Embalagens vazias de agrotóxico e técnico em central de processamento na Capital (Foto: Osmar Veiga)
Por Cássia Modena para o “Campo Grande News”
Eles são perigosos, mas altamente demandados na produção agrícola em larga escala. Leis e fiscalização tentam traçar a linha do meio no uso seguro de agrotóxicos, enquanto as infrações aumentam no Estado.
A Iagro (Agência Estadual de Defesa Sanitária Animal e Vegetal) e a PMA (Polícia Militar Ambiental) flagraram, juntas, 1.208 irregularidades em propriedades rurais de Mato Grosso do Sul entre 2023 e 2025.
A quantidade é maior que essa, já que a PMA não apresentou dados de 2023.
O crescimento foi de 10% na comparação entre autos de infração lançados apenas pela Iagro em 2023 e 2024. A maioria é sobre descarte e armazenamento errados, que oferecem risco de intoxicação e contaminação não só entre pessoas, mas também a animais, rios e lençol freático.
Arte: Thainara Fontoura
A Iagro e à PMA cabe cuidar o que tem a ver com a defesa da saúde humana e dos recursos naturais. Já a fiscalização da importação e uso de pesticidas proibidos no Brasil, é de responsabilidade de órgãos como PF (Polícia Federal), PRF (Polícia Rodoviária Federal), DOF (Departamento de Operações e Fronteira), Ministério da Agricultura e Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis).
Duas apreensões feitas pelo DOF em janeiro deste ano, por exemplo, desviaram cargas com veneno agrícola ilegal avaliadas em mais de R$ 9 milhões.
Falha na fiscalização
No mês passado, fiscais do Ibama foram até uma fazenda de Sidrolândia, após receberem denúncia de queima de embalagem e uso de agrotóxicos falsificados.
O que mais impressionou foi o descaso com os galões usados em área plantada tão grande, por arrendatário que fazia cultivo há anos no mesmo local, disse a superintendente do órgão em Mato Grosso do Sul, Joanice Lube.
Os fiscais federais não confirmaram a denúncia sobre agrotóxicos que vêm de fora. Foram encontradas somente embalagens de produtos nacionais, inclusive, com conteúdo vencido há mais de um ano. As irregularidades geraram multa de R$ 324 mil ao arrendatário.
Embalagens de agrotóxicos descartadas à céu aberto ou enterradas em fazenda de Sidrolândia (Foto: Divulgação/Ibama)
Joanice admite que a fiscalização do uso de agrotóxicos importados ilegalmente precisa melhorar. É o que o MPF (Ministério Público Federal) já pede ao Ibama em Mato Grosso do Sul.
Para ter certeza que não se depararam com embalagens mascaradas com rótulos falsos, o Ibama no Estado teria que ter um aparelho chamado espectrômetro para analisar o conteúdo líquido. O órgão federal comprou três, mas nenhum chegou aqui.
“O correto seria fazer amostra e usar o aparelho para fazer teste e ter o fazer resultado na hora. Como tem denúncias de uso de agrotóxico ilegal, temos que aprimorar a fiscalização”, falou a superintendente.
Terras indígenas
Enquanto algumas comunidades indígenas se organizam e cultivam suas lavouras, outras são vítimas de pulverizações aéreas de veneno com alto risco de intoxicar pessoas e comprometer a água consumida nas aldeias.
“Isso tem tem sido um grande problema no sul de Mato Grosso do Sul, onde a gente tem comunidades indígenas cercadas por plantações. Os aviões agrícolas passam por cima delas. Sem falar que os produtos ficam à deriva dependendo das condições atmosféricas, e podem ‘andar’ até mais que 500 metros”, descreve Joanice.
Aeronave faz pulverização de agrotóxico em fazenda (Foto: Perícia do MPT/MS)
Nos casos em que os próprios povos originários usam nas plantações, eles também podem ser vítimas. “Isso tem impactado diretamente a saúde deles”, conclui a superintendente.
Logística reserva
Editada em dezembro de 2023, a lei federal nº 14.785 deixou mais rígido o controle de agrotóxicos no Brasil e definiu as responsabilidades quanto à destinação correta das embalagens de agrotóxicos.
Mas ainda é comum fiscais encontrarem as vazias servindo até de garrafa para beber água no campo, o que não é recomendado, pois qualquer pequeno resíduo pode ser tóxico e levar à morte.
Os fabricantes nacionais montaram o InpEV (Instituto Nacional de Processamento de Embalagens Vazias) para dar conta da logística reversa das embalagens, de forma que elas sejam incineradas, se o resíduo não for lavável, ou reaproveitadas.
Arte: Thainara Fontoura
Cerca de 90% das embalagens usadas em propriedades rurais nos estados voltam para os galpões de processamento do instituto e ganham novas funções, segundo o engenheiro agrônomo que coordena as operações em Mato Grosso do Sul, Hamilton Flandoli.
O Estado é o 7º na lista de maiores devolvedores. Ele contribuiu com 7% do total de 4.894 mil toneladas de embalagens processadas em 2024, de acordo com o InpEV.
Hamilton explica que a conta não fecha porque o que é comprado, nem sempre é devolvido. “Não vai dar 100%, já que não necessariamente o produtor vai usar o produto naquele ano. E depende do produto. Pode não dar as pragas que ele achou que ia ter. Então, acaba ficando guardado”, diz. Outro caso, é a demora no recolhimento de embalagens que ficam em cooperativas.
O produtor rural precisa ter receita emitida por técnico para comprar um agrotóxico. Pela lei, ele deve devolver a embalagem em até um ano após a aquisição.
O coordenador do InpEV frisa que os fabricantes organizam caminhões de recolhimento apenas para atender pequenos produtores. Os grandes, precisam providenciar a destinação correta por si.
Plantação de árvores na perspectiva de uma formiga. Foto: Imagens/imagem Pond5
Por Norbert Suchanek para o JungeWelt
Todas as manhãs, um ônibus após o outro transporta milhares de trabalhadores da comunidade de Ribas do Rio Pardo até aquele que é hoje o maior canteiro de obras do Brasil. Uma planície de areia vermelha bem definida e nivelada, com vários campos de futebol em tamanho, nos quais dezenas de enormes guindastes de construção, alcançando o céu azul, estão erguendo monstruosos andaimes de aço e salas de produção, e ao mesmo tempo, máquinas de construção de estradas estão asfaltando tudo o que podem : Trata-se do projeto de celulose “Cerrado”, que custa cerca de quatro bilhões de euros da Suzano, já a maior produtora brasileira de celulose. A expectativa é que a nova fábrica entregue anualmente 2,55 milhões de toneladas de matéria-prima de papel proveniente de eucaliptos geneticamente modificados, aumentando a produção total da Suzano para 13,5 milhões de toneladas por ano.
O projeto, apoiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) e pelo governo do estado de Mato Grosso do Sul, trouxe mais de dez mil trabalhadores da construção civil do Sul e Nordeste do Brasil, de São Paulo e de países como Colômbia, Venezuela, Cuba, Argentina e Haiti à comunidade, que originalmente tinha cerca de 20 mil habitantes, que não estava preparada para esta “explosão demográfica”. Os preços dos terrenos e os aluguéis de apartamentos dispararam. O assentamento operário com 1.280 leitos, construído por uma empresa terceirizada na periferia da cidade, é apenas uma gota no oceano.
Os dias de empregos no mega canteiro de obras estão contados há muito tempo. A fábrica, que fica a apenas dez quilômetros de Ribas do Rio Pardo, tem conclusão prevista para junho do próximo ano. De acordo com um comunicado da empresa, a operação das instalações e as plantações de madeira empregarão cerca de 3.000 pessoas de forma permanente, muito poucas das quais virão da indústria da construção, atualmente em expansão.
A parte mais importante do projeto Cerrado é a matéria-prima: o eucalipto. As plantações uniformes de árvores já estão se espalhando pela região como um mar. Outrora conhecida como “Terra do Gado”, Ribas do Rio Pardo e comunidades vizinhas como Três Lagoas, Santa Rita do Pardo, Água Clara e Brasilândia são dominadas pelo eucalipto há vários anos. O boom das plantações de árvores começou na região no início dos anos 2000 e se acelerou com a conclusão das três primeiras fábricas de celulose em 2009, 2012 e 2017 em Três Lagoas, duas das quais pertencem à empresa Suzano e uma à empresa Eldorado Brasil.
Onde há poucos anos onças e pumas vagavam pela floresta intacta do Cerrado caçando tamanduás, veados, antas e outros animais selvagens, ou gado pastando para o consumo de carne do Brasil, hoje os paus de eucalipto estão enfileirados. De acordo com a Associação dos Produtores e Consumidores de Plantações Madeireiras (Reflore-MS), um total de 1,4 milhão de hectares em Mato Grosso do Sul já foram plantados com clones da espécie arbórea australiana de rápido crescimento. Este ano serão acrescentados mais 300 mil hectares de plantações de eucalipto: 822 hectares por dia.
De acordo com o atual plano de manejo florestal, a própria Suzano possui 169,3 mil hectares de floresta protegida de Cerrado e 458,4 mil hectares de áreas de eucalipto na região, que planeja expandir para 600 mil hectares até meados de 2024 para operar a nova fábrica. Para alegria da Secretaria de Estado do Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc) de Mato Grosso do Sul, Ribas do Rio Pardo se tornará a “capital mundial do eucalipto”.
A matéria-prima do papel mato-grossense já é vendida para 36 países da Ásia, América do Norte, América Central, América do Sul, Europa, Oriente Médio e África, sendo a China, de longe, o maior comprador. No ano passado o país importou 2,384 milhões de toneladas.
O que o governo do estado e a indústria de celulose comemoram é, para a rede contra os desertos verdes (Rede Alerta contra os Desertos Verdes), uma catástrofe ecológica e social. A Suzano é responsável pelo desmatamento do Cerrado, pela poluição e pela escassez de água, bem como pela destruição de solos férteis, segundo a rede, que descreve as monoculturas madeireiras como “desertos verdes”. “A expansão das monoculturas e das suas cadeias logísticas e industriais está causando a perda da biodiversidade e de qualidade de vida tanto no campo como na cidade”, queixa-se a rede.
Os ambientalistas denunciam especialmente o plantio pela Suzano de duas espécies de eucalipto geneticamente manipuladas – aprovadas pelo governo brasileiro: a variedade H421, aprovada em 2015 e que visa fornecer mais polpa por hectare, e a variedade 751K032, permitida desde 2021 e que, assim como a soja geneticamente manipulada conhecida da empresa genética Monsanto, é resistente ao herbicida total glifosato.
“Mato Grosso do Sul é o estado com maior produção de eucalipto, principalmente pelos incentivos fiscais às empresas de celulose e pela disponibilidade de terras antes utilizadas para a pecuária”, explicou o advogado trabalhista Leomar Daroncho em simpósio de cientistas, ativistas e atingidos pela monoculturas de árvores e plantações transgênicas de eucalipto, que ocorreu em junho na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). “Em grandes áreas, a vegetação nativa, o Cerrado, foi retirada para o plantio de eucalipto transgênico”.
As pequenas famílias de agricultores e as explorações pecuárias que anteriormente não venderam as suas terras às empresas de celulose estão agora presas às monoculturas e queixam-se de que os riachos e poços estão a secar e os operadores das plantações pulverizam regularmente pesticidas. A situação é particularmente dramática para os sobreviventes do povo Ofayé no município vizinho de Brasilândia. Sua reserva indígena restante, de 484 hectares, está cercada por dezenas de milhares de hectares de monocultura de eucalipto. Uma ilha de Cerrado no mar de plantações madeireiras que foi demarcada como território indígena na década de 1990, mas ainda não foi “homologada”, ou seja, reconhecida, pelo governo brasileiro.
Colheita de madeira em escala industrial. Joa Souza/imago
“Em pouco tempo vimos a expansão do Geneucalyptus no limite da reserva. Vimos como inúmeras árvores nativas, com cem ou duzentos anos, foram derrubadas mecanicamente em poucos minutos e substituídas por eucaliptos”, reclamou o cacique Ofayé, Marcelo da Silva Lins, durante o simpósio. O estado está agora a tornar-se cada vez mais seco e o clima local está a tornar-se cada vez mais quente.
De acordo com um relatório publicado em dezembro de 2022 pela Environmental Paper Network (EPN), uma rede global de mais de 150 grupos ambientalistas e organizações não governamentais, sabe-se que os clones de eucalipto de rápido crescimento drenam a água do solo. “A enorme expansão destas plantações, em conjunto com as alterações climáticas, está lentamente a transformar o reservatório de água continental da região numa área de seca. O restante vegetação natural será danificado, enquanto a agricultura tradicional e a agricultura de subsistência se tornarão impossíveis.”
O risco de grandes incêndios florestais também aumenta. Durante os períodos de seca, as plantações de madeira poderiam facilmente pegar fogo. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), responsável pelo monitoramento florestal via satélite, o número de incêndios na região do eucalipto multiplicou-se a partir de 2018, passando de cerca de 1.000 a 3.000 incêndios florestais por ano para mais de 10.000 incêndios em 2020. Um total de 20 mil hectares de floresta de eucalipto foram queimados naquela época no Mato Grosso do Sul. E, finalmente, o uso crescente de herbicidas como o glifosato ou insec=ticidas dirigidos contra formigas cortadeiras está envenenando os cursos de água e a ameaçar a vida selvagem e os meios de subsistência da restante população local que ainda não foi deslocada.
No Brasil, as empresas de celulose costumam afirmar que suas plantações de eucalipto não substituem áreas florestais naturais, mas sim substituem fazendas agrícolas ou degradadas anteriormente utilizadas. Um estudo publicado em 2013 pela Universidade Federal de Goiás mostra que, entre 2002 e 2010, mais de 61% das novas florestas de eucalipto foram criadas em áreas intactas de Cerrado. Apenas 26 por cento das plantações de madeira substituíram pastagens para gado e cerca de 13 por cento substituíram áreas anteriormente utilizadas para outros fins. Em comparação com os anos de 2005 e 2011, a área de eucalipto mais que quadruplicou em detrimento do Cerrado, especialmente no Mato Grosso do Sul, afirma o estudo.
Também é importante mencionar que as fazendas tradicionais de gado no Cerrado são significativamente menos prejudiciais do que as plantações madeireiras industriais. Por um lado, as áreas de pastagem fornecem mais habitat para a flora e a fauna naturais do que as monoculturas madeireiras australianas. Por outro lado, embora os pecuaristas desmatem ou queimem a floresta, deixam em pé algumas árvores de sombra e, sobretudo, as raízes das árvores e arbustos permanecem no solo, o que é uma diferença fundamental. O ecossistema do Cerrado está adaptado aos incêndios florestais há milhares de anos. Cerca de 70% da sua biomassa encontra-se no subsolo, protegida do fogo. Suas plantas têm raízes profundas e poderosas que armazenam grandes quantidades de água para sobreviver a incêndios florestais e longos períodos de seca. Portanto, após a limpeza, elas podem brotar novamente e o ecossistema pode se recuperar. Algumas pastagens da região do Cerrado que são consideradas degradadas pelos agricultores estão, na verdade, regenerando o Cerrado.
Em última análise, os grandes criadores de gado não fecham as portas apenas porque venderam as suas terras à indústria da pasta de papel. Com o lucro que obtêm, costumam adquirir terras mais baratas em outras áreas que ainda não foram desmatadas para criar novas pastagens.
A Suzano, porém, se vê como a salvadora do clima que protege o Cerrado. Nenhuma árvore foi derrubada na região para suas plantações madeireiras. »Na Suzano seguimos uma política de produção responsável e, por isso, introduzimos uma política de desmatamento zero. “Todas as nossas florestas de eucalipto estão localizadas em áreas que já eram cobertas por outras culturas”, afirma a empresa. O cultivo do eucalipto tem impactado positivamente a atmosfera devido à conversão de terras antes utilizadas para agricultura, disse o diretor da Suzano, Aires Galhardo, em entrevista ao portal Celulose .
É por isso que a empresa – tal como outras empresas de plantações de madeira – quer ser recompensada com dinheiro do comércio internacional de carbono. “O eucalipto cresce rapidamente e ajuda a absorver o dióxido de carbono da atmosfera e, assim, devolver oxigênio puro à natureza”, escreve Suzano sobre seu projeto de proteção climática “Carbono Cerrado”, de Ribas do Rio Pardo. “O papel das florestas de eucalipto é fundamental para os esforços da humanidade na neutralização dos gases de efeito estufa responsáveis pelo aquecimento global.” Toda a produção de celulose é baseada em plantações renováveis de eucalipto para abastecer a nova fábrica em Ribas do Rio Pardo. »As mudas utilizadas são criadas com tecnologia de clonagem e possuem uma das bases genéticas mais avançadas para a formação de florestas para produção de celulose.«
Embora as obras da maior fábrica de celulose de eucalipto do mundo, no Rio Pardo, ainda estejam a todo vapor, seus dias recordes já parecem estar contados. A empresa chilena de madeira e celulose Arauco aparentemente está planejando uma instalação ainda maior no bairro às margens do rio Sucuriú. Será o maior projeto de celulose do mundo, superando a Suzano, o que criará enormes oportunidades de emprego e crescimento, disse o então governador do Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja, quando o projeto foi anunciado no ano passado. A construção da nova fábrica de celulose próxima ao município de Inocência, no Rio Sucuriú, que tem cerca de 8.400 habitantes, está prevista para começar em janeiro de 2025 e empregará no máximo 12 mil trabalhadores da construção civil nesta fase. Quando entrar em operação, em 2028, a empresa precisará de cerca de 380 mil hectares de plantações de madeira na região, dos quais Arauco afirma já ter adquirido 60 mil hectares.
Ainda falta as licenças ambientais para o projeto Sucuriú, mas isso parece ser apenas uma formalidade. O governador do Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel, do Partido Social Democrata Brasileiro (PSDB), e seu secretário estadual do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação, Jaime Verruck, também o acolhem de forma exagerada. Por isso viajaram para a sede da Arauco no Chile em junho passado junto com seu antecessor e colega de partido, Reinaldo Azambuja, para – segundo anúncio do governo – conhecer com seus próprios olhos a tecnologia “avançada” da empresa chilena.
Este texto escrito originalmente em alemão foi publicado pelo jornal “JungeWelt” [Aqui!].
Cargill e Bunge, as duas maiores comercializadoras de soja brasileira do mundo, foram recentemente vinculadas a uma fazenda contestada no Brasil, conectando as empresas a violações de direitos humanos de comunidades tradicionais. Earthsight e De Olho nos Ruralistas, duas organizações sem fins lucrativos no Reino Unido e no Brasil, descobriram recentemente que a Cargill e a Bunge estão adquirindo soja de Brasília do Sul, uma fazenda de soja de 9.785 hectares em Mato Grosso do Sul (MS) (Figura 1) que está sendo contestado atualmente.
Os dois gigantes comerciais são os maiores exportadores de soja para a União Europeia e o Reino Unido. Entre 2014 e maio de 2022, a Bungeteriaexportado mais de 17 milhões de toneladas métricas (TM) de soja para a UE, com Espanha, França e Alemanha como os principais destinatários. A Cargill exportou mais de 13,7 milhões de toneladas, com os principais destinos Espanha, Holanda e Reino Unido.
Figura 1: Fazenda brasileira contestada Brasília do Sul com instalações próximas da Cargill e Bunge
Fonte : AidEnvironment, com base no INCRA, Sicarm 2022, Funai 2020. Observe que a ADM não foi mencionada na pesquisa investigativa .
A terra em disputa é supostamente roubada de uma comunidade tradicional chamada Guarani Kaiowá, os moradores originais da terra ancestral Takuara . Eles foram deslocados décadas atrás. A Funai, a agência federal brasileira encarregada de proteger os direitos indígenas, reconheceuTakuara como uma terra indígena tradicional, tornando ilegal a atividade de agronegócios de acordo com a constituição do país. No entanto, nenhuma das decisões judiciais emitidas ao longo dos anos foi conclusiva, e a demarcação final da área ainda está sendo considerada. Além da grilagem, a fazenda contestada também está ligada ao assassinato do líder Guarani Kaiowá, Marcos Veron.
As descobertas são particularmente importantes por causa dos próximos regulamentos da UE, que colocarão commodities de risco florestal, como soja e gado, sob maior escrutínio por desmatamento e violações de direitos humanos. A Diretiva de Governança Corporativa Sustentável (SCG) da UE, que visa melhorar a legislação societária e a governança corporativa, está em status de propostadesde fevereiro de 2022. De acordo com essa legislação, os comerciantes de commodities, como Cargill e Bunge, estão sujeitos a due diligence obrigatória para abordar direitos humanos adversos e impactos ambientais em suas cadeias globais de valor. As questões de direitos humanos também serão cobertas pelos requisitos de due diligence do Regulamento de Desmatamento da UE proposto, que buscapara travar a desflorestação legal e ilegal e a degradação florestal resultantes do consumo e da produção da UE. Embora os requisitos dainiciativa SCG “vão além dos requisitos do regulamento de desmatamento, eles se aplicam em conjunto”.
A investigação da Earthsight e De Olho nos Ruralistas também ressalta a importância da implementação e controle dos estados membros da UE sobre o não cumprimento de violações de direitos humanos sob a legislação futura. Por exemplo, como atualmente estruturada, a abordagem de direitos humanos do Regulamento de Desmatamento da UE baseia-se exclusivamente nas leis dos países produtores e não exige o atendimento de declarações e convenções internacionais sobre direitos humanos e trabalhistas. A Cargill, que confirmou relação de fornecedor com a fazenda contestada, apontou o cumprimento da legislação brasileira emrespostaàs alegações: não há ilegalidade na produção local.”Essa resposta (“violações de direitos humanos podem ter sido encontradas, mas nosso fornecimento não é ilegal”) pode prejudicar a eficácia das próximas regulamentações. Como diz a Earthsight: “A Cargill poderia ter adotado uma política de não causar danos e cortar os laços com quaisquer fazendas envolvidas em disputas de terras não resolvidas com comunidades indígenas e outras comunidades tradicionais, em vez de se apegar a interpretações legais equivocadas e zombar de sua própria natureza humana. compromissos de direitos ”.
Pesquisas anteriores do CRR destacaram a incerteza de como a implementação e a execução das próximas iniciativas legislativas da UE se desenvolverão na prática. Por exemplo, para o Regulamento de Desmatamento da UE, existem requisitos mínimos para verificações de conformidade. Além disso, não é obrigatória a apresentação de uma lista pública dos operadores e comerciantes que infringiram o regulamento. Essa lista forneceria um forte incentivo para o cumprimento, uma vez que separaria as medidas de acusação da disposição das agências nacionais de aplicação de penalidades, aumentaria a transparência e possivelmente serviria como um impedimento para as empresas não conformes.
No entanto, o projeto alterado do Regulamento de Desmatamento, que ainda precisa passar por várias rodadas de votação, agora incluiu explicitamente leis e padrões internacionais sobre os direitos dos povos indígenas e direitos de posse das comunidades locais, incluindo a Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas , a Declaração da ONU sobre os direitos dos camponeses e outras pessoas que trabalham em áreas rurais, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho e a diretriz da OCDE sobre direitos humanos e negócios.
O caso também chama a atenção para os requisitos de rastreabilidade mais fortes sob a próxima legislação. A fazenda contestada Brasília do Sul também abastece indiretamente, por meio de intermediários, a unidade de processamento da Bunge em Dourados. Em resposta, a Bunge afirmou que “ não possui a fazenda Brasília do Sul em seu banco de dados de fornecedores ”. Essa afirmação está aberta à interpretação e também pode implicar que a Bunge não consiga rastrear a soja até a fazenda contestada por meio de uma rede de intermediários. Em 2022, a empresainformouque poderia monitorar 64% de seus volumes indiretos em regiões prioritárias. Se o Regulamento de Desmatamento da UE mantiver o requisito de geolocalização como está atualmente (de volta ao “terreno”), a origem desses suprimentos seria atestada. Empresas como a Bunge teriam que monitorar toda a sua rede de abastecimento, revelando conexões entre produção de commodities e desvios socioambientais.
O setor financeiro da UE não é afetado diretamente pelo Regulamento de Desmatamento da UE, mas, indiretamente, os financiadores provavelmente seriam afetados por riscos financeiros em suas ações, títulos e empréstimos. Esses riscos incluem riscos de valor, bem como risco de reputação. A Bunge e a Cargill recebem financiamento de instituições financeiras da UE (e do Reino Unido) que se comprometem a reportar de acordo com o Regulamento de Divulgação de Finanças Sustentáveis. Desde 2017, essas duas empresas receberam 33% de seus financiamentos identificados de bancos e investidores na Europa, dos quaisdois terços são da UE-27. Do total de financiamento identificado, 44% são provenientes de linhas de crédito rotativo. Entre os 10 maiores financiadores da Bunge e Cargill, o BNP Paribas é o maior. Outros financiadores europeus no top 10 incluem Deutsche Bank, HSBC, Barclays e ING. Todos esses financiadores têm várias políticas de financiamento sustentável e podem sentir a pressão para se engajar nas alegações identificadas acima.
Este texto foi escrito originalmente em inglês e publicado pela “Chain Reaction Research” [ ].
Eram 17 trabalhadores em condições análogas às de escravo em uma fazenda de criação de gado. Com indenização, jovens comprarão primeira casa para mãe
Segundo o MPT, 25 trabalhadores já foram resgatados neste ano em propriedades rurais em Mato Grosso do Sul
Por Redação RBA
São Paulo – Uma fiscalização em propriedade rural no município de Porto Murtinho (MS), na fronteira com o Paraguai, resgatou 17 trabalhadores em situação análoga à de escravo,incluindo indígenas, paraguaios e menores. A indenização, além de verbas rescisórias, supera R$ 1,2 milhão. Trata-se de uma fazenda voltada à pecuária, com área de 15 mil hectares.
Segundo o Ministério Público do Trabalho (MPT), o dano moral individual, somou mais de R$ 718 mil. Já o dano coletivo, que deverá ser destinado a uma ou mais entidades sem fins lucrativos ou projetos sociais, totaliza R$ 500 mil.
Acordo na audiência
Em audiência na Vara do Trabalho de Jardim, foi assinado um termo de ajuste de conduta (TAC). De acordo com o MPT, o empregador depositou rapidamente os valores devidos nas contas bancárias indicadas pelos trabalhadores. Deverá ser firmado um outro TAC, relativo às condições de trabalho e do ambiente.
Os 17 trabalhadores compareceram à audiência. Entre eles, havia nove indígenas das etnias Guarani Kaiowá e Kadiwéu e seis paraguaios. Dois eram menores, de 14 e 15 anos. Este último, E.M., vivia no local com o irmão, de 27 anos, e aplicava agrotóxicos para limpeza do pasto. Com a indenização, comprarão a primeira casa própria da mãe, de 49 anos.
Neste ano, 25 resgatados
O outro menor que a fiscalização resgatou, o Kaiowá E.I., é órfão de mãe e não sabe onde está o pai, segundo o MPT. A avó o acompanhou na audiência. Ele declarou que o trabalho era necessário para comprar comida. Depois da pandemia, o menino indígena espera voltar à escola e conseguir um trabalho digno.
Segundo o Ministério Público, neste ano 25 trabalhadores já foram resgatados de condições análogas às de escravo em propriedades rurais de Mato Grosso do Sul. Em 2020, foram 63. Também participaram dos resgates a Superintendência Regional do Trabalho, com apoio das polícias Federal, Civil e Ambiental, além do MP estadual.
Com informações do MPT-MS
Este artigo foi inicialmente publicado pela Rede Brasil Atual [Aqui!].
O vídeo abaixo foi feito pela jornalista Fernanda Athas, em trecho da estrada entre Corumbá e Miranda no estado do Mato Grosso do Sul. A jornalista relata a presença de “muitos animais mortos na estrada”, os quais pereceram tentando fugir do fogo.
A consequência desses incêndios na região do Pantanal sul matogrossense poderá ser especialmente grave para a sustentabilidade dos recursos hídricos em outras regiões do Brasil, na medida em que aquela área contém 65% do estoque hídrico total daquela imensa região alagada. É importante frisar que no Pantanal são originadas originam bacias hidrográficas, incluindo a do Rio Paraguai.
De toda forma, o alcance e a intensidade do ciclo de queimadas de 2019 poderá agravar sensivelmente processos de degradação que já estavam em curso na região do Pantanal, especialmente porque neste momento não há uma ação governamental no sentido de coibir a prática de atividades que resultaram no desastre ambiental e social que é mostrado no vídeo da jornalista Fernanda Athas.
CINCO CIDADES DE MS ESTÃO ENTRE AS IMPACTADAS POR AGROTÓXICOS CANCERÍGENOS CHAPADÃO É UMA DELAS
Dourados, Chapadão do Sul, Maracaju, Bandeirantes e São Gabriel do Oeste aparecem entre as cidades brasileiras onde o agronegócio causa impactos nocivos à saúde dos trabalhadores e da população por conta do uso intenso de agrotóxicos, apontados por pesquisadores em todo mundo como principal causa da proliferação do câncer. A constatação foi feita no Seminário “Os Impactos dos Agrotóxicos na Sociedade Saúde, Trabalho e Meio Ambiente”, que aconteceu ontem (17), na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul.
Segundo o especialista, pesquisador Doutor Wanderlei Antonio Pignati, da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), pesquisas confirmam que a doença está ligada à utilização do agrotóxico nas lavouras. Ele citou as cidades de Lucas do Rio Verde (MT), Rio Verde de Goiás e os municípios sul-mato-grossenses como áreas de risco. “Dourados é grande produtor de algodão com 24 a 30 litros de agrotóxicos por hectare está mergulhado dentro da plantação. Chapadão do Sul também está mergulhado, São Gabriel do Oeste, Bandeirantes e Maracaju, onde todos os córregos e todas as nascentes vão levar a água que vão parar no Pantanal”.
Pignati explica que junto com pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) foram feitos cruzamentos que confirmaram onde há maior incidência da doença é exatamente os locais com maior produção agrícola e maior uso de agrotóxicos.
Pignati adverte que informações apontam contaminação da água potável em MS e MT. “Criança que mora perto da lavoura vai pior na escola, há também problemas neurológicos e também distúrbios endócrinos”. Ele citou problemas na tireóide, doenças como diabetes, depressão, suicídios e malformação”.
No Brasil, a Fiocruz aguarda financiamento para pesquisas nas áreas da vigilância e saúde. Faltam investimentos no Programa de Analise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimento (Para).
DESAFIOS
O impacto na saúde pública, segundo o pesquisador Luiz Claudio Meirelles, traz comprometimento das futuras gerações. “Impacta sofrimento das pessoas e também impacta o Sistema Único de Saúde (SUS) que tem que tratar essas pessoas. Não existem laboratórios a nível estadual, não tem estrutura para ter conhecimento dos registros. O trabalhador vai adoecendo e não tem atendimento devido. A falta de informações de banco de dados dificulta debate e políticas públicas”, disse Meirelles.
NÃO EXISTE SEGURANÇA
A professora Doutora e pesquisadora do INCA (Instituo Nacional do Câncer), Marcia Sarpa de Campos Mello foi categórica ao afirmar que “não existem limites seguros de exposição”. Ela defende uma força maior do Estado na fiscalização, nos investimentos em pesquisas e prevenção, pois diante do perigo “há um alto potencial de prevenção”.
Segundo ela, Desde 2008, o Brasil é o maior consumidor de agrotóxico do mundo. Em 2012 o Brasil usou em suas lavouras 1 milhão de litros e MS ocupa o 8º lugar no País.Ela citou como produtos ainda utilizados e que precisam ser tirados do mercado o Malationa; Diazinona; Glifosato e 2 -4D. “O Glifozado e o 2- 4 D são apontados como extremamente nocivos pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer”.
A pesquisadora cita a diminuição do sistema imunológico, o nascimentos de crianças com malformação congênita, toxicidade reprodutiva, infertilidade, abortos, mutação (agrotóxicos imitam os hormônios) e o câncer como a segunda causa de morte no mundo como consequências do uso do agrotóxico”. A estimativa feita em 2015 pelo INCA mas que pode ser usado também este ano é de que no Brasil somente em um ano serão detectados 576 mil novos casos de câncer”. “O câncer é um conjunto de manifestações patológicas, doenças celulares invadem outros tecidos e apenas 20% dos casos estão associados a hereditariedade 80% a fatores ambientais”.