Contaminantes emergentes e turismo: uma combinação perigosa

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Esmeraldas é uma das cidades mais turísticas do Equador, devido à combinação de belas praias e um clima muito agradável.  Mas afluência turística também pode jogar contra. Crédito da imagem: Aldo Barba/Wikimedia Commons , bajo licencia Creative Commons (CC BY-SA 2.5)

Por Carmina de la Luz para a SciDev

A presença de contaminantes emergentes na água dos rios e do mar está diretamente vinculada ao turismo costeiro.  É o que sugere um estudo realizado na provincia de Esmeraldas, no Equador,  que acaba de ser publicado na Science of The Total Environment .

Os contaminantes emergentes são um grupo diverso de substâncias de detecção recente no ambiente, como medicamentos, produtos de cuidado pessoal ou de limpeza de casas e produtos agrícolas, entre muitos outros.

No final de 2019, Isabel Cipriani Ávila, professora-investigadora da Pontificia Universidad Católica del Ecuador e autora principal da pesquisa e seus colaboradores avaliaram a qualidade da água neste destino popular pouco depois de ser iniciado o confinamento para evitar a propagação do COVID-19 e o fluxo de turistas.

“Em novembro de 2020 voltamos a coletar mostras e aproveitamos para fazer a comparação de contaminantes emergentes antes e durante a pandemia, a qual foi uma oportunidade de demonstrar o impacto tão forte que o turismo tem nos nossos hábitos e no meio ambiente ”, disse Cipriani Ávila em entrevista para a SciDev.Net .

O equipamento foi calibrado para identificar e quantificar cafeína, acetaminofén (paracetamol), diclofenaco, trimetoprima e sulfametoxazol em 10 desembocaduras de ríos e 14 praias de Esmeraldas. Esses compostos foram selecionados pelo fato do Ministério da Saúde Pública do Equador considerando-los de alto uso.entre a população.

“O que mais nos surpreendeu foi observar as maiores concentrações de contaminantes emergentes nos pontos onde o grau de urbanização era baixo, mas que estava muito próximo do local de descarga de águas residuais de um grande resort”, apontou a pesquisadora.

A análise evidenciou que a contaminação por cafeína e diclofenaco diminuiu notoriamente no contexto do confinamento, quando não houve  turismo. Da mesma forma, a aparição e a quantidade das substâncias estudadas foram menores durante esse tempo. O sulfametoxazol – um medicamento antibacteriano – resultou ser a exceção, pois não foi detectado nem antes ou durante a pandemia.

Os contaminantes emergentes são de interesse para os científicos no solo porque afetam a qualidade da água, mas também por suas conseqüências na vida silvestre e na saúde humana. Associarlos com uma atividade econômica específica –como se logró com o turismo neste estúdio– é complexo, já que nos ecossistemas aquáticos intervêm múltiplas variáveis.

Para o coautor Jon Molinero, o caso de Esmeraldas evidencia o problema da desigualdade no acesso a uma recreação com água limpa no Equador: “Vemos que os desejos do turismo de alta gama estão contaminando as zonas de entorno que são sedes de pequenos hotéis e negócios com os quais as pessoas humildes obtém sua renda”.

“Os turistas vêm em busca de água limpa para tomar banho, mas a atividade em si está prejudicando esse serviço. Se não fizermos algum tipo de controle não haverá turismo simplesmente porque as águas não vão ter qualidade suficiente”.

Jon Molinero, Escuela de Gestión Ambiental – Pontificia Universidad Católica, Equador

Tal cenário poderia estar se repetindo em outros países da América Latina, onde um quarto da população vive nas costas, segundo o Banco Interamericano de Desenvolvimento . Nas nações caribenhas , o turismo equivale a 26% do Produto Interno Bruto total e no resto da região representa 10%, de acordo com um informe de 2020 elaborado pela Comissão Económica para América Latina e Caribe (CEPAL) .

“Os turistas vêm em busca de água limpa para tomar banho, mas a atividade em si está prejudicando esse serviço. Se não fizermos algum tipo de controle, não haverá turismo simplesmente porque as águas não terão qualidade suficiente”, acrescenta Molinero.

María Teresa Alarcón Herrera, que não participou da investigação, comentou no SciDev.Net que essas reflexões constituem a porta mais destacada do estudo em Esmeraldas.

“O diagnóstico ambiental que é importante, mas também está entendendo o tema desde o ponto de vista econômico. O chamado que faz com sua investigação é melhorar os sistemas de tratamento de águas para que o turismo marítimo seja mais sustentável ”, aponta a acadêmica do Centro de Investigações de Materiais Avançados no México.

Na América Latina, apenas 40 % das águas residuais são tratadas, e as plantas que realizam esse processo não são aptas para eliminar contaminantes emergentes. Germán Santacruz, que também participou do estúdio, relaciona esta deficiência com o fato de que a disposição final dos contaminantes emergentes a um menu não está regulamentada.

Estudos como o publicado na Science of The Total Environment “são relevantes para compreender o fenômeno dos contaminantes emergentes, mas também nos lembramos que a maneira de fazer frente à ‘epidemia silenciosa’ que representam está caminhando para a regulamentação em nossos países”, conclui o professor do programa Água e Sociedade do Colégio de San Luis, no México.

Acesse o artigo completo [Aqui!].


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Este artigo escrito originalmente em espanhol foi publicado pela SciDev [Aqui! ].

Campos rupestres brasileiros são as novas vítimas do crescimento econômico “a qualquer custo”

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Artigo publicado por um grupo de pesquisadores brasileiros,  mostra que as áreas de campos rupestres existentes no Brasil foram convertidas em mais uma fronteira de desmatamento. Em função disso, o artigo traz um grave alerta: a previsão de perda de 82% das áreas de campos rupestres no país, impactando o acesso à água e a segurança alimentar de 50 milhões de pessoas.

O artigo atribuiu esse avanço na destruição de campos rupestres à implementação de políticas  equivocadas que levam à intensificação de atividades de mineração, turismo descontrolado e à construção de estradas não planejadas. De fato, a descoberta de grandes reservas minerais, a adoção de políticas de conservação ineficazes e, a partir de agora, as mudanças climáticas estão ameaçando esse ecossistema hiper-diversificado.

Quem desejar acesso este artigo, basta clicar [Aqui!].

Urbanização precária, mudanças climáticas e a multiplicação das doenças

Tenho lido e ouvido uma quantidade impressionante de informes sobre as três epidemias associadas (Dengue, Zika e a Chikungunya) ao mosquito Aedes e que estão grassando em diferentes partes do mundo, mas com especial alarme na América do Sul.

A mídia corporativa em sua maioria expressiva tem se valido dos problemas associados a um dos vírus transmitidos pelo mosquito Aedes, a Zika, para embaçar a discussão que realmente importa sobre como a extrema concentração da riqueza está potencializando a disseminação de doenças que já ocorreria pelas mudanças climáticas disparadas pelo aquecimento do planeta.

O fato é que se formos analisar a concentração de casos das doenças associadas ao mosquito Aedes não será difícil verificar que a imensa maioria dos casos se localiza nas periferias mais pobres, onde a urbanização precária assola a vida de milhões de pessoas apenas no Brasil. 

Mas em vez de fazer isso, a mídia corporativa prefere apelar para o emocionalismo e ressaltar, por exemplo, o dramático problema da microcefalia. E o resultado é que se deixa de apontar para as medidas básicas de controle da proliferação do vetor, enquanto se gera uma onda de pânico que em nada ajuda a adoção de um planejamento estratégico que melhore os padrões de urbanização.

No meio desse clima caótico a oportunidade de democratizar os espaços urbanos é perdida, apelando-se para medidas paliativas como a pulverização de eventuais criadouros com agrotóxicos de todo tipo de toxicidade. Mas como essas medidas são paliativas, o produto final é o aumento do caos a partir da ampliação da resistência dos mosquitos vetores. Como vários cientistas já estudaram o ciclo de reprodução do Aedes, não é a falta de informação e expertise que está impedindo a adoção das medidas necessárias.

Finalmente, algo que eu tenho visto na narrativa hegemônica é de que os vírus causadores da Zika e da Chikungunya chegaram ao continente sul americano e, por extensão, no Brasil.  As explicações mais comuns são voltadas para eventos esportivos e o turismo que contribuem para a circulação de pessoas infectadas.  Desta forma, co fato de que os carreadores iniciais dos vetores não façam parte das parcelas que irão arcar com o maior peso das consequências da dispersão de doenças como a Zika e a Chikungunya revela de forma ainda mais evidente as múltiplas injustiças da nossa estrutura social. E talvez seja exatamente por isso que a mídia corporativa, porta-voz preferencial das elites, não trate o problema sob este ângulo.