Extração ilegal de madeira na Amazônia tem aumento de 184% em Unidades de Conservação

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Por Imaflora 

De agosto de 2023 a julho de 2024, a exploração ilegal de madeira na Amazônia brasileira aumentou 184% em Unidades de Conservação (UCs). No período analisado, foram explorados 8,1 mil hectares nessa categoria fundiária, contra 2,8 mil no período anterior. A informação consta em estudo divulgado nesta quinta (18) pela rede Simex, composta pelo ICV, Imaflora e Imazon.

Ao todo, foram extraídos 327,6 mil hectares de florestas nativas para fins madeireiros no bioma, o que representa uma redução de 10,5% em comparação com o total identificado no estudo anterior. Desse número, 69% (225,1 mil ha) foram explorados de forma legal, com autorização emitida pelos órgãos competentes, enquanto 31% (102,5 mil ha) ocorreram de forma não autorizada.

Além do aumento da extração ilegal em UCs, houve também o aumento da exploração em Terras Indígenas (TIs) e assentamentos rurais. Em TIs, a extração de madeira chegou a 25,2 mil hectares, o que corresponde a um aumento de 24%. Já em assentamentos rurais, o número é de 6,7 mil hectares, 66% superior ao explorado no período anterior.

Do total explorado de forma não autorizada, os imóveis rurais privados respondem por 53%. Foram 54,4 mil hectares de floresta com exploração  nessa categoria durante o período analisado. Em comparação com o período anterior, contudo, o número representa uma redução de 39%.

As áreas de exploração madeireira foram identificadas e mapeadas por meio de imagens de satélite e contrapostas às autorizações de exploração emitidas pelos órgãos ambientais. O Simex é o principal indicador da atividade madeireira legal e ilegal na região amazônica. Os índices reúnem informações de sete estados (Acre, Amapá, Amazonas, Mato GrossoPará, Rondônia e Roraima).

Conforme destacou Leonardo Sobral, diretor de Florestas e Restauração do Imaflora, em 2024 foi observada uma tendência de estabilidade da área total explorada, mas a persistência de exploração não autorizada em áreas críticas reforça a necessidade de políticas continuadas de governança, transparência e comando e controle.

“A consolidação dos dados do Simex para a Amazônia mostra que o avanço do monitoramento da exploração madeireira tem produzido um retrato mais preciso da atividade na região, permitindo separar o que é manejo sustentável do que ainda ocorre à margem da legalidade”, explicou o diretor do Imaflora.

A pesquisadora Camila Damasceno, do Imazon, destacou que apesar da redução da extração ilegal ser positiva, a redução da extração legal acende um alerta, pois pode indicar um enfraquecimento da gestão florestal, o que gera um mercado desleal para quem segue as práticas do manejo florestal.

“Por isso, compreender esses movimentos é essencial para orientar políticas públicas que fortaleçam o manejo florestal sustentável e ampliem a proteção da floresta. Os números do Simex ajudam a identificar os pólos de maior pressão sobre a floresta e evidenciam onde é prioritário avançar na gestão, na fiscalização e no apoio à produção legal”, disse.

Ranking

Mato Grosso é o estado com mais área florestal explorada para fins madeireiros na Amazônia brasileira, com 190 mil hectares extraídos, o que corresponde a 58% do total. Em seguida, aparece o Amazonas, com 46,1 mil hectares (15%) e o Pará, com 43 mil hectares (13%).

No ranking dos dez municípios com mais exploração ilegal no período, 6 estão localizados em Mato Grosso, sendo o primeiro Aripuanã, com 12,7 mil hectares explorados ilegalmente. Em seguida, aparecem Colniza (3º), Nova Ubiratã (4º), Paranatinga (6º), Marcelândia (7º) e Juína (9º).

Também compõem a lista Lábrea/AM (2º), Paragominas/PA (5º), Porto Velho/RO (8º) e Dom Eliseu/PA (10º). Juntos, esses dez municípios concentram 51% de toda a exploração madeireira ilegal mapeada na Amazônia brasileira no período analisado.

Para Vinicius Silgueiro, coordenador do Núcleo de Inteligência Territorial do ICV, Mato Grosso lidera o ranking dos estados com mais exploração madeireira na Amazônia por uma série de fatores, entre eles o relevante papel econômico do seu setor de base florestal, a localização e o histórico de ocupação das áreas florestais, mas também a persistência da exploração não autorizada, que se beneficia especialmente da fragilidade em áreas protegidas.

“Os caminhos para coibir a exploração madeireira ilegal e buscar sua erradicação na Amazônia devem envolver uma combinação de fortalecimento da fiscalização, aprimoramento da rastreabilidade e da transparência, e incentivo à legalidade e ao manejo florestal sustentável”, explicou.

“A fiscalização precisa ser mais focada, ágil e punitiva para desmantelar as cadeias de ilegalidade. Com isso, concentrar o esforço de fiscalização, inclusive com operações conjuntas, nos municípios com maior incidência de ilegalidade, que historicamente concentram a maior parte do problema.”

A ilegalidade avança sobre áreas protegidas

O mapeamento de 2024 traz um sinal de alerta: a exploração madeireira sem autorização cresceu justamente onde a floresta deveria estar mais blindada – Terras Indígenas (TIs) e Unidades de Conservação (UCs). Ao todo, foram 33.454 hectares explorados ilegalmente nessas duas categorias, uma alta de 44% em relação a 2023 (23.120 ha). Na prática, isso significa que cerca de um terço de toda a área explorada sem autorização no período analisado ocorreu dentro de áreas protegidas.

A maior fatia da ilegalidade recaiu sobre as Terras Indígenas, com 25.278 hectares – 25% de toda a exploração ilegal mapeada. As Unidades de Conservação responderam por 8.177 hectares, o equivalente a 8% do total identificado.

Para Júlia Niero, analista técnica do Imaflora, o dado expõe um problema estrutural: “Quando a exploração ilegal cresce dentro de Terras Indígenas e Unidades de Conservação, isso indica fragilidade nos mecanismos de comando e controle e uma resposta insuficiente diante de um problema que se repete há anos”. Ela ressaltou que os impactos vão além da retirada de árvores: “A exploração madeireira ilegal abre caminho para degradação do habitat, perda de biodiversidade e aumento do risco de incêndios – pressionando áreas estratégicas para o clima e para a proteção dos modos de vida de povos indígenas e comunidades tradicionais”.

O padrão geográfico repete o mapa de pressão já observado em 2023, com maior impacto no sul do Amazonas, norte de Rondônia e noroeste do Mato Grosso – regiões historicamente marcadas por degradação e desmatamento.

Entre as Terras Indígenas, a TI Aripuanã (MT) aparece como o principal foco em 2024, com 8.601 hectares afetados. Na sequência, estão o Parque Indígena do Xingu (MT) (4.770 ha), a TI Kaxarari (AM/RO) (2.885 ha) e a TI Amanayé (PA) (2.026 ha). Somadas, essas quatro áreas concentram 54% de toda a exploração ilegal registrada em áreas protegidas.

Já nas Unidades de Conservação, a Reserva Extrativista Guariba/Roosevelt (MT) lidera como a mais impactada — e chama atenção por não ter figurado entre as mais afetadas no levantamento anterior. Para Júlia, o dado é um recado direto: “O avanço em uma UC que não estava no topo da pressão mostra que a ilegalidade é dinâmica e pode ‘migrar’ rapidamente. Nenhuma área protegida está fora de risco quando há falhas de fiscalização e impunidade no entorno”.


Fonte: Imaflora

Dietas ultraprocessadas impulsionam a obesidade e as mudanças climáticas — mas as soluções estão ao nosso alcance

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Por Brian Bienkowski para “The New Lede” 

Dietas em todo o mundo, dependentes de alimentos ultraprocessados ​​e da pecuária de base animal, estão impulsionando as taxas de obesidade e as mudanças climáticas, mas, de acordo com uma nova análise, existem soluções que podem fortalecer a saúde, economizar dinheiro e preservar o planeta. 

Os autores do novo artigo, publicado na revista Frontiers in Science , apontam que as taxas de obesidade quase triplicaram em todo o mundo nos últimos 50 anos e que aproximadamente metade da população mundial deverá estar com sobrepeso ou obesa na próxima década. Eles argumentam que o aumento no uso de medicamentos e cirurgias para perda de peso não aborda as causas principais do ganho de peso global. 

No entanto, os países podem enfrentar as “crises gêmeas” da obesidade e das mudanças climáticas concentrando-se no sistema alimentar como um todo, incentivando uma alimentação mais saudável e desencorajando o consumo de alimentos altamente processados, como bebidas açucaradas, bacon, salsichas, frios, muitos alimentos congelados, batatas fritas, doces e outros salgadinhos. 

“Tanto as mudanças climáticas quanto a obesidade são impulsionadas por um consumo insustentável, porém lucrativo”, escrevem os autores. “Existem soluções, mas elas não foram implementadas adequadamente devido à falta de vontade política.” 

Pesquisadores examinaram as evidências disponíveis que relacionam tanto a obesidade quanto as mudanças climáticas a um sistema alimentar que depende fortemente da pecuária e do processamento de animais, o que incentiva o consumo excessivo e a má saúde. Atualmente, cerca de 38% da população mundial sofre de excesso de peso ou obesidade. 

“O aumento global da obesidade desde a década de 1980 tem sido a mudança mais rápida e drástica no fenótipo humano em toda a nossa evolução”, escrevem os autores.

“O aumento global da obesidade desde a década de 1980 tem sido a mudança mais rápida e drástica no fenótipo humano em toda a nossa evolução.” 

Embora diversos fatores contribuam para as taxas de obesidade, incluindo a diminuição da atividade física, a revisão conclui que o excesso de calorias, frequentemente provenientes de alimentos processados, é o principal responsável pelo aumento da obesidade, especialmente nos EUA, onde as pessoas consomem, em média, mais da metade de suas calorias diárias em alimentos ultraprocessados. Esses alimentos estão associados a problemas cardíacos, diabetes e alguns tipos de câncer, além da obesidade.

O aumento no consumo de alimentos ultraprocessados ​​e na pecuária também impulsiona as mudanças climáticas, segundo o estudo. O cultivo, o processamento, o acondicionamento e o transporte de alimentos são responsáveis ​​por cerca de um terço das emissões de gases de efeito estufa do planetanualmente , sendo a pecuária o maior contribuinte. 



“A monocultura em larga escala de culturas necessárias para a produção de alimentos ultraprocessados” agrava as mudanças climáticas por meio do desmatamento, da degradação do solo e da perda de biodiversidade, escrevem os autores. (Crédito: Getty Images/Unsplash+ )

Alimentos ultraprocessados, como carnes processadas, aumentam a demanda por gado — e muitos outros alimentos processados ​​dependem de grandes quantidades de certas culturas, como milho, soja ou óleo de palma, que geralmente são cultivadas em campos uniformes com grandes quantidades de pesticidas e fertilizantes.

Essa “monocultura em larga escala de culturas necessárias para a produção de alimentos ultraprocessados” agrava as mudanças climáticas por meio do desmatamento, da degradação do solo e da perda de biodiversidade, escrevem os autores.

“A maneira mais eficiente em termos econômicos de garantir que abordemos essas questões enormes é acabar com os subsídios para carne, alimentos ultraprocessados ​​com alta densidade energética e açúcar em bebidas”, disse o autor sênior Jeff Holly, professor emérito de ciências clínicas da Universidade de Bristol, no Reino Unido. “No entanto, estamos em uma situação em que essas mudanças são politicamente muito difíceis.” 

A nova revisão surge um mês depois de uma série de artigos publicados no The Lancet, juntamente com um editorial relacionado , que apelaram a uma “resposta global bem financiada e coordenada” para “romper o domínio da indústria [de alimentos ultraprocessados] sobre os sistemas alimentares em todo o mundo”.

Combater a obesidade e as mudanças climáticas simultaneamente

Holly e seus colegas afirmam que as soluções para ambos os problemas estão interligadas e precisam se concentrar mais em todo o sistema alimentar e menos no comportamento dos indivíduos, que “não é páreo para campanhas de marketing agressivas”, disse a coautora Katherine Samaras, do Hospital St. Vincent’s de Sydney, do Instituto Garvan de Pesquisa Médica e da UNSW Sydney, em um comunicado.

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Medicamentos e cirurgias para perda de peso podem ajudar a combater a obesidade, mas não são tão eficazes em termos de custo ou eficiência quanto mudar a forma como produzimos e consumimos alimentos, de acordo com a nova revisão. (Crédito: Getty Images/Unsplash+ )

“Embora tratamentos como medicamentos e cirurgias ofereçam opções terapêuticas importantes para os indivíduos, eles não substituem a necessidade de combater nossos hábitos alimentares e ambientes de vida insalubres e insustentáveis”, acrescentou ela.

Os pesquisadores apresentaram diversas recomendações para combater a obesidade e as mudanças climáticas, incluindo a taxação de certos alimentos ultraprocessados ​​e bebidas açucaradas; o subsídio de alimentos saudáveis ​​com os impostos arrecadados sobre alimentos não saudáveis; a rotulagem e as restrições à comercialização de alimentos não saudáveis ​​para crianças; e a mudança para dietas com maior consumo de alimentos de origem vegetal e menor consumo de produtos de origem animal.

“Todos os dados que estão surgindo de países que introduziram impostos sobre bebidas açucaradas e rótulos de advertência na parte frontal dos alimentos indicam que essas políticas sistêmicas estão resultando em reduções no consumo populacional desses alimentos prejudiciais e em reduções no índice de massa corporal (IMC), particularmente entre as crianças”, disse Holly. Continuar lendo

Jacques Wagner precificou a democracia brasileira: R$ 20 bilhões

Jaques Wagner é anunciado por Lula como novo líder do Governo no Senado  Federal | PT - Capão Do Leão

Os bons companheiros em ação no PL da Dosimetria: Jacques Wagner costura acordo, Luís Inácio finge que veta

Que certas coisas só avançam no Brasil graças, digamos, à boa vontade da bancada parlamentar do PT na Câmara Federal e no Senado já é sabido faz algum tempo. Mas agora ao senador Jacques Wagner (PT/BA), a coisa atingiu uma nova prateleira com o o PL 2.162/2023, o famigerado PL da   Dosimetria. É que graças a um gesto de Wagner, o Senado Federal acaba de aprovar e enviar para sanção do presidente Luís Inácio. Com isso, todos os que tramaram contra a democracia brasileira, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro, terão uma generosa redução de suas penas, ficando livres para tentar mais uma vez a derrubada do estado de direito no Brasil.

A explicação de Jacques Wagner é que a peça iria passar mesmo, e não haveria porque empurrar a aprovação para 2026.  Mas segundo um outro membro notório do Senado, Renan Calheiras (MDB/AL), a coisa cheira mais a mais uma negociata para aumentar a arrecadação federal a partir de um acordo para  destravar a análise de outro texto considerado prioritário para a equipe econômica,  um que trata do corte de incentivos fiscais e do aumento da tributação de bets, fintechs e juros sobre capital próprio. O valor desse corte seria da ordem de R$ 20 bilhões.

Em outras palavras, houve um acordo para precificar a democracia brasileira no irrisório montante de R$ 20 bilhões, tudo sob os auspícios do líder do PT no Senado Federal!

Como sempre ocorre nesses casos escabrosos, já estão sendo anunciados vetos do presidente Luís Inácio para “defender a democracia”. Vetos esses que serão facilmente derrubados, como já ficou evidente nos casos do PL do Veneno e do PL da Devastação.

Assim, acredita nesses vetos quem quiser, mas o estrago já está feito, e em breve, dependendo de quem for eleito em 2026, poderemos ter a reedição daquelas cenas horrorosas em Brasília ou em alguma outra capital brasileira nas quais a extrema-direita fique descontente com os resultados.

E tudo isso graças a Jacques Wagner, que fique bem claro.

Exploração de lítio no Vale do Jequitinhonha tem mais casas rachadas do que promessas cumpridas

Moradores preferem deixar a região a conviver com impactos da Sigma, que enfrenta dificuldades financeiras

No Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, moradores de uma comunidade colada em uma mina de lítio, entre os municípios de Araçuaí e Itinga, temem que o teto caia sobre suas cabeças. Há semanas não se escuta o barulho da mineradora, mas a preocupação com as rachaduras das casas, causadas por anos de detonações, é maior do que o alívio momentâneo. Ninguém sabe o que vai acontecer daqui para frente.

Os representantes da empresa, que chegou ao Jequitinhonha prometendo mundos e fundos, disseram que as operações retornariam em novembro, mas o prazo não foi cumprido. Os impostos e royalties que viriam com a exploração do lítio, um dos chamados minerais críticos para a transição energética, secaram no último ano. Mesmo o aumento da oferta de empregos sofreu um revés: a Fagundes Construção e Mineração, empreiteira terceirizada, demitiu 500 funcionários e se retirou da operação minerária por falta de pagamento de um montante que chegaria a R$ 115 milhões.

A 1.800 km dali, em um evento paralelo à Conferência do Clima da ONU (COP30), em Belém (PA), a fundadora e CEO da Sigma Lithium, a maior produtora de lítio do Brasil, exaltou a responsabilidade social da empresa, afirmou ter a mina “mais sustentável do mundo” e diz que a chegada da companhia mudou a história da região, que “não tinha absolutamente nenhuma atividade econômica”.

Leia na íntegra: Agência Pública 

Public Eye expõe as doces mentiras da Nestlé

Por Géraldine Viret para “Public Eye” 

Em novembro, uma investigação da Public Eye sobre o açúcar adicionado em alimentos infantis vendidos pela Nestlé na África ganhou destaque internacional. Em diversos países africanos, nossas revelações desencadearam um debate sobre a responsabilidade das multinacionais em relação à saúde pública. Sob pressão, a gigante alimentícia opta por atacar a credibilidade do nosso relatório em vez de questionar suas próprias práticas.

“Todos os bebês têm o mesmo direito a uma alimentação saudável, independentemente de sua nacionalidade ou cor da pele. Todos os bebês são iguais.” Com essas palavras contundentes, 20 organizações da sociedade civil de 13 países africanos se dirigiram ao novo CEO da Nestlé, Philipp Navratil. 

Em uma carta aberta datada de 17 de novembro de 2025, eles exigem que a multinacional acabe com o duplo padrão exposto pela investigação da Public Eye : na África, os cereais infantis da Nestlé contêm altos níveis de açúcar adicionado, enquanto na Suíça e nos principais mercados europeus, esses produtos são isentos de açúcar. “Façam a coisa certa. Não amanhã. Não no ano que vem. Hoje! O mundo está observando”, concluem.  

Em novembro, a investigação da Public Eye sobre o açúcar adicionado em alimentos infantis vendidos pela Nestlé na África ganhou destaque internacional. Em diversos países africanos, nossas revelações desencadearam um debate sobre a responsabilidade das multinacionais em relação à saúde pública. Sob pressão, a gigante alimentícia opta por atacar a credibilidade do nosso relatório em vez de questionar suas próprias práticas.

“Todos os bebês têm o mesmo direito a uma alimentação saudável, independentemente de sua nacionalidade ou cor da pele. Todos os bebês são iguais.” Com essas palavras contundentes, 20 organizações da sociedade civil de 13 países africanos se dirigiram ao novo CEO da Nestlé, Philipp Navratil. 

Um escândalo da Nestlé abala a África 

Do jornal britânico The Guardian à agência de notícias Reuters e à rede de notícias Al Jazeera, nossas revelações repercutiram na mídia global. “Dois padrões diferentes para dois mundos diferentes”, resumiu um jornalista do veículo de mídia indiano Firstpost. E neste “mundo” onde a saúde dos bebês parece importar menos para a Nestlé, a notícia se espalhou como fogo em palha, provocando indignação em todo o continente africano. No Senegal, na Costa do Marfim, na África do Sul e no Togo, as reivindicações de nossos parceiros foram amplamente divulgadas na imprensa: zero adição de açúcar nos cereais infantis vendidos na África!

Em países como a Nigéria, o maior mercado para os cereais infantis Cerelac no continente, foram organizadas conferências que reuniram jornalistas, organizações da sociedade civil e agências reguladoras. De acordo com especialistas em nutrição presentes em Lagos, a investigação da Public Eye desencadeou “um importante debate em toda a África sobre segurança alimentar, ética corporativa e o direito das crianças à igualdade na proteção nutricional”, noticiou o jornal nigeriano The Sun. Para muitos pais que confiam na Nestlé, “as revelações levantaram questões que agora podem pressionar os órgãos reguladores e os fabricantes a responderem de forma mais completa”, acrescentou o The Sun. 

Má-fé como contra-ataque 

De volta a Vevey, os apelos por maior transparência e ética parecem ter caído em ouvidos surdos. Em resposta enviada aos nossos parceiros , a gigante alimentícia nega qualquer “duplo padrão” e proclama em alto e bom som: “Aplicamos o mesmo cuidado a todas as crianças, em todos os lugares.” 

Uma rápida visita ao site promocional da Nestlé na Suíça , no entanto, mostra que, nesse país, as crianças são alimentadas apenas com produtos orgulhosamente rotulados como “sem adição de açúcares”. Enquanto isso, na África, 90% dos produtos testados pela Inovalis – um laboratório líder no setor alimentício, a pedido da Public Eye – continham açúcar adicionado, e em quantidades significativas. Com exceção de duas variantes lançadas recentemente na África do Sul, os produtos sem adição de açúcar que encontramos não foram concebidos pela Nestlé para o mercado africano, mas sim importados da Europa por outras organizações. 

Quando os fatos contradizem palavras bonitas, a Nestlé recorre a uma tática antiga: atacar o mensageiro. Na imprensa, um representante da Nestlé classificou nosso relatório como “enganoso”, alegando que é “cientificamente impreciso se referir aos açúcares provenientes de cereais e naturalmente presentes nas frutas como açúcares refinados adicionados aos produtos”. No entanto, apenas os açúcares adicionados na forma de sacarose e mel foram contabilizados em nossos resultados; os açúcares naturalmente presentes em cereais, frutas e leite foram excluídos. A Nestlé não pode ignorar essa informação, pois a compartilhamos por escrito – como demonstra esta troca de e-mails datada de 28 de outubro de 2025, três semanas antes da publicação de nossa investigação. 

E-mail enviado à Nestlé por Laurent Gaberell, especialista em Agricultura e Alimentação da Public Eye, em 28 de outubro de 2025.

No entanto, como a multinacional nunca se furta a uma pitada extra de açúcar – ou a uma mentira extra – foi ainda mais longe na mídia, alegando falsamente que a Public Eye “se recusou a compartilhar detalhes de seus testes”.

E-mail enviado à Nestlé por Laurent Gaberell, especialista em Agricultura e Alimentação da Public Eye, em 30 de outubro de 2025.

Quanto aos problemas relacionados ao açúcar, a Nestlé não os aborda com maior honestidade. “O maior desafio na África não é a obesidade: é a desnutrição”, declarou a empresa ao The Guardian , ignorando dados alarmantes da Organização Mundial da Saúde, que alerta para uma “dupla carga” de desnutrição, combinando atraso no crescimento, baixo peso e obesidade nas mesmas populações. A OMS vem alertando há anos que a exposição precoce ao açúcar pode causar uma preferência duradoura por alimentos açucarados e é um importante fator de risco para a obesidade.  

Embora a gigante alimentícia se vanglorie de oferecer soluções enriquecidas com ferro e outros nutrientes, não hesita – em certas versões de sua resposta – em apresentar o açúcar como um ingrediente fundamental em sua luta contra a desnutrição: “Ter cereais doces o suficiente para serem palatáveis ​​para bebês foi vital no combate à desnutrição”. E acrescenta: “Lembrem-se de que crianças de seis meses […] podem se recusar a comer e, se se recusarem a comer, não conseguirão crescer adequadamente”. Talvez, ao contrário das crianças suíças, os bebês africanos sejam exigentes com a comida e tenham uma queda por doces? 

Cartoon de imprensa de Bénédicte publicado em 24 horas (19 de novembro de 2025)

A Nestlé pretende lançar variantes sem adição de açúcar em todos os seus mercados até o final de 2025. Mas as organizações africanas que escreveram a carta à Nestlé rejeitam essa medida como uma “meia-medida” totalmente inadequada. “Se o açúcar adicionado não é adequado para crianças suíças e europeias, não é adequado para crianças na África e em outros lugares”, insistem. 

Para citar o jornal satírico suíço Vigousse : “O mundo está de olho na Nestlé, mas a Nestlé, aparentemente, não se importa”. Por quanto tempo mais? A Public Eye e seus parceiros africanos estão determinados a responsabilizar a multinacional. 

Leia nossa reportagem sobre a África do Sul

“Os pássaros da Nestlé ficaram gravados em nossas mentes”


Fonte: Public Eye

Praia do Açu, a Atafona criada pelo porto, corre o risco de sumir

Pode ser uma imagem de horizonte, oceano e praia

Mantido o ritmo de avanço do mar, a localidade de Barra do Açu deverá desaparecer, deixando centenas de famílias ao Deus dará

Há mais de 10 anos, venho usando o espaço do Blog do Pedlowski para noticiar sobre o processo de erosão costeira que está consumindo a faixa de praia que circunda a localidade da Barra do Açu no V Distrito de São João da Barra. Este processo erosivo foi previsto nos estudos de impacto ambiental utilizados pela OSX para obter as licenças ambientais necessárias para a instalação da hoje defunta unidade de construção naval do Porto do Açu.

Este processo tem sido documentado por múltiplas reportagens e documentos científicos, mas nada tem servido para sensibilizar o poder público e os atuais gestores do Porto do Açu, a Prumo Logística Global. Amparados em laudos questionáveis e contando com a inércia do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), o Porto do Açu finge que não vê o que suas estruturas perpendiculares à linha da costa estão causando naquela faixa do litoral sanjoanense.

Esta manhã, por exemplo, está sendo de grande aflição para os moradores da Barra do Açu já que a ação das ondas resultou em uma grande perda do que resta da praia, aproximando o mar de dezenas de residências que agora parecem estar com os dias contados (ver vídeo abaixo).

A inércia tanto dos gestores do porto como das autoridades governamentais deixa os moradores ao Deus dará, na medida em que a perda das residências e estabelecimentos comerciais ocorrerá sem que haja qualquer discussão sobre medidas compensatórias ou, muito menos, de ações estruturantes que contenham o processo erosivo. As soluções de engenharia existem, mas falta pressão política para que os donos do Porto do Açu cumpram com as obrigações que foram criadas pelo processo de licenciamento ambiental.

Aliás, com o PL da Devastação se transformando em lei, o que fica claro é que casos como o da Praia do Açu tenderão a se multiplicar, já que vários regras anteriores foram simplesmente removidas, diminuindo ainda mais as responsabilidades das corporações que instalam esse tipo de empreendimento nas regiões costeiras brasileiras.

STJ faz 2 a 0 no julgamento do retorno do ex-CEO da Vale ao processo de Brumadinho

O Ministro Rogerio Schietti votou favoravelmente ao recurso especial do Ministério Público Federal (MPF) que busca reformar a decisão que concedeu habeas corpus para o presidente da Vale à época da tragédia em Brumadinho. O Ministro Antônio Saldanha pediu vista e o julgamento foi novamente suspenso

Brumadinho: ex-presidente da Vale recebe habeas corpus da Justiça Federal

 Ex-CEO da Vale, Fábio Schvartsman, poderá ser retornado ao processo de homicidio doloso associado ao rompimento da Vale em Brimadinho

Aconteceu nesta tarde (16/12), em Brasília, mais um capítulo do julgamento do recurso especial do MPF, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), para reincluir Fábio Schvartsman na ação por homicídio doloso duplamente qualificado, por 272 mortes, em função do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho. O ministro Rogério Schietti Cruz retornou do pedido de vista com um voto contra o habeas corpus e pela validade da denúncia, trazendo o ex-presidente da Vale de volta à ação penal. Na sequência o Ministro Antônio Saldanha, disse ter dúvidas concretas e fundadas e pediu vista dos autos na sessão da 6ª Turma, suspendendo, outra vez, a decisão por até 90 dias.

Com um voto bem embasado, com menção à jurisprudência e à doutrina e referência a outros casos julgados na 6ª Turma, o Ministro Schietti conclui que a denúncia não faz uma acusação genérica ou de vinculação de Fábio exclusivamente pautada na sua posição de presidente. Ao contrário, faz uma narrativa fática que estabelece todo o histórico de ações e omissões, e dedica todo um capítulo exclusivamente voltado ao delineamento da participação do ex-CEO da Vale no caso do rompimento da barragem. Além disso, o Ministro concordou com o relator Sebastião Reis e com o MPF: os desembargadores do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6) violaram o Artigo 413 do Código de Processo Penal ao explorarem minuciosamente as provas dos autos, algo incompatível com a fase processual e a via eleita.

Os familiares das vítimas consideram que mais um voto favorável foi uma vitória, mas ficaram frustrados por ter que esperar ainda mais. ”A gente fica um pouco decepcionado porque a esperança de que esse julgamento fosse terminar hoje era grande, mas infelizmente houve mais um pedido de vistas. Nossa luta começou há 7 anos com o rompimento da barragem da Vale. Foi cometido um crime horrível, que não vai ficar impune. Estaremos aqui sempre para lutar por Justiça pelas 272 pessoas que foram mortas, desabafou Maria Regina da Silva, vice-presidente da AVABRUM, e mãe de Priscila

Os advogados Danilo Chammas e Pablo Martins, da equipe de Litígio em Direitos Humanos do Instituto Cordilheira, representantes da AVABRUM nos processos criminais, fizeram um balanço do julgamento. “São cinco ministros no total. Dois votos já foram proferidos, ambos favoráveis ao recurso. Falta apenas mais um voto para alcançarmos a maioria. Vamos seguir trabalhando. Daqui até a próxima sessão, seguiremos atuando e estaremos presentes novamente quando o julgamento for retomado. Estamos à disposição de todos os familiares das vítimas e das pessoas interessadas para prestar quaisquer informações e esclarecimentos”, afirma Chammas.

Como foi a primeira sessão do julgamento, em setembro de 2025

O relator Sebastião Reis votou pela procedência do recurso, conforme descrito em seu voto: “viola o art. 413 do CPP o acórdão que ao determinar o trancamento da ação penal por falta de justa causa adentra no exame aprofundado e pormenorizado de fatos e provas indiciárias usurpando a competência do juízo natural da causa, na hipótese a denúncia não é genérica descreve de forma ampla os fatos que culminaram com as mortes de 270 pessoas na região de Brumadinho e afetou o meio ambiente”.

Na defesa do recurso realizada pela sub-procuradora da Procuradoria Geral da República (PGR), Ana Borges, foi lembrado que a farta documentação, com provas robustas, não imputa a responsabilidade ao Fábio Schvartsman pelo simples fato dele ocupar o cargo de presidente. A responsabilidade é pelo risco assumido de morte em condições devastadoras. O presidente da empresa tinha o dever de agir e evitar as mortes. Ela afirmou ainda que não há dúvidas que o TRF6 apropriou-se da competência do juiz natural da causa para a pronúncia e usurpou o direito ao Tribunal do Júri. Segundo o Ministério Público, os Desembargadores extrapolaram os limites do habeas corpus ao avaliar de maneira profunda as provas, assumindo indevidamente o papel do juiz responsável pela decisão de pronúncia.

Entenda o vai e vem do ex-CEO no processo criminal

Em fevereiro de 2020, Fábio Schvartsman se tornou réu sob a acusação de crimes de homicídio doloso duplamente qualificado, por 270 vezes, e diversos crimes ambientais em decorrência do rompimento da barragem em Brumadinho. Em março de 2024, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF6) decidiu pelo trancamento das ações penais em relação ao ex-CEO da Vale, ao acatar um habeas corpus apresentado por sua defesa. Diante dessa decisão, o MPF interpôs um recurso especial que foi remetido ao STJ. Os familiares das vítimas fatais da tragédia sofrem com a morosidade do sistema de justiça.

Exploração de lítio amplia contaminação do solo e da água em Minas Gerais

Pesquisadores alertam para o risco de consumo excessivo de alumínio entre os moradores do Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais

Mina de extração de lítio operada pela Sigma Lithium, próxima à comunidade Piauí Poço Dantas, em Itinga (MG). Rebeca Binda 

Por Enrico Di Gregorio para “Revista Pesquisa Fapesp”

Os municípios de Araçuaí, com 35 mil habitantes, e Itinga, com 15 mil, ambos no Vale do Jequitinhonha, nordeste de Minas Gerais, vivem a perspectiva de aumento de empregos e de renda, mas também de contaminação do solo e da água. Tanto o desenvolvimento econômico quanto os problemas ambientais estão associados à exploração do lítio, elemento químico estratégico para a produção de baterias e para a transição energética (ver Pesquisa FAPESP nº 285).

Em 2023, o governo de Minas Gerais lançou o programa Vale do Lítio, para promover a exploração do mineral. Até aquele ano, uma empresa privada nacional, a Companhia Brasileira de Lítio (CBL), era a única a operar na região. Depois, a mineradora canadense Sigma Lithium iniciou a produção. A também canadense Lithium Ionic, a norte-americana Atlas Lithium, a australiana Latin Resources e a chinesa BYD adquiriram áreas para pesquisa mineral na região.

No Brasil, o lítio é extraído principalmente do espodumênio, mineral encontrado em rochas chamadas pegmatitos. O problema é que a exploração química e mecânica das rochas e minerais para a retirada do lítio libera nanopartículas minerais com alumínio, elemento químico potencialmente tóxico que compõe o espodumênio.

“Os resíduos descartados contendo alumínio ficam empilhados em montes de rejeitos a céu aberto e, quando chove, são levados pela água superficial e se infiltram no solo”, conta o engenheiro-agrônomo Alexandre Sylvio Costa, da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). Com seus colegas da universidade, ele percorreu a região e buscou formas de resolver o problema.

O grupo da UFVJM examinou as possibilidades de uso do silicato de alumínio, resíduo gerado após o espodumênio passar por um aquecimento a altas temperaturas, a chamada calcinação, e por uma solução com ácido sulfúrico, formando sulfato de lítio. Em parceria com a CBL, os pesquisadores desenvolveram um silicato de alumínio não reativo, que, por causa de suas propriedades iônicas, atrai partículas dispersas na água, em um processo chamado floculação, ajudando a purificá-la, como detalhado em um estudo publicado em outubro no International Journal of Geoscience, Engineering and Technology.

A mineração do lítio amplia a liberação de elementos químicos e, portanto, os riscos de contaminação ambiental”, reforça o geólogo Edson Mello, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ele e o geólogo Cássio Silva, da Companhia de Recursos em Pesquisas Minerais (CRPM), coletaram amostras de solo, vegetais e água nos arredores das cidades de Araçuaí e Itinga em 2008 e 2009 e, em todas, identificaram teores de alumínio acima do recomendado.

Os resultados das amostras próximas à mina apresentaram valores de alumínio similares aos regionais. Em pouco mais da metade (60%) das amostras coletadas, a concentração média era de 30,7 miligramas (mg) de alumínio por quilograma (kg) no solo, quase o dobro dos 17,7 mg por kg de áreas sem exploração de lítio. Na água, a média é de 0,405 mg por litro (L), bem acima dos limites de 0,05 mg/L a 0,2 mg/L de água potável recomendados pelo Ministério da Saúde, como detalhado em um artigo publicado em agosto de 2025 na Journal of Geological Survey.

Pegmatito, rocha da qual é extraído o mineral que contém lítioLéo Ramos Chaves / Revista Pesquisa FAPESP

Silva estimou que cerca de 50 mil moradores da região estão expostos ao risco de contaminação por alumínio, cujo excesso prejudica o funcionamento dos ossos, músculos e do sistema nervoso central. Preocupado com a situação, ele enviou os resultados para as empresas e órgãos públicos de Minas Gerais. As prefeituras de Araçuaí e Itinga e a Sigma não responderam às reiteradas solicitações de entrevistas de Pesquisa FAPESP.

Outras áreas do Vale do Jequitinhonha também apresentam sinais de impacto social e ambiental. Em novembro de 2024, ao percorrer o Vale do Jequitinhonha, a socióloga brasileira Elaine Santos, do Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), em Portugal, também deu razão aos protestos dos moradores, expressos em uma reportagem da Agência Brasil, de outubro de 2025. “Nas paredes das casas, vi rachaduras que os moradores diziam ser causadas pelas explosões das mineradoras”, afirma. “Eles relatavam que, o tempo todo, havia poeira e barulhos de máquinas.”

Na província de Yichun, na China, a maior produtora mundial de lítio, além da contaminação da água, a mineração aumentou a concentração de partículas com diâmetro de até 2,5 micrômetros na atmosfera para mais que o dobro dos níveis recomendados naquele país, concluíram pesquisadores do Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG). As análises foram detalhadas em um artigo publicado em abril de 2025 na revista EixosTech.

Problemas semelhantes inquietam os habitantes no noroeste da Argentina. Nessa região, o problema é a retirada de grandes quantidades de água, reduzindo o fluxo dos aquíferos subterrâneos que abastecem os moradores, alertaram pesquisadores das universidades nacionais de Salta (UNSa) e de La Plata (UNLP) em um artigo publicado em fevereiro de 2025 na revista Heliyon. De acordo com esse trabalho, uma das minas, na província de Jujuy, consome cerca de 51 metros cúbicos (m³) de água por tonelada de carbonato de lítio. Esse volume corresponde a 30% da água doce do complexo de salinas conhecido como Salar de Olaroz-Cauchari, de onde se extrai o lítio.

O que fazer?
“Simplesmente parar de usar lítio não é uma opção”, antecipa Santos. A partir de 2011, a extração do mineral ganhou importância em todo o mundo ao ser amplamente usado em baterias que duram mais tempo e em fontes renováveis de energia. Para ela, não se deveria criar grandes empreendimentos sem investir em serviços de saúde e agentes de fiscalização: “É preciso desenvolver uma infraestrutura que possa suportar as consequências da mineração”.

Mello, da UFRJ, ressalta a necessidade de mais transparência, audiências públicas, estudos de impacto ambiental e acompanhamento da mineração. “Precisamos mostrar claramente os riscos ao ambiente e aos moradores, que raramente são ouvidos”, diz. “Os estudos geológicos prévios também precisam ser debatidos com as comunidades para que possamos ter uma mineração com o mínimo possível de impactos ambientais.”

As resoluções nº 001/1986 e nº 237/1997 do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) definem a participação popular no licenciamento ambiental de atividades de mineração como princípio fundamental e instrumento jurídico obrigatório. O artigo da EixosTech, porém, observa que a escassez de fiscais e de recursos da Agência Nacional de Mineração (ANM) dificulta a implementação dessas leis.

Em setembro de 2025, o procurador Helder Magno da Silva, do Ministério Público Federal (MPF), recomendou formalmente à ANM a suspensão e revisão de todas as autorizações de pesquisa e extração de lítio no Vale do Jequitinhonha e solicitou “uma consulta prévia, livre, informada e de boa-fé” das populações locais antes de qualquer nova concessão para exploração de lítio.

Artigos científicos


ANDRADE, G. S. et alImpactos da mineração de lítio: Análise comparativa entre Vale do Jequitinhonha e YichunEixosTech. v. 12, n. 2. abr-jun. 2025.

HERON, T. et alValuation of lithium mining waste for water treatment: An experimental study and broader implications of residual aluminum silicate (Al2SiO5) as an artificial zeolite. International Journal of Geoscience, Engineering and Technology. v. 12, n. 1. 31 out. 2025.
PAZ, W. F. D. et alThe water footprint of lithium extraction technologies: Insights from environmental impact reports in Argentina’s salt flatsHeliyon. v. 11, n. 4. 28 fev. 2025.
SILVA, C. et al. Exposure of aluminum in the Araçuaí-Itinga Lithium Pegmatite District, Minas Gerais, Brazil: Contaminant and toxicological effects on populations established nearby mining activities. Journal of Geological Survey. v. 8, n. 2. 7 mar. 2025.


Fonte:  Revista Pesquisa Fapesp

Pesquisadores encontram mercúrio em peixes da Baía de Guanabara

Estudo avalia risco à saúde de pescadores e comunidades costeiras

Os maiores níveis de contaminação foram registrados na Ilha do GovernadorUFF/Divulgação
 
Por Rafael Cardoso para Agência Brasil 

Uma pesquisa da Universidade Federal Fluminense (UFF) identificou a presença de mercúrio em peixes da Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, e avaliou os riscos à saúde de pescadores e moradores que têm o pescado como principal fonte de proteína. O estudo analisou oito espécies de peixes e amostras de cabelo de integrantes de colônias de pescadores em Magé, Itaboraí, cidades da Região Metropolitana, e na Ilha do Governador, na Zona Norte carioca.

Os pesquisadores constataram mercúrio nos peixes em concentrações que estão dentro do intervalo permitido na legislação brasileira. Mesmo assim, sugerem que o consumo tenha variação de espécies, para não incluir apenas os peixes com maiores concentrações, como o robalo. Já entre os pescadores, houve casos em que a contaminação supera o limite indicado por autoridades sanitárias, o que indica exposição maior dos trabalhadores ao metal pesado.

O trabalho é de Bruno Soares Toledo, sob orientação de Eliane Teixeira Mársico, ambos do Programa de Pós-Graduação em Higiene Veterinária e Processamento Tecnológico de Produtos de Origem Animal (PPGHIGVET-UFF).

A Baía de Guanabara sustenta milhares de famílias que dependem da pesca artesanal. Cerca de 4 mil pescadores estão vinculados à Associação de Homens e Mulheres do Mar da Baía de Guanabara (Rede Ahomar), em um território onde vivem aproximadamente 8 milhões de pessoas.

A intensificação de atividades industriais, o tráfego marítimo, o lançamento de resíduos domésticos e industriais aumentam a liberação de substâncias tóxicas no ambiente aquático

Resultados

A primeira etapa da pesquisa avaliou a presença de mercúrio total (HgT) em oito espécies de peixes de diferentes hábitos alimentares. Entre as espécies analisadas estavam sardinha, robalo, corvina e tainha.

Os limites estabelecidos pela legislação brasileira são de até um miligrama de mercúrio para cada quilograma de peixes predadores (mg/kg) e 0,5 mg/kg para não predadores.

Os resultados mostraram variações significativas entre as espécies: a sardinha apresentou valores muito baixos de mercúrio, em torno de 0,0003 mg/kg. Já o robalo teve a maior concentração, com 0,2218 mg/kg.

“A concentração detectada não é alta, mas expressa a necessidade de maior espaçamento entre as refeições. Precisa existir um intervalo maior entre o consumo”, explica o pesquisador Bruno Toledo.

“Nosso intuito não é que as pessoas deixem de consumir os peixes, mas que haja um rodízio entre as espécies. Desta forma, a possível exposição ao mercúrio será amenizada”, complementa.

Na segunda etapa, os pesquisadores analisaram amostras de cabelo humano, método reconhecido internacionalmente para identificar exposição crônica ao mercúrio. Utilizando como referência os limites indicados pela Organização das Nações Unidas (ONU), entre 1 e 2 mg/kg, o estudo encontrou valores que variaram de 0,12 mg/kg a 3,5 mg/kg entre os voluntários.

“Isso significa que tivemos voluntários com resultados acima do limite previsto, o que indica maior exposição, possivelmente relacionada ao consumo frequente de peixe”, diz Eliane Mársico.

Impactos na saúde

As amostras foram coletadas em realidades distintas dentro do mesmo estuário, com maiores concentrações na Ilha do Governador, seguidas por Magé e Itaboraí. A frequência de consumo e as espécies mais capturadas podem explicar essas diferenças.

Uma parcela dos peixes é direcionada para consumo próprio, principalmente aqueles com menor valor comercial. Os outros são comercializados, o que significa que os impactos na saúde podem se estender para além das três regiões pesquisadas.

Segundo a ONU, a inalação ou ingestão de grandes quantidades de mercúrio pode provocar consequências neurológicas sérias. Entre os sintomas, estão tremores, insônia, perda de memória, dores de cabeça, fraqueza muscular e até morte.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) reforça que dois grupos são especialmente vulneráveis: fetos cujas mães têm altos níveis de mercúrio em seu sangue e populações mais expostas a altos níveis da substância, como os pescadores de subsistência.

Benefício coletivo

A equipe de pesquisadores da UFF pretende devolver os resultados do estudo às comunidades pesquisadas. A ideia é levar as informações de forma acessível, para contribuir com a saúde coletiva.

“Os pescadores não têm conhecimento completo do problema. A percepção deles é o quanto diminuiu a oferta de peixes e outras espécies de pescado ao longo dos anos. Além disso, relataram que o tamanho dos peixes capturados está diminuindo bastante a cada período. De forma geral, eles entendem que é a poluição e acúmulo de resíduos líquidos e sólidos na baía”, diz Bruno.

“Nossa proposta é apresentar os dados em banners claros e diretos, que ficarão expostos na Associação de Pescadores, para que todas as colônias compreendam os resultados e saibam como se proteger”, complementa.

Para Eliane Mársico, a compartilhar os resultados da pesquisa é parte essencial do trabalho científico.

“Os pescadores querem saber e é necessário que tenham essa informação para que possam se prevenir, fazer um rodízio entre as espécies que consomem e evitar impactos no futuro. Nosso foco é garantir a essas comunidades a tranquilidade de se alimentar com algo que gostam e podem”, diz a pesquisadora.


Fonte: Agência Brasil

Apesar da propaganda oficial, Brasil continua sendo um dos 5 países mais desiguais do mundo

Dados do IBGE mostram que abismo da desigualdade social persiste no Brasil

Temos que ouvir quase todos os dias uma cantilena que tenta nos convencer que após a chegada do PT à chefia do executivo federal, seja com Luís Inácio ou Dilma Rousseff, o Brasil repentinamente se tornou menos desigual, e que temos de seguir nessa toada sob risco de vermos a extrema-direita desfazer todos os ganhos. 

Pois bem, o problema é que a propaganda ainda pode ser checada com dados frios da realidade. E estamos tendo uma janela de oportunidade para avaliar essa discrepância óbvia com o lançamento da última edição do chamado o Relatório da Desigualdade Global divulgado que foi lançado na semana passada pelo World Inequality Lab (WIL), grupo de pesquisadores liderado pelo economista francês Thomas Piketty.

A partir dos dados coletados globalmente, o relatório revela que os 10% mais ricos do Brasil concentram 59,1% da renda nacional, e que, enquanto isso, os 50% mais pobres ficam com apenas 9,3% da renda (ver gráfico abaixo).

Com isso, o Brasil perde em desigualdade apenas para 4 países:   África do Sul, seguido por Colômbia, México e Chile!

Além disso, se olharmos para o período entre 2003 e 2024, o que se vê é que com todas as políticas sociais executadas pelos governos liderados por Lula e Dilma Rousseff, a desigualdade permaneceu praticamente inalterada com os 10% mais ricos mantendo-se com o controle de pelo menos 60% da renda, e insisto, apesar de toda a propaganda em contrário (ver figura  abaixo).

A verdade é que os padrões históricos de concentração da riqueza não serão abalados por políticas minimalistas que não realizam as transformações sistêmicas que o Brasil precisaria ter para que houvesse um mínimo de justiça social e, mais, de distribuição da riqueza. 

Assim, sem a adoção de reformas como a da terra urbana e rural, o que teremos é a manutenção de um padrão de iniquidade profunda, mesmo com todas as riquezas existentes no território brasileiro.

Quem desejar ler o relatório na íntegra, basta clicar [Aqui! ].