Na planície dos Goytacazes, pau que dá em Chico, quase nunca dá em Francisco

pesquisas eleitorais

Por Douglas Barreto da Mata

A jornalista Jane Nunes é uma das pessoas mais abalizadas para tecer comentários sobre pesquisas e disputas eleitorais.  Ela é um daqueles personagens com rara experiência no ramo, tanto como (ex) integrante de governos locais, como profissional de comunicação. É aquilo que se chama de “casca grossa”.

Já fomos mais próximos, hoje estamos bem afastados, mas é preciso dizer que tenho grande respeito por ela. Por isso, me chamou atenção um artigo em que Jane Nunes desanca pesquisas recentes sobre a eleição para prefeito em Campos dos Goytacazes. Aliás, há algumas considerações ali que eu mesmo faria, sim, há um mercado de pesquisas eleitorais, que se destina a “vender uma versão da realidade” que se auto confirme, sim, há. 

Ela mesma já conviveu em redações, onde os patrões eram agentes importantes desse mercado.  Porém, como Jane Nunes sabe, isso não é de hoje.  Nem é exclusividade desse ou daquele lado, já que ela também já militou em todos os espectros da política local, principalmente, a favor e contra a família Garotinho.

Isso não a desmerece, de forma nenhuma, nem as suas opiniões, e muito menos o fato de ter escrito no “diário oficial” da oposição.   Mas vamos ao argumento dela. Primeiro, o viés de Jane Nunes está claro.  Ela tentou desconstruir a ideia de que o atual prefeito, Wladimir Garotinho, candidato à reeleição, seja favorito, ou melhor, que vá se manter como tal.

E o que ela usa para legitimar essa narrativa?  Os mais de 50% de indecisos, apurados pelo Instituto Paraná/Jornal O Dia.  Ora, se fosse totalmente coerente o argumento, onde está a sondagem feita logo depois, pelo Instituto Big Data/Rede Record, que apontou um número de indecisos muito menos, na ordem de 30%?

Não é uma discrepância insignificante, a ponto de desmerecer por parte da articulista uma menção, até para descredibilizar um instituto ou dar mais ênfase ao outro.  Também Jane Nunes nada menciona que o instituto que mostrou 50% de indecisos fez sondagens por telefone, o que induz um número maior desse indicador (indecisos).

Por último, a jornalista não questiona os dados coincidentes de todos os demais resultados, com pequenas variações, justamente quando entram os 50% de indecisos.  Estranho mesmo é ela falar desse “mercado de pesquisas”, os seus possíveis usos, e usar um dado de…de…de…pesquisa para referendar a ideia de que o eleitor ainda não se decidiu, na faixa dos 50%…

Uai, é para acreditar na pesquisa, qual pesquisa, em toda pesquisa, ou só na parte que convém?  Eu não acho que tenha sido má fé dela.  É só paixão política mesmo, vontade de que a sua versão ou visão da realidade seja a que se confirme. Ops, justamente o que ela criticou, né?

Pois é.  Nós podemos usar um discurso, números, enfim, podemos usar tudo para justificar nossos interesses e defendê-los.  O que não se pode é usar dois pesos e duas medidas.  Até porque, a história ensina que nenhum candidato favorecido pelas sondagens eleitorais jamais questionou a validade das pesquisas, mesmo que, depois, possa ser surpreendido por elas.  Já os que são desfavorecidos pelos números, sempre os questionam.

É do jogo.

Pesquisas eleitorais: desconfiar sempre é a medida mais saudável

pesquisas

Estou cada vez mais convencido que a confusão existente na situação eleitoral está tornando inúteis muitas das ditas pesquisas eleitorais. É que os cálculos feitos a partir de amostras, além de trazer erros inerentes ao processo de amostragem, também não são muito confiáveis do ponto de vista de captar a volatilidade do eleitorado. As pesquisas são, como se sabe, uma fotografia de momento e nem sempre retratam o processo real de decisão dos eleitores.

Além disso, como cada vez mais temos uma confusão entre pesquisas feitas por institutos supostamente independentes daqueles que claramente atendem a demandas de determinadas candidaturas, o problema ainda maior para aqueles que se baseiam em pesquisas para decidir em quem votar.

Vejamos, por exemplo, uma pesquisa feita pelo desconhecido Instituto FSB ,a pedido da BTG Pactual, após o início da propaganda eleitoral na televisão e do registro de candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ser impugnada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Jair Bolsonaro (PSL) continua à frente no cenário sem Lula. Além dele, Fernando Haddad (PT) Ciro Gomes (PDT) apresentaram crescimento, enquanto Marina Silva (Rede) teve queda.

Até aí morreu o Neves, pois estas oscilações seriam esperadas. O problema é que o contratante da pesquisa, o BTG Pactual, teve entre os seus fundados o economista Paulo Guedes, mentor do programa econômico de Bolsonaro.  A ligação de interesse direta entre o BTG Pactual e a candidatura de Bolsonaro passa sem dúvidas por essa ligação umbilical com Paulo Guedes. O problema é que os órgãos da mídia corporativa que disseminaram estes resultados simplesmente ignoraram esta questão, e passaram a difundir o resultado como se fosse efetivamente um retrato fiel da situação.  

Como se vê, há que se tomar muito cuidado não apenas com a fonte da pesquisa, mas com quem paga por sua realização. É que, por detrás da aparentemente neutralidade dos números, há muito interesse em jogo.  Por isso, antes de crer piamente em uma só pesquisa, é preciso levar em conta essas questões e comparar com outras, de preferência todas as disponíveis, para evitar comprar gato por lebre. Simples assim.