MPF pede urgência na análise de recurso sobre a instalação de termelétricas na Baía de Sepetiba (RJ)

Há quase um ano o MPF atua para impedir instalação de quatro usinas no mar
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O Ministério Público Federal (MPF) manifestou-se pela imediata continuidade de duas ações civis públicas que tratam da instalação de quatro usinas termelétricas flutuantes e 36 torres de transmissão de energia, na Costa Verde, região litorânea do sul fluminense.

O projeto da empresa Karpowership abrange a instalação das termelétricas a gás sobre balsas que flutuarão sobre a Baía de Sepetiba (RJ) Juntas, as usinas possuem a capacidade instalada de 560 megawatts de energia. Já as torres de transmissão de energia elétrica percorrerão cerca de 14 km de extensão, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, sendo que parte das torres serão fincadas no espelho d’água da baía. Confira infográfico no fim do texto.

Em nova manifestação encaminhada em fevereiro à Justiça Federal, o MPF pediu a remessa dos autos para o Tribunal Regional Federal da 2ª região (TRF2), para que os recursos sejam analisados o quanto antes.

O MPF contesta as sentenças que extinguiram prematuramente as duas ações civis públicas. As sentenças do juiz de primeira instância adotaram como fundamentação uma suposta ilegitimidade do MPF, alegando de falta de interesse federal. Os recursos do MPF, no entanto, lembram que o megaempreendimento, objeto das duas ações propostas, localiza-se e impacta diretamente o mar territorial, bem da União. Além disso, o MPF observa que, para além de impactar um bem da União, cuja gestão compete aos órgãos federais, os interesses em questão transcendem os limites locais e dizem respeito aos interesses coletivos presentes na proteção do patrimônio socioambiental.

Mérito

Os recursos reiteram os pedidos formulados nas duas ações civis públicas ajuizadas em 2022. Entre eles está o pedido para que o Instituto Estadual do Meio Ambiente (Inea) seja impedido de conceder quaisquer licenças que permitam a instalação e a operação das torres de linha de transmissão e das usinas sem o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) completo e adequado.

O MPF argumenta que o licenciamento precisa necessariamente “abarcar os impactos cumulativos e sinérgicos do empreendimento, o que deve exigir um estudo multidisciplinar a respeito dos efeitos negativos das linhas de transmissão, da instalação e funcionamento das quatro termelétricas, em conjunto com as atividades poluentes já desenvolvidas na região, e o que o conjunto desses impactos acarreta sobre a biota”. Nessa linha, o MPF pede a anulação das licenças ambientais que ,a toque de caixa, autorizaram a instalação e operação de 36 torres de linha de transmissão de energia e das quatro usinas termelétricas flutuantes na baía.

De acordo com o procurador da República Jaime Mitropoulos, a licença emitida pelo Inea abriu mão do EIA/Rima, necessários para a realização desse tipo de atividade altamente poluente. Os estudos técnicos multidisciplinares aprofundados deveriam detalhar a intensidade e dimensão do impacto do empreendimento e apontar possíveis alternativas ou possíveis medidas mitigadoras e compensatórias adequadas, caso fosse atestada a viabilidade do megaempreendimento.

“No entanto, o órgão ambiental, agindo por delegação do Ibama, não observou o dever de exigir estudos mais detalhados e abrangentes possíveis, descurando, assim, de seu dever de máxima proteção aos meio ambiente”, ressalta Jaime Mitropoulos. O procurador da República ainda aponta a falta de transparência do órgão ambiental, que emitiu as licenças ambientais sem as indispensáveis audiências públicas para debater os impactos do empreendimento com os moradores da região afetada.

Quanto à Karpowership, o pedido é para que a empresa não realize qualquer atividade sem os licenciamentos ambientais. Além disso, o MPF pede que a empresa e o órgão ambiental paguem indenização pelos danos que porventura venham a ser apurados.

Cronologia da atuação do MPF no caso:

Março de 2022 – Ainda durante a apuração dos fatos, o MPF recomendou ao Inea que anulasse a licença para instalação de 36 torres de transmissão de energia na Baía de Sepetíba (RJ) e que nenhuma outra fosse emitida antes do EIA/RIMA;

Março de 2022  Não acatada a recomendação, o MPF ajuíza ação civil pública 5020957-93.2022.4.02.5101  na qual questiona a falta de EIA/RIMA e o indevido fracionamento do licenciamento, fatiado para permitir a instalação e operação das 36 torres temporárias de linha de transmissão de energia. O MPF pediu urgência e alegou que os quase 14 km de extensão das linhas de transmissão fazem parte do megaempreendimento das 4 termelétricas e que, por si só, já causariam significativo impacto ambiental, visto que resultariam em supressão de trecho da Mata Atlântica e áreas de preservação permanente, como, por exemplo, manguezais.

Maio de 2022 Considerando que a empresa empreendedora já havia contestado a primeira ação e que, neste ínterim, o Inea concedeu licença para instalação e operação das quatro termelétricas, o MPF propõe uma segunda ACP – 5041112-20.2022.4.02.5101. Desta vez, o órgão ministerial pediu a nulidade do licenciamento das termelétricas e a suspensão de qualquer atividade de que visasse a instalação dos equipamentos no local dos fatos. O parquet federal volta a alegar que o licenciamento do megaempreendimento não poderia ter sido fracionado e tampouco deveria ter dispensado o necessário, completo e aprofundando EIA/RIMA.

Setembro de 2022  Após diversas reiterações sobre a urgência e necessidade da concessão da tutela jurisdicional de urgência, a Justiça Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro extingue o processo sem analisar o mérito, alegando, entre outras coisas, ilegitimidade do MPF, falta de competência da Justiça Federal e uma suposta litispendência. Em relação a esse último ponto, o MPF esclarece, nos recursos de apelação interpostos, que existe uma antiga decisão proferida pela Justiça do Estadual, obrigando o Estado do Rio de Janeiro a se abster de licenciar atividades de significativo impacto ambiental sem o necessário EIA/RIMA. No caso das quatro termelétricas, além da magnitude do empreendimento, da alta capacidade de produção de energia suja, da direta influência no mar territorial, na Mata Atlântica e em áreas de preservação permanente, tanto o empreendedor quanto o Estado do Rio de Janeiro alegam que não há significativo impacto ambiental, argumento adotado para dispensar o EIA/RIMA no caso concreto.

Novembro de 2022  MPF envia nova manifestação à Justiça Federal, requerendo que os recursos sejam encaminhados ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região, logo assim que decorridos os prazos para contrarrazões dos apelados.

Fevereiro de 2023 Uma vez decorridos os prazos, MPF cobra o envio dos autos para o TRF2 para análise dos recursos, salientando que há requerimentos de tutela recursal de urgência, através dos quais busca-se efetividade da prestação jurisdicional.

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Termelétricas da privatização da Eletrobras agravam problemas socioambientais do Brasil, alerta IEMA

Se contratadas no leilão do dia 30, vão emitir 5,2 milhões de toneladas de carbono e gerar poluentes do ar, desmatamento e estresse hídrico no Norte e Nordeste

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As novas usinas termelétricas a serem contratadas no próximo leilão de reserva de capacidade de energia (LRCE-2022), do dia 30 de setembro, devem emitir 5,2 milhões de toneladas de tCO2e ao ano associadas à entrada de 2 gigawatts (GW) na matriz elétrica brasileira a partir do fim de 2026. Esse valor equivale a quase 30% de tudo o que foi emitido por usinas termelétricas de serviço público a gás natural no país em 2020. O alerta está disponível no novo Boletim Leilão de Energia Elétrica divulgado hoje, dia 28 de setembro, pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA). 

Esse leilão é diferente dos demais. É o primeiro realizado para cumprir a Lei 14.182/2021 que prevê a contratação de usinas termelétricas para início de operação entre 2026 e 2030. Apesar de versar sobre a privatização da Eletrobras, a versão final do texto conta com os chamados “jabutis” (alusão ao ditado “jabuti não sobe em árvore”) uma vez que determina a admissão de pelo menos 50% da demanda de leilões por Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e um total de 8 GW por termelétricas a gás natural para além da abertura de capital da empresa estatal. 

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Com exceção de projetos específicos, como a construção das hidrelétricas de Belo Monte, Santo Antônio e Jirau, é a primeira vez em que as usinas devem ser contratadas em regiões pré-estabelecidas: até 1.000 MW na Região Norte, 300 MW no Maranhão e 700 MW no Piauí. Vale ressaltar que essas termelétricas serão ligadas em tempo integral, ao contrário do que fazia-se antigamente no Brasil, quando eram acionadas para poupar os reservatórios das hidrelétricas em tempos de crise hídrica ou em momentos de pico de demanda. A operação de termelétricas em tempo integral quebra essa regra e reduz o espaço de participação das demais fontes de energia. Lembrando que as energias renováveis, como solar e eólica, têm custo mais barato quando comparadas às termelétricas.

Além disso, esse leilão estipula um preço ainda maior comparado ao que foi contratado nos últimos realizados. Segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), 37 empreendimentos se cadastraram, totalizando 11.889 MW que devem cumprir a exigência de ter um custo variável unitário (CVU) inferior ou igual a R$ 450,00/MWh. O valor anterior era de R$ 400/MW. Outra condição para os projetos participantes é sua localização em regiões sem estrutura de gasodutos e terminais de Gás Natural Liquefeito (GNL), necessários para abastecer as termelétricas.

A expansão de gasodutos totaliza uma extensão de 7.476 km, quase duplicando a malha atual do país. Caso essa infraestrutura seja totalmente implantada, demandará quase R$ 57 bilhões do orçamento, com impacto direto na alteração dos usos do solo e aumento das emissões de gases de efeito estufa (GEE) desses projetos. Acrescenta-se o risco de tornar a matriz elétrica mais dependente de um combustível importado, como é o caso do GNL, sujeito a variações de preço internacional e indexado ao dólar. As consequências dessa escolha já foram sentidas na conta de luz em 2021.

Com contratos de 15 anos, até 2042 o IEMA calcula que as usinas contratadas no LRCE devem emitir 77,6 milhões de toneladas de CO2e na atmosfera: 38,8 milhões pela Região Norte; 27,2 pelo Piauí; e 11,6 pelo Maranhão. Ao todo, devem ser contratados segundo a Lei 14.182/2021 2,5 GW na Região Norte, 2,5 GW na Região Centro-Oeste, 2 GW na Região Sudeste e 1 GW na Região Nordeste que emitirão até 2045 310 milhões de toneladas de CO2e.

Por conta da queima de combustíveis, usinas termelétricas emitem gases e partículas que, em elevadas concentrações na atmosfera, têm efeitos negativos comprovados na saúde humana e no meio ambiente. Entre eles, destacam-se o material particulado (MP), o monóxido de carbono (CO), os óxidos de nitrogênio (NOx) e os óxidos de enxofre (SOx). Alguns desses poluentes participam de reações na atmosfera, dando origem a poluentes secundários como o ozônio troposférico (O3). A degradação da qualidade do ar tem sido associada ao agravamento de doenças respiratórias, cardiovasculares e neurológicas, bem como diferentes tipos de câncer. Porém, em nenhuma das áreas habilitadas para a contratação das usinas há estações de monitoramento da qualidade do ar em operação e que disponibilize para a sociedade as concentrações de poluentes aferidas.

O investimento em térmicas que estarão em operação no sistema até pelo menos 2042, além de representar custos adicionais de gasodutos em relação a outras opções energéticas menos custosas para o atendimento dos maiores centros de carga do país, estarão sendo comprometidos em uma fonte energética que tornará mais distante a necessária descarbonização da matriz elétrica brasileira, na contramão do cenário global de transição energética. 

Por fim, outro fator importante e preocupante é a dificuldade em encontrar informações técnicas e de licenciamento sobre as unidades geradoras participantes de forma fácil e acessível. Até o dia 22 de setembro de 2022, data de finalização do boletim, foi impossível encontrar informações sobre o licenciamento de sete das 33 unidades geradoras habilitadas para o leilão. Mesmo para aquelas em que o processo de licenciamento foi encontrado e consta a emissão de algum documento, apenas estão disponíveis para download as Licenças Ambientais de 13 unidades e para apenas 5 delas foi possível o acesso ao Estudo de Impacto Ambiental (EIA) dos empreendimentos a serem construídos. “A ausência de informações mais detalhadas sobre as tecnologias empregadas nos empreendimentos, sua localização e uso de água, entre outros dados, torna a avaliação dos impactos ambientais desafiadora e incompleta tanto por parte do poder público quanto por parte da sociedade civil”, ressalta Raissa Gomes, pesquisadora do IEMA.

Sobre o Boletim Leilão de Energia

Essa é a quarta publicação realizada pela organização sobre os leilões de energia elétrica. O objetivo é analisar as implicações dos projetos concorrentes em relação aos seus atributos ambientais como emissão de gases de efeito estufa (GEE), poluentes locais, uso de água, conformidade com requisitos de licenciamento e atendimento ao sistema elétrico para alertar a população e o poder público sobre os possíveis problemas. 

Licenciamento ambiental “fast food” de termelétricas flutuantes ameaça a Baía de Sepetiba, denuncia ONG

Desastre anunciado: Arayara.org alerta sobre irregularidades de usinas termoelétricas a serem instaladas sem Estudo de Impacto Ambiental em área sensível do Rio de Janeiro.  Notificações extrajudiciais emitidas pela Arayara aos órgãos responsáveis lista irregularidades das Usinas Termelétricas Flutuantes da empresa turca KarpowerShip, que pretende se instalar em zona de preservação da Baía de Sepetiba, RJ

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O Instituto Internacional ARAYARA realizou nesta segunda, dia 9 de maio, uma série de notificações extrajudiciais pedindo a suspensão da precária licença ambiental do empreendimento termelétrico da empresa Karpowership Brasil Energia Ltda, emitida pelo INEA (Instituto Estadual do Ambiente), além do arquivamento do projeto. O documento aponta seis principais irregularidades no processo de licenciamento, assim como o rompimento com leis municipais, estaduais, federais e internacionais, como o CONAMA 01/86, lei nº 12.651/2012 do Código Florestal e Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). É endereçada à Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), à Comissão Estadual de Controle Ambiental – CECA, ao Grupo de Trabalho (GT) do Acordo de Cooperação no 05/2022 IBAMA e INEA, à Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal – CCAF da Advocacia-Geral da União, ao Serviço de Regularização Ambiental e Delegações – SERAD da Diretoria de Licenciamento Ambiental (Dilic) do IBAMA e ao próprio diretor do IBAMA, ao Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro – CREA RJ, ao Conselho Regional de Biologia – 2a Região RJ/ES e às Coordenações da Frente Parlamentar Ambientalista na Câmara Federal e no Senado Federal.

Este megaempreendimento está planejado para ser instalado na Baía de Sepetiba, nos municípios do Rio de Janeiro e Itaguaí, e compreende quatro unidades flutuantes geradoras de energia movidas a gás, uma unidade Flutuante de Armazenamento e Regaseificação de GNL, além de 36 torres temporárias, ancoradas em terra e mar, de transmissão de energia. Segundo a ARAYARA, o potencial poluidor do complexo é alto e de porte excepcional, enquadrado na classe 6C – Impacto Significativo, onde jamais poderia ter sido isentado a realização do EIA/RIMA deste empreendimento.

Área na Baía de Sepetiba onde a KarpowerShip quer se instalar as usinas termoelétricas e torres de transmissão

Área na Baía de Sepetiba onde a KarpowerShip quer instalar as usinas termoelétricas e torres de transmissão

São enumerados os seguintes pontos de irregularidades:

1. O não cumprimento do cronograma de datas para cada etapa do projeto, aprovado pela ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica);

2. A não competência do INEA para viabilizar o licenciamento ambiental, cujo processo iniciado no órgão estadual foi anterior ao convênio de delegação por parte do IBAMA;

3. A supressão vegetal e escavação de áreas do bioma de Mata Atlântica e áreas de manguezais, que exigem obrigatoriamente o Estudo de Impacto Ambiental não realizado pelo empreendimento;

4. A não existência de um cenário de crise energética e hídrica no Brasil que serviu como justificativa para a contratação do projeto temporário;

5. A falta de consulta às populações tradicionais diretamente impactadas, que fora do processo de licenciamento foram alertadas. Aconteceu apenas uma audiência pública que não foi promovida pelo processo de licenciamento.

6. As informações inadequadas, escassas e omissas apresentadas pela empresa Karpowership.

Segundo cronograma aceito e homologado pela ANEEL com base em urgência movida por uma crise hídrica que já não se faz mais realidade, o início da operação de teste deveria acontecer em 24 de abril e o início da operação comercial em 1º de maio, prazo este que já foi descumprido.

“O Brasil não se encontra mais em um cenário de crise do abastecimento hídrico e energético, motivo que foi usado para justificar o caráter temporário de curto prazo (44 meses) do empreendimento de alto impacto” comenta John Würdig, técnico sênior da Arayara.org.

A supressão de 7,33 hectares de vegetação da Mata Atlântica, uma parte em estágio avançado de regeneração, e de áreas de mangue são tópicos sensíveis que não foram estudados pela empresa, nem INEA, nos documentos apresentados. A Baía de Sepetiba é considerada, pela Constituição Estadual do Rio de Janeiro em seu Artigo 269, área de relevante interesse ecológico. Já o Ministério do Meio Ambiente a considerou de importância biológica e ecológica extremamente alta e uma das mais preciosas do litoral brasileiro,  pois abriga um conjunto de áreas de manguezais, que compreendem um dos maiores e mais conservados remanescentes desses ecossistemas no litoral fluminense. Segundo a Lei Federal nº 11.428/06 sobre a Mata Atlântica e Resolução CONAMA 01/86, é obrigatoriedade a realização de EIA/RIMA para o licenciamento ambiental de Usinas Termelétricas acima de 300 MW.

O atropelamento do trâmite ordinário do licenciamento ambiental inviabiliza o seguimento de processos necessários para a segurança social e ambiental do local. As notificações destacam trecho do processo de licenciamento que afirma que “não faz sentido, ao menos no presente momento, que ocorra a supressão de vegetação nativa, inclusive em estágio avançado de desenvolvimento e em mangue, se a concretização do projeto ainda é incerta”.

Milhares deixados à deriva

Segundo levantamento realizado no Estudo de Impacto do Meio Ambiente do empreendimento de Ampliação do Porto Sudeste, o número de pescadores registrados na baía de Sepetiba, em 2017, era de 3.307 pescadores. Neste estudo, foram identificadas 15 artes de pesca diferentes que são empregadas pelos pescadores locais, que não foram previamente avisados ou ouvidos, rompendo com a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), assinada e homologada pelo Brasil.

“As termoelétricas encarecem a conta de energia elétrica, e isso é repassado aos consumidores, à indústria, comércio e toda a cadeia produtiva. Investir em mais termoelétricas é uma irresponsabilidade que só agrava a crise econômica e social levando milhares de pessoas à linha da miséria. Nesse caso, ainda afeta diretamente o ganha pão de quem trabalha na pesca” diz Nicole Figueiredo de Oliveira, diretora da Arayara.org.

No documento mais descritivo sobre os impactos sociais e ambientais apresentado pela Karpowership, o Memorial Descritivo da UTE Rio de Janeiro, com apenas 55 páginas, são omitidas diversas informações primordiais para sua instalação, como exemplo, o volume de emissão de poluentes atmosféricos, assim como a ausência de referência aos termos “Mata Atlântica”, “Mangue” ou “Manguezal” e “pescadores”.

A ARAYARA.org ressalta a importância do EIA-RIMA; de estudos de influência direta e indireta ao meio físico (água, solo, geologia, ruído, entre outros), biótico (vegetação e fauna) e socioeconômico (comunidades, história da região, economia e modo de vida); a delimitação do perímetro de impacto, a divulgação do volume das emissões de gases do efeito estufa emitidos pelas UTEs, em especial poluentes atmosféricos como óxidos de nitrogênio (NOx), dióxido de enxofre (SO2), dióxido de carbono (CO2) e partículas (PM10) e o cumprimento das leis municipais, estaduais, federais e internacionais.


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Este texto foi inicialmente publicado pela Arayara [Aqui! ].

MPF move ação para anular licença de instalação de 36 torres de transmissão de energia na Baía de Sepetiba (RJ)

O licenciamento ambiental não poderia ser fracionado, tendo em vista que as torres fazem parte do empreendimento que prevê a instalação e operação de 4 termelétricas, também na Baía de Sepetiba
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O Ministério Público Federal (MPF) ingressou com ação civil pública, com pedido de liminar, na última sexta (25), contra o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) e a empresa Karpowership Brasil Energia Ltda para evitar danos e impactos ambientais a serem provocados pelo empreendimento de instalação de 4 termelétricas e 36 linhas de transmissão de energia na Baía de Sepetiba, no Rio de Janeiro. O principal pedido é para que a Justiça declare nula a Licença Ambiental Integrada (LAI) nº IN000312, expedida pelo Inea no processo de licenciamento ambiental SEI- 070002/000499/2022, que liberou parte do projeto para a construção das torres de transmissão, fatiando o empreendimento, mesmo sem Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima) e realização de audiência pública. O Processo n° 5020957-93.2022.4.02.5101 tramita junto à 17ª Vara Federal do Rio de Janeiro e o pedido liminar ainda está sendo apreciado pela Justiça Federal.
 
A ação do MPF se dá após o Inea se negar a acatar recomendação expedida no último dia 15, em que o Ministério Público Federal apontou vícios para o licenciamento, uma vez que o empreendimento tem potencial de impactos significativos sobre o bioma, não sendo precedida pelo necessário estudo ambiental (EIA/Rima), “que inclusive deveria considerar os impactos cumulativos e sinérgicos com a instalação de quatro termelétricas flutuantes, também na Baía de Sepetiba, a cargo da mesma empresa autorizada a instalar as torres de linha de transmissão”, detalha a ação. Outro ponto que o Inea ignora é o fato de que empreendimento principal visa à produção de energia por termelétricas, o que constitui um modelo energético baseado em combustíveis fósseis, por sua própria natureza gerador de poluição por gases de efeito estufa, que constitui um dos principais fatores de contribuição para as mudanças climáticas.
 
“O órgão ambiental tem ciência de que os dois projetos possuem potencial de impactos cumulativos e sinérgicos, a merecer uma avaliação conjunta e contextualizada. Nessa linha, não se pode fatiar, fracionar ou desmembrar projetos que no seu todo implicarão impactos cumulativos e sinérgicos sobe o ecossistema. Dessa forma, a Licença Ambiental Integrada (LAI) nº IN000312 foi expedida sem que tenha havido o prévio e indispensável estudo de impactos ambientais mais detalhados e aprofundados, os quais necessariamente devem considerar, repita-se, o potencial dos impactos cumulativos e sinérgicos de instalação das 4 termelétricas e das 36 torres temporárias de linha de transmissão de energia”, alerta o procurador da República Jaime Mitropoulos, autor da ação.
 
Em resposta à recomendação, o Inea confirmou que as 36 torres de transmissão, com tensão de 138kV, estendem-se de Itaguaí até a Baía de Sepetiba e que os projetos – as torres e as usinas – estão atrelados, vez que as linhas de transmissão interligam, em circuito simples, a Subestação (SE) Zona Oeste de propriedade de Furnas Centrais Elétricas S/A, inicialmente a quatro Usinas Termoelétricas Flutuantes Geradoras de Energia, sendo um único e grande empreendimento, previsto em acordo de cooperação assinado entre o Ibama e o Inea, assinado em 22 de fevereiro deste ano.
 
“Cabe dizer que a instalação das torres implica, da forma como foi licenciada, a supressão de vegetação secundária da mata atlântica, em todos os níveis de regeneração, sem o cumprimento de leis de proteção do Bioma Mata Atlântica, a Lei de Proteção da Zona Costeira e as resoluções 1/86 e 237 do Conama. Além disso, não foi feita audiência pública que garanta a efetiva participação popular na tomada de decisão sobre a instalação e operação das linhas de transmissão, não tendo sido feito estudo e avaliação criteriosa sobre alternativas técnicas e locacionais quanto à instalação e também em relação ao tipo de compensação ambiental, que deve sempre prestigiar a compensação ambiental “in situ” e “in natura”, avalia o procurador.
 
Apesar de os projetos impactarem diretamente a Baía de Sepetiba e, portanto, o mar territorial e a Zona Costeira, além do Bioma Mata Atlântica, incluindo áreas de preservação permanente, o licenciamento, que originariamente competia ao Ibama, foi delegado ao Inea, conforme possibilita a Lei Complementar nº 140/2011. O Acordo de Cooperação entre Ibama e Inea foi firmado no dia 22 de fevereiro de 2022. Duas semanas depois, a Licença Ambiental Integrada (LAI) nº IN000312 já havia sido emitida, o que também revela como o licenciamento está sendo conduzido a toque de caixa, caracterizando, com isso, o grave e iminente risco de danos ambientais irreparáveis ou de difícil reparação, o que por si só já justifica a concessão da tutela jurisdicional de urgência, acrescenta o procurador.
 
Outros pedidos
 Além de declarar nula a LAI IN00031, o MPF requer à Justiça a condenação do Inea na obrigação de não conceder quaisquer licenças que permitam a instalação e operação 36 torres temporárias de linha de transmissão de energia, sem o necessário, prévio, detalhado e aprofundado Estudo de Impacto Ambiental (conforme previsto no artigo 15 da Lei 11.428/2006 c/c art.5º, § 2º da Lei 7.661/88), com respectivos relatórios e avaliações, os quais devem abarcar os impactos cumulativos e sinérgicos dos dois empreendimentos ou projetos previstos no Acordo de Cooperação Técnica n.º 5/2022.
 
O EIA/Rima deve abranger, além de outros pontos, todos os aspectos exigidos nas resoluções do Conama de 01/1986 e 237/1997, de modo a permitir uma abordagem ampla, profunda, holística, completa, interdisciplinar e sistêmica dos dois empreendimentos em conjunto. Nesse sentido, deverá abranger os meios físico, biológico e ecossistemas naturais, e o socioeconômico. Deve também compreender e identificar previsão da magnitude e interpretação da importância dos prováveis impactos relevantes, discriminando impactos positivos e negativos, diretos e indiretos, imediatos e de médio e longo prazos, temporários e permanentes, seu grau de reversibilidade, suas propriedades cumulativas e sinérgicas, a distribuição dos ônus e benefícios sociais; a criteriosa avaliação de impactos deve obrigatoriamente apontar riscos, alternativas, melhores soluções, de modo a vislumbrar uma visão integrada e ampla sobre os aspectos geográficos, hidrográficos, hidrológicos, biológicos, sócio-econômicos, levando-se em conta, inclusive, os benefícios e riscos para as comunidades circunstantes. Além disso, deve abarcar minudente especificação das medidas mitigadoras dos impactos negativos, entre elas os equipamentos de controle e sistemas de tratamento de despejos, avaliando a eficiência de cada uma delas; programa de acompanhamento e monitoramento, indicando os fatores e parâmetros a serem considerados, além de indispensáveis planos de contingenciamento para o caso de acidentes.

No Porto do Açu é assim: saem agricultores e pescadores e entra a Siemens com suas termelétricas poluentes

Usinas a gás em vez de pequenos produtores e pescadores: Siemens, Siemens Energy, KfW-Ipex e o “superporto do Porto de Açu” na região norte do Rio de Janeiro

O “superporto do Porto de Açu” brasileiro, próximo a Campos dos Goytacazes, no norte do estado do Rio de Janeiro, representa agravamento da crise climática, poluição ambiental com anúncio, desapropriação de terras e territórios sem indenização aos pequenos agricultores familiares e pesca – agricultores e pescadores, para um local em cujo terreno está sendo construído o complexo de usinas a gás Gás Natural Açu (GNA), nocivo ao clima, que também é propriedade da empresa alemã Siemens Energy, cujo financiamento também é fornecido pela Siemens Serviços Financeiros e garantia de crédito à exportação pelo governo federal KfW-Ipex-Bank.Onde está a conformidade com a responsabilidade climática e a devida diligência em direitos humanos por parte das empresas alemãs e das autoridades e ministérios alemães?

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Os pescadores também protestam contra a construção do “superporto” Porto de Açu. Foto: Marcos Pedlowski (cortesia)

Por Christian Russau para a “Kooperation Brasilien”

Quando uma multinacional se entusiasma com superlativos, todos os alarmes devem soar: “Com capacidade instalada de 3 GW, GNA I e GNA II são o maior projeto de usina a gás da América Latina, que pode abastecer até 14 milhões de residências com energia”, disse a Siemens em agosto 2020 ao anunciar a entrada de uma subsidiária da Chinese State Power Investment Corporation (SPIC) nos projetos de usinas a gás GNA I e GNA II do projeto Gás Natural Açu no “superporto Porto de Açu” brasileiro perto de Campos dos Goytacazes no norte do estado do Rio de Janeiro. É também claro que hoje em dia a referência a “projectos na área das energias renováveis” não deve faltar no mesmo parágrafo do comunicado de imprensa da empresa, afinal a terminologia “sustentabilidade”

GNA I e GNA II são as duas primeiras de um total de quatro torres de usinas a gás no local do “Super Porto Porto de Açu”, que inclui também um “terminal de GNL com capacidade total de 21 milhões de m3/dia”O gás para o complexo da usina será retirado do chamado Pré-Sal, situado vários milhares de metros abaixo da costa brasileira . “O valor total estimado dos investimentos planejados no complexo de gás e energia GNA é de cerca de US$ 5 bilhões”, gabou-se a Siemens em meados de 2020 .

Agora, no início de 2022, a estrutura de propriedade do “maior projeto de usina a gás da América Latina” mudou novamente, ainda mais para a Alemanha. Porque a Prumo Logística deixou o consórcio do complexo GNA com BP, SPIC, Siemens e Siemens Energy e vendeu sua participação em partes iguais para a BP e Siemens Energy, enquanto a Siemens transferiu toda a sua participação para a Siemens Energy, que foi desmembrada da controladora por meio de um IPO. Após a aprovação dos controladores brasileiros de concorrência do CADE em 31 de dezembro de 2021, apenas a aprovação do banco estadual de desenvolvimento social e desenvolvimento BNDES, que estava envolvido no projeto com a concessão de empréstimos de 1,7 bilhão de reais, estava pendente no início de janeiro. A BP e a Siemens Energy deterão, cada uma, 33,5% das ações do complexo de usinas a gás GNA e a SPIC 33%.

Além do IFC, que apóia o projeto com 288 milhões de dólares, a estatal KfW-Ipex, que, de acordo com um relatório da urgewald e da ajuda ambiental alemã, está cofinanciando o projeto GNA, também está envolvida por meio de de empréstimos “através de uma garantia de crédito à exportação com um volume de cobertura da categoria 5 (ou seja, superior a 200 milhões de euros)”, segundo Urgewald e Deutsche Umwelthilfe. De acordo com a imprensa, o valor exato da cobertura da garantia de exportação do KfW Ipex é exatamente os 1,76 bilhão de reais do banco estatal BNDES (ver IJGlobal, Edição 379, Verão 2020, p. 41). Urgewald e Deutsche Umwelthilfe criticaram acertadamente em setembro de 2021 que o “governo federal […] responsável pelas atividades da estatal KfW-Ipex […] por meio de garantias para a indústria de petróleo e gás [a] transição energética internacional ” — literalmente: “sabotado”. Um dos projetos “gravemente criticado pela Urgewald e pela Deutscher Umwelthilfe está no Brasil: o projeto GNL Gás Natural Açu no Complexo Industrial do Superporto do Açu”.

Trata-se de um daqueles projetos que, como suposta “tecnologia de ponte”, deve manter o suprimento de energia até então convencional, que dá continuidade à matriz energética fóssil com todas as suas consequências catastróficas para o clima e cuja retenção deve garantir os lucros borbulhantes das corporações. Agora, a transferência de ações da Siemens para a Siemens Energy não é apenas uma transação de direito de propriedade com uma mudança de capital na casa dos milhões, o que significa que, em vez da Siemens, apenas a Siemens Energy é agora o foco das críticas da sociedade civil e das críticas dos protecionistas climáticos , que chama pelo nome as causas e a responsabilidade da crise climática Porque a Siemens também precisa explicar qual é o lado potencialmente contínuo do financiamento através da Siemens Financial Services: porque ainda em 2020, foi dito que “a Siemens contribuirá com capital, tecnologia inovadora e sua experiência no gerenciamento de projetos semelhantes por meio de sua subsidiária financeira Siemens Financial Services e em estreita cooperação com a Siemens Energy”. De qualquer forma, a Siemens Financial Services ainda não anunciou que se retirará do financiamento do projeto.

E, por último, mas definitivamente não menos importante, a Siemens e a Siemens Energy têm que responder perguntas sobre sua responsabilidade conjunta em direitos humanos pela construção de toda a área do “superporto Porto de Açu” no norte do estado do Rio de Janeiro: na due diligence societária na Cadeia de Suprimentos conta também que a aquisição ou arrendamento e uso de área localizada em área portuária declarada como o “Superporto Porto de Açu” para construção de plantas industriais próprias – como é o caso da o projeto Gás Natural Açu – é cuidadosamente considerado que não há violações ambientais e não ocorreram violações de direitos humanos. No entanto, não é o que informa o professor universitário Marcos Pedlowski da Universidade Estadual do Norte Fluminense em Campos dos Goytacazes no estado do Rio de Janeiro. O “superporto do Porto de Açu” expropriou as terras de centenas de famílias para construir o porto e, segundo o professor Marcos Pedlowski, “centenas de famílias que tiveram suas terras desapropriadas para construir essa área industrial em São João continuam sem receber compensação do Governo do Rio de Janeiro. Além disso, não se fala mais em salinização das águas continentais causada pelo transbordamento de água salgada das barragens construídas no Porto do Açu, nem se fala mais em destruição da Praia do Açu e o fechamento das áreas de pesca preferencial para os moradores do bairro V de São João da Barra.” Desta forma, o professor Pedlowski fala em “grilagem legal de terras” no caso do Porto de Açu.

O professor Pedlowski é duro com a Siemens: “A participação da Siemens no parque da usina a gás do porto do Açu é um bom exemplo de um padrão que prevalece nas atividades das empresas multinacionais no Brasil. As usinas a gás da GNA não são só muito poluente e geram energia cara, mas também contribuem para o não cumprimento das metas globais de emissões de gases de efeito estufa. Além disso, o histórico de abuso social e ambiental que caracteriza a construção do Porto do Açu deveria ter impedido a participação da Siemens em um empreendimento tão questionável. Mas a preocupação com o lucro parecia superar o compromisso com a boa governança corporativa e com a proteção do meio ambiente e das comunidades locais”,explicou Pedlowski.

A Siemens Energy, a Siemens e a estatal KfW-Ipex são, portanto, co-responsáveis ​​por aderir ao processamento convencional de energia fóssil, que está promovendo ainda mais a crise climática. Além disso, o projeto defende a poluição ambiental com anúncio e significa a desapropriação de terras e territórios sem indenização para os pequenos proprietários que ali exercem a agricultura familiar por um terreno em cujo terreno está sendo construído um complexo de usinas a gás prejudiciais ao clima, também de propriedade da é uma empresa alemã como a Siemens Energy, que também foi financiada pela Siemens Financial Services e a garantia de crédito à exportação pelo KfW-Ipex-Bank, de propriedade federal. Isso deve ter um fim.

color compass

Este texto foi escrito inicialmente em alemão e publicado pela Kooperation Brasilien [Aqui!].

Moradores de Macaé (RJ) já respiram ar poluído e estão pressionados por novos projetos termelétricos, mostra novo estudo do IEMA

macae poluição

Três meses de ar poluído. Os habitantes de Macaé respiraram por 88 dias uma quantidade de ozônio em 2020 acima do recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), segundo a nota técnica “Qualidade do ar em Macaé (RJ)”, publicada hoje dia 15 de dezembro pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA). Essa foi a marca alcançada pela estação Fazenda Severina que mede a qualidade do ar em Macaé, nas proximidades das duas usinas termelétricas que lá operam. Com a previsão da expansão de termelétricas no município, a possibilidade de aumentar em mais de oito vezes a capacidade atual de geração de energia elétrica local. Os moradores e os visitantes da “Princesinha do Atlântico”, internacionalmente conhecida como a “Capital do Petróleo”, podem sofrer ainda mais de doenças crônicas causadas pela inadequada qualidade do ar.

“É preciso atender aos dois objetivos ao mesmo tempo, proteger a saúde da população local e garantir a geração elétrica para o desenvolvimento socioeconômico do país”, ressalta David Tsai, coordenador de projetos do IEMA e um dos autores do estudo. O aumento projetado de termelétricas novas ou ligadas por mais tempo indica que algumas regiões serão particularmente mais impactadas. Como é o caso de Macaé, no Norte Fluminense. De acordo com o documento:

●     Existem lacunas na produção dos dados diários pelas quatro estações que operam no município. As estações Fazenda Severina e Pesagro não produziram dados em quantidade satisfatória para o poluente ozônio nos anos 2018 e 2019. Entre 31% e até 80% dos dias do ano não houve medições válidas para o cálculo da média diária. A mesma situação também ocorreu na estação Pesagro nos anos 2016 e 2017. A estação Cabiúnas apresenta lacuna relevante de dados, mas em menor escala. Já a estação Fazenda Aires manteve uma média de 7% do número de dias por ano sem dados;

●     É possível observar frequentes concentrações do poluente ozônio (O3) acima das recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS), sobretudo nos últimos dois anos (2019 e 2020). Também há esporádicos episódios críticos de poluição por dióxido de enxofre (SO2) detectados por uma das estações;

●     O excesso de ozônio na região consta em relatórios do órgão ambiental do Rio de Janeiro e nos estudos de impacto ambiental das novas instalações termelétricas previstas para o município. Ou seja, a questão da poluição do ar é um problema reconhecido pelo poder público local e pelo setor elétrico. Porém, mesmo assim, está prevista a expansão do polo de energia centrado na exploração do gás natural, gerando mais poluentes.

Gás natural

Macaé tem dois polos de processamento de gás natural (Petrobras e Shell/Mitsubishi). Também duas usinas termelétricas (UTEs) a gás natural: a UTE Termomacaé (antiga Mário Lago) com 922 MW de potência e a UTE Norte Fluminense com quase 827 MW. Juntas elas representam 4% da potência termelétrica total instalada no Brasil. Somada a elas, está em fase de construção a usina termelétrica Vale Azul I, licenciada com mais de 565 MW de potência.

Estão previstos quatro novos parques termelétricos (Litos, São João Batista, Vale Azul e Nossa Senhora de Fátima) e a expansão de um parque existente (Norte Fluminense), do Terminal Portuário de Macaé (Tepor) e de uma nova unidade de processamento de gás natural. Esses novos parques termelétricos aumentam em mais de oito vezes a capacidade atual de geração no município.

Tais empreendimentos são reforçados pela expansão da produção offshore (localizadas em alto mar). Recentemente, foi anunciada a decisão de se escoar a produção de gás do pré-sal da bacia por meio de gasoduto submarino, conectando as plataformas ao Terminal Cabiúnas, já existente na cidade. “Macaé pode até continuar expandindo sua geração elétrica, mas isso deve ser feito sem agravar a qualidade do ar. É preciso empregar tecnologias mais limpas ou, caso não seja possível, expandir a geração elétrica para outros locais respeitando sua capacidade de suporte à carga de poluentes”, ressalta Tsai.

“Aumentar as emissões de poluentes em uma região já saturada, com problema de poluição por ozônio, é inadequado. O setor elétrico e os governos precisam se atentar a essa questão”, diz. “Além disso, é necessário a elaboração de inventário oficial de emissões de poluentes atmosféricos, um instrumento para identificar mais precisamente como cada instalação contribui para a poluição local, de modo a planejar ações certeiras para reduzir as emissões”, explica Tsai.

Ar poluído

O ozônio na baixa atmosfera não é emitido diretamente, mas formado em reações químicas que ocorrem sob influência de elevadas temperaturas e níveis de radiação solar, tendo como reagentes principais (os “ingredientes da receita”) os compostos orgânicos voláteis não metano (COVNM) e os óxidos de nitrogênio (NOx), ambos poluentes emitidos diretamente pelas fontes poluidoras.

Segundo dados do SEEG Municípios, as usinas termelétricas foram responsáveis por 41% das emissões totais desses compostos orgânicos voláteis no município no ano de 2018. O demais é proveniente do transporte na região, com destaque para as emissões associadas a automóveis e motocicletas. Com relação aos óxidos de nitrogênio, a maior parte das emissões, mais de 70%, são das usinas termelétricas. A queima de óleo diesel no transporte rodoviário, principalmente a partir de caminhões e ônibus, responde por 14%.

Há uma poluição sistemática local ocasionada pelo gás ozônio. A expansão do polo de energia de Macaé centrado na exploração do gás natural deve levar em conta as implicações para o agravamento da poluição do ar e seu impacto na saúde da população. Existem mais de dez projetos de usinas termelétricas com licença ambiental, além dos investimentos anunciados por grandes empresas petrolíferas.

Qualidade do ar

Os dados analisados na Nota Técnica são produzidos pelas estações de qualidade do ar operadas por empreendimentos potencialmente poluidores e enviados em tempo real para a central do Instituto Estadual do Ambiente (INEA) onde são armazenados, processados e disponibilizados no endereço eletrônico do órgão público. O IEMA inclui esses dados na sua Plataforma da Qualidade do Ar, uma ferramenta que reúne e padroniza as informações do monitoramento da qualidade do ar gerados por órgãos do poder público de todo o Brasil.

As informações publicadas pelo INEA indicam quatro estações de monitoramento automático da qualidade do ar operando em Macaé: Fazenda Severina (desde 2002), Pesagro (também desde 2002), Fazenda Aires (a partir de 2003) e Cabiúnas (2010). Os poluentes monitorados por essas estações são o monóxido de carbono (CO), os óxidos de nitrogênio (NOx), o ozônio (O3), hidrocarbonetos (HC), material particulado (MP10), partículas totais em suspensão (PTS) e dióxido de enxofre (SO2). Os três últimos são apenas monitorados pela estação Cabiúnas.

Movimento SOS Rio Macaé lança manifesto político em defesa do meio ambiente

Manifesto ao Prefeito, aos Vereadores, e aos Conselheiros Municipais de Rio das Ostras, dos ativistas do Movimento Ambiental SOS Rio Macaé, que atuam na Região Norte Fluminense e Região dos Lagos.

RIO MACAÉ

Com muita esperança, conclamamos por meio deste Manifesto, a atuação responsável de todas as autoridades gestoras do município, sobre a necessidade de ações urgentes pela proteção das Bacias Hidrográficas dos Rios Macaé  e das Ostras, das praias, dos arquipélagos, dos fragmentos e mosaicos de Mata Atlântica, e das populações que vivem nestes ambientes e deles dependem economicamente, como agricultores, ribeirinhos, pescadores e comerciantes do tradicional turismo regional.

Neste Manifesto representamos os cidadãos dos municípios de Rio das Ostras, Macaé, Nova Friburgo, Cachoeiras de Macacu, Carapebus, Conceição de Macabu, Casimiro de Abreu, Arraial do Cabo, Búzios e Cabo Frio, que buscam trazer luz a questões consideradas gravíssimas e que necessitam de amplo, honesto e corajoso debate junto a sociedade, pois são fatos tragicamente desconhecidos da grande maioria dos gestores públicos, responsáveis pela boa condução das decisões sociais e econômicas dos seus municípios.

Perante as ameaças de mais projetos da cadeia do petróleo e gás, na nossa região – que já apresenta alto grau de saturação de impactos sociais, ambientais e econômicos negativos – devido a décadas de “acúmulos” de decisões de pouca visão e falta planejamento, acumulamos “passivos” quase impagáveis que tem se agravado, dramaticamente:

Falta de saneamento, praias poluídas, crise crônica de falta de abastecimento de água, precariedade no uso do solo urbano e rural, favelização e violência explosivas, logística e mobilidade precárias, políticas e equipamentos de saúde deficientes, educação básica caótica, provocam prejuízos aos arranjos produtivos locais, em especial as tradicionais atividades de turismo, pescados, comércio e agricultura.

Estes são exemplos do caos socioeconômico que a região vivencia, e que poderão ser agravados se não forem tomadas decisões responsáveis e compromissadas com a reversão dos danos, como preconiza a proposta “sustentável”, de modelos econômicos, possível de corrigir os rumos desta verdadeira “tragédia anunciada”.

São altamente preocupantes para a absoluta maioria dos técnicos e pesquisadores especializados, as propostas de mais projetos na cadeia de petróleo e gás na nossa região, em face ao momento de decréscimo na produção na Bacia de Campos, que já iniciou o “descomissionamento” das plataformas de extração de hidrocarbonetos.

Devido a este momento de retração na produção, são considerados nefastos, obsoletos e desnecessários os investimentos em projetos de geração de energia a partir da cadeia fóssil, altamente poluente, sendo uma matriz energética já superada, devido às melhores alternativas de geração, mais sustentáveis.

O projeto de “mais outro porto” no mar de Macaé, coloca em alto risco todas as praias dos municípios vizinhos, que tem sua economia voltada para a produção de pescados e turismo; também as propostas de mais termelétricas no município de Macaé vai provocar um aumento exponencial de gases efeito estufa, alterando o clima e a qualidade do ar da região, e também “exige” consumir “muita” água do Rio Macaé, recurso que já falta para a população dos municípios de Macaé e Rio das Ostras, abastecidos pelo manancial, que já se encontra altamente degradado.

O órgão responsável pela gestão dos Rios Macaé e Ostras, o “Comitê de Bacia Hidrográfica”, já declarou que a bacia do Rio se encontra em colapso e não possui reservas hídricas capazes de atender o aumento de consumo de água que esses projetos pretendem demandar.

Somando-se a estes projetos, há também a proposta de criar “mais uma outra unidade de processamento de gás”, que vai demandar o corte de muitos quilômetros de dutos sobre a planície da baixada norte-fluminense, repleta de córregos, lagoas e brejos, para transportar fluídos altamente venenosos: gás e “águas de produção”, substâncias  poluentes, que historicamente vazam, por repetitivas falhas de manutenção, causando acidentes muito trágicos – pois são poluentes “acumulativos” nos seres vivos, e “persistentes” nos ambientes – água e solo, e sempre deixam um rastro irreparável de devastação.

Agravando todo esse cenário preocupante, a implantação de termelétricas vai obrigar a remoção de centenas de quilômetros de mata atlântica para a passagem de seus “linhões de transmissão de alta tensão”, que provocarão a desconexão definitiva dos fragmentos da floresta, cultivados com grande esforço há décadas, por diversos municípios e instituições, que assumiram o compromisso de reestabelecer os Corredores Ecológicos para espécies de fauna e flora  ameaçadas, que são essenciais para a manutenção do equilíbrio biológico de todos seres.

Os estudos técnicos evidenciam mais um outro grande contrassenso: a baixíssima geração de vagas de emprego, sendo a maior parcela de vagas temporárias, o que causa um grande alvoroço de especulações enganosas, agravando a explosiva migração de pessoas em busca de trabalho que não existe, e provocando mais miséria, violência e sobrecarga dos equipamentos públicos dos municípios, que se tornam incapazes de absorver tamanha explosão demográfica e seus efeitos danosos, que se estabelecem de forma crônica, agravando o passivo contábil das prefeituras, que é invisível nos falaciosos estudos apresentados pelos empreiteiros, cegos para a responsabilidade e a ética.

Diante destas ameaças devastadoras e já fora do tempo, solicitamos aos gestores – que são grandes responsáveis pelo destino de suas populações e seus territórios – que exijam a realização de Audiências Públicas, para que seja possível evidenciar a verdadeira realidade desse pacote de projetos, considerado um enorme retrocesso para toda nossa região, que é abundante em potencial de energias limpas, renováveis e benéficas, como solar, eólica e marinha.

É importante repetir que estamos diante de um cenário de Emergência Climática, e que a retração da produção de óleo e gás é uma realidade econômica irreversível.

Portanto, certos de termos sensibilizado a todos com este Manifesto, nos colocamos dispostos a contribuir no debate pelos rumos corretos das decisões políticas compromissadas com sustentabilidade das nossas vidas, e das vidas de nossos filhos e netos.

Sustentabilidade já!

Movimento SOS Rio Macaé