Urbanização precária, mudanças climáticas e a multiplicação das doenças

Tenho lido e ouvido uma quantidade impressionante de informes sobre as três epidemias associadas (Dengue, Zika e a Chikungunya) ao mosquito Aedes e que estão grassando em diferentes partes do mundo, mas com especial alarme na América do Sul.

A mídia corporativa em sua maioria expressiva tem se valido dos problemas associados a um dos vírus transmitidos pelo mosquito Aedes, a Zika, para embaçar a discussão que realmente importa sobre como a extrema concentração da riqueza está potencializando a disseminação de doenças que já ocorreria pelas mudanças climáticas disparadas pelo aquecimento do planeta.

O fato é que se formos analisar a concentração de casos das doenças associadas ao mosquito Aedes não será difícil verificar que a imensa maioria dos casos se localiza nas periferias mais pobres, onde a urbanização precária assola a vida de milhões de pessoas apenas no Brasil. 

Mas em vez de fazer isso, a mídia corporativa prefere apelar para o emocionalismo e ressaltar, por exemplo, o dramático problema da microcefalia. E o resultado é que se deixa de apontar para as medidas básicas de controle da proliferação do vetor, enquanto se gera uma onda de pânico que em nada ajuda a adoção de um planejamento estratégico que melhore os padrões de urbanização.

No meio desse clima caótico a oportunidade de democratizar os espaços urbanos é perdida, apelando-se para medidas paliativas como a pulverização de eventuais criadouros com agrotóxicos de todo tipo de toxicidade. Mas como essas medidas são paliativas, o produto final é o aumento do caos a partir da ampliação da resistência dos mosquitos vetores. Como vários cientistas já estudaram o ciclo de reprodução do Aedes, não é a falta de informação e expertise que está impedindo a adoção das medidas necessárias.

Finalmente, algo que eu tenho visto na narrativa hegemônica é de que os vírus causadores da Zika e da Chikungunya chegaram ao continente sul americano e, por extensão, no Brasil.  As explicações mais comuns são voltadas para eventos esportivos e o turismo que contribuem para a circulação de pessoas infectadas.  Desta forma, co fato de que os carreadores iniciais dos vetores não façam parte das parcelas que irão arcar com o maior peso das consequências da dispersão de doenças como a Zika e a Chikungunya revela de forma ainda mais evidente as múltiplas injustiças da nossa estrutura social. E talvez seja exatamente por isso que a mídia corporativa, porta-voz preferencial das elites, não trate o problema sob este ângulo.