Pesquisa revela que 80,6% dos médicos sofreram pressões e interferências de planos de saúde

planos

Por Medscape

A maioria dos médicos e médicas brasileiros é pressionada pelas operadoras de planos de saúde e se declara descontente com essa interferência e entraves à sua autonomia profissional, com prejuízos à qualidade da medicina praticada e ao atendimento em saúde de pacientes/usuários. Pelo menos 53% já sofreram interferências ou tentativas no tratamento dos pacientes por parte das operadoras de planos de saúde. Além disso, mais de 80,6% dos entrevistados enfrentaram pressões e restrições aos seus pedidos de exames e autorizações e 51,8% dos médicos disseram que as operadoras costumam criar dificuldades à internação dos seus pacientes.

Os dados são parte de uma pesquisa conduzida pela Associação Médica Brasileira (AMB) em parceria com a Associação Paulista de Medicina (APM) que foi divulgada na quinta-feira (31). Divulgado na quinta-feira (30), o levantamento “Os médicos brasileiros e os planos de saúde” foi feito durante os dias 25 de fevereiro e 09 de março deste ano por meio da ferramenta on-line Survey Monkey e teve a participação de 3.043 médicas e médicos. A margem de erro das estatísticas comentadas a seguir foi de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Segundo o levantamento feito pelas entidades, ao menos 88,3% dos médicos e médicas já presenciaram o abandono do tratamento ou de algum procedimento médico por causa dos reajustes no valor cobrado pelas operadoras de plano de saúde. Baixe aqui o resultado completo da pesquisa “Os médicos brasileiros e os planos de saúde”.

Para o Dr. César Eduardo Fernandes, médico e presidente da AMB, “os resultados da pesquisa mostram o desrespeito e a violação do trabalho dos médicos e o descaso com a saúde dos beneficiários de planos de saúde.” Segundo ele, a pesquisa é uma forma de alertar os atores do setor para a necessidade de discutir e encontrar alternativas para uma situação que se cronifica e se agrava.

De modo geral, os resultados do estudo indicam a grande penetração e influência das operadoras de saúde na prática dos profissionais da medicina: 70,1% dos participantes da pesquisa atendem planos de saúde, sendo que 55,3% o fazem há mais de 20 anos. Também chama a atenção que 51,7% da categoria atendem cinco ou mais planos, enquanto 21,7% atendem apenas um plano. Vale notar que 50,3% dos respondentes declararam ter mais de 30 anos de formados, enquanto 19,5% têm entre duas e três décadas de atividade profissional.

Quanto aos valores recebidos das operadoras pelos serviços prestados, apenas 1% da categoria se disse satisfeito. Outros 85,8% dos profissionais da saúde informaram que já deixaram de receber seu pagamento ou foram pagos com atraso por consultas e procedimentos devido às glosas (não recebimento dos serviços prestados por causa de “inconsistências”). 

O levantamento trouxe mais um alerta: 92,4% da categoria acham que elas não estão investindo adequadamente na prevenção das doenças. É mais um ponto delicado, uma vez que esse é um apelo central de boa parte das campanhas de marketing do segmento.

Em nota, a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde), que representa os maiores planos de saúde do país, afirmou, a respeito dos dados da pesquisa da AMB/APM, que “as associadas têm como conduta cumprir rigorosamente todas as leis, normas e regulamentações que lhe são impostas pelos órgãos competentes, assim como respeitar o ato médico, as diretrizes e os procedimentos necessários para a integridade de um sistema que atende com excelência a 49 milhões de usuários.” Disse ainda que “qualquer prática indevida observada na cadeia de saúde, inclusive desvios e fraudes, deve ser tratada individualmente”.

Maioria desaprova projeto de mudanças na lei que regula os planos de saúde

A percepção dos médicos sobre as principais mudanças em tramitação na Câmara dos Deputados, em Brasília (PL propostas o Projeto de Lei 7.419/2006), que visa mudar a chamada Lei dos Planos de Saúde (a Lei 9.656/1998) é de que a propositura é ruim. Cerca de 8 a cada 10 participantes do levantamento (mais de 77,1%) criticaram várias propostas contidas no projeto.

Uma das propostas criticadas pelos médicos é a possibilidade de segmentar os planos de saúde de acordo com os tipos de procedimentos contratados e outras diferenciações. Cerca de 79,9% dos médicos acham que essa ideia trará consequências negativas para a saúde dos pacientes.

Mais de 83% dos respondentes da pesquisa realizada pelas entidades médicas se disseram contrários às alterações que têm a intenção de reduzir a lista de procedimentos de cobertura obrigatória da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) ou limitar a cobertura dos planos, o que pode facilitar as negativas de procedimentos prescritos.


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Este texto foi inicialmente publicado pelo site Medscape [Aqui!].

Na “The Lancet”, médicos brasileiros desafiam os fatos e defendem as ações do governo Bolsonaro no controle da COVID-19

hospitais covid-19

Na “The Lancet”,  médicos brasileiros defendem as ações do governo Bolsonaro no (des) controle da pandemia da COVID-19, em que pese os mais 135 mil mortes ocorridas no Brasil

Há quem não entenda algumas situações envolvendo a falta de reação da comunidade médica brasileira às ações do governo Bolsonaro no (des) controle da pandemia da COVID-19 no Brasil, especialmente quando o presidente Jair Bolsonaro está a meses defendendo um medicamento, a cloroquina, que não possui nenhuma comprovação de que tenha qualquer utilidade no combate ao coronavírus.

Mas uma carta publicada hoje pela revista “The Lancet” lança luz sobre essa situação ao publicar uma carta assinada por um coletivo de médicos brasileiros (alguns detentores de títulos de doutorado) que não só defendem ardorosamente as ações do governo Bolsonaro, como também exigem que uma das principais revistas científicas da área médica do mundo retire do ar um editorial em que critica duramente as ações do governo Bolsonaro.

Em meio ao bombardeio de declarações pseudo-nacionalistas, uma me chamou a atenção. É que aquela que afirma que “Brasil está se saindo melhor do que o Reino Unido em resposta à pandemia COVID-19. Os casos, óbitos e taxas de letalidade do COVID-19 ajustados pela população são muito mais elevados no Reino Unido do que no Brasil.”

Essa afirmação por si só já deve ter divertido os editores da “The Lancet” a ponto deles decidirem publicar uma carta que, se por um lado tem elementos que envergonham os autores da mesma, por outro, oferecem uma rara entrada no que pensam respeitáveis representantes da classe médica brasileira.

Quem se der ao trabalho de ler a “resposta” abaixo, notará que não se pode culpar os pobres pela eleição e manutenção de Jair Bolsonaro no posto de presidente do Brasil. É que a defesa apaixonada que emerge do texto nos mostra quem racionalmente opta por defender as práticas indefensáveis de um governo indefensável.

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Resposta COVID-19 do Brasil

Por Mauro RN Pontes e Julio Pereira Lima

Foi decepcionante ler o Editorial 1  sobre a resposta do Brasil ao COVID-19, criticando o presidente brasileiro que “desencorajou [ed] as medidas sensatas de distanciamento físico e bloqueio”. Sim, ele insistiu que o bloqueio é ineficaz e terrível para a economia. 

As evidências sugerem que ele estava certo. Um estudo europeu concluiu que o bloqueio pode não ter salvado vidas.

2 Um estudo brasileiro descobriu que um aumento de 1,0% na taxa de desemprego estava associado a um aumento de 0,5% na mortalidade por todas as causas.

 3 A taxa de desemprego esperada (23%) causaria 120 mil mortes no Brasil, segundo projeções dos autores. 3 Portanto, o governo brasileiro implementou medidas de proteção; distribuiu US $ 5,6 bilhões às cidades, estados e diretamente à população por meio de um salário de salvamento de emergência; criaram leitos para unidades de terapia intensiva; e entregou equipamentos de proteção e ventiladores. Esta resposta mostra um “vácuo de ações políticas”?1

Até o momento, o Brasil está se saindo melhor do que o Reino Unido em resposta à pandemia COVID-19. Os casos, óbitos e taxas de letalidade do COVID-19 ajustados pela população são muito mais elevados no Reino Unido do que no Brasil. O Lancet deveria criticar seu próprio país, antes de criticar o nosso.

Sentimos que o preconceito abundou durante a editoria de Richard Horton, incluindo o imbróglio da vacina MMR4(colocando a vida das crianças em risco) e a correspondência incendiária sobre a situação em Gaza5O Lancet elogiou a resposta chinesa à pandemia de COVID-19, mesmo depois que a China foi acusada de encobrir a propagação inicial e a transmissão de humano para humano de COVID-19. O Lancet foi mais duro com o Brasil, sugerindo que deveríamos expulsar o presidente de sua cadeira.

Desconsideramos seu editorial desinformador, 1 que sentimos ser claramente tendencioso contra nosso governo de direita. Infelizmente, o The Lancet não publicou nada contra o governo de esquerda brasileiro, que priorizou estádios de futebol em vez de hospitais.

Como médicos brasileiros, damos a vocês uma resposta clara: o Editor do The Lancet deve abandonar o viés político, retratar o Editorial,1  e focar na ciência, ou então ele “deve ser o próximo a ir”.1

Declaramos não haver interesses conflitantes. Os signatários desta correspondência estão listados no apêndice