Fiocruz: Rio recebe conferência internacional sobre Ciência, Tecnologia e Inovação

unnamed (13)

A Fiocruz traz de 13 a 15 de fevereiro para o Rio de Janeiro a reunião anual da Comunidade Global de Tecnologia Sustentável e Inovação, a G-Stic, que pela primeira vez será realizada nas Américas. Nomes como o de Tedros Adhanom Ghebreyesus, diretor-geral da Organização Mundial de Saúde, Qu Dongyu, diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), ambos online, e Nísia Trindade Lima, ministra da Saúde, presencialmente, reúnem-se na ExpoMag para discutir o tema Por um futuro equitativo e sustentável: soluções tecnológicas inovadoras para uma melhor recuperação pós-pandemia. E como a Fundação é a principal co-anfitriã, a saúde ganha um grande destaque na G-Stic Rio.

“A Fiocruz, como principal organizadora desta edição, reforça sua participação em âmbito global na discussão de tecnologias e inovações sustentáveis, com uma visão de destaque para a saúde”, explicou Mario Moreira, presidente interino da Fundação. Para Moreira, a realização da conferência no continente confere uma ênfase especial à questão das desigualdades globais e regionais em Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I). “Essa tem se revelado uma das fragilidades da capacidade internacional de articulação de resposta e preparação para emergências sanitárias. Equidade e sustentabilidade apresentam-se, nesse aspecto, como outros elementos definidores dessa capacidade”, acrescentou.

A lista de participantes reúne outros nomes de peso, como Macharia Kamau, diplomata queniano que foi o enviado especial da ONU para Implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) a serem alcançados até 2030; Amandeep Singh Gill, enviado especial do secretário-geral da ONU para Tecnologia; e Maria Van Kerkhove, líder técnica da OMS para Covid-19. A lista segue com a ativista indígena Samela Sateré Mawé e a princesa belga Marie-Esmeralda, presidente do Fundo Leopoldo III para a Conservação da Natureza, entre outros. A Fiocruz participa ainda com integrantes como o próprio Moreira; Marco Krieger, vice-presidente de Produção e Inovação em Saúde; e Mauricio Zuma, diretor do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos).

“O mundo está diante de um grande desafio: a reconstrução pós-pandemia em bases sustentáveis, respeitando a equidade e a inclusão. E para fazer frente a esse processo, o grande referencial é a Agenda 2030, com os ODS”, explicou Paulo Gadelha, coordenador da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030 (EFA 2030) e à frente da organização da G-Stic Rio. A conferência lida justamente com essa questão: pensar em como garantir tecnologias eficazes e sustentáveis visando os ODS. Gadelha lembrou que, apesar da proximidade de 2030, a grande maioria desses objetivos está longe de ser cumprida. “O desafio que temos é como CT&I podem modificar esse cenário, quebrar assimetrias, garantir o acesso às tecnologias, em processos inclusivos. A pandemia nos deu exemplos disso, como nas vacinas contra Covid-19, que foram produzidas rapidamente, mas que ficaram inacessíveis à maioria da população.”

Inicialmente capitaneado pelo instituto de tecnologia belga Vito, que mantém peso significativo no evento, a G-Stic reúne um conjunto de instituições com representações em todas as regiões do mundo. A entrada do Brasil em 2018, por meio da Fiocruz, deu uma relevância ainda maior para o tema da saúde, o que fica claro na programação de fevereiro.

“Um dos ativos únicos da G-STIC é sua perspectiva multissetorial e orientada para o futuro em CT&I. A G-Stic analisa clusters de tecnologia e identifica soluções que contribuem substancialmente para alcançar os princípios da Agenda 2030 e os ODS. Ela reúne partes interessadas de organizações multilaterais, governos, indústria, atores privados, sociedade civil e academia”, disse Dirk Fransaer, diretor-geral da VITO. “Em sintonia com essa abordagem, a G-Stic Rio reconhece os princípios de solidariedade e ‘trabalho conjunto’ do relatório do secretário-geral da ONU Nossa Agenda Comum como fundamentais para acelerar a implementação dos ODS. A CT&I têm o potencial de catalisar o envolvimento da comunidade nesse processo. A próxima edição do G-STIC no Rio de Janeiro trará esse conceito de integração, solidariedade e multilateralismo entre setores, partes interessadas e países em um interesse comum”, acrescentou.

Sessão especial sobre vacinas

As sessões do evento se dividem em seis temas: Saúde, Educação, Água, Energia, Clima e Oceanos. Em Saúde, Bio-Manguinhos está organizando mesas sobre vacinas e imunização. O painel Desafios e Perspectivas para a produção local, nos dias 14 e 15, será dividido em quatro sessões que trarão especialistas como James Fitzgerald, diretor do Departamento de Sistemas e Serviços de Saúde da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas); Lieve Fransen, consultora sênior do Centro Europeu de Políticas em Saúde; Carla Vizzotti, ministra da Saúde da Argentina; e Tiago Rocca, vice-presidente do Conselho de Membros de Fabricantes de Vacinas para Países em Desenvolvimento (DCVMN); além de representantes de instituições internacionais de renome na área como Wellcome, CEPI e Medicines Patent Pool, OXFAM e MSF, entre outros.

Essa agenda tem como objetivo discutir fatores críticos de sucesso para produção local de vacinas em países em desenvolvimento, endereçando os desafios e perspectivas em relação a demanda e fornecimento, financiamento e perspectiva global em relação à propriedade intelectual e acesso. As discussões envolverão os desafios sistemáticos de pesquisa & desenvolvimento e produção local de vacinas, abrangendo: desafios de saúde tendo em conta o cenário epidemiológico, doenças emergentes e reemergentes, experiências de financiamento da inovação e prontidão para respostas a emergências, os desafios de desenvolvimento de capacidades e financiamento da produção local, e equidade e acesso para assegurar a vacina e a vacinação para todos.

Também participarão do evento de Bio-Manguinhos Ethel Maciel, secretária de Vigilância em Saúde e Ambiente (SVSA) do Ministério da Saúde; Hugo Gomes da Silva, líder médico Global para Vacinas da Astrazeneca; Júlia Spinardi, diretora sênior da Pfizer para Assuntos Médicos e Científicos; e Cristiano Pereira, de Desenvolvimentos de Negócios do Butantan; além de integrantes da Fiocruz, como o assessor sênior científico Akira Homma, Mario Moreira, Mauricio Zuma, Rosane Cuber e Sotiris Missailidis.

A conferência

Esta é a sexta edição da G-Stic. Considerada a maior conferência global de Ciência, Tecnologia e Inovação para aceleração da Agenda 2030, ela acontecia na Bélgica desde seu início, em 2017. Para aumentar a sua capilaridade, passou a ser realizada em outros países, acontecendo em 2022 durante a Expo Dubai. A Fiocruz, que participa como coanfitriã desde 2018, sugeriu então que a edição de 2023 ocorresse no Brasil.

A G-STIC é organizada em conjunto pela Vito (organização belga de pesquisa, tecnologia e desenvolvimento sustentável) e sete outros institutos de pesquisa sem fins lucrativos: Fiocruz, CSIR (Conselho de Pesquisa Científica e Industrial, África do Sul), Giec (Instituto de Conversão de Energia de Guangzhou, China), Gist (Instituto de Ciência e Tecnologia de Gwangju, Coreia do Sul), Nacetem (Centro Nacional de Gestão de Tecnologia, Nigéria), Teri (Instituto de Energia e Recursos, Índia) e SDSN (Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas).

No Brasil, a G-Stic Rio conta com o patrocínio master da Petrobras, Pfizer e Fiotec e com o patrocínio das empresas Aegea, IBMP, Instituto Helda Gerdau, Klabin, Sanofi, GSK, Enel, Engie, The Rockefeller Foundation, RaiaDrogasil e Firjan, além do apoio do Instituto Clima e Sociedade.

Credenciamento

O evento acontece de 13 a 15 de fevereiro no Expo MAG (Rua Beatriz Larragoiti Lucas – Cidade Nova, Rio de Janeiro), em quatro auditórios e também será transmitido online. Jornalistas podem se credenciar pelo link (Link) até as 22h do dia 12. Depois disso o credenciamento é diretamente na recepção do evento.

A área destinada a cinegrafistas e fotógrafos ficará a uma distância de 25 metros do palco do auditório principal (Auditório Manguinhos).

Clique para ver o vídeo release

A programação pode ser conferida no site da G-Stic Rio

Para mais informações, entre em contato com ccs@fiocruz.br

Urgências científicas para o Brasil

naderFoto: Cristina Lacerda

Por Helena Nader para a Science

No mês passado, no Egito, na Conferência de Mudanças Climáticas das Nações Unidas, o presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, reafirmou sua promessa de tornar o Brasil um líder global no combate às mudanças climáticas e ao desmatamento. No entanto, quando Lula assumir o cargo em 1º de janeiro, entrará em uma situação bem diferente da última vez em que foi presidente (2003-2010). Naquela época, priorizou a ciência e a educação em todas as ações governamentais e conduziu o Brasil a um estado social próspero e economia sustentável. Desta vez, ele enfrentará um cenário local e global muito diferente. O mundo ainda está passando por uma crise de saúde sem precedentes e, como outros países, o Brasil precisa estabelecer novas formas de enfrentar os consequentes problemas sociais, educacionais, ambientais e econômicos. Isso será especialmente desafiador, visto que, desde 2016, o país tem feito a contramão da maioria dos governos, cortando investimentos em educação em todos os níveis e em ciência, tecnologia e inovação (CT&I).

A questão é como Lula pode enfrentar imediatamente a grave crise de pobreza e fome no Brasil, ao mesmo tempo em que restaura o meio ambiente e uma economia competitiva e equitativa para o país.

No século 21, os países estão se concentrando no desenvolvimento de capacidades para criar conhecimento científico e tecnologias para melhorar o bem-estar social. A ciência e a educação surgem assim como prioridades. É urgente, portanto, que Lula recomponha o orçamento dos setores de educação e CT&I do país. No entanto, o novo governo enfrentará um desafio sem paralelo. Somado aos cortes históricos nas políticas sociais e de CT&I, o orçamento para 2023 apresentado pelo governo Bolsonaro não contempla gastos básicos que necessariamente terão que ser retomados. Além disso, o Congresso brasileiro é o mais conservador desde o retorno do país à democracia. Mas o investimento em ciência e educação é especialmente importante por causa da população jovem do Brasil.

Alguns indicadores de educação, bem como de CT&I, mostram que, em média, entre os países pertencentes à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, 47% dos adultos (25 a 34 anos) concluíram o ensino superior (um diploma de bacharel), em comparação com os do Brasil (23%). O número de adultos no Brasil que não vão além do ensino médio (pré-faculdade) é um dos mais altos entre essas nações. O apoio a programas de ajuda que ajudam estudantes com antecedentes desfavorecidos a concluir o ensino superior foi profundamente reduzido nos últimos 4 anos. O Brasil também ainda não atingiu a matrícula plena de crianças no ensino fundamental, uma das metas de referência da Agenda 2030 dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas.

A economia do Brasil oscila entre a 10ª e a 12ª posição (dependendo do sistema de classificação) no mundo, e esse resultado é consequência direta principalmente dos investimentos feitos em CT&I nos anos anteriores. Por exemplo, o sucesso da agricultura brasileira no aumento da produção de soja é resultado de avanços alcançados principalmente por meio de pesquisas em universidades e instituições públicas. Infelizmente, nos últimos anos, o governo Bolsonaro cortou o financiamento de pesquisas, o que em breve afetará a competitividade global do Brasil.

Acima de tudo, a ciência brasileira carece de constância e continuidade nos investimentos em CT&I. O Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico é hoje a única fonte de financiamento de CT&I. O governo Bolsonaro afirma ter equilibrado os gastos ao restringir o uso do fundo. A nova administração deve revigorar esse recurso e priorizar CT&I.

O Brasil precisa se comprometer urgentemente com estratégias que alcancem a liderança na era do conhecimento, como investir em “big data”, inteligência artificial e tecnologias de comunicação. Essas áreas continuarão a revolucionar o mercado de trabalho global, mas aumentarão as desigualdades no Brasil, a menos que seja dada atenção especial à educação adequada. Além disso, é necessário cultivar pesquisas multidisciplinares e transdisciplinares que considerem os impactos sociais e ambientais para garantir que a ciência apoie amplamente o desenvolvimento econômico e social do país.

Vinte anos depois de sua primeira presidência, Lula retorna e enfrenta seus maiores obstáculos até agora. A boa notícia é que ele ainda defende a ciência e a educação. O povo brasileiro deve se unir e apoiar a construção de um futuro para a juventude de hoje.

*Helena B. Nader é presidente da Academia Brasileira de Ciências, Rio de Janeiro, Brasil; o presidente honorário da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, São Paulo, Brasil; e professora de Biologia Molecular da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, Brasil.


Este escrito originalmente em inglês foi publicado pela Science [Aqui!].

O massacre das universidades como elemento central na destruição nacional promovida pelo governo Bolsonaro

bolsonaroweintraub-960x540

O presidente Jair Bolsonaro com um dos seus vários ministros da Educação, Abraham Weintraub

Ainda que a educação pública tenha sofrido imensamente ao longo do governo que agora se encerra, as universidades públicas federais estiveram sob intensa pressão a partir de um corte vigoroso das verbas direcionadas pelo governo federal, ainda que elas produzam mais de 90% da produção científica nacional (ver gráfico abaixo)

wp-1667393967977

Essa asfixia financeira implicou não apenas na redução das verbas para custeio da pesquisa, o que já é grave, mas também alcançou o pagamento de serviços básico como segurança e limpeza. A coisa foi tão grave que muitas universidades federais estão terminando o ano dando calote no pagamento desses serviços para poderem simplesmente continuarem funcionando.

Ainda que haja um elemento ideológico que leva um governante de extrema-direita como é Jair Bolsonaro a desdenhar da importância do conhecimento científico, o problema aqui é mesmo de concepção de destino nacional. É que ao desmontar um sistema de ciência e tecnologia ainda em formação, o que está se fazendo é inviabilizar qualquer oportunidade de que o Brasil possa gerar o tipo de conhecimento necessário para participar minimamente dos ganhos associados à chamada Revolução Industrial 4.0.  (ver imagem abaixo descrevendo as principais diferenças nas diferentes etapas do processo de Industrialização).

Indústria 4.0: O que é, e como ela vai impactar o mundo. - Citisystems

Mas se para quem entende a importância do conhecimento científico para o desenvolvimento econômico a asfixia financeira das universidades não faz o mínimo sentido, o mesmo não ocorre para quem não vê nenhum problema que a posição de desvantagem competitiva que países como o Brasil tem em relação a países que estão na ponta de cima do processo competitivo, hoje fortemente ditado por novas formas de conhecimento.

A verdade é que se olharmos para o atraso causado no desenvolvimento econômico de países como Espanha e Portugal por ditadores como Francisco Franco e Ernesto Salazar, vamos encontrar o mesmo desdém pela educação da população, o que dizer da criação de universidades públicas capazes de gerar conhecimento de ponta.

Agora com a eleição de Luís Inácio Lula da Silva abre-se a possibilidade de que este quadro de penúria seja revertido, mesmo que parcialmente, visto que o presidente eleito já indicou o seu compromisso com o fortalecimento das universidades públicas, com o consequente envio das verbas necessárias para que elas possam contribuir com o processo de desenvolvimento econômico.  Se não for por nada, essa posição já representa um giro de 180 graus em relação ao que está sendo feito contra as universidades públicas desde que Michel Temer assumiu o poder após o golpe parlamentar realizado contra a presidente Dilma Rousseff em 2016.

Finalmente, algo que eu não abordei até aqui é a necessidade de que os reitores/interventores impostos contra a vontade das comunidades universitárias de um grande número de universidades sejam sumariamente removidos. É que esses reitores/interventores jogaram sujo contra suas próprias universidades. Com a saída de Jair Bolsonaro do Palácio do Planalto, a saída desses interventores é uma condição sine qua non para que as universidades voltem a funcionar em ambientes minimamente democráticos, uma premissa básica para que se desenvolva conhecimento científico de ponta.

Governo Bolsonaro avalia fusão do Ministério de Ciência e Tecnologia com a Indústria e o Comércio

sem ciencia

Por Luiz Queiroz para a Capital Digital

Num eventual segundo mandato do presidente Jair Bolsonaro, expectativa que vem crescendo a cada anúncio das pesquisas eleitorais, existe uma forte possibilidade do atual Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) virar um braço de uma nova estrutura ministerial a ser criada, que envolveria também a Indústria e o Comércio Exterior. Os rumores dessa fusão correm soltos no mercado empresarial privado e pelos corredores do MCTI e do Ministério da Economia, que supostamente comandaria essa articulação.

O novo ministério que conjugaria a Ciência com a Indústria e o Comércio seria dado ao governador de Minas Romeu Zema, como pagamento político ao apoio dado à reeleição de Bolsonaro. E o cabeça da pasta viria da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG), com o aval político da Confederação Nacional da Indústria (CNI), através do seu MEI- Movimento Empresarial pela Inovação. Essa entidade reúne hoje 429 empresas que representam expressiva parcela do PIB nacional. O nome mais cotado para virar ministro dessa nova pasta seria o do empresário mineiro do setor têxtil, Flávio Roscoe Nogueira (foto abaixo), atual presidente da FIEMG.

Se confirmadas essas especulações, considerando que o presidente Bolsonaro tenha revertido a campanha eleitoral e conseguido a reeleição, a nova pasta contaria com os recursos do BNDES e da Finep, e passaria a controlar a gestão dos R$ 9 bilhões arrecadados pelo FNDCT – Fundo Nacional do Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

FNDCT

Independentemente se essa articulação vai vingar ou não passa de boato, o redirecionamento do FNDCT é uma realidade e vem sendo defendida abertamente pela Confederação Nacional da Indústria (CNI). Este blog teve acesso a uma apresentação da entidade, cujo teor trata de uma “Nova governança da MEI e proposta de nova governança do FNDCT”, elaborado pelo Movimento Empresarial pela Inovação.

E na proposta fica clara que a indústria veria com bons olhos se o Governo Bolsonaro reordenasse o FNDCT para um cenário no qual a distribuição dos recursos acabaria majoritariamente na pesquisa aplicada e na indústria. O restante seria canalizado para a pesquisa acadêmica que, se já tem dificuldades de obtê-los via um ministério voltado para isso, imaginem numa nova pasta comandada por representantes de empresas?

O MEI tem a seguinte caracterização representativa:

 


compass black

Este foi inicialmente publicado pelo site “Capital Digital” [Aqui! ].

Com falta de investimento em Educação e Ciência, Brasil perde talentos e cai em índice de competitividade

Pesquisas científicas e projetos inovadores podem ser cortados
elcio abdallaÉlcio Abdalla, coordenador e professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP)
O corte contínuo de verbas em Ciência e Tecnologia, que vem acontecendo no Brasil nos últimos anos, não está afetando apenas as pesquisas científicas, mas pode levar a um fenômeno de difícil reversão: a fuga de cérebros, o que já pode ser visto em número. No ranking do Índice Global de Competitividade por Talento, o Brasil despencou 25 posições de 2019 para 2020: da posição 45 foi para a 70. Na lista das nações que mais atraem talentos, o país também caiu muito em quatro anos: perdeu 28 posições.

A emigração intelectual coincide com a redução do orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações, que perdeu quase metade dos recursos de 2015 para 2016 e vem sofrendo mais cortes de 2019 para cá. Só em outubro, o Ministério da Economia decidiu cortar do Orçamento 90% dos recursos que seriam destinados a vários projetos científicos, inclusive a bolsas e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). A verba destinada para a ciência, que era de R$690 milhões, vai ficar em apenas R$55,2 milhões.

As consequências para o país serão nefastas. Por aqui, a quase totalidade das pesquisas científicas e em inovação são feitas pelas universidades públicas, financiadas pela FAPESP, pelo Ministério da Educação e outras instituições, como a Finep. Élcio Abdalla, coordenador e professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP), é coordenador do Bingo, um radiotelescópio inédito no país, financiado pela Fapesp, pelo governo da Paraíba com colaboração chinesa, que corre o risco de ser interrompido com a queda de investimentos. Além disso, em sua sala de aula ele tem visto: a fuga de cérebros é um fenômeno que tende a crescer. Revertê-lo é mais difícil, diz.

Hoje no projeto há três colaboradores de altíssima competência, que estão saindo definitivamente do Brasil por falta de oportunidades aqui.”São alguns excelentes pesquisadores, alunos recém formados, que estão indo embora e não necessariamente porque queriam, mas porque são extremamente qualificados e aqui não são remunerados adequadamente em pesquisa, e, pior que isto, por vezes não encontram trabalho. China, Alemanha, Estados Unidos são alguns dos destinos deles e, pelas perspectivas que vemos desse governo, de cada vez maior desvalorização do conhecimento, a perspectiva de que esses cérebros podem retornar é baixa. Mesmo que voltemos a investir, serão anos para retomarmos os níveis atuais”.

Pandemia mostrou importância do investimento em ciência

A pandemia da Covid-19 e a consequente busca por vacinas deixou claro que os países com maior investimento saíram na frente – e devem continuar liderando o mundo:

“A produção científica, o investimento em pesquisa, retorna para a sociedade em quase todas as áreas. Desde inovações e descobertas que tornam bens de consumo melhores e mais acessíveis até a produção de medicamentos e vacinas, procedimentos médicos, obras de engenharia que melhoram a mobilidade urbana e desenvolvimento agropecuário que torna a produção de alimentos mais barata e de melhor qualidade. Investir em inovação e ciência é criar autonomia para o país. Percebemos isso agora, nas vacinas. Aqueles com capacidade de desenvolver e produzir saíram na frente. Isso não é uma simples coincidência, são as nações que mais valorizam a ciência”, explica Élcio. Não apenas isto, há também benefícios tecnológicos que revertem diretamente na economia do país, como já tem acontecido.

Os dados confirmam: os quatros países que mais investem em pesquisa estão na frente em inovação. Eles são Coreia do Sul e Alemanha, que investem quase 4% em pesquisa; e Japão e Estados Unidos, que repassam cerca de 3%. No Brasil, esse montante é um pouco maior que 1%. E vale lembrar: essas quatro nações têm PIB maior que o nosso. Ou seja, elas direcionam mais dinheiro não só percentualmente, mas também em números absolutos. Nos EUA, só para pesquisas envolvendo a COVID-19 foram destinados mais de 6 bilhões de dólares. No Brasil, apenas US $100 milhões.

As principais fontes desses recursos são justamente algumas instituições que podem ter corte de verba, como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), ligados ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Igualmente importante é a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), ligada ao Ministério da Educação. Todos eles sofreram cortes significativos, essenciais, no Orçamento de 2021.

Projeto inédito e revolucionário pode sofrer

Um dos projetos que sofre com o corte de verbas e investimento é o coordenado por Abdalla, o Bingo. Trata-se de um radiotelescópio, financiado principalmente pela Fapesp e pelo Governo da Paraíba, inédito no país e que conta com pesquisadores do Brasil, da China, África do Sul, Reino Unido, Coréia do Sul, Portugal e França. O objetivo é explorar novas possibilidades na observação do universo a partir do céu brasileiro. O sertão da Paraíba, pela alta visibilidade e baixa poluição, foi o local escolhido. A FINEP, que contribuiria significativamente, não está colocando verbas no projeto, apesar de termos, na análise técnica, logrado aprovação do apoio pretendido por duas vezes, em 2018 e em 2021.

“A proposta do radiotelescópio BINGO é estudar a energia escura e também o fenômeno Fast Radio Bursts [“Rajadas Rápidas de Rádio”, em tradução livre], ainda pouco conhecido. Além disso, entender e conhecer o nosso céu pode trazer conhecimentos importantes e estratégicos sobre o que acontece em cima de nós, quais fenômenos, que tipo, por exemplo, de satélites, estão passando por aqui. É informação importante para toda a sociedade”, conta Élcio.

Há um extenso plano educacional que segue diretrizes internacionais, aprovado pela Secretaria de Educação do Estado da Paraíba. Há também um plano de divulgação muito importante. Isto tudo sem detalhar aqui as contribuições tecnológicas do projeto, já em andamento, assim como a formação de um conjunto de pesquisadores capazes de trazer conhecimento estatístico vital para a economia e que podem contribuir inclusive no sistema financeiro nacional, o que também já está acontecendo.

O BINGO contribuirá com a visão do Hemisfério Sul para um trabalho sobre o fenômeno que já vem sendo realizado por meio do Chime (Canadian Hydrogen Intensity Mapping Experiment) no Hemisfério Norte. O chamado “setor escuro do Universo” estará no foco das descobertas. No sertão, longe da poluição eletromagnética, será possível saber mais sobre estruturas desconhecidas da galáxia, pulsares que ainda precisam de observação e perceber novos sinais do espaço.

O coordenador do projeto observa que “cerca de 95% do conteúdo energético do universo é completamente desconhecido, e o BINGO olhará para a distribuição detalhada da matéria conhecida para verificar os vínculos do setor escuro”. E mostrar para o cidadão comum como seus impostos beneficiam o país é um dos objetivos que Élcio tem com esse projeto:

“O assunto não é necessário apenas para a comunidade científica, mas para a população em geral. De fato, há um enorme projeto educacional conectado às pesquisas, é ciência e educação para todos. Não podemos simplesmente falar para doutores, temos que colocar as pessoas a par, já que são elas que pagam pela nossa pesquisa. O ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços] do pãozinho vai para esse trabalho também. Então nós temos, até como obrigação, contribuir para um desenvolvimento real e mostrar ao cidadão que a ciência é importante, que a ciência muda o mundo – como de fato mudou nos últimos três séculos a face da civilização”, sintetiza Élcio Abdalla.

Atolado no pântano de Pandora, Paulo Guedes manda cortar 90% dos recursos destinados a bolsas e projetos de pesquisa científica

O ministro da Economia, Paulo Guedes, em mais um golpe contra a ciência, cortou 90% dos recursos destinados a bolsas e apoio à pesquisa e projetos já agendados pelo CNPq. Em ofício encaminhado à Comissão Mista do Orçamento, Guedes mandou cortar R$ 690 milhões já previstos para projetos científicos, deixando apenas R$ 55 milhões

Sumaia-Villela-Agencia-BrasilCom o corte, restam apenas R$ 55,2 milhões de reais. Foto: Sumaia Villela Agência Brasil

“É um golpe duro na ciência e na inovação, que prejudica o desenvolvimento nacional. E que caminha na direção contrária da Lei 177/2021, aprovada por ampla maioria pelo Congresso Nacional”, afirmam a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Associação Brasileira de Ciências, entre oito entidades que enviaram uma carta, na quinta-feira (7), ao presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco, para que reverta a decisão.

“O PLN 16 destinava 690 milhões de reais para o MCTI, alimentando em particular as bolsas e o Edital Universal do CNPq, mas, em cima da hora, por força de um ofício enviado pelo Ministério de Economia na véspera da reunião da CMO, mais de 90% desses recursos foram transferidos para outros ministérios, restando apenas R$ 55,2 milhões de reais, destinados ao atendimento de despesas relacionadas aos radiofármacos”, denunciam.

Segundo as entidades, o argumento de Guedes de que os recursos já transferidos para Ciência e Tecnologia não estão sendo utilizados é uma afronta. “Já nos manifestamos anteriormente sobre a estratégia perversa de alocar 50% do total dos recursos do FNDCT para crédito reembolsável, o qual, uma vez não utilizado, será recolhido ao Tesouro no final do ano. Dá-se com uma mão, para retirar com a outra. Nesse processo, agoniza a ciência nacional”.

Leia a seguir a carta assinada pela oito entidades que compõem a Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento (ICTP.br) – Associação Brasileira de Ciências (ABC), Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (Confap), Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (Conif), Conselho Nacional das Fundações de Apoio às Instituições de Ensino Superior e de Pesquisa Científica e Tecnológica (Confies), Conselho Nacional de Secretários para Assuntos de Ciência Tecnologia e Inovação (Consecti), Instituto Brasileiro de Cidades Inteligentes, Humanas e Sustentáveis (IBCHIS) e Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

MANOBRA DO MINISTÉRIO DA ECONOMIA AFRONTA A CIÊNCIA NACIONAL

A modificação do PLN 16, feita na última hora, no dia de hoje, pela Comissão Mista do Orçamento do Congresso Nacional, atendendo a ofício enviado ontem pelo Ministro da Economia, subtrai os recursos destinados a bolsas e apoio à pesquisa do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovações e impossibilita projetos já agendados pelo CNPq. É um golpe duro na ciência e na inovação, que prejudica o desenvolvimento nacional. E que caminha na direção contrária da Lei 177/2021, aprovada por ampla maioria pelo Congresso Nacional.

O PLN 16 destinava 690 milhões de reais para o MCTI, alimentando em particular as bolsas e o Edital Universal do CNPq, mas, em cima da hora, por força de um ofício enviado pelo Ministério de Economia na véspera da reunião da CMO, mais de 90% desses recursos foram transferidos para outros ministérios, restando apenas R$ 55,2 milhões de reais, destinados ao atendimento de despesas relacionadas aos radiofármacos.

O argumento utilizado pelo Ministério da Economia afronta a comunidade científica e tecnológica: afirma que os recursos já transferidos para o MCTI não estão sendo utilizados. Cabe lembrar que esses recursos são para crédito, são reembolsáveis, e não interessam à indústria. Já nos manifestamos anteriormente sobre a estratégia perversa de alocar 50% do total dos recursos do FNDCT para crédito reembolsável, o qual, uma vez não utilizado, será recolhido ao Tesouro no final do ano. Dá-se com uma mão, para retirar com a outra. Nesse processo, agoniza a ciência nacional.

Fazemos um apelo aos parlamentares para que revertam essa decisão, com todos os meios disponíveis para repor os recursos destinados ao MCTI e ao CNPq. Está em questão a sobrevivência da ciência e da inovação no país.

compass

Este texto foi originalmente publicado pelo jornal “Hora do Povo” [Aqui!].

Corte de verbas para pesquisa e ciências ameaça a continuidade de projetos no Brasil

Especialista aponta que pandemia mostrou que investimento retorna para a sociedade

Corte na ciência, tecnologia e inovação prejudica o país | CEISE Br
Universidades federais à beira do colapso, podendo inclusive fechar as portas por falta de verba. O anúncio da UFRJ e da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) estampou capas de jornais e deixou a comunidade científica em alerta. As duas instituições não são as únicas a sofrerem com a possibilidade de não retomarem as atividades no segundo semestre de 2021. Segundo especialistas, o corte de investimentos em pesquisa, educação e inovação é realidade pelo menos desde 2015, mas este ano a situação piorou exponencialmente: 30% dos recursos foram bloqueados pelo Governo Federal e o montante ficou em cerca de 52 bilhões, a menor cifra em valores corrigidos pela inflação desde 2008.

As consequências para o país, apontam especialistas, serão nefastas. Por aqui, quase que a totalidade de pesquisas científicas e em inovação são feitas pelas universidades públicas, financiadas pelo Ministério da Educação e outras instituições, como a Finep. Élcio Abdalla, coordenador e professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP) aponta ainda: a pandemia da Covid-19 e a consequente busca por vacinas deixou claro que os países com maior investimento saíram na frente – e devem continuar liderando o mundo:

“A produção científica, o investimento em pesquisa retorna para a sociedade em quase todas as áreas. Desde inovações e descobertas que tornam bens de consumo melhores e mais acessíveis até a produção de medicamentos e vacinas, procedimentos médicos, obras de engenharia que melhoram a mobilidade urbana e desenvolvimento agropecuário que torna a produção de alimentos mais barata e de melhor qualidade. Investir em inovação e ciência é criar autonomia para o país. Percebemos isso agora, nas vacinas. Aqueles com capacidade de desenvolver e produzir saíram na frente. Isso não é uma simples coincidência, são as nações que mais valorizam a ciência”, explica ele.

Os dados confirmam: os quatros países que mais investem em pesquisa estão na frente em inovação. Eles são Coreia do Sul e Alemanha, que investem quase 4% em pesquisa; e Japão e Estados Unidos, que repassam cerca de 3%. No Brasil, esse montante é um pouco maior que 1%. E vale lembrar: essas quatro nações têm PIB maior que o nosso. Ou seja, elas direcionam mais dinheiro não só percentualmente, mas também em números absolutos. Nos EUA, só para pesquisas envolvendo a COVID-19 foram destinados mais de 6 bilhões de dólares. No Brasil, apenas US $100 milhões.

As principais fontes desses recursos estão no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), ligados ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Igualmente importante é a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), ligada ao Ministério da Educação. Todos eles sofreram cortes no Orçamento de 2021.

Projeto inédito e revolucionário pode sofrer

PROJETO BINGO

Um dos projetos que podem sofrer com o corte de verbas e investimento é o coordenado por Abdalla, o Bingo. Trata-se de um radiotelescópio, financiado pela Fapesp e pela Finep, inédito no país e que conta com pesquisadores do Brasil, da China, África do Sul, Reino Unido, Coréia do Sul, Portugal e França. O objetivo é explorar novas possibilidades na observação do universo a partir do céu brasileiro. O sertão da Paraíba, pela alta visibilidade e baixa poluição, foi o local escolhido.

“A proposta é estudar a energia escura e também o fenômeno Fast Radio Bursts [“Rajadas Rápidas de Rádio”, em tradução livre], ainda pouco conhecido. Além disso, entender e conhecer o nosso céu pode trazer conhecimentos importantes e estratégicos sobre o que acontece em cima de nós, quais fenômenos, que tipo, por exemplo, de satélites, estão passando por aqui. É informação importante para toda a sociedade”, conta Elcio.

O Bingo contribuirá com a visão do Hemisfério Sul para um trabalho sobre o fenômeno que já vem sendo realizado por meio do Chime (Canadian Hydrogen Intensity Mapping Experiment) no Hemisfério Norte. O chamado “setor escuro do Universo” estará no foco das descobertas. No sertão, longe da poluição eletromagnética, será possível saber mais sobre estruturas desconhecidas da galáxia, pulsares que ainda precisam de observação e perceber novos sinais do espaço.

Abdalla observa que “cerca de 95% do conteúdo energético do universo é completamente desconhecido, e o BINGO olhará para a distribuição detalhada da matéria conhecida para verificar os vínculos do setor escuro”. E mostrar para o cidadão comum como seus impostos beneficiam o país é um dos objetivo que Abdalla tem com esse projeto:

“O assunto não é necessário apenas para a comunidade científica, mas para a população em geral. Não podemos simplesmente falar para doutores, temos que colocar as pessoas a par, já que são elas que pagam pela nossa pesquisa. O ICMS [Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços] do pãozinho vai para esse trabalho também. Então nós temos, até como obrigação, contribuir para um desenvolvimento real e mostrar ao cidadão que a ciência é importante, que a ciência muda o mundo”.

*Elcio Abdalla é físico teórico brasileiro com reconhecimento internacional e importante liderança na pesquisa de física teórica no Brasil. Com doutorado e pós-doutorado pela Universidade de São Paulo, é atualmente professor titular do Instituto de Física dessa universidade, além de coordenador do Projeto Bingo, radiotelescópio brasileiro que está sendo construído no interior da Paraíba que fará o mapeamento da parte escura do universo.

Marcos Pontes, o ministro astronauta, finalmente deu as caras, só que na “motociata” Bolsonarista

O ministro da Ciência e Tecnologia, o “astronauta” Marcos Cesar Pontes, é uma daquelas ausências que preenche lacunas em uma das equipes ministeriais mais medíocres e bizarras da história da república brasileira. A ausência de Pontes do noticiário só é comparável à que ele oferece enquanto o ocupante de um ministério que em democracias mais consolidadas é ocupada por pessoas que realmente se preocupam com o avanço do sistema científico de seus respectivos países. Mas esse claramente não é o caso de Marcos Pontes, pois enquanto o governo do qual ele participa promove uma caçada à ciência e aos cientistas brasileiros, ele é um completo ausente de qualquer debate sério para evitar o desmanche de um sistema científico que vinha em processo de consolidação, mas que agora se desmancha a olhos vistos.

Pois bem, aparentemente para compensar sua completa nulidade enquanto ministro de Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes resolveu ontem se juntar à malta de apoiadores do presidente da república que saíram pelas ruas de São Paulo para tentar impor a imagética bolsonarista que, entre outras coisas, tem como um dos seus pilares a diminuição do valor da ciência enquanto um instrumento de combate à pandemia da COVID-19 (ver imagem abaixo).

astronauta 1

Sem usar máscara, ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, faz uma “selfie” ao lado do presidente Jair Bolsonaro durante a “motociata” ocorrida em São Paulo

Por essas e outras é que considero o absoluto silêncio no interior da comunidade científica brasileira sobre o papel nefasto que Marcos Pontes vem cumprindo no esforço de destruir a ciência brasileira. Para mim, ele está no mesmo nível de outros ministros que têm merecido mais atenção, como é o caso de Ricardo Salles e Damares Alves. Entretanto, pouco ou nada se ouve das associações e sociedades científicas sobre a gestão desastrosa de Pontes, que assim pode tranquilamente participar de motociatas, sem que se ouça qualquer voz apontando para a sua parcela direta de culpa no que estamos assistindo nas agências de fomento, universidades e institutos públicos de pesquisa.

E pensar que foi o ex-presidente Lula quem alçou Pontes a algum tipo de notoriedade ao pagar caro para ele dar um passeio espacial às custas dos impostos pagos pelos trabalhadores brasileiros.

Orçamento 2021 compromete o futuro da ciência brasileira

Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações sofreu corte de 29%. Ministro vê situação “crítica” e teme corte de bolsas no CNPq

arte cienciaArte de Lívia Magalhães sobre imagens de Pixabay e Flaticon

Por Herton Escobar,  Arte: Lívia Magalhães/Jornal da USP

A ciência brasileira terá que sobreviver em 2021 com um orçamento pífio. O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) foi o que sofreu o maior corte no orçamento federal aprovado em 25 de março pelo Congresso Nacional, com uma redução de 29% dos seus recursos, em comparação com 2020. O orçamento de fomento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) — que é vinculado ao MCTI — será de apenas R$ 23,7 milhões; uma quantia absolutamente irrisória para a sustentação da produção científica nacional.

O orçamento total previsto para o MCTI neste ano é da ordem de R$ 8,3 bilhões, comparado a R$ 11,8 bilhões em 2020. O valor reservado para “despesas discricionárias” (ou seja, efetivamente disponível para investimentos em pesquisa), porém, é de apenas R$ 2,7 bilhões, 15% a menos do que em 2020 e 58% a menos do que em 2015 (quando o orçamento já estava em queda), segundo dados apresentados pelo ministro Marcos Pontes em uma audiência pública na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados, na última quarta-feira, 7 de abril.

Considerando o crescimento da comunidade científica ao longo das últimas décadas, o orçamento pode ser considerado o menor da história, em termos da sua capacidade de atender às demandas do setor. O outros dois ministérios que mais perderam recursos foram Educação e Meio Ambiente.

Pontes reconheceu que a situação do MCTI é “crítica” e disse que o orçamento é insuficiente até mesmo para a manutenção básica das 28 unidades de pesquisa vinculadas ao ministério (incluindo vários institutos de extrema relevância para a ciência nacional, como InpeInpaCBPF e CNPEM); “o que dirá para se manter os projetos” de pesquisa vinculados a elas.

orçamento

Orçamento em queda – Gráfico apresentado pelo ministro em audiência na Câmara dos Deputados

Pontes também previu cortes de bolsas no CNPq para este ano, a não ser que o governo consiga liberar recursos adicionais do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) para tapar o rombo. “O que para mim é uma facada”, lamentou o ministro, em seu depoimento na Câmara. “Realmente isso é uma coisa à qual eu dou muita importância; consegui manter por dois anos, e este ano não estou vendo perspectiva de manter as bolsas integralmente.”

Pelos cálculos da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), com base nos números originais do projeto de lei do orçamento, o CNPq terá 10% a menos de recursos para bolsas neste ano, com o agravante adicional de que mais de 60% desses recursos dependerão da liberação de créditos suplementares pelo Congresso ao longo do ano. O montante efetivamente garantido no orçamento (cerca de R$ 378 milhões) seria suficiente para pagar apenas quatro meses de bolsas. 

A não liberação do FNDCT, segundo Pontes, implicará ainda a inviabilização de várias iniciativas essenciais da pasta, incluindo o desenvolvimento de vacinas e tratamentos nacionais contra a covid-19. Um desses projetos é o da vacina Versamune, que está sendo desenvolvida pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, em parceria com as empresas Farmacore e PDS Biotechnology, e que já entrou com pedido na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para dar início aos testes clínicos, com seres humanos.

Também estão previstas quedas expressivas nos orçamentos da Capes, das universidades federais e até mesmo da Embrapa, a mais importante instituição de pesquisa agropecuária do País.

“As instituições que produzem CT&I (ciência, tecnologia e inovação) podem ter suas atividades muito reduzidas, ou mesmo paralisadas, caso seus orçamentos não sejam minimamente recompostos”, já dizia um documento que a SBPC encaminhou ao Congresso no fim de março, às vésperas da votação do orçamento, delineando valores mínimos para a manutenção da ciência nacional. “Para que as universidades, instituições de pesquisa e empresas inovadoras possam atuar eficazmente no enfrentamento da pandemia e contribuir para a recuperação do País, é imprescindível que elas tenham os recursos necessários para seu funcionamento.”

No que depender do orçamento apresentado pelo governo e aprovado pelos parlamentares, porém, esses recursos não estarão disponíveis. A situação é agravada pelo fato de que uma parte significativa desse orçamento do MCTI (cerca de 48% dele, segundo a SBPC) está condicionada à liberação de créditos suplementares pelo Congresso. Ou seja, é possível que apenas metade desse orçamento esteja efetivamente disponível para uso do Ministério ao longo deste ano, a depender da situação econômica (e política) do País. No caso do CNPq, por exemplo, a verba efetivamente garantida para fomento à pesquisa é de apenas R$ 11,6 milhões (+ R$ 12,1 milhões em créditos suplementares), segundo os números que constam no relatório do senador Marcio Bittar, relator-geral do orçamento no Congresso.

orçamento 2021

Fontes:PLOA – PLN 28/2020, com as alterações do Congresso Nacional e Consultoria de Orçamento do Senado Federal / via Agência Senado

Em sua fala na Câmara, Pontes ressaltou a importância dos investimentos em ciência para o desenvolvimento do País. “Se a gente investir em ciência e tecnologia, como todos os países desenvolvidos, a gente vai não só sair mais rápido da pandemia como recuperar a economia mais rapidamente também”, declarou o ministro. Ele disse que o governo planeja apresentar uma medida provisória para liberar recursos do FNDCT para os projetos de vacinas nacionais.

FNDCT

A proibição do contingenciamento de recursos do FNDCT, que era a grande esperança da comunidade científica para amenizar o impacto desse rombo orçamentário, acabou não se concretizando, apesar de ter sido aprovada no Congresso. A lei que altera as regras de funcionamento do fundo (Lei 177/2021) foi aprovada nas duas casas legislativas (Câmara e Senado) por ampla maioria no fim do ano passado. Além de proibir o contingenciamento do fundo de 2021 em diante, ela previa a liberação dos recursos que haviam sido contingenciados do fundo em 2020, abrindo uma perspectiva de liberação de R$ 9 bilhões para investimentos em ciência neste ano.

Ao sancionar a lei no início de março, porém, o presidente Jair Bolsonaro vetou esses dois dispositivos; preservando, assim, o contingenciamento do fundo. Começou, então, mais um grande esforço de entidades científicas e acadêmicas junto ao Congresso para derrubar os vetos do presidente e restaurar o espírito original da lei. O movimento é capitaneado pela Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento (ICTP.br), uma rede criada em 2019, que engloba várias organizações do setor.

A iniciativa deu certo. Em 17 de março, o Congresso derrubou um dos vetos do presidente — o que preservava o direito do governo de colocar recursos do FNDCT em reserva de contingência. (O outro veto, referente à liberação dos recursos contingenciados de 2020, foi mantido.) Em tese, com essa decisão do Congresso, os recursos do fundo estariam 100% liberados para investimento em ciência e tecnologia em 2021. O valor do FNDCT previsto no orçamento deste ano é de R$ 5,5 bilhões, dos quais R$ 5 bilhões (90%) foram alocados como reserva de contingência (ou seja, indisponível para investimentos em ciência e tecnologia, que é verdadeira finalidade do fundo), segundo os números que constam no relatório do senador Bittar.

Só que essa liberação não aconteceu. O Congresso demorou a encaminhar sua decisão ao Executivo e, assim, a derrubada do veto presidencial só veio a ser publicada no Diário Oficial da União nove dias depois, em 26 de março, um dia após a votação da Lei Orçamentária Anual (LOA 2021). Ou seja, o orçamento foi aprovado quando ainda estava valendo a versão original da Lei 177/2021 (com o veto presidencial em vigor) e, portanto, o contingenciamento de 90% do FNDCT permaneceu válido para este ano, apesar de o próprio Congresso ter aprovado uma lei que proíbe esse contingenciamento, e de as entidades científicas terem alertado amplamente este mesmo Congresso para a necessidade de a lei ser promulgada antes da votação do orçamento.

fndct

Importância do FNDCT – Imagem apresentada pelo ministro Pontes em audiência na Câmara

Fontes ouvidas pela reportagem acreditam que o atraso foi proposital. Seja como for, o imbróglio ainda não está resolvido: apesar de o orçamento ter sido aprovado no Congresso, a LOA que resulta dele ainda não foi promulgada (publicada no Diário Oficial da União), e a nova versão da Lei 177/2021 (sem o veto) já está valendo. Juridicamente, portanto, pode-se argumentar que a lei orçamentária, ao ser promulgada, precisará levar em conta o que está previsto na nova lei do FNDCT — que proíbe o contingenciamento. Seria “uma questão de coerência do Congresso Nacional, que votou pela derrubada dos vetos”, segundo o presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich, em texto divulgado pela entidade.

Outro caminho seria pressionar o governo a apresentar um projeto de lei para retificar o orçamento e destravar os recursos contingenciados do FNDCT. “Vamos usar todos os meios legais possíveis para pressionar o governo e o Congresso para que esses recursos sejam liberados”, disse o Jornal da USP o presidente da SBPC, Ildeu Moreira.

“O FNDCT é um mecanismo vital para o financiamento das atividades científicas e tecnológicas no País”, diz uma carta em defesa da liberação do fundo, assinada por mais de uma centena de conselheiros e ex-conselheiros técnico-científicos das unidades de pesquisa vinculadas ao MCTI, enviada ao Congresso no início de março. A carta chama atenção para a situação “bastante crítica” desses institutos, que “tiveram seus orçamentos reduzidos significativamente e seu quadro de pessoal drasticamente diminuído” ao longo do últimos anos.

“Se essas reduções de orçamento e de pessoal persistirem, o sistema dos institutos de pesquisa, em particular do MCTI, em breve entrará em colapso. Isto não trará qualquer economia para o País; ao contrário, deixaremos de contar com um componente importante no esforço de melhorar nossa situação socioeconômica”, alerta o documento. “Fortalecer a infraestrutura de institutos de pesquisas é um desafio importante para qualquer governo comprometido em melhorar a economia do país e o bem-estar dos seus cidadãos.”

Na audiência da Câmara, Pontes pediu ajuda dos parlamentares para “proteger” o CNPq e a Finep de “ideias malucas” que volta e meia surgem por aí e que “poderiam potencialmente destruir a estrutura do sistema de ciência, tecnologia e inovações no País”, como propostas de juntar as duas agências ou fundir a Finep com o BNDES.

fecho

Este foi originalmente publicado pelo “Jornal da USP”  [Aqui!].

Na trilha da campanha: Wladimir Garotinho oferece visão para ações em áreas estratégicas caso seja eleito

Em um esforço para oferecer clarificação sobre alguns aspectos que considero importantes para a próxima administração municipal, formulei quatro perguntas para serem respondidas pelos dois candidatos que participarão do segundo turno em Campos dos Goytacazes. Contactado, o candidato Wladimir Garotinho (PSD) já enviou suas respostas que publico logo abaixo. Convite similar já foi feito a Caio Vianna, e continuo aguardando a posição do candidato do PDT. Caso ele envie suas respostas, as mesmas serão também  publicadas na íntegra.

wladimir

Blog do Pedlowski (BP):  Um dos principais desafios que as áreas urbanas irão enfrentar nos próximos anos e décadas serão os efeitos das mudanças climáticas. Entre estes efeitos estão as chuvas extremas e os longos períodos de seca. Como você pretende atuar para deixar o município melhor preparado para responder a estes desafios?

Wladimir Garotinho (WP): É preciso equilibrar as contas e vou governar com pessoal técnico, capacitado e comprometido com a cidade, para recuperar capacidade de investimento em infraestrutura. Precisamos avançar com obras, há recursos do Banco Mundial, verbas federais e estaduais, vamos buscar diálogo para soluções de um grande projeto de irrigação. O atual governo não investiu nada em obras, que aquecem a economia, a construção civil, garantem mobilidade, preparam a cidade para os efeitos dessas mudanças climáticas. Vou integrar os órgãos da Administração Pública em nível municipal, estadual e federal, formar um plano de contingência.

BP: O município de Campos possui diversas instituições universidades que desenvolvem projetos de pesquisa com grande potencial de geração de renda. No entanto, até hoje não foi criada uma secretaria de Ciência e Tecnologia. Se for eleito, qual seria sua posição em torno da criação dessa secretaria?

WP: Eu sou deputado federal e em meu mandato uni partidos de diferentes linhas ideológicas para aprovar uma emenda coletiva para retomar as obras do campus da UFF, liberando mais de R$ 40 milhões. Quadros de universidades participaram de um grupo de mais de 114 técnicos, pesquisadores, professores, pessoas capacitadas, que durante 10 meses discutiram um projeto para a cidade. O nosso projeto para a cidade tem na inovação e na tecnologia uma prioridade para reduzir custos, garantir serviços e eficiência na gestão pública, e também para agregar valor à agricultura, à indústria, ao comércio, e atrair novas empresas e gerar oportunidades. Vamos discutir todas essas questões com os polos de ensino superior, dos centros de pesquisa, das universidades em um projeto de apoio ao processo de retomada da economia.

BP: município possui 11 assentamentos de reforma agrária que produzem grande quantidade de alimentos que em sua maioria acaba exportada para outros centros urbanos. Se eleito, o que faria para apoiar o desenvolvimento desses assentamentos e da agricultura familiar como um todo?

WP: Nós vamos apoiar o pequeno produtor local, vamos ajudar a organizar a agricultura familiar, com a participação das universidades, para agregar valor e gerar renda no campo. A nossa ideia é criar um selo municipal de qualidade de nossos produtos. Não basta produzir, mas também apoiar a distribuição, com um moderno centro de distribuição, que pode atrair pequenas indústrias para beneficiamento. Vou apoiar a organização dos pequenos produtores em modelo de associativismo e, por isso, vamos ter ao nosso lado as universidades, as instituições e centros de pesquisa e extensão, e também a Organização das Cooperativas do Brasil para inovar, capacitar, qualificar e ajudar a organizar a atividade produtiva.

BP: Há algo que eu não perguntei e que você acha importante falar para a população de Campos?

WP: O nosso governo vai ter o olhar voltado para as pessoas, para o cidadão. Vou montar uma equipe técnica para propor a modernização de nossa legislação, tornar mais ágil a estrutura pública para atrair e instalar novas empresas. Vamos instalar a Zona Especial de Negócios na Baixada Campista ao lado do Porto do Açu. Vamos governar com justiça social, reabrindo o Restaurante Popular e garantindo a segurança alimentar. Fazer com que as Vilas Olímpicas voltem a atender crianças, jovens e idosos. Estou me reunindo com técnicos, trabalhadores e empresas para a gente ter um transporte coletivo que funcione de verdade. E logo no início de nossa gestão vamos acabar com aquela estação de passageiros feita com tendas e banheiros químicos, toda improvisada. A mobilidade urbana eficiente oferece acesso a serviços públicos, irriga a economia no comércio, gera empregos.