
Palanque cheio em meio a uma guerra de movimento e de posições
Por Douglas Barreto da Mata
Podemos relacionar uma série de defeitos do deputado estadual Rodrigo Bacellar, pois humano como nós, ele os tem, assim como reúne em si também qualidades. Porém, um defeito ele não tem: ele não é burro. Comparado ao seu principal adversário regional, o prefeito Wladimir Garotinho, Rodrigo Bacellar teve uma trajetória diferente, por óbvio, e talvez um pouco mais acidentada. Não é herdeiro de um legado político como aquele do tamanho da família Garotinho, que tem no acervo várias eleições bem sucedidas, para mandatos de prefeito, deputado estadual e federal e, governador. No quesito vitórias eleitorais, não há comparação possível.
O casal Anthony e Rosinha foi o único, como de governadores eleitos a partir do interior em toda a história do Estado do Rio de Janeiro, já fundido com o da Guanabara, antigo distrito federal. Não é pouca coisa, quando se olha a distribuição do peso do eleitorado fluminense, com 70%, ou mais, concentrado na capital, baixada e zona metropolitana (que agora se estende até Itaboraí). Então, a tarefa de Rodrigo Bacellar para se estabelecer como um vetor de poder estadual não foi fácil.
Ao mesmo tempo, ensinam os antigos que manter-se no topo é mais difícil que chegar lá. Pode ser. O fato é que a trajetória de Rodrigo Bacellar no topo da “cadeia alimentar” no Rio de Janeiro está por um fio, aliás, parece que sempre esteve. Só ele pode escolher entre cair com paraquedas ou rede de segurança, ou sem nada mesmo.
Olhando Rodrigo Bacellar e Wladimir Garotinho temos dois personagens bem distintos, e que se encontram em posições bem diferentes também. Ninguém poderá dizer quem vai ser bem sucedido em suas intenções, ou pior, os dois podem sucumbir, mas o fato é que Rodrigo Bacellar parece em situação mais desconfortável. Não foi (só) um erro de cálculo de Rodrigo, como seus detratores irão dizer, ou excesso de impetuosidade, como dirão também.
Estes ingredientes podem fazer parte dessa história, mas não são determinantes. Havia sinais (como as caneladas do pastor Silas Malafaia, nunca desmentidas ou censuradas pelos Bolsonaros), porém para o jogador não há outro caminho senão assumir certos riscos, ou, “quem não arrisca, não petisca”. Há alguns meses, ninguém, eu incluído, diria que Washington Reis teria mais de 1% de chances de reverter sua inelegibilidade. Hoje, essa circunstância quase se inverteu, e o recado (público) já foi dado em despacho desde Gilmar Mendes para o presidente do STF, Barroso: é possível um acordo de não persecução penal depois de sentença condenatória não definitiva (não transitada). O artigo 28-A do CPP não diz quando não pode, e aí a porca torce o rabo.
É possível interpretar a omissão da lei (interpretação extensiva) em benefício do réu, assim como fazer analogias (usar casos parecidos para suprir omissões legais). Até os dias atuais, é verdade, ninguém tinha pensado nisso, ou proposto isso (muita gente boa poderia ter se livrado, ou poderá se livrar da cadeia e de inelegibilidades, é certo). Como vemos, “bons advogados” são matéria valiosa nesse habitat hostil.
Bem, voltando a Rodrigo Bacellar, Wladimir Garotinho e etc., temos um mundo de alternativas, mas todas partem de pontos comuns: Washington Reis vai definir parte do jogo, a depender da decisão de sua elegibilidade. Mesmo inelegível ele já era peça crucial no desfecho.
Há uma parte que será definida pela montagem da chapa presidencial e as repercussões dessa arrumação nos palanques estaduais. Outra variável é: a importância do prefeito Wladimir Garotinho perde força com a saída de Rodrigo Bacellar de cena, por mais estranho e paradoxal que pareça. Sem Rodrigo no páreo, a necessidade da chapa de Eduardo Paes de um contraponto no quintal dele (Rodrigo) diminui muito.
Por outro lado, suas chances de ocupar um espaço nesta mesa estadual crescem, não pelo antagonismo, mas pela solidariedade política entre os dois clãs, os Reis e os Garotinho. Alguns mais reticentes dizem que essas chances diminuem, justamente porque o peso político do sobrenome, e suas próprias qualidades (de Wladimir) deixariam desconfortáveis tanto Paes como Reis em ter um vice como ele.
Um cálculo pragmático e correto, afinal, a gente sabe que o time só tem um camisa dez. Desse modo, a presença de Wladimir Garotinho na chapa como vice de Washington Reis ou Eduardo Paes será consagrada como uma exigência de uma conjuntura, não apenas de promessas e afagos. Há os que defendem que Washington Reis será o candidato a governador de um grande bloco de centro e direita, com Paes senador, sobrando outra vaga a ser definida, de acordo com os movimentos da corrida ao Planalto.
Não creio nesse caminho, embora o reconheça possível. Tudo indica que a chapa bolsonarista ao Planalto tenha na cabeça de chapa o governador de SP, Tarcísio. Até aí tudo bem, não haveria grandes problemas em acomodar Eduardo Paes e Washington Reis, e isolar o palanque petista. O nó górdio é o Senado Federal.
A questão é ajustar a estratégia bolsonarista àquela casa, já que a premissa para concorrer com as bênçãos do ex-presidente e de seu filho senador seria a fidelidade expressa e irredutível à missão de combater o Supremo Tribunal Federal (STF), o que é prerrogativa dos senadores. Nesse ponto, nem Cláudio Castro, nem Washington Reis, nem Eduardo Paes, nem Rodrigo Bacellar, enfim, muito pouca gente além do atual senador Carlos Portinho aceitaria fazer esse compromisso, ainda mais quando boa parte dos nomes citados têm interesse em causas em julgamento, que definem suas próprias sobrevivências políticas.
Querem um aperitivo do pavor que reina no STF com essa estratégia? Bastou o presidente do Senado mandar o recado sobre a questão do julgamento da inconstitucionalidade do decreto legislativo que derrubou o IOF, sugerindo o desengavetamento dos pedidos de impeachment de Alexandre de Moraes, que o mesmo decidiu fazer o impensável: ao invés de dizer que é ou não constitucional, decidiu “conciliar” antes governo e Congresso. Não existe “conciliação” em matéria constitucional, ou é ou não é. No entanto, o STF, além de todo o protagonismo já arrecadado na história recente desse país, para nossa infelicidade, agora se auto proclamou (não sem a omissão de outros poderes) em uma instância de moderação, um quarto poder.
No caso das terras indígenas e o marco temporal, o STF deve ter sofrido a mesma chantagem do impeachment, e assim devem ser entendidas todas as “conciliações”. Então, os Bolsonaro parecem loucos, mas não são, quem controlar o Senado, controla esse quarto poder, e claro, os demais.
Sendo assim, para termos uma chapa do tipo todo mundo junto, as duas vagas para o senado têm que ter adeptos radicais dessa tese do bolsonarismo anti STF. Essa hipótese só tem chance com Washington Reis correndo contra Paes, com uma chapa que contemple, ao mesmo, parte esfacelada do que restar do governo Castro (e o próprio), do PP, de Luizinho, e outros que não me vem à mente agora, além do próprio Wladimir Garotinho. É gente demais, para vaga de menos.
Rodrigo Bacellar sabe que seu espaço encurtou, não só pelos seus arroubos ou atos precoces de hostilidade com esse ou aquele adversário. Foram as circunstâncias que alteraram o jogo, circunstâncias estas que ele não poderia incluir muito, ou nada. Quem olhar mais de perto verá que esses gestos mais extremos de Rodrigo, principalmente os mais recentes, podem ter sido calculados, como forma de apontar uma saída honrosa, já que o deputado já sabia que sua trajetória nessa corrida seria curta, ou percebeu isso com o balançar da carruagem.
A única chance que resta para que ele seja candidato a governador é como uma candidatura tipo Ramagem (na última campanha de 2024, para prefeito do Rio). Ou seja, funcionar para ancorar as candidaturas ao senado. Não acho que ele aceitaria esse papel coadjuvante. O certo é que nenhuma etapa dessa caminhada de Rodrigo Bacellar se deu sem muito atrito e ruído.
Como mencionei em outro texto, sua pré candidatura parece uma luta de doze assaltos com Evander Holyfield, no auge da forma, enquanto lhe espera outra luta, logo depois, com George Foreman, aos 25 anos. O que Bacellar parece fazer é dar aquela famosa mordida na orelha de Mike Tyson. Como anteviu a derrota, decidiu acabar a luta, perder por desclassificação, e não por knock out, e tendo arrancado um pedaço do outro.
A vaga a governador poderia ser oferecida a Wladimir Garotinho, em uma chapa que significaria um suposto racha na direita, com Washington Reis e Wladimir em palanques separados. Isso poderia diminuir as chances de o pleito ser definido em primeiro turno. A questão é Wladimir Garotinho aceitar embarcar nessa, tendo como certos o cumprimento de seu mandato de prefeito ou o de deputado federal eleito.
É preciso dizer novamente, 2026 será dos sobreviventes, e nenhuma força política é tamanha que pode desprezar as demais. Vai prevalecer quem souber poupar munição e estiver melhor localizado no campo de batalha. Por derradeiro, a IA nos informa:
“A diferença principal entre guerra de movimento e guerra de posições reside na mobilidade e no foco estratégico. A guerra de movimento envolve movimentos rápidos e ofensivos de tropas, buscando a conquista de território e a derrota decisiva do inimigo. Já a guerra de posições é caracterizada por uma estabilização das linhas de frente, com exércitos entrincheirados e pouca movimentação, onde a principal estratégia é a defesa e a manutenção de posições conquistadas.”