
Dizem conhecidos meus que labutam nas forças de segurança pública, que quando se inaugura uma investigação policial, basta responder às seguintes perguntas: O quê, quem, quando, onde, como, por quê e tem testemunhas?
O trabalho policial se resume a isso, ou melhor, é tudo isso, porque não é pouca coisa estabelecer as respostas a tais quesitos, de forma a oferecer ao Ministério Público a robustez de provas (ou indícios) para a propositura de uma ação penal.
O relatório do caso Marielle, com suas quatrocentas e tantas páginas, não responde a uma pergunta sequer. As respostas trazidas aos autos pela Polícia Federal (PF) já estavam no trabalho da Polícia Civil do Rio de Janeiro, isto é, os executores, a arma do crime, o veículo.
Todo o resto são ilações, e é bom que se diga, algumas corretas, do ponto de vista sociológico, antropológico e da ciência política. No entanto, a respeito das provas necessárias para “encerrar o caso”, como foi dito pelo Ministro da Justiça, ombreado pelo Diretor Geral da PF, é possível afirmar que não existem.
Não bastassem tais lacunas, há contradições graves, senão: ora, como imaginar que o grupo de mandantes teria contratado um delegado, feito dele chefe de polícia, e ele ter prendido justamente o executor do crime, e a delação deste executor tenha se transformado na pièce de résistance de toda a investigação?
Ao mesmo tempo, como aceitar a tese de que este delegado tenha orientado a execução e local do crime para afastar a presunção de delito político (aquela história louca de que ele mandou evitar a morte perto da Câmara), se desde a mais tenra hora, o modus operandi indicado (ou planejado) por ele, supostamente, deixou tal impressão mais que evidente, isto é, de que se tratava de uma execução com motivos não passionais ou patrimoniais?
Outra coisa engraçada: ora, se o Chefe de Polícia estava na lista de pagamento dos grupos organizados do crime no Rio, e se inclusive essa lealdade o levaram ao posto mais alto na hierarquia da corporação, como dizer que a esposa do Chefe de Polícia passou a movimentar mais dinheiro após a morte da vereadora?
Todo mundo sabe que nesse meio, quando já há um pagamento regular, e quando há um favor do tamanho da indicação ao posto de Chefe de Polícia, as contrapartidas estão inclusas no pacote, sem extras.
Supor que o Chefe de Polícia usou a conta da esposa para lavar dinheiro obtido com propinas por ter planejado a morte da vereadora é de rolar de rir. O cara que planejou o crime do século, que manteve tudo em segredo por 06 anos, lavou dinheiro na conta da esposa? Como assim?
Podem haver outras implicações ilícitas nas contas do casal, de outras fontes? Novamente dizemos: sim, mas vincular ao fato em apuração parece roteiro de filme B, e novamente se fazem necessárias provas. Afinal, ter dinheiro em conta não é crime, até que o Estado-juiz, no devido processo, diga que é crime.
Outra coisa, se houve direcionamento nos mais altos escalões da polícia, como dito, e o delegado por isso foi preso cautelarmente, perfeito, mas e as alegações da PF sobre promotores, as as possíveis manipulações no Ministério Público do Rio de Janeiro, troca de titulares da investigação, e etc.?
Alguém imagina que uma conspiração dessas só contamina a polícia, mas por que só a polícia serve de Geni? Nenhum promotor preso? Nada?
A imprensa corporativa platinada (isto é, a Rede Globo) martela todo o tempo: A PF que desvendou o caso, após a chegada do atual governo, mas esquece de dizer que os executores foram presos durante as investigações do delegado preso e de seu grupo, e foi desse executor que se extraiu a delação.
Há milícias no RJ e estas contaminam o aparato estatal fluminense, como disse Marcelo Freixo, do alto de sua memória seletiva (ou cinismo?) crime, polícia e política andam juntas no Rio? Sim. Há.
Desde 2007/2008, como consta no relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito tocada pelo então deputado estadual Freixo? Sim. Ele só esquece de dizer, talvez porque hoje faz parte do esforço governamental federal em promover o turismo carioca, e a chamada vocação Cidade-Evento que começava ali, é que, em 2007, as milícias eram a opção das autoridades federais, estaduais e municipais para garantir a “paz” nas áreas pobres e adjacentes às instalações do Pan Americano.
Freixo agora parece ter esquecido esse detalhe do próprio trabalho. O que nos parece, e nos estarrece, é ver o PT e seu governo fazerem justamente aquilo que reclamam terem sido vítimas. A fala do Ministro da Justiça parece um PowerPoint sem PowerPoint. Quando Lula entregou ao STF a tarefa de fazer aquilo que ele, Comandante em Chefe das Forças Armadas, deveria ter feito, ou seja, punir, prender e mandar para reserva todo e qualquer militar envolvido com o golpe, além de dirigir ele próprio o processo político de seu desagravo democrático, aquilo que se exigia, ele inaugurou, com sua omissão, a sua versão da Lava Jato.
Porém, como o governo Lula não sabe lidar bem com essas coisas, podemos dizer que a patacoada da PF é o início do fim da versão lulista da Lava Jato, personificada na pessoa do Ministro Relator (super), tanto do IP de Marielle, quanto do 08 de janeiro. De uma tacada só, essa peça de ficção da PF vai subtrair legitimidade do STF de tudo que foi feito até agora. Vai lançar uma suspeição indelével, como aquela que recaiu sobre o pato (ou seria marreco?) de Curitiba, quer dizer, o ex-juiz Sérgio Moro.
Riem os verdadeiros mandantes, riem os advogados de Bolsonaro e sua turma de aloprados de 8 de janeiro.
Na verdade, não é o início do fim…é o fim de tudo bem no início.



A vereadora Marielle Franco (PSOL/RJ) e o motorista Anderson Gomes foram barbaramente assassinados no dia 14 de março de 2018

O presidente Jair Bolsonaro com o ex-PM Élcio Queiróz, um dos principais acusados pelo assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes


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