Por Gerson Teixeira

Membros da bancada ruralista estão apreensivos com o crescimento que vem sendo observado na arrecadação do ITR – Imposto Territorial Rural. Já convocaram reunião de Audiência Pública na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados para o debate do tema e a definição de estratégias a respeito. Aprovada no dia 26 de março, a reunião contará com as participações da Receita Federal do Brasil – RFB; Confederação Nacional de Municípios – CNM; Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil – CNA; Associação Brasileira dos Produtores de Algodão – ABRAPA; e Associação Brasileira dos produtores de Soja – APROSOJA BRASIL.
O ‘sinal de alerta’ foi dado pela arrecadação verificada em 2013 que alcançou o valor de R$ 848 milhões, resultado 225% superior ao valor arrecadado no exercício de 2006 (preços correntes).
É de amplo conhecimento que desde sempre a tributação sobre a propriedade fundiária rural no Brasil foi desprezível, mantendo-se, na última década, em valor máximo anual em torno de R$ 300 milhões.
Ainda que distante de traduzir o seu potencial fiscal, a receita proporcionada pelo ITR em 2013 correspondeu a 0.2% do Valor Bruto da Produção Agropecuária, resultado que de todo o modo equivaleu a um salto de 100% em relação à mesma razão no ano de 2006. A Tabela a seguir apresenta a evolução da arrecadação do ITR, de 2006 a 2013, em valores correntes.
| Ano | Valor Arrecadado- R$ 1 milhão |
| 2006 | 261,9 |
| 2007 | 379,2 |
| 2008 | 469,8 |
| 2009 | 474,5 |
| 2010 | 526,4 |
| 2011 | 602,7 |
| 2012 | 677,4 |
| 2013 | 847,8 |
Fonte: RFB
O baixo desempenho histórico da arrecadação do ITR tem sido justificado pela sua natureza extrafiscal, vez que, a função tributária propriamente dita do ITR supostamente teria a finalidade de punir o latifúndio improdutivo e os grandes imóveis que, em geral, não cumpram a função social. Em suma, seria um tributo auxiliar aos objetivos do programa de reforma agrária. Contudo, o ITR jamais teve relevância fiscal; tampouco, efeitos virtuosos nos planos ambiental e fundiário.
Na expectativa de fragilizar ainda mais o ITR, os ruralistas, com o apoio da Receita Federal que jamais se interessou pelo tributo, conseguiram a viabilização de uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional) propondo a transferência aos Municípios, por opção destes, das atividades de fiscalização, lançamento dos créditos tributários, e da cobrança do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural. Como contrapartida os Municípios contariam com a integralidade da receita gerada pelo tributo.
Do processo legislativo correspondente resultou a Emenda Constitucional nº 42, de 2003, transformada no inciso III do § 4º do art. 153 da CF, regulamentado pela Lei nº 11.250, de 2005, e Normas posteriores.
Vale assinalar que, diversamente do processo de municipalização do tributo que perdurou de 1961 a 1964, por força da Emenda Constitucional nª 5, no caso presente foi preservado o caráter federal do ITR, i.e, manteve-se a competência da União na legislação e na administração geral do tributo, neste caso, exceto nas atividades fiscalização e cobrança remetidas para a esfera municipal por opção das respectivas prefeituras.
O que os ruralistas não previram era que os prefeitos passassem a vislumbrar o ITR como um instrumento para a viabilização de algum espaço fiscal ante um contexto de oposição entre receitas e restrições da LRF, demandas sociais crescentes e necessidade de contrapartidas financeiras dos municípios aos programas federais.
Em decorrência 1.901 celebraram Convênios com a RFB desde 2008 (posição de início de abril de 2014), dos quais, 1.221 no ano de 2009.
Como seria previsível os municípios dos estados do sudeste, sul e depois centro-oeste são os que concentram o maior número de convênios firmados, conforme ilustra a figura abaixo.
ITR – Número de municípios com convênios firmados com a RFB por UF
Por fim, cumpre enfatizar que o crescimento da arrecadação do ITR na esfera dos Municípios não justifica a decisão pela ‘desfederalização’ dessas atividades. Com certeza, a RFB poderia produzir resultado fiscal muito superior ao conseguido pelos municípios caso não qualificasse o ITR como um ‘imposto podre’.
Afora esse fato, ao renunciar à centralização plena do ITR a União renunciou a possibilidade do uso simétrico em todo o país de um instrumento potencialmente poderoso de regulação fundiária e ambiental.
Gerson Teixeira é presidente da Associação Brasileira de Reforma Agrária – ABRA.
