
O fato de existirem 11 assentamentos de reforma agrária criados a partir de 1998 em Campos dos Goytacazes, os quais abrigam em torno de 800 famílias de pequenos agricultores não está, mais uma vez, merecendo a devida atenção na atual campanha eleitoral.
Como alguém que estuda a dinâmica social e produtiva dessas áreas desde que cheguei para trabalhar na Uenf, olho essa situação como um misto de incredulidade e impaciência, na medida em que vivemos em uma cidade que quase metade de seus habitantes possui acesso precário a uma alimentação digna e que garanta nutrição saudável.
O fato é que estudando esses assentamentos, e o estudo mais recente foi a da agora mestre em Políticas Sociais, Mariana Batista, enfatiza a falta de políticas municipais que permitam não apenas o escoamento da produção que sai dos lotes de reforma agrária, mas também que haja o devido investimento para a agregação de valor que sirva para gerar mais renda entre os assentados.
Como temos um vice-prefeito que é um dos impulsionadores de um tentativa de reviver o moribundo setor sucro-alcooleiro campista, o fato da primeira gestão de Wladimir Garotinho ter investido centavos (se muito) no apoio à agricultura familiar dinamizada pela reforma agrária não chega a ser surpreendente. É até de se esperar, pois o compromisso continua sendo com os usineiros e grandes proprietários de terra.
Mas essa é uma fórmula cara e ineficiente e, pior, socialmente injusta, na medida em que o apoio à produção dos assentamentos seria mais racional, já que dali sai muito comida. Mas com a falta da participação municipal, boa parte dessa comida acaba sendo adquirida por atravessadores que exportam essa produção para outros municípios e capitais. Com isso se reforça a injustiça social de impedir que os assentados elevem a sua renda, já que os atravessadores pagam menos pelo que compram, e a comida que poderia matar a fome dos campistas vai para outras regiões do estado e do país.
Por isso, acho extremamente positivo a presença de dois candidatos a vereador que são ligados umbilicalmente à luta pela reforma agrária, um literalmente já que nasceu no Assentamento Zumbi dos Palmares. Falo aqui do candidato pelo PT, “Mateus do MST” (13713), que vem a ser um dos filhos do líder do MST, Cícero Guedes, que foi covardemente assassinado quando lutava pela criação de um assentamento nas terras da Usina Cambahyba. O outro candidato ligado à luta pela reforma agrária é uma liderança importante na luta pela criação de canais coletivos de comercialização da produção oriunda dos assentamentos, sendo ele próprio assentado no Assentamento Antonio de Faria. Falo aqui do “Hermes Mineiro” (13014) que conheço desde os tempos em que chegou para se instalar no acampamento que deu origem ao assentamento onde ele vive e produz alimentos em base ecológica.
A minha expectativa é que sendo bem votados, tanto Mateus quanto Hermes possam avançar na luta pelo criação de estruturas de agregação de valor e comercialização da produção de alimentos oriundos dos assentamentos existentes em Campos dos Goytacazes e outros municípios vizinhos (como Cardoso Moreira e São Francisco do Itabapoana). Afinal, eles entendem bem não apenas a importância da realização da reforma agrária, mas do papel central que os assentamentos podem cumprir em garantir acesso a comida barata e livre de agrotóxicos.
Para mim, enquanto pesquisador e cidadão que vive nesta cidade, está muito claro que um dos principais focos da luta política em nossa região continua sendo a realização de uma ampla reforma agrária nos muitos latifúndios improdutivos que existem nela. É que, com a reforma agrária não apenas teremos a democratização da distribuição da terra, mas também teremos mais alimentos disponíveis para a matar a fome que campeia livre por um município tão desigual quanto rico.


