Quer saber o que acontece no Brasil? Leia a mídia estrangeira!

Não sei quem foi o criador do anúncio publicitário publicado na página oficial da emissora internacional da Alemanha, Deutsche Welle (Voz da Alemanha), na rede social Facebook (ver reprodução abaixo), mas quem o fez mandou uma mensagem poderosa para os brasileiros: esqueça a mídia corporativa nacional se quiser ficar minimamente bem informado.

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É que lendo apenas três reportagens postadas em inglês sobre as manifestações anti-Temer que ocorreram ontem em diversas partes do Brasil não há outra coisa a fazer a não ser notar que são coberturas totalmente opostas ao que se viu ontem e se vê hoje nos grandes veículos da mídia corporativa brasileira.

Nos casos da matéria da agência Reuters para os leitores estadunidenses, do jornal El País para a edição em português, e da rede estatal britânica BBC para os leitores ingleses, o que se vê é a ênfase no caráter pacífico das manifestações e na violência policial injustificada (no caso da PM de São Paulo) contra os que participavam dos protestos (ver reproduções das manchetes logo abaixo).

Eu convido a todo leitor deste blog que procure na cobertura nacional as reportagens sobre o que ocorreu ontem para verificar se a cobertura dada é similar ou não. Mas aviso logo aos navegantes para que não comecem suas buscas com muita esperança de que a mídia brasileira esteja atuando com a mesma imparcialidade e qualidade de apuração. É que se há alguma coisa que os clãs bilionárias que controlam a mídia corporativa brasileira não querem neste momento é que a informação flua de forma qualificada. Na verdade, como articuladores centrais do golpe de estado “light” contra Dilma Rousseff, a última coisa que eles querem é que isso ocorra. 

Felizmente, alguns dos grupos da mídia internacional não apenas possuem sucursais no Brasil, como também estão publicando edições voltadas para o público brasileiro. Caso os protestos continuem e aumentem de tamanho, a presença da mídia estrangeira certamente sofrerá restrições como a imposta a um jornalista da BBC que foi agredido ontem enquanto cobria a violência da PM paulista, apesar de ter se identificado com suas credenciais.  Entretanto, por enquanto é provável que possamos continuar podendo acessar as matérias publicadas por esses veículos.  

Em função do descompasso de coberturas, eu me arrisco a ir mais longe do que foi o anúncio da Deutsche Welle para afirmar que neste momento histórico preciso, nós vamos precisar mais do que nunca da opinião que vem de fora.

Finalmente, para quem quiser ler as matérias citadas da Reuters, do El País e da BBC, basta clicar ( Aqui!Aqui! e Aqui!)

 

Matéria do El País expõe a farsa que é a aplicação de multas ambientais no Brasil

Menos de 3% das multas ambientais cobradas no Brasil são pagas

Empresas poluidoras ou responsáveis por desastres protelam pagamento por meio judicial

AFONSO BENITES / HELOÍSA MENDONÇA Brasília / São Paulo 

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Localidade de Bento Rodrigues devastada após rompimento de barragem. / ROGÉRIO ALVES (FOTOS PÚBLICAS)

De cada 100 reais em multas aplicadas pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) desde 2011 para quem infringiu regras ambientais, menos de três reais entraram nos caixas do Governo federal. Os dados constam de um relatório do órgão que é entregue ao Tribunal de Contas da União (TCU) anualmente. Entre janeiro 2011 e setembro de 2015, foram aplicados 16,5 bilhões de reais em punições, por exemplo, a empresas que emitiram gases poluidores acima do limite aceitável, petroleiras responsáveis por derramamento de óleo no mar ou madeireiras que desmataram áreas proibidas, entre outros. Desse valor, apenas 494,2 milhões acabaram sendo efetivamente pagos pelas empresas infratoras.

O assunto ganha fôlego depois do acidente de Mariana que matou aos menos 11 pessoas, número que pode subir para 23, uma vez que outras 12 estão desaparecidas. No cálculo do Ibama ainda não está relacionada a multa de 250 milhões de reais aplicada à mineradora Samarco, responsável pelo desastre na cidade mineira de Mariana e no rio Doce, que atinge os Estados de Minas Gerais e o Espírito Santo. O rompimento de uma barragem desta mineradora, que é controlada pela Vale, a maior mineradora do Brasil, e pela australiana BHP (a maior do mundo), resultou em um tsunami de lama que devastou ao menos três municípios mineiros e já alcançou o estado do Espírito Santo.

Entre os motivos para se ter uma arrecadação tão baixa, em comparação com os valores de multas aplicados, é o excesso de recursos judiciais a que tem direito as companhias. Quando uma empresa recebe um auto de infração ela tem ao menos duas instâncias administrativas para recorrer dentro do próprio Ibama. Além disso, pode buscar um aparo do Judiciário para evitar ou protelar o pagamento.

O baixo número de autoridades julgadoras das ações administrativas – hoje são sete servidores com essa função nas últimas instâncias, em Brasília, para analisar cerca de 14.000 casos anuais –, também colabora para a lentidão nos julgamentos. Conforme fontes do Ibama, na área administrativa, um processo leva até três anos para ser concluído. Ou seja, com mais recursos financeiros, as empresas colocam seus advogados para brecar as punições com mais velocidade que os fiscais podem empregar para cobrar respeito à legislação. Assim, o Governo fica atrás com um funil para lidar com as agressões ao meio ambiente, que podem desembocar em tragédias como a de Mariana. A lentidão levou a milhares de crimes prescritos entre 2012 e 2013, quando 8.580 processos perderam o prazo legal para condenar os autores das infrações, segundo o relatório de gestão entregue ao TCU.

O Ibama tem defendido mudanças nas regras ambientais para alterar o limite de 50 milhões de reais. 

Há um esforço pela melhoria desse quadro há alguns anos. Em 2013, por exemplo, a média de tempo para a conclusão da análise de um auto de infração era de quatro anos e três meses. Em 2012, cinco anos e sete meses.

Os dados dos relatórios obtidos pelo EL PAÍS somados ao, em alguns casos, reduzido valor da multa em comparação com o tamanho do dano ambiental  – o teto das multas no Brasil é de 50 milhões de reais – implicam na precipitada sensação de impunidade. Ocorre que as multas não são o único instrumento para punir as empresas poluidoras ou responsáveis por desmatamentos. Para interferir no patrimônio das infratoras, o Ibama pode sugerir o embargo, a interdição ou a suspensão do registro de funcionamento. Sem poder funcionar, ela não consegue fazer o dinheiro circular e, algumas vezes, se vê forçada a pagar as multas e se adequar às regras ambientais. Isso tem ocorrido com frequência em relação às madeireiras que atuam principalmente na Amazônia.

Uma outra frente é inscrever as infratoras no Cadastro dos Inadimplentes do Governo Federal (Cadin). Uma vez com o nome sujo, as empresas não podem assinar contratos com a União nem obter uma série de benefícios como isenções fiscais ou créditos em bancos públicos

Mas, quando se compara o valor da multa inicial da Samarco (250 milhões de reais, somando cinco infrações, que vão da poluição dos rios ao lançamento de resíduos danosos à biodiversidade) com a paga pela British Petroleum, por exemplo, de 20,7 bilhões de reais pelo vazamento de petróleo no Golfo do México em 2010, a impressão é que o Brasil precisa ser mais rigoroso no assunto.

O Ibama tem defendido mudanças nas regras ambientais para alterar o limite de 50 milhões de reais. Na última quarta-feira, em uma audiência na Câmara dos Deputados que discutiu o desastre de Mariana, o diretor de proteção ambiental do órgão, Luciano Evaristo, externou essa posição do instituto. “Quando se limita uma autuação a 50 milhões de reais, o empreendedor que tem um custo de 500 milhões de reais para segurança vai preferir deixar tudo cair, porque o valor da multa será menor. Temos que rever esse valor máximo”, afirmou.

Apesar do valor das multas aplicadas pelo Ibama parecer pequeno diante do dano causado pela tragédia, o presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB Minas, Mário Werneck, ressalta que não se pode confundir essa penalidade com a indenização total que a Samarco terá que pagar. “Só com a finalização da ação civil pública será possível mensurar o que terá que ser repassado pela empresa para a recuperação ambiental da região afetada e a reparação dos danos às vítimas”, explica Mário Werneck.

“O que acontece aqui é que temos apenas 4 fiscais, estamos em cima de uma bomba atômica em Minas Gerais”.  Presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB Minas, Mário Werneck

Nesta quarta-feira, a mineradora recebeu uma nova notificação de multa. Dessa vez ,ela foi notificada pela Subsecretaria Estadual de Fiscalização de Meio Ambiente de Minas, que penalizou a mineradora em 112, 69 milhões de reais pelos danos ambientais causados pelo rompimento da Barragem Fundão, no início do mês. A Samarco confirmou o recebimento da notificação e terá o prazo de até 20 dias do recebimento do auto de infração para pagar a multa ou apresentar a defesa.

A pressão sobre a mineradora deve crescer com uma ação conjunta que deve ser impetrada pelo Governo de Minas Gerais e Espírito Santo na Justiça, segundo informa o O Estado de S. Paulo deste sábado. O governador capixaba Paulo Hartung afirmou ao jornal que um processo do gênero foi adotado nos Estados Unidos pelos Estados atingidos pelo vazamento da BP em 2010. O desastre de Mariana ganhou a boca do povo no Brasil e a cobrança por uma punição tem sido crescente. Nesta sexta, o vocalista da banda Pearl Jam, Eddie Vedder, que se apresentava em Belo Horizonte, capital mineira, leu um texto em português para falar do desastre de Mariana. “Esperamos que eles sejam punidos, duramente punidos para que nunca esqueçam o triste desastre causado por eles”, disse ele, para delírio da plateia.

Multas anistiadas

Com um programa de concessões em infraestrutura lançado este ano, que prevê investimentos de até 200 bilhões de reais, o Governo brasileiro deve ser cada vez mais cobrado por uma legislação ambiental eficiente diante dos problemas que tendem a surgir nesses empreendimentos. Atualmente, além das multas ambientais não serem pagas pela maioria das empresas, algumas infrações são anistiadas por falta de recursos para bancar os custos dos processos judiciais. Em agosto, o governador mineiro, Fernando Pimentel (PT), sancionou uma lei que permite ao Sistema Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) anistiar multas ambientais de até 15.000 reais que foram emitidas até o fim de 2012. A medida também será aplicada para infrações de até 5.000 reais que foram notificadas em 2013 e 2014 e deve anistiar cerca de 120 mil multas.

“Um processo de cobrança judicial, hoje, para o Estado de Minas Gerais, custa em torno de 16 mil reais, segundo cálculos da Advocacia Geral do Estado. Qualquer cobrança de crédito abaixo desse valor significa que o Estado paga para receber”, explicou o secretário de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Sávio Souza Cruz por meio de nota enviada pelo Sisema.

Werneck é contra a medida já que, segundo ele, muitas empresas já deixam de pagar porque sabem que serão anistiadas. “Se eu aplico multas elas precisam ser cobradas, mas a verdade é que não há um corpo técnico para atuar. Se eles resgatassem essas multas poderiam inclusive aumentar o pessoal, a fiscalização. É um absurdo”, explica.

Para o presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB Minas, Mário Werneck, é preciso estudar um novo modelo de barragem e aplicar uma maior fiscalização da atividade já que, segundo ele, Minas Gerais possui 450 barragens de rejeitos e 45 delas estão com as licenças desatualizadas, à espera de revalidação. “Mas o que acontece aqui é que temos apenas quatro fiscais. Estamos em cima de uma bomba atômica em Minas Gerais”.

FONTE: http://brasil.elpais.com/brasil/2015/11/19/politica/1447971279_540766.html

O pior dos racismos é o da cor da alma

O mundo seguirá sendo violento e despedaçado enquanto pensarmos que nossa alma de privilegiados é mais nobre do que a dos despossuídos

Por JUAN ARIAS 

Existe um racismo da cor da pele e outro da cor da alma: o que admite que nem todos os seres humanos têm o mesmo direito à felicidade. Qual deles é o mais perigoso e atroz?

No fundo, ambos afetam o mesmo sujeito: os que dispõem de menos recursos, sempre os mais pisoteados. Talvez porque, no fim das contas, consideramos que se tratam de humanos inferiores, dos quais o poder tem menos medo, até que um dia se cansam de ser humilhados, despertam e põem tudo de pernas para cima.

Digo isto porque me tocaram algumas declarações de Joseph Blatter, presidente da FIFA, em relação às manifestações de protesto com os esbanjamentos da Copa do Mundo que será disputada no Brasil. “É impossível deixar todos felizes”, disse, e adicionou: “O mundo mudou e sempre existe alguém que não está feliz”.

O que Blatter quis dizer? Que existem os que têm direito de ser felizes e os que não têm? E quais são esses que segundo ele “é impossível fazer felizes”?

Certamente não se referia aos privilegiados que poderão desfrutar ao vivo das partidas com direito a um palco de luxo, como no Rio de Janeiro, que custou mais de cem milhões de reais e que somente eles poderão usar.

Os que, de acordo com o dirigente da FIFA, deveriam abandonar a ideia de fazer manifestações durante a Copa para pedir melhorias de vida, são, claro, os mais despossuídos, os que necessitam lutar para que aumentem seus salários porque a inflação os come. Os que querem ter serviços públicos dignos de seres humanos.

Os senhores da Fifa deveriam ter mais memória histórica quando atacam os protestos

Os senhores da FIFA – alguns dos quais com descaramento chegaram a pedir que a Copa seja uma grande festa pois o que “foi roubado, já está roubado” – deveriam ter mais memória histórica quando atacam as manifestações de protesto e de reivindicações dos cidadãos.

Talvez tenham esquecido que, sem está pressão das ruas, muitas ditaduras e muitos tiranos nunca teriam caído de seu pedestal. Nem teria sido derrotada a escravidão ou o apartheid e ainda teríamos ônibus e banheiros diferentes para negros e brancos.

Sem as manifestações de protesto, as mulheres não teriam conseguido nunca o direito ao trabalho, ao voto e ao estudo. Nem teriam direitos os sexualmente diferentes.

Sem a pressão dos trabalhadores, o mundo do trabalho seguiria sem férias, trabalhando 20 horas e sem amparo legal.

Todas as grandes conquistas das minorias e dos despossuídos foram feitas historicamente com a rebelião contra quem se empenhava em considerá-los seres humanos de segunda classe.

Alguém poderia dizer que tudo isto já foi conquistado e que, como pensa o dirigente da FIFA, ainda assim nem todos podem ser felizes. Ou seja, que devemos aceitar que existem os que devem ser sempre menos dos que os outros.

Li também que o Governo do Brasil se empenhou em taxar alguns produtos para arrecadar mais. Tentem imaginar de quais produtos se tratam: Talvez o luxo dos que têm mais? As grandes fortunas? Bebidas e alimentos importados? Joias preciosas?

Não, decidiram taxar o “luxo dos pobres”, como a cerveja e os refrigerantes, umas das poucas satisfações que ainda podem permitir-se os que ganham por volta de mil reais.

Os milhões de pobres saídos da miséria, aos que agora a FIFA pede para que fiquem tranquilos em casa vendo as partidas, sem fazer ruído nas ruas, tinham até começado a sonhar com alguns produtos geralmente consumidos pelos que estão bem, como o iogurte, filé e até um shampoo. Ou uma garrafa de vinho de 20 reais.

Hoje o furacão da inflação os trouxe de volta à realidade e estão voltando o arroz e feijão, a farinha de mandioca com ovo cozido, e alguma carne de terceira ou embutidos baratos para o típico churrasco entre amigos aonde não podem faltar a cerveja e o refrigerante. E agora?

Se lhes taxam a lata de cerveja e a garrafa de refrigerante, o que vão deixar para eles? A água? Nem isto porque também está na mira dos próximos aumentos.

Os pobres que antes bebiam qualquer água que encontravam para não ter pagar por ela, o que supunha um crescimento de doenças intestinais por muitas vezes estar contaminada, tinham começado a comprar, como um luxo, sobretudo para seus filhos, garrafões de água de 20 litros a quatro reais. Hoje já estão pagando oito reais no mercado e ainda pensam em aumentar o preço o que os faria voltar a beber a que encontram de graça no primeiro poço artesiano que virem, contaminada ou não. Falta água em um país que conta com 20% da água potável do planeta.

É incrível que para os pobres tudo parece muito. Para a FIFA até a felicidade deles é demasiada.

“Para que querem comprar iogurte se nem gostam disso?”, escutei uma madame falar em um mercado ao ver uma faxineira examinando os preços dos iogurtes.

Poderiam dizer a mesma coisa da água: “Não beberam a vida inteira a água do poço?” E até justificam o aumento do luxo da cerveja: “assim ficam menos bêbados”. O porre de uísque escocês é mais nobre

Se taxam a lata de cerveja e a garrafa de refrigerante dos torcedores, o que vão lhes deixar? A água?

As vezes nos parece um luxo para os pobres o que para nós é visto como normal.

Li que outra senhora se escandalizou porque uma de suas empregadas comprou um perfume que ela considerava exagerado para sua categoria. Devia pensar: “para que os pobres se perfumam?”. Talvez seja por isto que entre os produtos a ser taxados estejam também os cosméticos em geral. Assim, os pobres voltam para sua “água com sabão” que é o que pensamos que os pertence. Para que eles querem usar shampoo?

Hoje os governos fazem esforços para oferecer receitas contra a desigualdade para que os pobres possam também entrar na ciranda mágica do consumo. É justo, mas não basta.

O que devemos mudar é o chip de nosso cérebro, porque não existem seres humanos considerados de primeira e de segunda classe; não é certo que os que estudaram menos, por exemplo, apresentem maior inclinação para a violência ou sejam menos sensíveis à beleza ou ao luxo. Ou que tenham menor senso de honra e de dignidade. As piores violências e desonestidades se escondem nos palácios do poder.

Enquanto mantivermos aberta esta brecha de desigualdade vista como algo quase genético entre os da classe de cima e os da de baixo, entre os que têm direito de saborear certos manjares e de apreciar certos luxos e os que “não entendem destas coisas”, seguiremos alimentando o pior dos racismos, que já não é somente o da cor da pele, e sim o da cor da alma. São Tomás chegou a duvidar que as mulheres tivessem alma. Do mesmo modo há quem gostaria de pensar desta forma dos pobres, que na prática, acabam sendo considerados seres humanos inferiores que não podem querer desfrutar e sentir como os que tiveram o privilégio de nascer em berço mais abastado.

E entretanto, como dizia o carnavalesco da Beija Flor, das favelas do Rio, Joãosinho Trinta: “Pobre gosta de luxo. Quem gosta de miséria (alheia) é intelectual”. E provava sua afirmação recordando que as novelas brasileiras mostram sempre um cenário de luxo e riqueza e são seguidas com fervor pelo pobres. E as fantasias de carnaval são uma exibição de dourados e luxo artístico.

Sempre me pareceu doentia esta paixão de alguns europeus ou norte-americanos para visitar, quando chegam no Brasil, uma favela, que, além de tudo, deve ser o mais pobre e violenta possível. É como se fossem visitar feras em um zoológico.

Levamos uma vez alguns espanhóis para visitar uma favela pacificada do Rio, mas lhes pareceu pouco excitante e foram conhecer uma com emoções mais fortes.

Nosso mundo seguirá sendo violento e despedaçado enquanto pensarmos que nossa alma de privilegiados é mais nobre e refinada que a dos despossuídos. Nos dói inclusive quando vemos que são capazes de desfrutar de uma dose maior de felicidade que nós e com menos recursos.

Nunca me esquecerei de uma cena que observei, da rua, por acaso, em um restaurante de luxo de um dos cafés da mítica e fascinante praça de San Marcos, em Veneza. Um casal já de idade, e com todas as características visíveis de quem tem dinheiro de sobra, estavam, do lado da janela, jantando com ar aborrecido e em silêncio, em um dos lugares mais especiais, mais românticos e mais caros do mundo.

Saíram em seguida do restaurante e o garçom retirou os pratos quase intactos de lagosta e caviar e os copos de cristal de Murano ainda cheios de champanhe, enquanto a senhora se embrulhava em um abrigo de pele de visão. Era inverno.

Naquele momento me veio à memória os churrascos barulhentos de meus amigos brasileiros pobres onde no final da festa, com direito a dança, só sobram os ossos de frango. E com os ossos, um clima de festa e amizade.

Parece, entretanto, que até a alegria e a camaradagem, que é o maior luxo dos pobres, acaba por nos irritar. “Do que riam tanto?”, escutei algumas pessoas dizerem comentando uma festa alegre de gente simples, mas feliz, na pequena cidade de pescadores próxima do Rio onde moro.

Talvez ignoremos que riem e se divertem muitas vezes, com o pouco que têm, também para não chorar. Ou também consideramos um luxo as lágrimas dos pobres derramadas no silêncio anônimos de suas vidas?

FONTE: http://brasil.elpais.com/brasil/2014/06/09/opinion/1402336433_239878.html

El País: falência do Grupo OGX lança sombra na economia do Brasi

Jornal do Brasil

eike açu

A ascensão e queda do Império X, do ex-bilionário Eike Batista, é destaque do jornal espanhol El País, nesta segunda-feira (4/11). A reportagem intitulada “Falência do milionário da OGX lança sombras na economia brasileira”, coloca Eike no ranking dos homens mais ricos do mundo e afirma que o seu sonho era chegar ao topo da lista. O El País destaca que o empresário brasileiro estava presente em diversos setores sociais, como petróleo, construção naval, minerais, incluindo ouro e diamantes, mas “seu castelo desmoronou.

A falência do grupo OGX, a maior empresa da América Latina, chegou “cruelmente” neste fim de semana, informa o jornal espanhol. A despedida de Eike teve início há alguns meses, quando ele deu sinais da sua “despedida” das redes sociais, assim como a sua saída da Bolsa de Valores de São Paulo, onde as ações de seus negócios despencou.

O El País classifica a trajetória de Eike como “a maior catástrofe financeira do Brasil e sua derrota pegou a todos os cidadãos de surpresa. O presidente mais popular do Brasil, Luis Inácio Lula da Silva, lamentou o declínio do empresário que era o cartão postal do país, que queria conquistar o mundo com a sua criatividade empreendedora e otimismo quanto a nação. “Ninguém queria ficar de fora. A seus pés caiu a Petrobras”, cita o El Paìs. Após o episódio do campo de petróleo de Tubarão Azul, que não tinha um terço do petróleo anunciado por Eike, o jornal espanhol lança um questionamento quanto o pré-sal brasileiro, que pode levar o Brasil à colocação de um dos países mais ricos do mundo.

“E para ficar claro que os grandes bancos eram públicos, apoiados por políticos de peso, que abriram as portas para o milionário brasileiro e dando o dinheiro que era dos cidadãos. Isso pode criar um problema agora quando se trata de financiar outras empresas”, destaca o El Pais. O veículo cita que, no Rio de Janeiro, ficaram órfãos uma série de projetos em andamento que deveriam ser financiados pelo magnata Batista, a partir da reestruturação de áreas inteiras da cidade, tendo em vista os Jogos Olímpicos 2016, projetos sociais de grande escala nas favelas ‘pacificadas'”, diz o texto. Segundo o jornal, tudo foi desfeito como uma “bolha de sabão”, inclusive o monumental estaleiro situado em São João da Barra, no Norte Fluminense.

“Hoje, os brasileiros se perguntam se Batista deve ser o modelo para esta galáxia de jovens empreendedores, que se tornam mais numerosos e ansiosos para ter sucesso.(…) O Brasil deve agora olhar para o outro lado, para outros modelos de negócios, talvez mais longe dos rankings planetários e revistas de fofocas, mas com menos risco de falhas desanimadoras”, diz o texto do El País.

FONTE:http://www.jb.com.br/internacional/noticias/2013/11/04/el-pais-falencia-do-grupo-ogx-lanca-sombra-na-economia-do-brasil/