As reinações de Cláudio Castro: em uma dia “uma megaoperação”, no outro a “bot farm” entra em ação para legitimar a matança

Cláudio Castro se tornou um símbolo da guerra híbrida: o cantor católico transformado em governador acidental, agora nada em um mar de sangue, enquanto número de seguidores nas redes sociais sobe exponencialmente

A suposta “megaoperação policial” determinada pelo governador Cláudio Castro ganha ares de outro tipo de guerra, a híbrida, ao se ver a mídia corporativa propalanda acriticamente a informação de que o ex-cantor católico amealhou o impressionante número de 1 milhão de novos seguidores enquanto a população empilhava os corpos dos mortos pelas forças policiais que ele enviou para os complexos de favelas da Penha e do Alemão.

A primeira coisa que me ocorreu foi uma reportagem que eu acabei de ver sobre as chamadas “bot farms” (ou grosseiramente traduzidas como “fazendas de cliques”) que na prática são redes organizadas que utilizam grandes quantidades de contas automatizadas (bots) e, por vezes, até mesmo dispositivos físicos como celulares, para manipular a percepção online e simular um comportamento humano e engajamento falsos em larga escala. A Thales relata que, em 2024, o tráfego automatizado de bots representou 51% de todo o tráfego da web , a primeira vez em uma década que ultrapassou a atividade humana online.

Fazenda de Bots controlada por IA.

Quem estuda as bot farms já detectou que a operação delas se baseiam em: a) automação onde são Utilizados softwares programados para executar tarefas repetitivas automaticamente, imitando ações humanas como clicar, seguir, curtir, comentar e visualizar conteúdo; b) uso de infraestrutura física que milhares de dispositivos móveis (como celulares empilhados em racks) para executar as tarefas, tornando mais difícil para os sistemas de detecção identificarem as atividades como não-humanas, e c) na criação de contas falsas que gerenciam inúmeras contas em plataformas de redes sociais, lojas de aplicativos, sites de streaming e e-commerce. Também é sabido que as bot farms contribuem para a degradação do ambiente digital, tornando difícil distinguir entre engajamento real e artificial, o que prejudica a confiança nas informações e plataformas online.

O que nem sempre é dito é que as bot farms são operadas por todas as forças políticas, e estudos de instituições como a Universidade de Oxford e a Freedom House indicam que o uso de bots e “ciber-tropas” é prevalente tanto por governos e partidos de direita quanto de esquerda, dependendo do país e do momento político. Assim, em princípio, esta ferramenta é ideologicamente neutra; o que varia é quem a emprega para atingir seus objetivos. Mas é mais prevalente por aquelas forças que possuem recursos financeiros poderosos e que utilizam as farm bots para controlar a narrativa pública, silenciar a dissidência e solidificar o apoio ao poder estabelecido.

Um caso que tornou o Brasil um país notório pelo uso das bot farms foi a operação massiva pela forças de extrema-direita durante as eleições gerais de 2018, onde foi notório que redes de bots foram usados para realizar disparos em massa de mensagens via WhatsApp para influenciar o debate público e disseminar desinformação. 

Há ainda que se dizer que a mídia corporativa ao propalar certas versões da realidade são grandes alimentadoras das bot farms, na medida em que elas não apenas reproduzem os conteúdos disseminados pela mídia, mas como também orientam a produção de mais conteúdo, em uma espécie de retroalimentação de versões falsas da realidade (ou seja há uma combinação/parceria entre a mídia corporativa e operadores das bot farms para orientar a percepção de realidade entre pessoas reais).

É nesse contexto de cooperação que a mídia corporativa legitima de forma inquestionada e acrítica, a informação de que Cláudio Castro amealhou 1 milhão de novos seguidores poucos dias após a “megaoperação” nos complexos de favelas do Alemão e da Penha. Simples, mas tragicamente óbvio.

What Are Bot Farms & How Do They Work? | Anura

O que também me parece óbvio é que em 2026, a bot farms vão estar funcionando a todo vapor, e que será inútil tentar vencer o combate político nas redes sociais. Se as forças de esquerda desejarem ter alguma chance, elas terão que gastar muita sola de sapato. É que nas redes sociais e nos aplicativos de mensagens, a extrema-direita reinará soberana por causa dos investimentos que já estão sendo feitos para favorecê-las, incluindo a grana que virá de outros países.