
Estudo analisa dados socioeconômicos e ambientais de 466 cidades de Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul
Se por um lado o Centro-Oeste brasileiro é notoriamente reconhecido como eixo do agronegócio no país, por outro é uma região marcada pela baixa prevalência da agricultura familiar. A maioria das cidades de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul têm até 10% da área produtiva dedicada à atividade. Em Goiás, o total de terras destinadas aos pequenos produtores rurais sobe para até 40%. Além da desigualdade de distribuição de terras, a concentração de renda e dificuldade de acesso a recursos dificultam a agricultura familiar na região, revela estudo da Universidade de São Paulo (USP) publicado na revista Food Security na quarta (10).
Os dados vêm de análise de 466 cidades de Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A equipe aplicou técnicas de regressão espacial para associar a proporção de terras destinadas à agricultura familiar com fatores socioeconômicos e ambientais. Entre os fatores considerados estavam densidade populacional, PIB per capita, índice de concentração fundiária, valor da produção de milho e de soja, além das emissões de gases de efeito estufa ligadas à agricultura e ao uso da terra.
Como resultado, a pesquisa revela que a agricultura familiar está positivamente associada à maior densidade populacional, por favorecer a fixação de moradores no campo, e à produção de milho, cultura mais voltada à alimentação quando comparada à soja. Por outro lado, a presença da agricultura familiar tende a diminuir à medida que o PIB per capita aumenta nos municípios.
O artigo também mostra que, em regiões de maior expansão da soja, a agricultura familiar foi menos presente. Nessas áreas, dominadas por monoculturas, observou-se maior emissão de gases de efeito estufa.
Para Lucas de Almeida Moura, pesquisador no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia Combate à Fome (FSP/USP) e autor principal do artigo, a presença dos agricultores familiares nas regiões contribui para a fixação dos moradores no campo e para um menor impacto ambiental, sendo um importante indicativo de garantia da segurança alimentar da região. “A agricultura familiar possui extrema importância para as cadeias locais de abastecimento e para a alimentação da população. Isto a enfatiza como essencial para a garantia do direito humano à alimentação adequada e da segurança alimentar da população, tendo em vista que a emergência climática impacta diretamente os sistemas alimentares, sobretudo em áreas já vulneráveis, o que compromete o acesso à alimentação”, destaca.
O artigo destaca a importância de políticas públicas para fortalecer a agricultura familiar, que no Brasil representa a base da economia local de 90% dos municípios com até 20 mil habitantes e é a principal responsável por alimentos consumidos pela população, como milho, mandioca, laticínios e hortaliças.
Segundo Moura, a escolha do Centro-Oeste como estudo de caso se deve às características marcantes da produção agrícola da região e ao desempenho já observado em análises anteriores. “Isto pode ser tomado como ponto de partida para investigações mais aprofundadas, considerando dados e características ainda mais localizadas, o que contribui para gerar evidências mais robustas para a tomada de decisão sobre a presença da agricultura familiar nestes territórios e o fortalecimento desse modelo de produção”, conclui Moura.
A pesquisa foi realizada em parceria com o Sustentárea e com apoio da World Wildlife Fund Brasil e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).
Fonte: Agência Bori




