Afinal, o que Ouvidoria da UENF ouve?

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Nas últimas semana, a “Ouvidoria da UENF” ganhou grande publicidade em função de não ter sido usada para a realização de uma denúncia sobre um suposto caso de assédio sexual contra uma estudante de graduação do curso de Ciências Sociais.  A grande reclamação da reitora da Uenf na reunião do Conselho Univeristário contra quem postou uma espécie de dazibao na porta de um banheiro  próximo de seu gabinete era de que a pessoa deveria ter procurado a Ouvidoria da Uenf em vez de usar, digamos assim, a via chinesa.

Rodrigo da Silva on X: "Em chinês se chama dazibao (大字報) e significa  “jornal mural afixado na rua”. Durante a Revolução Cultural, essa era a  rede social. Os chineses usavam esses murais

Em chinês se chama dazibao (大字報) e significa “jornal mural afixado na rua”

Pois bem, resolvi procurar a página da Ouvidoria da Uenf para saber mais das atividades desse que seria o mecanismo preferencial de encaminhamento de denúncias de supostos malfeitos que ocorram dentro da Universidade Estadual do Norte Fluminense.  Uma primeira coisa que me chamou a atenção na busca pela página da Ouvidoria é que não é uma coisa muito fácil encontrá-la, pois a mesma está depositada dentro do Portal da Transparência da Uenf, sem que esteja apartentemente visível em outros acessos.

Passada a fase do encontrar onde está, passei a analisar o que está informado na página da Ouvidoria. Uma primeira coisa é que a mesma está defasada, pois os últimos relatórios depositados se referem ao ano de 2022. Além disso, o mesmo ocorrendo com o montante de atendimentos feitos pela Ouvidoria que teria recebido 45 reclamações em 2022 (contra 44 em 2021, 35 em 2020, e 47 em 2019).

Os relatórios estatísticos  assinados pelo ouvidor da Uenf se mostram particularmente bastante opacos, pois apenas apresentam porcentagens dos tipos de reclamação, sem que haja, por exemplo, maiores explicaçõessobre o que seriam as reclamações, as razões para terem arquivadas ou atendidas, ou as questões objetivas que foram reclamadas, na medida em que só foram apontados os itens gerais em que as mesmas foram classificadas.

Uma curiosidade nos quatro relatórios disponibilizados, em um total de 181 reclamações não foi apontado de forma explícita que alguma delas tenha se referido a casos de assédio (moral ou sexual). A única indicação é de que em 2 dos 4 quatro quadrimestres de 2022, as reclamações teriam sido feitas contra posturas de docentes, sem que fosse explicitado quais. Mas nada nos relatórios aponta que tenham sido casos de assédio. Assim, das duas uma, ou na Uenf inexistem casos de assédio ou os que eventualmente ocorreram no período relatado não foram denunciados. 

Por outro lado, a não ser que os relatórios da Ouvidoria da Uenf estejam depositados fora da sua página oficial, o que fica demonstrado é que a Uenf não possui efetivamente o que canal que tem sido propalado, abrindo a hipótese de que o universo de problemas suscetíveis a serem apurados sejam bem maiores do que aqueles que viram reclamações.  Aliás, quem é o atual ouvidor da Uenf e qual é a duração, digamos, do seu mandato?

Finalmente, um problema com uma ouvidoria aquém da demanda existente é exatamente abrir caminho para que os eventuais malfeitos apareçam por outros canais, goste a reitoria da Uenf ou não. E, sim, que a atual conformação desse canal não o torna a panacéia que se andou apregoando desde que a notícia do dazibao foi divulgada no apagar das luzes da última reunião do Conselho Universitário da Uenf.