MPF rebate município de Campos (RJ) em processo sobre gestão local do SUS

Prefeitura recorre contra decisão do TRF2 de determinar regularização de serviços

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O Ministério Público Federal (MPF) rebateu um recurso do município de Campos dos Goytacazes (RJ) contra a sentença que o obriga a gerir melhor recursos federais para pôr fim às “inúmeras irregularidades em diversas unidades de saúde” do Sistema Único de Saúde (SUS). O réu alega, entre outras questões, que a ordem judicial afrontaria ao princípio da separação dos poderes. Em outubro, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) tinha julgado um processo do MPF contra o Município por irregularidades listadas por auditores do Denasus em relatórios sobre 2010 e 2015-2017, como as faltas de material e mão de obra em unidades de saúde.

O MPF na 2ª Região (RJ/ES) expediu manifestação contra um recurso no qual o município pede ao Supremo Tribunal Federal (STF) que reveja a decisão do TRF2. Na ordem contestada nesse recurso extraordinário, a 7ª Turma do Tribunal rejeitou alegações municipais como a de que o sistema local de saúde não se encontrava na situação apontada em 2015, ano inicial do processo. Se o recurso não prosperar, o MPF avalia que a sentença contra o Município poderá ser executada, ainda que de forma provisória.

“Há um lastro fático robusto e continuado de irregularidades na gestão dos recursos federais destinados à saúde”, afirmou o MPF ao defender que o recurso extraordinário não seja remetido ao STF. “Elas devem ser prioritárias, sobretudo se já empenhado valor de grande monta a determinado ente municipal. Assim, não se trata de afronta ao princípio da separação dos poderes, mas apenas de buscar a correção de inúmeras irregularidades constatadas em inspeções do Departamento Nacional de Auditoria do SUS, bem como em, ao menos, uma dezena de inspeções do MPF em unidades hospitalares, pré-hospitalares e unidades básicas de saúde no Município de Campos dos Goytacazes.”

Em sua manifestação, o MPF relatou ainda inspeções do Conselho Regional de Medicina (Cremerj)   em 2019 que confirmaram a persistência de inúmeras irregularidades citadas na ação de quatro anos antes. As inspeções em agosto daquele ano no Hospital Ferreira Machado e no Hospital Geral de Guarus se deviam à greve dos médicos e não seriam para o MPF produzir provas para o processo, como registrou o TRF2 na decisão contestada pelo Município.

Furadeira de construção na ortopedia

Os autos do processo incluem relatórios do Denasus e o mais recente, do Cremerj. Nele, médicos constataram irregularidades que, somadas, formam uma “situação caótica (…) onde há risco de morte por desassistência por falta de materiais, insumos, medicamentos e equipamentos”. No Hospital Ferreira Machado, viu-se o uso de furadeira de construção civil pela ortopedia, falta de autoclave (local para esterilização) funcionando na sala de atendimento ao politraumatizado, falta de medicamentos e insumos, superlotação de pacientes internados em macas nos corredores (com higiene sendo feita no corredor, em afronta à dignidade humana), respiradores sem bateria e falta de próteses vasculares.

No Hospital Geral de Guarus, o Cremerj viu condições de higiene precária, superlotação de pacientes internados em macas nos corredores, falta de antibióticos e outros medicamentos, uma farmácia da emergência sem aclimatação, respiradores sem bateria, falta de saída de oxigênio nos leitos, tomografia computadorizada sem funcionamento e CTI com deficiências em equipamentos.

Processo nº 0074441-49.2015.4.02.5103/RJ

Movimentos e organizações sociais divulgam carta contra a isenção fiscal de agrotóxicos

isenção agrotóxicos

Cerca de 75 movimentos e organizações sociais enviaram nesta quinta-feira (11) carta para secretarias de fazenda e governos estaduais solicitando que benefícios e isenções para agrotóxicos previstos nas cláusulas 1ª e 3ª do Convênio nº 100/97 não sejam renovados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). A próxima reunião do Conselho acontece nesta sexta-feira (12), às 10h, e precisa de decisão unânime dos membros sobre o assunto.

No documento, as organizações defendem que “alimentos essenciais para a vida da população brasileira devem ter benefícios fiscais, não os agrotóxicos”, lembrando que o maior volume de venenos agrícolas é direcionado para a produção de produtos para exportação – soja, milho e cana-de-açúcar corresponderam a 82% de todo o consumo de agrotóxicos em 2015.
Pode ser uma imagem de uma ou mais pessoas e texto que diz "QUEM PAGA A CONTA DA ISENÇÃO FISCAL DOS AGROTÓXICOS? #NÃO INCENTIVE INCEI AGROTOXICOS"
💲☠️ “Sobretudo em momento de colapso do SUS pela propagação da pandemia de COVID-19, é um contrassenso que o país permaneça estimulando, via benesses fiscais, o uso de produtos tóxicos que acarretam em internações por intoxicações crônicas ou agudas”, criticam.

📲 Confira na íntegra: https://bit.ly/3t7XppL

Dados do SUS embasam pesquisa sobre os efeitos da COVID-19 nas cinco regiões brasileiras

2-UPA-Jose-Rodrigues_foto-Marcio-James-Amazonia-Real_internaDe janeiro a agosto de 2020, o índice de mortalidade entre o pacientes com Covid-19 internados em UTIs na região Norte estava em 79% (Foto: Marcio James / Amazônia Real)

Por Paula Guatimosim o Boletim da Faperj

Coordenada pelo pesquisador Fernando Augusto Bozza, chefe do Laboratório de Pesquisa Clínica em Medicina Intensiva do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas da Fundação Oswaldo Cruz (INI/Fiocruz), em uma colaboração com pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (Idor), do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto de Saúde Global de Barcelona (ISGlobal), a pesquisa, que utilizou dados do Sistema Único de Saúde (SUS) coletados nas cinco regiões brasileiras, revela dados alarmantes. Do universo de 254.288 pacientes hospitalizados que testaram positivo para a COVID-19, 38% (87.515) faleceram; dos 79.687 pacientes que foram internados em Unidades de Terapia Intensiva (UTI), 59% (47.002) não sobreviveram, e nada menos que 80% (36.046) dos 45.205 doentes que precisaram de auxílio de respiradores morreram. E para quem ainda acha que a doença só afeta idosos, os dados mostram que 1/3 dos pacientes hospitalizados tinha menos que 50 anos e 47% menos de 60 anos.

Publicado em 15 de janeiro, o artigo “Caracterização das primeiras 250 mil internações hospitalares por COVID-19 no Brasil: uma análise retrospectiva de dados nacionais” (Aqui!) também mostra como a epidemia atingiu  populações das diferentes cinco regiões brasileiras (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul) de forma desigual. Os maiores impactos foram observados nas regiões em que a renda per capita é mais baixa e os sistemas de saúde mais precários, como por exemplo no recente colapso no estado do Amazonas, onde apenas na capital, Manaus, há UTIs

grafico1_fioO gráfico mostra o número de pacientes com Covid-19 hospitalizados, os que necessitaram de UTI, os que foram ventilados artificialmente em todas as regiões do País, bem como o percentual de óbitos nas diversas faixas etárias (Fonte: The Lancet)

A análise abrangeu retrospectivamente os dados de pacientes internados com COVID-19 durante os primeiros cinco meses da pandemia no Brasil, usando um banco de dados de âmbito nacional que cobre cada macrorregião. Foram avaliados doentes com registro no Sistema de Informação de Vigilância Epidemiológica da Influenza (Sivep-Gripe), usado desde 2012 pelo Ministério da Saúde para monitorar infecções respiratórias agudas graves no Brasil, entre os dias 16 de fevereiro e 15 de agosto de 2020. Neste período, a região Norte já apresentava 79% de mortalidade de pacientes em UTI, contra 49% no Sudeste. Os números mostram uma alta mortalidade hospitalar, mesmo entre pacientes jovens, e diferenças regionais substanciais em termos de recursos disponíveis e desfechos da doença. Do total de pacientes avaliados, 16% não tinham comorbidades e 72% receberam algum suporte respiratório (invasivo ou não invasivo). A mortalidade hospitalar em pacientes com menos de 60 anos foi de 31% no Nordeste contra 15% na região Sul. O Sivep-Gripe registra os casos e mortes devido à doença lançados por todas as unidades de saúde dos municípios, confirmados pelo teste RT-PCR, que é considerado o mais eficaz, ou padrão de referência, já que identifica o vírus e confirma a COVID-19 por meio da detecção do RNA do vírus.  

Bozza, que recebe apoio da FAPERJ para a realização de suas pesquisas por meio do programa Cientista do Nosso Estado (CNE) e da chamada Apoio a Projetos Temáticos, diz que o estudo ganhou grande repercussão, tanto dentro da comunidade científica quanto da população em geral. “Um dos objetivos da equipe foi informar os resultados da pesquisa por meio de uma linguagem acessível e em que os dados falassem por si”. Os pesquisadores foram motivados pela extrema pressão que a pandemia de COVID-19 provocou nos sistemas de saúde em todo o mundo, em especial devido ao aumento de internações hospitalares e o crescimento da demanda por leitos de UTI, suporte respiratório avançado e profissionais de saúde treinados. Para Fernando Bozza, o fato de o artigo ter “viralizado” nos diversos grupos de médicos nas redes sociais e tido boa repercussão na mídia mostra a importância da reflexão social e política sobre a epidemia e esse momento dramático para a humanidade e para o País.

No artigo, os pesquisadores chamam a atenção para o fato de o Brasil ter uma população de 210 milhões de habitantes distribuídos em uma extensa área territorial, com grande heterogeneidade entre suas cinco macrorregiões, incluindo disparidade socioeconômica, que se reflete na qualidade dos serviços regionais de saúde. “A COVID-19 afeta as populações e os sistemas de saúde de forma desigual, colapsando primeiro os sistemas de saúde mais frágeis e provocando desfechos piores sobre as populações mais vulneráveis, tanto econômica quanto biologicamente”, afirma o médico intensivista. A proporção geral de mortes hospitalares foi maior entre pacientes analfabetos (63%), negros ou pardos (43%) ou indígenas (42%). 

Fernando-BozzaBozza: para o pesquisador, País precisa usar os dados disponíveis para planejar políticas pública e tornar o sistema de saúde um sistema inteligente  

“Embora a pesquisa confirme o impacto negativo da pandemia sobre o sistema de saúde e sobre a população brasileira, também mostra a importância do Sistema Único de Saúde (SUS), onde foram gerados e disponibilizados os dados para a pesquisa”, ressalta Bozza. Ele diz que o principal objetivo do trabalho foi mostrar que a COVID-19 é realmente uma doença grave, com um índice de mortalidade muito alto e que atinge todas as faixas etárias, até mesmo os jovens. E que os dados estatísticos apresentados deveriam servir para nortear políticas públicas e ações para o enfrentamento da segunda e demais ondas que a doença possa provocar. “O País tem os dados, tem a competência para analisar os dados, mas precisa usar os dados e informações para planejar ações, elaborar políticas públicas e tornar o sistema de saúde um sistema inteligente. É triste saber que apesar da disponibilidade dos dados, a mortalidade no País não caiu”, alerta o médico. 

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Este artigo foi inicialmente publicado pelo Boletim da Faperj  [Aqui!].

Sob intensa pressão, Bolsonaro recua de decreto para privatização da UBS. Mas a pauta continua posta

bolsonaro 1Presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia no Palácio do Planalto. Por ADRIANO MACHADO

Os veículos da mídia corporativa estão noticiando que o presidente Jair Bolsonaro acaba de anunciar que irá revogar o Decreto No.10.530 de 26 de outubro de 2020 em função da repercussão altamente negativa que o anúncio do início da privatização do Sistema Único de Saúde causou em diversos segmentos da sociedade brasileira.

Essa tática de recuar rapidamente após jogar um mega bomba em meio a uma pandemia letal em que a necessidade de uma sistema público de saúde ficou clara no mundo inteiro não deve servir para enganar ninguém.

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General Pazuello toma posse no ministério da Saúde ao lado do presidente Jair Bolsonaro.  Por Marcelo Camargo/Agência Brasil

A verdade é que ainda esta tarde o ministro da Fazenda, Paulo Guedes, havia jogado sobre as costas do general Eduardo Pazuello o custo político de haver demandado a implantação de uma medida de que se provou altamente impopular.

Mas a verdade é que o objetivo básico do decreto já foi alcançado pelo governo Bolsonaro. Esse objetivo era simplesmente colocar na pauta política a privatização de um sistema de saúde que está garantido pela Constituição Federal de 1988 como sendo universalmente gratuito.

Essa bomba semiótica se combina com outra lançada pelo indescritível Ricardo Barros (PP/PR), líder do governo Bolsonaro na Câmara de Deputados que na última segunda-feira (26/10) havia proposto a realização de uma assembleia nacional constituinte para escrever uma nova constituição federal, visto que a de 1988 seria uma “que só tem direitos” e que  “torna o Brasil ingovernável”. 

O centro de toda essas manobras aparentemente despropositadas é sedimentar a ideia de que precisamos ter uma profunda reforma do Estado que remova todos os direitos que estão garantidos na Constituição de 1988. Esse, aliás, é o projeto com o qual Jair Bolsonaro foi acolhido pelas elites financeiras e pelos latifundiários como o candidato que defenderia um processo de destruição das garantias sociais existentes no Brasil.

Por isso, antes de que alguém queira celebrar o último recuo de Jair Bolsonaro, é bom lembrar que todas essas aparentes sandices irão emergir com força logo após as eleições municipais. A profundidade e a ferocidade dos ataques que virão dependerão dos resultados das eleições, mas não apenas deles.

O governo Bolsonaro publica decreto para iniciar privatização do SUS em plena pandemia da COVID-19

pandemia

Em uma demonstração de que não há limite para a sanha privatizante comandada pela dupla Jair Bolsonaro e Paulo Guedes, o governo federal fez publicar o Decreto No.10.530 de 26 de outubro de 2020 cujo mote é privatizar um número indefinido das 44 mil unidades básicas de saúde (UBS) existentes no Brasil, sem que o Ministério da Saúde tivesse sido ouvido. E isso, em plena pandemia da COVID-19!

Em um primeiro momento há que se entender que a UBS cumprem um papel estratégico que é o de garantir a capilarização do atendimento nos serviços públicos de saúde, fazendo alcançar as populações mais pobres e muitas vezes localizadas nas regiões mais periféricas das cidades brasileiras e das suas regiões rurais.

A privatização das UBS seria um papel gigantesco na universalização dos serviços públicos, o que, na prática, deixará de fora uma parcela muita significativa da população brasileira de qualquer tipo de assistência médica. E isso, pasmem, em um contexto histórico em que nunca se teve tanto trabalhador desempregado no Brasil. 

A reação inicial a essa proposta absurda está vindo de todos os quadrantes sociais, especialmente de especialistas e de entidades de saúde, o que muitos lerão como uma inviabilização da proposta de privatização do SUS. Eu já diria que o governo Bolsonaro está, mais usando, a tática de estabelecer metas aparentemente absurdas para serem rejeitadas, ocultando o objetivo real que depois é vendido com mais palatável. 

Em função dos riscos entranhados de que até parcela da dita oposição ao governo Bolsonaro aceite propostas que não sejam as mais aparentemente absurdas, não podemos deixar que esse ataque ao SUS fique sem resposta, como tem ficado a privatização da Petrobras, por exemplo. E é preciso ter claro que se um poderoso movimento de resistência não for criado por sindicatos, movimentos sociais e associações de moradores, a privatização do SUS ocorrerá. Tudo em nome do aumento do lucro das grandes instituições financeiras e aquela parcela de 1% dos brasileiros que vivem da especulação financeira.

Com SUS e experiência com zika, resposta do Brasil à pandemia frustrou expectativa, afirma editorial

ms bolsonaro

Por bori

Os dados brasileiros de infecção e óbitos decorrentes da Covid-19, que chegam a mais de 100 mil mortes em 8 de agosto, segundo consórcio de veículos da imprensa, frustrou as expectativas de reação do estado brasileiro à crise sanitária. A constatação é de editorial da Revista de Administração Pública (RAP), em edição especial sobre a pandemia. Segundo a análise inédita, que será lançado na segunda (10), esperava-se uma reação melhor do Brasil frente à pandemia de Covid-19, por causa da existência da estrutura do Sistema Único de Saúde (SUS) e da aprendizagem adquirida no combate a epidemias como H1N1, em 2009, e zika, em 2015. Não foi o que aconteceu.

A edição completa da RAP traz 35 artigos de autores de 41 instituições de pesquisa, que tratam das capacidades e estratégias estatais de enfrentamento da crise, as respostas comportamentais à pandemia, explorando fatores de predisposição ao isolamento social, como polarização política, e a capacidade de mobilização das organizações da sociedade civil (OSCs). “Nestas pesquisas são discutidos e mensurados os efeitos da pandemia na política, no mercado de trabalho, na educação básica, em setores de prestação de serviços públicos e nas micro e pequenas empresas”, escreve Alketa Peci, editora da RAP. Os textos estão disponíveis no site da revista.

Além de detectar capacidades existentes, como o SUS, os artigos também identificam fragilidades do sistema estatal, considerado central para a gestão da pandemia, segundo o editorial. A ideia é que “este conjunto de reflexões subsidie, com evidências, os processos de tomada de decisão no contexto da pandemia e demarque, no âmbito da administração pública brasileira, o potencial da contribuição da pesquisa acadêmica na gestão da crise e de suas consequências”, finaliza o editorial.

Invasões de hospitais: coletivo de médicos cearenses responde diretamente a Jair Bolsonaro

rebento

O “Coletivo Rebento” de “Médicos em Defesa da Ética, da Ciência e do SUS” é composto por médicas e médicos cearenses defensores do Sistema Único de Saúde (SUS) produziu o vídeo abaixo onde seus membros respondem ao presidente  Jair Bolsonaro que pediu por invasões e filmagens em hospitais públicos supostamente para que se documento a existência de leitos ociosos em meio à pandemia da COVID-19.

A linguagem especificamente direta e dura ao chamado do presidente, que já resultou em múltiplas invasões e tentativas fracassadas de adentrar unidades de saúde onde cidadãos com COVID-19 são tratados reflete a irritação de um segmento profissional que está na linha de frente do combate a uma pandemia letal que assola o Brasil  neste momento.

Avalio que este tipo de reação dentro das diversas categorias profissionais que atuam na área de saúde se tornará cada vez mais eloquente na medida em que dentro delas está ocorrendo um nível particularmente alto de mortes, mesmo quando comparado a outros países como Itália, Espanha, França, Reino Unido e EUA.

O desprezo ao esforço que os profissionais de saúde, especialmente os médicos e enfermeiros, estão realizando neste momento é provavelmente um dos erros mais básicos que o presidente Jair Bolsonaro já cometeu em sua longa carreira política. Um erro que ainda lhe deverá causar muitos dissabores em um tempo em que ele já se encontra no limite do seu capital político.

Controladores do Magalu destinam 10 milhões de reais para combate à COVID-19

Famílias Trajano e Garcia doaram respiradores artificiais, leitos, colchões e travesseiros para hospitais e governos estaduais

MAGALU

As famílias Trajano e Garcia, controladoras do Magazine Luiza, maior plataforma digital de varejo do país, anunciaram hoje que vão doar 10 milhões de reais em equipamentos e outros itens que serão usados no tratamento das vítimas brasileiras da pandemia de COVID-19 (novo coronavírus). O valor está sendo destinado à compra de respiradores artificiais, leitos, colchões e travesseiros para equipar hospitais públicos e filantrópicos de todo o país.

Já foram doados monitores cardíacos para o Hospital Emílio Ribas, de São Paulo, centro de referência nacional em infectologia, e ventiladores pulmonares para uma unidade do Sistema Público de Saúde (SUS) localizada na Vila Guilherme, bairro onde fica a sede do Magalu, na cidade de São Paulo, e para a Santa Casa da cidade de Franca, no interior do estado. Por meio da Communitas, organização da sociedade civil que promove parcerias entre os setores público e privado, as famílias Trajano e Garcia destinaram 2 milhões de reais para compra de ventiladores pulmonares para o estado de São Paulo. Um milhão de reais foi doado para a Amigos do Bem, ONG que trabalha para a melhoria das condições de vida de populações carentes no sertão nordestino.

Também foram doados, até o momento, 4 000 colchões e travesseiros para os governos estaduais do Pará e da Bahia. Esses itens serão usados para equipar abrigos para moradores de rua e para outras populações socialmente vulneráveis, com sintomas de COVID-19.

Mudar a política econômica e fortalecer o SUS são medidas corretas para combater coronavírus

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Por Carlos Ocklé Reis*

A Organização Mundial da Saúde – OMS – elevou a Covid-19, infecção respiratória aguda provocada pelo novo coronavírus (SARS-CoV2), à categoria de pandemia na última quarta-feira, 11 de março, pressionando os mercados em escala global com sua disseminação em mais de cem países, em todos os continentes.

Apesar da insegurança sobre a magnitude e duração dessa pandemia, neste momento de desaceleração econômica, um conjunto de países adota medidas para fortalecer suas economias e sistemas de saúde: vários bancos centrais já reduziram seus juros e vêm defendendo políticas fiscais expansionistas.

Vale dizer, a decisão da Arábia Saudita de reduzir o preço do petróleo, dentro da disputa geopolítica internacional entre Rússia e EUA, acabou contribuindo para o aumento da instabilidade na economia mundial, já debilitada com a agudização da crise sanitária.

No Brasil, por exemplo, o dólar atingiu a marca histórica de R$ 5 reais e, além da fuga de capital observada em 2019, esse ano já saíram R$ 50 bilhões de dólares. Dada a queda dos preços dos ativos de risco, o Ibovespa suspendeu o pregão da bolsa de valores diversas vezes essa semana, deixando claro que a política econômica equivocada de Guedes desarma o país para o enfrentamento desta pandemia.

Diante de tais incertezas econômicas e sanitárias é crescente o risco de a economia global crescer abaixo de 1,5% em 2020, comprometendo a capacidade de pagamento das dívidas das empresas petrolíferas, uma vez que o baixo preço do petróleo pode colocar em xeque o mercado de crédito nos Estados Unidos (Federal Reserve injetou US$ 1,5 trilhões de dólares para regular as operações de curto prazo entre as instituições financeiras).

Neste quadro, de um lado, a União Europeia criará um fundo de 25 bilhões de euros para combater os efeitos da pandemia na zona do euro, que será usado, entre outros, para reforçar os sistemas de saúde e proteger o mercado de trabalho europeu. Em particular, o Reino Unido anunciou a aplicação de 30 bilhões de libras para enfrentar o coronavírus. De outro lado, a Casa Branca anunciou também um pacote de estímulos fiscais, bem como prometeu ampliar a licença médica dos trabalhadores estadunidenses. E, finalmente, a Itália pretende oferecer uma moratória do pagamento de dívidas e hipotecas, para permitir que trabalhadores e empresas enfrentem o coronavírus: o governo italiano aplicará até 10 bilhões de euros para reduzir os danos causados pela pandemia.

Sendo assim, o governo Bolsonaro está no mínimo mal assessorado ao seguir a cartilha de Guedes. A China, é bom lembrar, precisou adotar medidas agressivas do ponto de vista social e econômico contra a expansão da doença, que permitiu a redução do número de novos casos.

No contexto de redução de R$ 20 bilhões dos recursos da saúde, entramos na fase da transmissão comunitária do vírus, que tem alta taxa de letalidade entre os idosos: idade avançada, doenças crônicas e respiratórias, e sinais de sepse indicam maior risco de gravidade.

Desse modo, o Ministério da Economia não pode permanecer prisioneiro da sua estratégia de manter as restrições aos investimentos públicos e gastos sociais, de negar o papel do BNDES como garantidor do crédito de longo prazo da economia, de aprofundar a política de austeridade com a aprovação das “reformas” e de contingenciar o orçamento federal em 2020.

Essa postura fiscalista é irracional e irresponsável. Devemos nos prevenir para evitar o quadro sofrido até agora pela China, Itália, Irã, Coréia do Sul e mesmo os Estados Unidos. O próprio Banco Central Europeu recomendou a aplicação da política fiscal para combater o coronavírus, citando a crise financeira de 2008 como um exemplo dos riscos associados à paralisia governamental.

O mercado fez o seguinte balanço antes do anúncio da pandemia pela OMS: no cenário otimista haveria estabilização do ritmo da alta de novos infectados e controle efetivo da transmissão em dois meses; no intermediário, a epidemia continuaria a se espalhar pelo mundo, mas sem se transformar numa pandemia global, encerrando seu ciclo em julho; e, finalmente, no cenário pessimista, o coronavírus se tornaria uma pandemia com reflexos negativos sobre a demanda global até o terceiro trimestre de 2020.

Dada a estagnação da economia brasileira, o governo precisa responder a esses cenários revogando o teto do gasto (Emenda Constitucional 95), para retomar o crescimento econômico, aumentar a arrecadação e fortalecer as políticas sociais para mitigar os efeitos desta pandemia, no contexto do aumento da pobreza e da desigualdade na sociedade brasileira.

A rigor, os investimentos públicos e os gastos sociais devem ser avaliados pela sua efetividade, ou seja, pelo seu efeito multiplicador na cadeia produtiva e pelo bem-estar produzido na sociedade e não apenas pelos efeitos fiscais produzidos sobre o déficit primário. A inflação está abaixo do centro da meta e o Banco Central vem reduzindo a taxa de juros, abrindo espaço fiscal para o governo adotar uma política contracíclica, a partir da introdução de três mecanismos:

(i) a despesa primária deve estar condicionada a uma meta fiscal vinculada ao ciclo econômico (Produto Interno Bruto ou Receita Corrente Bruta);

(ii) o investimento público deve ser retirado do cálculo do superávit primário (assim como o gasto com juros é retirado desse indicador);

(iii) a abertura de crédito extraordinário para o SUS no valor de R$ 20 bilhões, criando um fundo público emergencial semelhante ao da União Europeia.

Cabe destacar, os recursos deste fundo teriam por objetivo fortalecer o SUS, assegurar condições dignas de trabalho aos profissionais de saúde e proteger a população: (i) retomada do programa Mais Médicos; (ii) melhoria das ações de vigilância em saúde; (iii) busca ativa de possíveis infectados a partir dos agentes comunitários de saúde (iv) ampliação do teste laboratorial do coronavírus; (v) garantia de insumos, equipamentos e respiradores nas unidades de saúde; (vi) oferta de leitos hospitalares e de unidades de terapia intensiva; (vii) agilidade da licença médica dos trabalhadores (auxílio-doença); (viii) organização das quarentenas e dos isolamentos de locais públicos com a participação do controle social; (ix) campanhas educativas massivas nas rádios, tevês e redes sociais.

Em particular, é fundamental destinar recursos adicionais para a Fiocruz desenvolver kits de diagnósticos, bem como para participar dos esforços da comunidade científica internacional na busca da vacina contra o coronavírus. Como afirma corretamente o professor Reinaldo Guimarães, vice-presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco “(…) não é razoável acreditar que um país que não estiver envolvido no esforço global de pesquisa e desenvolvimento de ferramentas diagnósticas, terapêuticas ou de vacinas contra o vírus poderá ter a capacidade de produzir industrialmente essas ferramentas e o direito de comercializá-las”.

Essas medidas econômicas demostrariam que o governo está adotando ações efetivas para conter e monitorar a expansão da doença e preparar o SUS para o seu enfrentamento, caso haja um crescimento exponencial de casos.

Desse modo, considerando as altas taxas de desemprego e as condições de moradia e transporte da maioria da população brasileira, bem como o tamanho do mercado informal de trabalho sem cobertura previdenciária, não devemos subestimar os efeitos dessa pandemia, tampouco o nível de estresse sobre o Sistema Único de Saúde – SUS, que hoje está desfinanciado e pressionado pela dengue e pelo retorno de doenças evitáveis, como sarampo e febre amarela.

*Carlos Ocké-Reis é economista, pesquisador do Ipea e pós-doutor pela Yale School of Management. Vice-presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde (ABrES) (as opiniões emitidas não exprimem, necessariamente, o ponto de vista do Ipea).

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Arte: Hara Flaeschen

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Este material foi inicialmente no site da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) [Aqui!].

Despreparado para a pandemia, o SUS perdeu quase 50 mil leitos desde 2007

uti leitgosCoronavírus chega ao Brasil em um momento em que o SUS já está altamente sobrecarregado e sem leitos suficientes para acomodar os doentes.

O gráfico abaixo mostra a evolução negativa do estoque de leitos hospitalares disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS) nos últimos 12 anos, indicando a perda de quase 50 mil unidades. Esse é o resultado de um ataque contínuo do acesso a hospitais públicos que hoje deixa os mais pobres basicamente desamparados, enquanto diversas enfermidades graves circulam no Brasil, a começar pelo Coronavírus.wp-1584098908582.jpg

A questão da diminuição de leitos hospitalares é apenas uma faceta do desmanche do SUS, uma experiência que, mesmo com uma série de problemas, logrou dotar os brasileiros mais pobres do acesso à saúde universal.  E é por isso mesmo que desde a sua criação, o SUS tem estado na mira de diferentes administrações federais cuja opção preferencial é de favorecer os interesses das grandes corporações financeiras que se alimentam da dívida pública brasileira, ainda que causando enormes sacrifícios aos mais pobres que não tem como pagar planos privados de saúde.

As autoridades do setor da saúde, a começar pelo ministro da Saúde, claramente subestimaram o impacto que a chegada do Coronavírus no Brasil, especialmente em termos da necessidade de um estoque maior do que aquele que existe nos hospitais. E como o Brasil não é a China que demonstrou a capacidade de construir unidades hospitalares em menos de duas semanas apenas para atender os infectados pelo Coronavírus, as expectativas para um eventual alastre dessa enfermidade não têm como ser boas, e provavelmente passaremos por momentos caóticos, onde os servidores públicos da área da saúde serão chamados a se colocar na linha de frente do combate sem que sequer estejam preparados para não serem eles mesmos contaminados.

Enquanto isso, o governo Bolsonaro seguirá tentando impor retrocessos a esses e outros servidores públicos, como se a causa da bancarrota das contas públicas fossem os salários dos empregados do estado e não as exorbitantes quantias que são entregues aos bancos todos os dias sob a desculpa de pagar uma dívida pública para a qual não se tem a menor transparência.

A realidade que se avizinha é dura e passaremos por uma dura prova. Mas o essencial aqui é entender a importância de se proteger o SUS e impedir o seu desmantelamento. O fato é que a rede privada de saúde não está nem preparada ou interessada em enfrentar situações como o país está começando a enfrentar neste momento. Por isso, a necessidade estratégica de defender o SUS dos ataques que vem recebendo sob o argumento de diminuir as despesas do Estado brasileiro.