Painel Acadêmico: Currículo Lattes de cotado para Ciência e Tecnologia mostra pouca relação de bispo com a área

Sem iniciação científica, mestrado ou doutorado, presidente do PRB é autor apenas de um livro e de um artigo publicado em uma coletânea

Igor Truz | São Paulo 

As notícias sobre a indicação de um pastor evangélico para o comando do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação movimentou a comunidade científica brasileira nos últimos dias. Bispo licenciado da IRUD (Igreja Universal do Reino de Deus) e presidente do PRB (Partido Republicano Brasileiro), Marcos Pereira deve ser o nome escolhido pelo vice-presidente Michel Temer para o comando da pasta com o eventual afastamento de Dilma Rousseff da presidência da República na semana que vem.

Foto: Reprodução/ Youtube/ Fernando Rodrigues

Bispo licenciado da Igreja Universal, Marcos Pereira deverá ser o ministro da Ciência e Tecnologia no governo Temer

Nesta quarta-feira (4/5), Pereira rebateu as avaliações negativas de entidades e especialistas sobre sua provável indicação. Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o pastor garantiu não misturar religião com ciência e, praticamente antecipando um “sim” ao convite, disse que os críticos deverão se surpreender com sua atuação à frente da pasta.

“Religião é uma questão de foro íntimo. Nunca misturei religião com trabalho ou com política”, disse o provável novo chefe da pasta que, desde sua criação em 1985, tem como principal objetivo fomentar e coordenar políticas nacionais de pesquisa e desenvolvimento.

No entanto, questões ecumênicas à parte, o pastor não tem muita experiência com o ambiente científico. De acordo com seu currículo Lattes, que foi colocado no ar nesta quarta-feira (4/5)*, sua carreira acadêmica se restringe a uma graduação em Direito pela Unip (Universidade Paulista) e uma especialização lato-sensu em Direito e Processo Penal pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo.

A monografia para conclusão no curso (com duração de um ano e meio) do Mackenzie originou a única publicação de Pereira, o livro O Uso da Informação como Notícia do Crime Ambiental. Além do livro, o currículo também aponta que o presidente do PRB é coautor do artigo Segurança do Estado e Comunicação Social, publicado em 2012, como um capítulo do livro Estudos Jurídicos, da editora Ribeirão Preto. Nenhuma das publicações aconteceu em uma revista científica ou plataforma semelhante.

O provável novo ministro também não estudou ou trabalhou em alguma universidade pública. Também não há registros de cursos de mestrado e doutorado concluídos ou em desenvolvimento.

Contudo, mesmo com curta carreira acadêmica, o bispo licenciado já atuou como professor universitário. Entre 2010 e 2012, foi professor do IDP (Instituto Brasiliense de Direito Público), instituição fundada em 1998 pelo ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal).

Pereira também é membro-fundador da Comunidade de Juristas e Língua Portuguesa e integra a Comissão Especial de Direito Empresarial da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

Criada e mantida pelo CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), a Plataforma Lattes reúne informações acadêmicas sobre pesquisadores e é uma das principais referências para a comunidade científica brasileira.

Sucesso na política

Também com pouca experiência, Pereira alcançou sucesso na política. Mesmo sem exercer nenhum cargo público até aquele momento, foi eleito presidente do PRB em 2011 e, no ano passado, reeleito por aclamação.

O pastor é apontado como um dos principais responsáveis pelo crescimento exponencial do Partido nos últimos anos. Em sua gestão, o PRB aumentou de 8 para 22 o número de deputados federais no Congresso Nacional. No Senado, o Partido é representado pelo bispo Marcelo Crivella.

O crescimento na Câmara dos Deputados foi impulsionado pelos votos alcançados por Celso Russomanno nas últimas eleições. Com mais de 1,5 milhão de votos, o apresentador da Rede Record –emissora da qual Marcos Pereira foi vice-presidente – foi o candidato a deputado federal mais lembrado nas urnas na eleições de 2014.

Lançado por Pereira como candidato à prefeitura de São Paulo, Russomanno foi o “fenômeno” das eleições municipais de 2012. O apresentador liderou as pesquisas de intenção de voto durante boa parte da campanha eleitoral e foi derrotado por Fernando Haddad (PT) apenas no segundo turno. No pleito, desbancou nomes tradicionais da política nacional, como o ex-governador de Sâo Paulo José Serra (PSDB).

Atualmente, ao lado do PSC (Partido Social Cristão) e sob o comando do bispo licenciado, o PRB é o principal partido na Bancada Evangélica no Congresso Nacional.

(*) A reportagem de Painel Acadêmico tentou acessar, sem sucesso, o currículo Lattes de Marcos Pereira nesta terça-feira (3/5). O link foi cedido hoje pela assessoria do presidente do PRB, que informou que as informações não estavam no ar porque estavam sendo atualizadas. 

FONTE: http://painelacademico.uol.com.br/painel-academico/6491-curriculo-lattes-de-cotado-para-ciencia-e-tecnologia-mostra-pouca-relacao-de-bispo-com-a-area

Maurício Tuffani reflete sobre a escolha do bispo da IURD para dirigir MCTI

temer pereira

Pior que Temer e seu ministro da Ciência foi não duvidarmos que a notícia fosse verdade

Por Maurício Tuffani

Peço desculpas aos leitores deste blog jornalístico de ciência por manter como destaque o mesmo assunto de ontem. Mas não há como deixar de registrar a terrível constatação a que chegou este blogueiro ao final do dia, ao fazer um balanço das reações na internet à escolha do presidente nacional do PRB, o pastor Marcos Pereira — bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus — pelo vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP) para ser o titular do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) se a presidente Dilma Rousseff for afastada de seu cargo.

Desta vez não fomos capazes de duvidar ou até mesmo de não levar a sério. Diferentemente das reações a inesperadas e anedóticas escolhas da presidente reeleita Dilma no final de 2014 para seu novo ministério — como a do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) para o MCTI e a do então presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine, para a Petrobras —, desta vez, salvo por raríssimas exceções nas redes sociais, ninguém achou que a notícia sobre Temer e Pereira fosse intriga política ou até mesmo pegadinha. O próprio Sensacionalista demorou muito para publicar a piada da tomada dos três pinos. Pode ser um sinal de que não somos mais os mesmos debochados brasileiros de sempre.

Além de enquadrar e reduzir todos os assuntos e de pulverizar nosso caráter nacional do “homem cordial”, descrito pelo historiador Sérgio Buarque de Hollanda em “Raízes do Brasil” — OK, tudo bem, já é sabido que teóricos posteriores criticaram essa concepção —, a polarização político-ideológica que se intensificou a partir das eleições de 2014 parece já ter roubado definitivamente de nós até mesmo nossa capacidade não aprender depressa a chamar de realidade o que quer que seja.

Em meio a tudo o que está nos deprimindo, estamos ficando cada vez  mais sem graça e, pior, menos irreverentes. Sempre fomos majoritariamente conformistas, nunca tivemos um passado verdadeiramente glorioso. Mas era um conformismo temperado pela irreverência. Se estas reflexões forem corretas, nosso risco maior é partirmos para um conformismo cínico, indiferente e, pior ainda, temperado pela polarização política burra que está obstruindo nossa capacidade de refletir.

FONTE: http://www.diretodaciencia.com/2016/05/04/pior-que-temer-e-seu-ministro-da-ciencia-foi-nao-duvidarmos-que-a-noticia-fosse-verdade/

De volta para a Idade Média: Temer planeja entregar Ministério da Ciência e Tecnologia para bispo da IURD

Muito tem se falado sobre os planos nefastos que estariam sendo engendrados pelo vice-presidente Michel Temer após a tomada do poder presidencial via o impeachment da presidente Dilma Rousseff.  Muitas desses anúncios me parecem ser a repetição da velha estratégia do “bode na sala”: primeiro se anunciam muitas desgraças, e depois se aprova aquela que realmente se quer.

Agora, como professor universitário e pesquisador, um anúncio que me faz pensar que o que está ruim ainda pode piorar muito foi transmitido pelo jornalista Maurício Tuffani no seu blog “Direto da Ciência” (Aqui!). É que segundo Tuffani,  Michel Temer estaria  planejando usar o Ministério de Ciência e Tecnologia (MCTI) como moeda de troca ao entegá-lo ao  presidente do partido, Marcos Pereira, que também é bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD).

Se confirmando essa indicação, o que teremos é uma regressão histórica no próprio entendimento do que vem a ser ciência e tecnologia, já que não é preciso ser nenhum Einstein para perceber que um bispo neopentecostal no cargo que dirige o ministério responsável por seu desenvolvimento não vai dar em coisa boa para o país.

Mas então por que Michel Temer iria fazer isso? Apenas em nome da acomodação de cargos e partidos no seu ministério? Pessoalmente acredito que não é só isso, pois cargos e ministérios para serem ocupados é o que não falta em Brasília.  O que parece estar se anunciando é uma guerra aberta ao pensamento crítico que apenas a ciência pode gerar. 

Em outras palavras, as trevas inauguradas pela Ampla Energia no dia de ontem na Casa de Cultura Villa Maria da Uenf são apenas o prenúncio do que está por vir no Brasil.