Nota de Repúdio do Núcleo Cidade Cultura e Conflito contra a Megaoperação realizada por Cláudio Castro no RJ

Megaoperação deixa corpos enfileirados no Rio; força-tarefa é anunciada

O Núcleo Cidade, Cultura e Conflito da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro expressa absoluta indignação com a operação Contenção. Até agora o número de mortes de civis e policiais chega a 121 e não deixa dúvidas sobre como qualificar esta ação do Governo Cláudio Castro: cruel, desastrosa, criminosa. Cruel ao ceifar a vida de inocentes, desastrosa porque não há argumentos para justificar o número de mortos e o caos instaurada no Estado (a operação impacta outras cidades além do Rio de Janeiro). Criminosa ao descumprir a ADPF das Favelas.

Seguimos afirmando que Castro bate recordes de uso intensivo da força policial de forma irresponsável, expondo aqueles que ele deveria proteger à uma condição desigual de enfrentamento. São as mesmas favelas em que outras dezenas de vidas foram perdidas em anos anteriores, em ações semelhantes.

Concordamos com as avaliações sobre os interesses do atual governador, que sempre tratou mal os servidores. Mirando 2026, ele pretende ser um candidato viável para o campo da extrema direita.  Consideramos após análises nos territórios dominados pelo tráfico e a milícia no Rio de Janeiro, que o combate às facções do Comando Vermelho é uma cortina de fumaça e uma janela midiática. A fragilidade de nossa democracia foi escancarada pelo golpe tentado logo após as eleições de 2022 e não há engano: vemos demonstrações de apoio a execuções sumárias, mesmo quando concluída que a vítima não possuía nenhuma relação com atividades ilegais.

Devemos lembrar que a execução não é uma das atribuições da Polícia Militar. Mas este foi o modus operandi da ação que abalou o país como a mais letal até então, sob o governo Castro. É preocupante que se pense em termos de uma guerra. Pois não estamos em uma guerra. Estamos vendo a população sofrer um ataque contínuo com as operações que se tornaram rotineiras na Maré e em outras favelas. Seria possível afirmar que ainda estamos sob um Estado de Direito?

Defendemos que uma polícia cidadã deve ter melhores salários, melhores condições de trabalho e conquistar o respeito da população, o que contribuiria para a diminuição da corrupção policial. Para termos um Estado democrático, precisamos que nossos servidores tenham condições de fazer bem o seu trabalho. E na área de Segurança Pública não é diferente

À todos os moradores enlutados, nossa solidariedade.

E, mesmo tardia, que seja feita justiça aos mortos, considerando que todos eles deveriam ser julgados e se concluída a responsabilidade pelas ações à eles imputadas, condenados dentro dos preceitos defendidos pela Constituição da República Federativa do Brasil.

Campos dos Goytacazes, 30 de outubro de 2025. 

Núcleo Cidade, Cultura e Conflito

Quão fácil é manipular sua posição no ranking científico? Conheça Larry, o gato mais citado do mundo

“Exercício de absurdo” revela falhas nas métricas de produtividade do Google Acadêmico.

Michael Richardson segurando Larry, o gato.

Larry, aqui retratado com Michael Richardson (pai de Reese Richardson), ostentou o título de gato mais citado do mundo por uma semana. Kelly Richardson 

Por Christie Wilcox para a “Science”

Larry Richardson parecia ser um matemático promissor em início de carreira. Segundo o Google Acadêmico, ele havia escrito uma dúzia de artigos sobre temas que variavam de álgebras complexas à estrutura de objetos matemáticos, acumulando mais de 130 citações em 4 anos. Tudo seria bastante notável — se os estudos não fossem um completo disparate. E Larry não era um gato.

“Foi um exercício de absurdo”, diz Reese Richardson, estudante de pós-graduação em metaciência e biologia computacional na Universidade Northwestern. No início deste mês, ele e seu colega Nick Wise, da Universidade de Cambridge, que também investiga má conduta em pesquisas, criaram o perfil de Larry e arquitetaram a ascensão científica do felino. O objetivo: torná-lo o gato mais citado do mundo , imitando uma tática aparentemente usada por um serviço de aumento de citações anunciado no Facebook. Em apenas duas semanas, a dupla cumpriu sua missão.

A ação visa, espera-se, chamar a atenção para o crescente problema da manipulação de métricas de pesquisa, afirma Peter Lange, consultor de ensino superior e professor emérito de ciência política da Universidade Duke. “Acredito que a maioria dos professores das instituições que conheço sequer tem conhecimento dessas fábricas de citações.”

De maneira geral, quanto mais um artigo científico é citado por outros estudos, mais importante ele e seus autores são em uma área de pesquisa. Uma forma abreviada de medir isso é o popular “ índice h “: um índice h de 10 significa que uma pessoa tem 10 artigos com pelo menos 10 citações cada, por exemplo.

Inflar o número de citações e o índice h de um pesquisador lhe confere “uma enorme vantagem” em contratações e decisões de titularidade, afirma Jennifer Byrne, pesquisadora de câncer da Universidade de Sydney. Isso também alimenta o modelo de negócios de organizações obscuras que prometem aumentar suas citações em troca de dinheiro . “Se você pode simplesmente comprar citações”, diz Byrne, “você está comprando influência”.

Eis que surge Larry, o gato. Sua história começou algumas semanas atrás, quando Wise viu um anúncio no Facebook oferecendo “aumento de citações e índice h”. Não era a primeira vez que ele e Richardson viam uma promoção desse tipo. (O preço médio parece ser de cerca de US$ 10 por citação.) Mas este anúncio incluía capturas de tela de perfis do Google Acadêmico de cientistas reais. Isso significava que a dupla podia ver exatamente quais citações estavam elevando os números.

Descobriu-se que as citações frequentemente pertenciam a artigos repletos de textos sem sentido, escritos por matemáticos há muito falecidos, como Pitágoras. Os estudos haviam sido carregados como PDFs na plataforma acadêmica ResearchGate e, posteriormente, excluídos, obscurecendo sua natureza. (Wise e Richardson tiveram que vasculhar o cache do Google para ler os documentos.) “Pensamos: ‘Nossa, esse procedimento é incrivelmente fácil'”, lembra Richardson. “Basta publicar alguns artigos falsos no ResearchGate.”

Wise observou na época que era tão fácil que um roteiro escrito às pressas para produzir artigos com aparência plausível poderia tornar qualquer pessoa altamente citada — até mesmo um gato. “Não sei se ele estava falando sério”, diz Richardson. “Mas certamente encarei isso como um desafio.” E ele sabia exatamente qual gato superar: FDC Willard . Em 1975, o físico teórico Jack Hetherington adicionou seu gato siamês a um de seus artigos de autoria única para que as referências a “nós” fizessem mais sentido. Até este ano , “Felis Domesticus Chester Willard” tem 107 citações.

Para quebrar esse recorde, Richardson recorreu a Larry, o gato de sua avó. Em cerca de uma hora, ele criou 12 artigos falsos, um atribuído a Larry e o outro a outros 12 autores, cada um citando um dos trabalhos de Larry. Isso resultaria em 12 artigos com 12 citações cada, totalizando 144 citações e um índice h de 12. Richardson carregou os manuscritos em um perfil do ResearchGate que criou para o felino. Então, ele e Wise esperaram que o Google Acadêmico extraísse automaticamente os dados falsos.

Em 17 de julho, os artigos de Larry e 132 citações apareceram no site. (O Google Acadêmico não conseguiu detectar um estudo espúrio, observa Wise.) E, assim, Larry se tornou o gato mais citado do mundo. “Perguntei a Larry qual foi sua reação por telefone”, disse Richardson à Science . “Só posso presumir que ele ficou tão atônito que não conseguiu falar.”

aspas

Se você pode simplesmente comprar citações, está comprando influência.

Jennifer ByrneUniversidade de Sydney

Embora o perfil de Larry possa parecer obviamente falso, encontrar perfis manipulados geralmente não é fácil, afirma Talal Rahwan, cientista da computação da Universidade de Nova York em Abu Dhabi. No início deste ano, ele, Yasir Zaki, também cientista da computação da mesma instituição, e seus colegas analisaram mais de 1 milhão de perfis do Google Acadêmico em busca de contagens de citações anômalas. Eles encontraram pelo menos 114 perfis com “padrões de citação altamente irregulares”, de acordo com um artigo publicado em fevereiro no servidor de pré-impressões arXiv. “A grande maioria tinha pelo menos algumas de suas citações duvidosas provenientes do ResearchGate”, diz Zaki.

A ResearchGate está “claro que ciente dos crescentes problemas de integridade na pesquisa na comunidade científica global”, afirma o CEO da empresa, Ijad Madisch. “[Nós] estamos continuamente revisando nossas políticas e processos para garantir a melhor experiência para nossos milhões de usuários pesquisadores.” Nesse caso, ele diz, a empresa desconhecia que sites de citação ilegal excluem conteúdo após a indexação, aparentemente para encobrir seus rastros — informação que pode ajudar a ResearchGate a desenvolver sistemas de monitoramento mais eficazes. “Agradecemos à revista Science por nos relatar essa situação específica e usaremos este relatório para revisar e adaptar nossos processos conforme necessário.”

O Google Acadêmico removeu as citações de Larry cerca de uma semana depois de terem sido publicadas, fazendo com que ele perdesse seu título não oficial. No entanto, seu perfil ainda existe , e as citações duvidosas presentes no anúncio permanecem. Portanto, “Eles não resolveram o problema”, afirma Wise. O Google Acadêmico não respondeu aos pedidos de comentários.

Não é a primeira vez que alguém manipula o Google Acadêmico publicando artigos falsos. Em 2010, Cyril Labbé, um cientista da computação da Universidade Grenoble Alpes, inventou um pesquisador chamado Ike Antkare (“Não me importo”) e o tornou o sexto cientista da computação mais citado no serviço, publicando artigos falsos no site institucional de Labbé. “Imitando um cientista falso em um gato é muito fofo”, diz Labbé. “Se isso pode ser feito com um gato, pode ser facilmente feito com uma pessoa de verdade.”

Por essa razão, muitos pesquisadores gostariam de ver menos ênfase no índice h e em outras métricas que têm “o brilho indevido da quantificação”, como Lange coloca. Enquanto os benefícios de manipular esses sistemas superarem os riscos e custos, diz Wise, as pessoas continuarão tentando burlá-los. “Como criar uma métrica que não possa ser manipulada? Tenho certeza de que a resposta é: Não dá.”


Fonte: Science

Por que 70% dos agrotóxicos largamente usados no Brasil foram banidos na União Europeia?

As autoridades de lá consideram alertas científicos da relação dessas substâncias com o câncer, malformações fetais, danos à reprodução, rins e fígado, autismo, Parkinson, Alzheimer, contaminação da água e muito mais

Tecnologia avançada para aplicar aqui venenos proibidos em outros países. Foto: ANAC

Cida de Oliveira* 

Atentas aos alertas da ciência sobre os riscos que os agrotóxicos representam para a saúde pública e o equilíbrio dos ecossistemas – e, claro, à pressão dos consumidores – autoridades da União Europeia já baniram 223 ingredientes ativos químicos desde 2001. Pesou na decisão a relação desses produtos com a alarmante lista do início desta reportagem, que vai bem além. Ou seja, foram proibidas as substâncias que foram utilizadas até que a efetividade e a segurança foram questionadas por estudos mais modernos e abrangentes. Portanto, deixaram de ser aceitáveis perante os novos conhecimentos científicos.

Já o Brasil, em sentido oposto, segue autorizando esses produtos por aqui. Tanto que esses 223 correspondem a 52% dos 429 ingredientes químicos permitidos no país pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). São matérias primas usadas na formulação de uma infinidade de herbicidas, fungicidas, inseticidas, acaricidas e reguladores do crescimento das plantas, que compõem as milhares de toneladas vendidas todo ano no Brasil, o maior mercado consumidor desses venenos.

Para piorar, desses agentes banidos pelos europeus, 7 estão na lista dos 10 mais vendidos no Brasil em 2023, segundo dados do Ibama divulgados no início do ano. No final da reportagem, você poderá conferir um recorte a partir do parecer publicado nesta terça (28) aqui no Blog do Pedlowski. Trata-se de um documento produzido e divulgado de maneira voluntária pela professora juntamente com Leonardo Melgarejo, coordenador adjunto do Fórum Gaúcho de Combate aos Efeitos dos Agrotóxicos, para respaldar organizações e setores do governo e legislativo na discussão de possibilidades relacionadas ao Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pronara).

 “São moléculas banidas há muito tempo porque são velhas, mais tóxicas. E aqui se usa já há muitos anos, desde 1985. Isso impede a entrada de outras mais novas, menos tóxicas e melhor testadas”, disse ao Blog a engenheira química Sonia Corina Hess, professora aposentada da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e coautora de um parecer técnico detalhando dados sobre esses produtos banidos na União Europeia. “Não é por falta de opção que a gente está usando essas moléculas velhas. E sim porque são despejadas aqui devido ao preço mais baixo desse lixo em relação a moléculas novas. É por isso que entre os mais vendidos estão 7 banidos. A gente vai cumprindo assim esse papel de lixeira mesmo”.

De acordo com ela, que se dedica arduamente ao estudo desse caldeirão de venenos, a situação é bem complexa. Entre suas causas principais está o poder das transnacionais fabricantes, com seu lobby sobre os poderes da República. “A indústria química foca muito no Brasil porque é o maior mercado de agrotóxicos do mundo. Vale muito dinheiro. Há forte pressão até para impedir o banimento. Por isso a gente está com esse cenário tão trágico para o povo brasileiro, que praticamente não tem defesa diante desse poder das indústrias multinacionais”.

Regulação frágil

Esse lobby onipresente, aliás, explica em parte a fragilidade da regulação brasileira quando comparada à do bloco europeu. Lá o conjunto de países observa vários pontos no processo de análise de pedido de registro e de sua validade. “Na União Europeia a reavaliação dos produtos é periódica. Trata-se de um trabalho extenso, que pode levar 6 anos ou até mais; um processo bem bacana, em que um país assume a liderança desses estudos. Depois é feito um parecer que é apresentado para os demais países. Entra então em consulta pública. Se aparece algum ponto que pode sinalizar para o banimento, eles convocam a indústria para justificativas. É bem sério”, disse.

“Já no Brasil a validade é eterna, não tem prazo. Uma vez aprovado, não há regras definindo datas para reavaliação. Por isso a gente tem moléculas que são vendidas no Brasil desde 1985. Para conseguir banir é um processo muito complicado; é no varejo e não no atacado, como na Europa. Como lá cada substância tem uma validade e se naquele prazo não se justificar a manutenção, eles vão banir. Existe uma organização, uma sistemática de reavaliação que não tem no Brasil”, disse. “Isso é que falta aqui. E cada vez que tem reavaliação de agrotóxicos no Brasil é aquele drama, um ‘Deus nos acuda’, com o lobby todo contrário pressionando. E ninguém leva em consideração a saúde pública, o gasto no SUS, a tragédia que é o adoecimento das pessoas. Uma tragédia brasileira diante desse poderio das multinacionais.”

Sonia Hess lembra ainda o processo de enfraquecimento da legislação do setor. “A lei dos agrotóxicos, em vez de mais rigorosa, ficou mais branda, dificultando o banimento. Mas os números da saúde pública estão aí. A incidência de câncer em pessoas mais jovens está aumentando. Autismo, desregulação endócrina. São muitas doenças que provêm de contaminação ambiental e os agrotóxicos têm papel muito decisivo nisso”, disse a especialista, que se vê particularmente preocupada com a qualidade da água de abastecimento. “Cada vez que a gente analisa a água encontra uma série de substâncias perigosas, inclusive agrotóxicos.”

Interesses em conflito

O engenheiro agrônomo Leonardo Melgarejo, com extenso currículo envolvendo o tema, acrescenta outro fator agravante: o poder do agro no poder, inclusive sobre o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), por trás da liberação dos agrotóxicos. “O MAPA afirma que precisamos usar no Brasil venenos desnecessários na União Europeia por conta de nosso clima tropical. Oculta com isso um fato simples: aqueles produtos hoje proibidos na União Europeia já foram utilizados lá; eram necessários para a agricultura até que se comprovaram perigosos demais para a saúde humana e ambiental. Mas como a agricultura européia se mantém, sem eles? Utilizando outras formulações”, apontou.

“O fato é que estas outras formulações são mais caras, enquanto o lixo tóxico, que não pode ser comercializado lá é desviado para cá, a preços baixos. Lixo tem preço baixo”, disse, fazendo coro a Sonia Hess. Na sua análise, trata-se tambem de uma questão de contabilidade, onde os gastos com saúde são desprezados por aqueles só enxergam os resultados da lavoura, a cada safra, desprezando o horizonte de uso de seus próprios territórios. “Estão acabando com a microvida e a fertilidade dos solos, envenenando a água, multiplicando tragédias familiares e justificam isso com base em argumentações falaciosas”, completou.

Após uma década de espera pelos movimentos e organizações da sociedade civil, em junho deste ano o governo federal instituiu, por decreto, o Pronara. A política visa a redução gradual e contínua do uso de agrotóxicos, principalmente os altamente perigosos ao meio ambiente e extremamente tóxicos para a saúde. 

Mensagem de repúdio ao Pacote do Veneno projetado em edifício. Foto @projetemos

atribui ao mesmo MAPA, entre outras coisas, priorizar o registro de agrotóxicos de baixa toxicidade e de bioinsumos. Ou seja, uma incumbência que destoa dos horizontes do poderoso comando da pasta. Para Melgarejo, o nó dessa improvável convergência de interesses só pode ser desatado pela sociedade. E isso quando estiver plenamente consciente da situação.

“As pessoas que residem nas ‘zonas de sacrifício’ não estão cientes de que seus parentes estão sofrendo doenças incuráveis que poderiam ser evitadas, que gestações estão sendo perdidas, que se multiplicam casos de oncologia infantil e distúrbios nos sistemas endócrinos, nervoso e reprodutivo porque a água está sendo envenenada. E se soubessem que isso tudo poderia ser evitado com mudanças nas regras de financiamento, isenção de impostos e autorização de uso, aqui, de venenos que são PROIBIDOS em outros países, não reagiriam?”, pondera, lembrando que “zonas de sacrifício” são áreas nas quais os índices de mortalidade, afecções cancerígenas, gestações perdidas e casos de autismo e infertilidade superam as médias nacionais.

 Nessa perspectiva, Melgarejo defende que a sociedade seja informada sobre a gravidade da situação em que vive. “As pessoas estão sendo enganada a respeito dos agrotóxicos. E o Pacote do Veneno é um instrumento criminoso a serviço de interesses econômicos, cego aos direitos humanos fundamentais, antiético e contrário à civilidade”, disse. “Os números e fatos relatados no parecer demonstram isso. A sociedade precisa ser informada para avaliar aqueles seus representantes que vêm sendo escolhidos para ocupar espaços no poder legislativo. A maioria deles, como demostram as decisões envolvendo o pacote do veneno e as dificuldades para discussão de um modelo de desenvolvimento amistoso à natureza, zombam da saúde de seus eleitores”, diz.

Ele defende também que esta disseminação de informações sobre o tema dê o devido espaço para os avanços das práticas agroecologias, “um sistema de produção mais coerente com as necessidades de soberania alimentar e de enfrentamento ao aquecimento global, está sendo bloqueado pelo estímulo ao uso de lixo tóxico entre nós”. “Precisamos de proteção para as regiões onde a agroecologia se expande, que sejam estabelecidas áreas livres de agrotóxicos e os avanços possam ser multiplicados.

Mas não é só. Como tudo isso depende de políticas públicas, a importância de esclarecimento da sociedade ganha ainda mais relevância. “Até mesmo para o ganho de força na correlação que levou o agro ecocida a dominar o estado”, diz Melgarejo. “Eles estão no legislativo e ocupam postos chave no executivo, em todos os governos. Ocuparam o estado, que precisa se aproximar mais das necessidades da população e se afastar dos mecanismos que nos subordinam a interesses ofensivos à saúde humana e ambiental.”

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Confira a seguir


Cida Oliveira é jornalista e colaboradora regularmente com o Blog do Pedlowski.

A Revolução Verde na América Latina: debates, perspectivas e interdisciplinaridade, o livro

LRV

Abordar o legado da Revolução Verde a partir de uma perspectiva latino-americana exige examinar a dinâmica das mudanças agrárias, seus atores, gestão e fatores condicionantes, além de monitorar suas trajetórias em evolução. O livro “A Revolução Verde na América Latina: debates, perspectivas e interdisciplinaridade” surge do desejo de explicar o passado da América Latina em relação à Revolução Verde e o lugar da América Latina em sua trajetória global. O octogésimo aniversário, em 2023,  impeliu os autores desta obra a considerar a pluralidade e a diversidade da Revolução Verde, cujas várias interpretações revelam que o processo em questão se transformou em múltiplas revoluções verdes.

Os autores adotaram uma perspectiva crítica sobre a comemoração, visando contribuir para uma renovação das interpretações. Essa iniciativa também abrange questões historiográficas referentes à periodização, ao local de sua produção, aos contextos que justificaram seu estudo e às questões que ainda precisam ser exploradas.

Quem desejar baixar gratuitamente este livro, basta clicar [Aqui!].

 

O mercado de CO2 é cego

Comércio de emissões – O mercado de CO2 é cego.

Foto: dpa/Jan Woitas 

Por Jörg Staude para o “Neues Deutschland”

Como se livrar de uma substância nociva que, em altas concentrações, torna o planeta inabitável? A abordagem normal seria proibir a substância e desenvolver um plano de eliminação gradual. Primeiro para as áreas onde a substância é fácil de substituir e, posteriormente, para os casos mais difíceis. E aqueles que absolutamente não podem ficar sem ela seriam monitorados de perto.

É assim que funciona com os CFCs que destroem a camada de ozono, e é assim que deveria funcionar com os resíduos de plástico. Mas se existe a crença de que o mercado pode regular tudo, então surge a ideia de permitir o comércio dessa substância nociva .

Aqueles que lidam com a substância recebem uma cota que diminui com o tempo. Dependendo do nível dos chamados custos de evitação, aqueles com acesso a alternativas mais baratas serão os primeiros a fazer a transição. Posteriormente, aqueles para quem a transição for mais cara tomarão medidas.

Essa é a ideia básica por trás do sistema europeu de comércio de emissões de CO2, o gás que prejudica o clima . Ele deveria fornecer a prova definitiva de que o livre mercado pode proteger o clima – aliás, que o mercado é o melhor protetor do clima. No entanto, durante os primeiros 15 anos, pouco aconteceu no comércio de emissões. O CO2 é prejudicial ao clima? Não sabemos ao certo, era a opinião predominante até meados da década de 2010. Para cada defensor do clima, havia três céticos.

Assim, foram alocadas mais licenças de emissão para a substância nociva do que as empresas afetadas efetivamente emitiram. Novas usinas termelétricas a combustíveis fósseis foram construídas desenfreadamente na Europa após 2005, milhares de megawatts somente na Alemanha. O comércio de emissões tornou-se uma mera fachada para a proteção climática.

No entanto, as emissões de CO2 diminuíram : na Alemanha, em cerca de 100 milhões de toneladas entre 2005 e 2020. Mas isso não se deveu ao comércio de emissões, e sim às energias renováveis ​​legalmente obrigatórias e, posteriormente, à eliminação gradual do carvão, também legalmente obrigatória. Até o momento, não se conhece nenhum estudo que esclareça a contribuição real do comércio de emissões para a redução de CO2 .

Para justificar sua continuidade, o comércio de emissões está sujeito a constantes ajustes políticos. Os certificados excedentes foram transferidos para uma reserva de mercado, cujos mecanismos agora são debatidos por inúmeros especialistas. O supostamente simples mercado de CO2 se transformou em um monstro burocrático.

Só o clima não se deixa enganar por tanta conversa fiada. Com o Acordo de Paris de 2015 e a meta de 1,5 grau, os políticos ficaram pressionados a demonstrar sucessos nas políticas climáticas. Até meados do século, o mundo deveria e precisa ser neutro em carbono.

Assim, a era de ouro do comércio de emissões chegou ao fim a partir de 2020. O preço do CO2 aumentou. Novos setores, como construção civil e transportes, serão incluídos. A partir de 2040, não serão emitidas novas licenças de emissão.

De repente, muitas empresas estão em pânico, como o CEO da empresa química Evonik, sediada em Essen. Descobriu-se que, nos últimos 20 anos, eles não tomaram nenhuma providência para se livrar da substância nociva. Era simplesmente um item de custo em seus cálculos. Como sempre, os lucros foram privatizados e os custos ambientais, socializados. A proteção climática, em grande parte, não passou de greenwashing.

É claro que as mudanças climáticas não podem mais ser negadas. Executivos e consultores corporativos estão se adaptando: o prejuízo econômico causado pelo comércio de CO2 agora é considerado maior do que o prejuízo causado pelas mudanças climáticas. Dessa forma, os políticos continuam vulneráveis ​​à chantagem.

Conclusão: O comércio de substâncias nocivas não as eliminará; apenas prolongará sua existência. De qualquer forma, o mercado é o instrumento errado para uma transformação rumo à neutralidade climática. Ele é cego para esse desafio.


Fonte: Neues Deutschland

Andes peruanos sofrem com poluição severa por metais, mostra estudo

poluição do Lago Junin Transporte de blocos de concreto para a instalação de uma estação flutuante tipo boia no Lago Junín, destinada ao monitoramento da qualidade da água. Crédito da imagem: AsiriMH/Wikimedia Commons , sob licença Creative Commons CC BY-SA 4.0. 

De acordo com um estudo publicado na revista Science of the Total Environment , “99% da área apresenta níveis de risco ecológico muito altos a extremamente altos”, bem como “100% de risco carcinogênico” para adultos e exposição de crianças ao arsênio.

“Os níveis de arsênio são extremamente altos, assim como os de chumbo e cádmio , ultrapassando em muito os limites aceitáveis. O risco carcinogênico combinado é inaceitável. A quantidade de cromo encontrada também é significativa e representa uma séria ameaça à saúde humana”, disse Samuel Pizarro, um dos autores, ao SciDev.Net .

O estudo foi conduzido por um grupo de pesquisadores do departamento de serviços agropecuários estratégicos do Instituto Nacional de Inovação Agropecuária do Peru e da Universidade Nacional Toribio Rodríguez de Mendoza, do Amazonas.

No total, a distribuição espacial, o risco ecológico e as implicações para a saúde humana de 14 metais pesados, metaloides e oligoelementos nos solos superficiais ao redor do Lago Junín (ou Chinchaycocha) foram avaliados em 211 amostras de solo.

“Os resultados revelam uma contaminação extrema , com concentrações de arsênio, chumbo, cádmio e zinco que excedem os limites ecológicos em mais de 100 vezes eáreas agrícolas ”, escreveram os pesquisadores.

“Os níveis de arsênio são extremamente altos, assim como os de chumbo e cádmio, ultrapassando em muito os limites aceitáveis. O risco carcinogênico combinado é inaceitável. A quantidade de cromo encontrada também é alarmante, representando uma séria ameaça à saúde humana.”

Samuel Pizarro, pesquisador da Diretoria de Serviços Agrícolas Estratégicos do Instituto Nacional de Inovação Agrícola, filial de Huancayo.

“As avaliações de risco ecológico, utilizando o grau de poluição, o índice de carga de poluição e o índice de risco, mostraram que mais de 99% da área de estudo apresenta níveis de poluição muito altos a extremamente altos”, continua o estudo.

A região abriga cerca de 50.000 pessoas, incluindo áreas urbanas e rurais, e faz parte da Reserva Nacional de Junín.

“Mas o impacto atinge 1,3 milhão de pessoas, porque parte da água é usada nos vales e em barragens rio abaixo”, acrescentou Pizarro: calcular a dimensão desse impacto, bem como o efeito sobre crianças e mulheres grávidas na região, é uma tarefa que ainda precisa ser feita.

O Lago Junín, ou Chinchaycocha em quéchua, é um dos lagos mais emblemáticos e importantes do altiplano peruano. Crédito da imagem: CRICOBA7/Panoramio , sob licença Creative Commons CC BY 3.0 Deed .

Um emblema

A área do Lago Junín é um dos ecossistemas mais emblemáticos do altiplano peruano, acrescentou Dennis Ccopi, um dos coautores do estudo. “A 4.100 metros acima do nível do mar, é o segundo maior corpo d’água do país e a nascente do Rio Mantaro, que irriga áreas agrícolas no vale”, afirmou.

Este importante ecossistema tornou-se um “sumidouro de metais e metaloides, arsênio, chumbo, cádmio, que se acumulam na água , nos sedimentos e nos solos de pastagem. Isso afeta os alimentos e expõe as comunidades locais que utilizam a terra e a água”, acrescentou.

Esses são passivos ambientais decorrentes de minas abandonadas há quase um século, acrescentou ele, ou até mais, visto que a zona andina de altitude possui uma tradição de mineração de mais de 300 anos, além da atual pecuária e urbanização.

“Há um processo de bioacumulação porque os animais ao redor do lago consomem ração contaminada”, acrescentou Pizarro.

Outro dos autores do trabalho, Alberto Arias-Arredondo, é originário da região e lembra que, desde a infância, na escola, a poluição era um dos problemas locais, mas que agora este estudo conseguiu obter dados de robustez sem precedentes.

Além de sua importância ecológica, o lago é fonte de sustento para seus habitantes, apesar dos altos níveis de poluição. Crédito da imagem: Carlos Arias Segura/Wikimedia Commons , sob licença Creative Commons CC BY-SA 4.0 Deed .

Um dos motivos é que eles realizaram uma amostragem sistemática da área usando pontos de amostragem em grade ao redor do lago. “Essas são amostras compostas, representando um pixel de satélite. Essa concentração é comparada com variáveis ​​ambientais, e o cálculo de quantos dias a área ficou inundada também é levado em consideração”, acrescentou Pizarro.

Para isso, eles utilizaram um modelo de aprendizado de máquina (uma das bases dIA ) com validação cruzada, para verificar se o modelo é robusto e se os dados podem ser extrapolados ; o sistema poderia ser usado em outras áreas semelhantes.

“Os resultados são consistentes com as descobertas da minha própria pesquisa na bacia do rio Mantaro, bem como na região de Huaraz: a poluição relacionada à mineração nos altos Andes peruanos representa um sério risco ecológico, socioeconômico e de saúde para a população local”, disse Anna Heikkinen, pesquisadora da Universidade de Helsinque (Finlândia), que não participou deste trabalho.

“Este estudo apresenta uma análise muito detalhada dos diferentes níveis de metais pesados ​​e metaloides na área do Lago Junín e os riscos que representam para as populações e ecossistemas locais”, acrescentou, concluindo que espera que “as autoridades peruanas levem este estudo a sério para proteger o bem-estar da população local, dos animais e do meio ambiente ”.

A SciDev.Net solicitou repetidamente um posicionamento da Gestão Regional de Recursos Naturais e Gestão Ambiental do Governo Regional de Junín sobre os resultados deste estudo e as medidas a serem adotadas, mas até o fechamento desta matéria não havia recebido resposta.


Fonte: SciDev.Net

Crise climática avança mais rápido que ações de mitigação, alerta relatório global

crise climáticaPlaneta está absorvendo mais calor do que emitindo ao espaço, indicando uma aceleração do aquecimento global  

Agência BORI

A crise climática avança em ritmo mais rápido que as medidas de combate, com florestas, solos e oceanos menos capazes de absorver os gases causadores do efeito estufa. Com isso, as temperaturas globais continuam subindo. É o que mostra um relatório da The Earth League, um consórcio internacional de cientistas e especialistas em clima, divulgado na noite desta quarta (29) – às vésperas da COP30, a Conferência do Clima da ONU, sediada em Belém de 10 a 21 de novembro. O documento reúne os achados científicos mais recentes sobre o tema.

Com o objetivo de fornecer subsídios a políticas públicas atualizadas e à governança internacional, 70 pesquisadores coordenaram uma consulta online com mais de 150 especialistas de diversos países. As contribuições foram analisadas e organizadas em dez tópicos principais, fundamentados em estudos científicos, e distribuídas em três frentes: as evidências da aceleração do aquecimento global, os impactos observados e possíveis caminhos para aprimorar a mitigação.

O primeiro destaque do documento alerta que os recordes de temperaturas registrados em 2023 e 2024 podem estar relacionados com um desequilíbrio energético na Terra, indicando uma aceleração do aquecimento global. Esse fenômeno é impulsionado principalmente pela menor reflexão da luz solar, causada pela redução da quantidade e da refletividade das nuvens sobre os oceanos e do recuo da cobertura de gelo. Ou seja, somente a ocorrência do fenômeno El Niño não é capaz de explicar todas as anomalias de temperaturas verificadas nesses dois anos.

“A Organização Meteorológica Mundial (OMM) confirmou que 2024 foi o ano mais quente já registrado, com temperaturas médias atingindo 1,55 °C acima dos níveis pré-industriais”, explica Mercedes Bustamante, pesquisadora da UnB e parte da equipe que formulou o relatório. Ela ressalta que o aumento contínuo das temperaturas tem alimentado eventos extremos como ondas de calor, secas, incêndios florestais, tempestades e inundações com mais intensidade e frequência, causando perdas humanas e econômicas.

De acordo com Bustamante, o aquecimento geral excepcional também veio acompanhado de recordes nas ondas de calor oceânicas, assim como pela perda acelerada de massa de geleiras e elevação do nível do mar. Em 2024, a temperatura média da superfície do mar ficou 0,6°C acima da média de 1981 a 2019 e cerca de 0,9°C acima dos níveis pré-industriais.

Os efeitos desse aquecimento incluem desde perdas de biodiversidade, com declínio ou redistribuição de diversas espécies marinhas, até impactos econômicos para quem sobrevive desses ecossistemas. O aumento da temperatura da superfície do mar também retroalimenta o agravamento da crise: com águas mais quentes, o oceano absorve menos gás carbônico, um dos principais gases responsáveis pela crise climática, afetando sua capacidade de reduzir o impacto das emissões humanas.

O relatório também destaca outros oito pontos importantes, como o esgotamento de águas subterrâneas, o aumento de surtos de doenças reforçadas pelo calor, como a dengue, e os riscos provocados por incêndios florestais. Nesse contexto, Bustamante alerta que as ações voluntárias dos países para mitigação climática – as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) – precisam ser mais ousadas e eficientes. “Se totalmente implementada, a última rodada de NDCs reduziria as emissões globais em apenas 5,9% até 2030, bem abaixo dos 42% necessários para limitar o aquecimento a 1,5°C ou dos 28% para mantê-lo abaixo de 2°C”, explica a pesquisadora. “Enquanto isso, os indicadores climáticos seguem sinalizando crescente preocupação”, salienta.

Bustamante ressalta que a urgência de avançar na implementação de novas metas climáticas cresce diante dos repetidos atrasos de diversos países na apresentação das contribuições nacionais atualizadas, em preparação para a COP30 em Belém. A equipe espera que o relatório sirva de base para as discussões e propõe medidas prioritárias. “É preciso criar indicadores de progresso padronizados, monitorar a transição para além dos combustíveis fósseis, fortalecer a conservação e restauração florestal e proteger a biodiversidade e os sumidouros de carbono”, afirma a cientista. “Também é essencial reconhecer os papéis das estratégias de remoção de CO₂, tanto para compensar emissões difíceis de reduzir quanto para permitir, no futuro, emissões líquidas negativas”, finaliza.


Fonte: Agência Bori

Em defesa do PCV, professores da Uenf decidem entrar em estado de greve para pressionar governo do RJ

Após esperarem por mais de 4 anos a implementação do seu novo Plano de Cargos e Vencimentos (PCV), os professores da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf) decidiram em uma assembléia representativa, e por ampla maioria, se colocar em estado de greve a partir de hoje (29/10).

Além de se colocar em estado objetivo de preparação para uma greve geral caso o governador Cláudio Castro não envie o novo PCV da Uenf para ser apreciado pela Alerj no mês de novembro, os professores decidiram ainda formar um Comando de Mobilização, o qual será responsável por organizar atos e mobilizações em defesa da universidade pública e do respeito aos servidores.

Como primeira atividade desse estágio pré-greve, os professores decidiram que irão estar presentes na Alerj no dia 3 de novembro para a audiência pública que será realizada para analisar os impactos da Reforma Administrativa sobre os servidores públicos estaduais,  a qual também deverá atingir todos os servidores da Uenf.

A assembléia de hoje foi a maior desde o encerramento da greve geral dos professores que ocorreu em 2017 quando os salários deixaram de ser pagos pelo governador Luiz Fernando Pezão.

Segurança pública não se faz com sangue

A operação mais letal da história do Rio de Janeiro, a Operação Contenção, nesta terça (28), expõe o fracasso e a violência estrutural da política de segurança no estado e coloca a cidade em estado de terror.

Rio de Janeiro (RJ), 28/10/2025 - Durante operação policia contra o Comando Vermelho, bandidos ordenam fechamento de comércio e usam lixeiras incendiadas para bloquear a via na rua Itapiru, no Catumbi. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

© Fernando Frazão/Agência Brasil

A chacina que se desenrola desde as primeiras horas desta terça-feira (28), nos complexos de favelas do Alemão e da Penha, na Zona Norte do Rio de Janeiro, inscreve-se em um longo e trágico histórico de matanças cometidas por forças policiais no estado — apresentadas, equivocadamente, como política pública. Até o momento, já são 64 pessoas mortas em uma única operação — a mais letal da história do Rio de Janeiro.

A perda massiva de vidas reitera o padrão de letalidade que caracteriza a gestão de Cláudio Castro, governador que detém o título de responsável por quatro das cinco operações mais letais da história do Rio de Janeiro, superando seus próprios recordes anteriores registrados no Jacarezinho (2021) e na Vila Cruzeiro (2022). O que o governador Cláudio Castro classificou hoje como a maior operação da história do Rio de Janeiro é, na verdade, uma matança produzida pelo Estado brasileiro.

Ao longo dos quase 40 anos de vigência da Constituição Federal, o que se viu nas favelas fluminenses foi a consolidação de uma política de segurança baseada no uso da força e da morte, travestida de “guerra” ou “resistência à criminalidade”. Trata-se de uma atuação seletiva, dirigida contra populações negras e empobrecidas, que tem no sangue seu instrumento de controle e dominação.

Não há nela elementos que efetivamente reduzam o poderio das facções criminosas nos territórios. Pelo contrário: essas ações aprofundam a insegurança e o medo, instalam o pânico, interrompem o cotidiano de milhares de famílias, impedem crianças de ir à escola e impõem o terror como expressão de poder estatal. A morte não pode ser tratada como política pública.

Esse ciclo de violência não é acidental: ele decorre de uma estratégia deliberada que privilegia o confronto armado em detrimento de qualquer compromisso com a vida e com a legalidade. Durante seu pronunciamento, o governador ainda tentou responsabilizar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n.º 635 — a ADPF das Favelas — e as organizações da sociedade civil que atuaram por sua implementação, pela letalidade da operação. Ao fazer isso, ataca o controle das polícias, papel constitucionalmente atribuído ao Ministério Público, e busca deslegitimar o trabalho das entidades que lutam pelo direito à vida nas favelas.

Castro ainda atuou politicamente para esvaziar a ADPF 976 no Supremo Tribunal Federal, com o objetivo de liberar as forças de segurança de obrigações legais como planejamento prévio e preservação de vidas. Paralelamente, manteve a lógica de premiação pela letalidade ao sancionar, na nova Lei Orgânica da Polícia Civil, a gratificação por “bravura” — dispositivo que substitui a antiga “gratificação faroeste”, vetada após ampla reprovação social. Ao premiar o confronto e a morte, o governo estimula a mentalidade de guerra e transforma as comunidades em campos de batalha, onde moradores são tratados como “inimigos internos”.

O Manual sobre o Uso da Força e Armas de Fogo por Agentes da Segurança Pública, publicado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), estabelece princípios fundamentais que devem orientar toda ação policial: legalidade, necessidade, proporcionalidade, precaução e responsabilidade. As operações conduzidas pelo Estado do Rio de Janeiro violam frontalmente todos esses parâmetros, configurando uma prática sistemática de uso ilegítimo da força letal.

O Brasil e o Estado do Rio de Janeiro já foram reiteradamente advertidos pela Organização das Nações Unidas e pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre o caráter racista e discriminatório da política de “guerra às drogas”, que define quem morre e quem vive nas favelas e periferias. O Estado fluminense acumula duas condenações na Corte Interamericana de Direitos Humanos — pelas chacinas de Acari (1990) e Nova Brasília (1994 e 1995) — e segue reproduzindo o mesmo padrão de violência. Nos últimos dez anos (2014–2024), 5.421 jovens de até 29 anos foram mortos em intervenções policiais, segundo o Instituto de Segurança Pública.

Desde os anos 1990, sucessivos governos ignoram propostas de segurança pública orientadas pela prevenção, pela redução da violência e pelo fortalecimento de direitos. O investimento segue voltado ao confronto, com resultados trágicos e repetidos: mais mortes, mais dor e nenhuma segurança.

O que se testemunha hoje é o colapso de qualquer compromisso com a legalidade e os direitos humanos: o Estado substitui a segurança pública baseada em direitos por ações militares de grande escala. Sob o pretexto da “guerra às drogas”, instala-se um estado de insegurança permanente, voltado contra a população negra e pobre das favelas. Não há justificativa para que uma política estatal, supostamente voltada à proteção da sociedade, continue a ser conduzida a partir do derramamento de sangue. A segurança pública deve garantir direitos, não violá-los. As moradoras e os moradores das favelas têm direito à vida, à integridade física e à paz — e isso não é negociável.
Rio de Janeiro (RJ), 28 de outubro de 2025.

Anistia Internacional Brasil
Justiça Global
Centro de Estudos de Segurança e Cidadania — CESeC
Conectas Direitos Humanos
Centro pela Justiça e o Direito Internacional — CEJIL
Instituto Papo Reto do Complexo do Alemão
Movimentos
Redes da Maré
Instituto de Estudos da Religião — ISER
Observatório de Favelas
Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular (NAJUP) Luiza Mahin
Movimento Unidos dos Camelôs
Grupo Tortura Nunca Mais — RJ
Fórum Popular de Segurança Pública do Rio de Janeiro
CIDADES – Núcleo de Pesquisa Urbana da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Instituto de Defensores de Direitos Humanos — DDH
Iniciativa Direito Memória e Justiça Racial
Frente Estadual pelo Desencarceramento — RJ
Instituto Terra Trabalho e Cidadania — ITTC
Associação de Amigos/as e Familiares de Pessoas Presas e Internos/as da Fundação Casa — Amparar
Gabinete Assessoria Jurídica Organizações Populares — GAJOP
Instituto Sou da Paz
Rede Justiça Criminal
Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional — FASE RJ
Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares — RENAP RJ
Rede de Comunidades e Movimentos contra a Violência
Casa Fluminense
Plataforma Justa


Fonte: Redes da Maré 

Pessoas Atingidas pelo Tsulama da Vale em Brumadinho ocupam a linha férrea em Mario Campos (MG) na busca por direitos mínimos

Quase sete anos após o rompimento, a luta segue por auxílio emergencial, garantia da assessoria técnica independente escolhida pelo povo e condições para participação na governança dos recursos para reparação.

Na manhã dessa terça-feira (28) pessoas atingidas pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho ocuparam a linha férrea da MRS em Mário Campos (MG). A linha férrea faz parte do ramal logístico Paraopeba e é utilizado por várias mineradoras, entre elas a mineradora Vale, responsável pelo rompimento da barragem que matou 272 pessoas em 2019 e atingiu toda bacia do rio Paraopeba e lago de Três Marias. A população revoltada com a falta de reparação pelos danos causados pela Vale, que já se arrasta por mais de 6 anos, realizou o ato em forma de protesto. Os manifestantes apresentaram 3 principais reivindicações:              

Pagamento imediato do “Auxílio Emergencial” pela mineradora Vale

Até o mês outubro de 2025 mais de 160 mil pessoas atingidas de toda a bacia do Paraopeba recebiam um valor mensal, sendo meio salário-mínimo até janeiro de 2025, e após janeiro ¼ de salário-mínimo. Esse valor é chamado de Programa de Transferência de Renda (PTR) e funciona como uma medida de mitigação enquanto a reparação não é concluída. Acontece que esse programa chegou ao fim porque se esgotou o recurso definido para ele, em 2021, no acordo entre Vale, Ministérios Públicos, Defensoria Pública e Governo de Minas Gerais. Porém, a reparação se encontra longe de ser concluída. A população atingida alega que apenas 10% da população foi indenizada e que o rio continua contaminado e sem poder ser utilizado. Segundo levantamento das Assessorias Técnicas dos Atingidos no ritmo atual, a Vale vai gastar 700 anos para limpá-lo. Além disso, os projetos comunitários de reparação coletiva estão previstos para serem iniciados somente em 2026. Dessa forma é evidente que a reparação não caminhou suficientemente para haver suspensão de medidas de mitigação. A Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB) – Lei 14.755/2023 – garante em seu texto o direito ao Auxílio Emergencial nos “casos de acidentes ou desastres, que assegure a manutenção dos níveis de vida até que as famílias e indivíduos alcancem condições pelo menos equivalentes às precedentes”. Diante da degradação da condição de vida das populações atingidas e com fim do PTR, recurso que era majoritariamente utilizado para adquirir alimentos e remédios, as mazelas sociais já são observadas nos 26 municípios atingidos pelo rompimento. Dessa forma os manifestantes exigem a imediata aplicação da lei da PNAB e o atendimento da Vale para pagar o auxílio emergencial. A população também destaca que desde março deste ano tramita uma ação na justiça solicitando esse direito que já teve decisão favorável em primeira instância e a Vale arrasta o processo com recursos afim de atrasar a chegada do direito aumentando o sofrimento do povo.

Direito à Assessoria Técnica Independente escolhida pelas comunidades atingidas

Esse é outro direito garantido pela PNAB e pela Política Estadual dos Atingidos por Barragens (PEAB) – Lei nº 23.795, de 15/01/2021. No momento a população atingida de 6 municípios (Brumadinho, Mário Campos, Betim, São Joaquim de Bicas, Igarapé e Juatuba), cerca de 70% da população atingida, está tendo esse direito violado por parte dos Ministérios Públicos e Defensoria Pública de Minas Gerais (Instituições de Justiça).  Esses órgãos que deveriam defender as pessoas atingidas estão removendo de forma arbitrária e sem consulta à população, a entidade que presta o serviço nesses municípios. Essa ação se deu após as Instituições de Justiça imporem um valor para o prosseguimento do trabalho nos próximos 2 anos que é insuficiente e sem isonomia em relação aos demais municípios da bacia. Dessa forma os Ministérios Públicos e a Defensoria Pública atrasam ainda mais o processo de reparação, causando prejuízos na vida das pessoas além da perda vultosa de recursos, que se somam às perdas por um atraso de 4 anos provocado por elas para início da reparação socioeconômica. Diante dessa situação os manifestantes exigem o respeito a escolha da população e a permanência da Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas), entidade que presta o serviço para a população nos referidos territórios, além da liberação do recurso necessário para o trabalho de forma isonômica e com a devida qualidade.

Condições para as pessoas atingidas participarem da gestão dos projetos de demandas das comunidades ( Anexo 1.1)

Uma importante parte da reparação dos danos causados pela Vale são os projetos de demanda das comunidades, conhecidos como Anexo 1.1, por causa de sua denominação no acordo assinado em 2021. Essa é única fração da reparação que contará com a participação efetiva da população atingida. Para isso está sendo construída uma governança através de conselhos formados pelas pessoas das comunidades atingidas. Uma pauta antiga dessas comunidades é a garantia de condições para que esses conselheiros possam participar das reuniões de conselhos através do pagamento de diárias pelos dias de atuação. Já que a participação é voluntária, essas diárias são importantes para compensar as horas de trabalho perdidas no empenho das tarefas comunitárias. Porém no dia 21/10 os Ministérios Públicos e Defensoria Pública negaram o atendimento dessa pauta com a argumentação de que existem algumas leis que impedem esse tipo de pagamento. A decisão foi tomada mesmo com a existência de um estudo realizado pela entidade gestora do anexo 1.1 que afirmava a possibilidade técnica do pagamento. Diante disso, os manifestantes exigem a liberação do pagamento de diárias para compensar as participações de conselheiros e conselheiras nos espaços formais de representação do anexo 1.1.

Os manifestantes aguardam uma posição da Vale, Ministérios Públicos e Defensoria a respeito das solicitações.

Saiba mais sobre a reparação: 

Veja nota do MAB sobre a atual situação da reparação na Bacia do Paraopeba [Aqui! ].