas em vida selvagem.
Nos últimos anos, surgiram preocupações sobre as populações de minhocas, que diminuíramum terçonos últimos 25 anos. Entretanto, umprojeto de ciência cidadãque monitora insetos voadores no Reino Unido encontrou um declínio de 60% entre 2004 e 2021. A trajetória global, como mostram os números de monitoramento do governo, tem sido descendente desde a década de 1970.
No entanto, apesar da evidênciado efeito prejudicial dos agrotóxicos na nossa população de insectos, a acão governamental tem sido lenta e os especialistas estão preocupados com o facto de o Reino Unido não estar a monitorar corretamente a utilização de agrotóxicos .
“Há uma falta quase total de monitoramento eficaz do uso de agrotóxicos na agricultura do Reino Unido”, disse Nick Mole, responsável político da Pesticide Action Network UK. “O pouco que temos está incompleto, desatualizado e numa escala tão ampla que é praticamente sem sentido.
“O Reino Unido precisa urgentemente de um registo acessível ao público de todos os agrotóxicos utilizados nas explorações agrícolas em todo o Reino Unido, que seja apresentado no prazo de seis meses após a aplicação e mostrado ao nível da exploração agrícola ou, no mínimo, por captação fluvial. Deveríamos também ter acesso aos dados de vendas de agrotóxicos , informação que está atualmente escondida sob o manto da confidencialidade comercial. Sem dados precisos, é impossível avaliar adequadamente o impacto dos agrotóxicos ou tomar decisões eficazes. Neste momento estamos legislando no escuro.”
O governo conservador deveria publicar o Plano de Ação Nacional sobre a Utilização Sustentável de Agrotóxoicos (NAP) em 2018, que estabeleceria metas e planos para a redução e monitoramento de agrotóxicos Mas seis anos depois ainda não se concretizou.
A “Pesticides Collaboration”, composta por 81 ONG, acadêmicos e grupos agrícolas, incluindo a RSPB, a Buglife, a Associação Britânica de Apicultores, a Greenpeace e a Redede AgriculturaAmiga da Natureza , estabeleceu as suas “linhas vermelhas” para o que precisa estar no plano adiado.
Afirmava: “O Reino Unido comprometeu-se a ‘reduzir o risco global de agrotóxicos e produtos químicos altamente perigosos em pelo menos metade’ no Quadro Global de Biodiversidade Kunming-Montreal acordado na Cop15. Isto deve agora refletir-se na política nacional, e a regulamentação nacional de agrotóxicos deve ir mais longe do que isto e usar as palavras ‘uso’ e ‘toxicidade’ em vez de risco.”
Fontes trabalhistas disseram que consultarão imediatamente os cientistas do Departamento de Meio Ambiente, Alimentação e Assuntos Rurais (Defra) se e quando a equipe entrar no departamento após a eleição.
O partido já anunciou que acabará com as isenções para pesticidas que matam abelhas que foram proibidos na UE, mas que o governo do Reino Unido aprovou durante quatro anos consecutivos.
Este ano, o governo conservador permitiu a utilização de tiametoxame, também conhecido como Cruiser SB, nas culturas de beterraba sacarina – contra o conselho dos seus cientistas, que afirmaram que representaria uma ameaça para as abelhas. O professor Dave Goulson, especialista em abelhas da Universidade de Sussex, alertou que uma colher de chá do produto químico é suficiente para matar 1,25 bilhão de abelhas. Mesmo um traço minúsculo desta toxina pode perturbar a capacidade de navegação e reprodução de uma abelha, reduzindo significativamente a sua probabilidade de sobrevivência.
Há também uma lacuna crescente na ambição em matéria de pesticidas entre o Reino Unido e a União Europeia (UE). O Reino Unido não conseguiu proibir 36 agrotóxicos que são proibidos na UE, embora os ministros ingleses tenham prometido que o Reino Unido não diluiria os padrões ambientais derivados da UE após o Brexit.
O Reino Unido não proibiu 36 pesticidas cujo uso não é permitido na UE. Fotografia: Loop Images Ltd/Alamy
Os ativistas apelam ao próximo governo para implementar uma estratégia adequada para a redução de agrotóxicos. Vicki Hird, líder agrícola do TheWildlife Trusts, disse: “Insetos polinizadores, como abelhas e mariposas, e predadores de pragas agrícolas, como joaninhas e libélulas, são a base para um sistema alimentar produtivo e sustentável. No entanto, estes dois grupos de insetos diminuíram 18% e 34%, respectivamente, desde 1970. Uma dependência excessiva de produtos químicos – combinada com a perda de habitat e as alterações climáticas – poderá fazer com que estes números caiam ainda mais. Isto tornaria a situação muito pior para a vida selvagem do Reino Unido e poderia significar um desastre para a produção alimentar do Reino Unido.
“Apesar de delinear alguma intenção positiva de reduzir o uso de agrotóxicos, o atual governo do Reino Unido não conseguiu dar a esta questão a atenção que merece. No início deste ano, enviou sinais ao resto do mundo de que os insetos não importam, ao autorizar a utilização de um agrotóxico proibido, o tiametoxame, nas culturas de beterraba sacarina, pelo quarto ano consecutivo. Queremos ver o fim destas autorizações de emergência e um plano adequado para reduzir drasticamente o uso de pesticidas nos próximos anos. Esta questão – e na verdade produtos químicos perigosos – não deve ser jogada na grama alta.”
Richard Benwell, CEO da Wildlife and Countryside Link, disse: “O Reino Unido assinou um compromisso internacional de reduzir pela metade o risco de agrotóxicos e produtos químicos perigosos até 2030. Os partidos políticos devem oferecer maiores incentivos aos agricultores para reduzirem ou cessarem o uso de agrotóxicos em todo o mundo. suas fazendas, proibir o uso de agrotóxicosem áreas urbanas e rever a abordagem às autorizações para que os produtos químicos proibidos não possam continuar a ter uso emergencial”.
Ao abrigo dos novos pagamentos agrícolas pós-Brexit, os regimes de gestão ambiental dos solos, os agricultores são recompensados por utilizarem menos agrotóxicos. No entanto, as empresas agrícolas argumentam que é necessário mais apoio e educação para que os agricultores não temam abandonar os agrotóxicos dos quais dependem há muito tempo para cultivar as suas culturas.
Martin Lines, CEO da Nature Friendly Farming Network, disse: “Temos estado numa jornada de mudança nos últimos 10 a 15 anos. Lembro-me de ver campos sendo cultivados com muito poucas minhocas e quase nenhum pássaro seguindo o arado, por isso mudamos a forma como gerimos o nosso solo para reduzir a perturbação e aumentar a matéria orgânica que alimenta as minhocas. Como resultado, tenho visto os números aumentarem bastante, juntamente com a melhoria da saúde do solo.
“Ter um solo mais saudável leva a culturas mais saudáveis, o que, por sua vez, leva a menos doenças e a uma menor utilização de fungicidas para as controlar. Adquirir conhecimento sobre o papel dos insetos predadores, polinizadores, invertebrados e besouros na gestão e controle de pragas levou-me a mudar práticas e a colocar mais diversidade de habitats na nossa paisagem agrícola. As margens ricas em flores e as margens de relva que colocamos dentro e à volta dos nossos campos são o lar de insectos predadores e polinizadores que agora controlam a maioria das nossas pragas. Isso me permitiu parar completamente de usar inseticidas.”
Ibama havia proibido a pulverização do tiametoxam por considerá-lo uma ameaça potencial a abelhas e a outros insetos polinizadores — Foto: Divulgação
Graças a uma decisão obtida no dia 24 de abril na justiça do Rio Grande do Sul, a multinacional suiço/chinesa Syngenta voltou a comercializar o agrotóxico neonicotinóide Tiametoxam que é conhecido por exterminações massivas de polinizadores, incluindo as abelhas.
Lembremos que a Syngenta conseguiu reverter na justiça as restrições que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) impôs, em fevereiro, sobre a produção, a venda e a aplicação do Tiametoxam no Brasil. O IBAMA havia proibido a pulverização do insumo por considerá-lo uma ameaça potencial a abelhas e a outros insetos polinizadores. O processo de reavaliação do defensivo no Ibama estendeu-se por quase dez anos quando, finalmente, houve a proibição para o uso de Tiametoxam.
O caso do Tiametoxam é apenas o primeiro exemplo dos efeitos danosos da aprovação do Pacote do Veneno que foi sancionado pelo presidente Lula no dia 28 de dezembro. Com isso, a Syngenta poderá continuar vendendo esse assassino de abelhas.