Greenpeace Brasil emite nota sobre a aprovação do “Marco Temporal” na Câmara dos Deputados

marco temporal

Sobre a aprovação do PL 490 pela Câmara dos Deputados nesta terça-feira (30), que aprova a tese do Marco Temporal, o porta-voz de Amazônia do Greenpeace Brasil, Danicley de Aguiar afirma:

“A aprovação do PL 490 coroa os esforços da bancada ruralista para relativizar os direitos indígenas e forçar a abertura dos territórios tradicionais ao agronegócio e a outras atividades econômicas incapazes de conviver com a floresta; ignorando o desejo de reparação histórica aos povos originários expresso pela sociedade brasileira nos Artigos 231 e 232 da Constituição de 1988. Em pleno século 21, não podemos tolerar que um punhado de deputados comprometidos com o atraso siga trabalhando para reverter a vontade da maioria dos brasileiros. A bancada ruralista precisa entender que todo ataque aos direitos indígenas é um ataque contra a democracia.”

Cheiro de Belo Monte no ar

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Há uma grande diferença entre ambição e cobiça: a primeira pode ser uma coisa boa; a segunda, jamais. Exemplos práticos: o atual governo tem a ambição de transformar o Brasil na maior potência ambiental de fato; porém, o mesmo grupo político que hoje está no poder foi movido pela cobiça quando construiu Belo Monte. A hidrelétrica, que gera mais prejuízos que energia, está lá, desde 2016, como lição a ser aprendida – para que erro igual não seja repetido. Por isso, causa preocupação a declaração do presidente Lula de que “se explorar esse petróleo tiver problema para a Amazônia, certamente não será explorado, mas eu acho difícil, porque é a 530 km de distância da Amazônia”. Esses “mas” costumam ser prenúncio de más notícias.

O Ibama negou a autorização, porque os senões são muitos. Para começar, a região já tem cerca de 100 poços perfurados e não se encontrou nada que justificasse novas explorações – vários deles, por sinal, foram fechados por causa de acidentes. Nesse quesito particular, o Brasil tem um currículo nada invejável: foram nove desastres do tipo de 2011 a 2022, quase um por ano. Ficar a “530 km de distância da Amazônia” não é nenhuma vantagem, pois a Petrobras levaria quase dois dias para chegar ao local em caso de vazamento. Além disso, a empresa não está habituada com as correntes marítimas locais, que são bem diferentes das bacias de Campos (RJ) e Santos (SP). Mas o argumento definitivo é que se estima que a produção na região seria pelo menos três vezes menor que as das reservas marinhas do Sudeste. Não tem um cheirinho de Belo Monte no ar?

E esse odor desagradável se espalha floresta adentro. Lula se comprometeu a zerar o desmatamento no país até 2030. Mas, até lá, muito verde pode vir abaixo. Um desses projetos, asfaltar a BR-319, que liga Manaus a Porto Velho, serviria de tapete vermelho para toda sorte de malfeitor: invasores de terras protegidas, traficantes, grileiros, mineradoras e garimpeiros ilegais, milicianos, contrabandistas de madeira etc. A rodovia, que tem 885 km de extensão, pode impactar 69 terras indígenas – onde vivem 18 etnias e povos isolados –, 41 unidades de conservação e a última grande área contínua de mata virgem da Amazônia brasileira. A estrada é uma ideia de jerico da ditadura, reabilitada pelo governo anterior; isso já seria motivo de sobra para ser descartada pelo atual. 

O traçado da BR-319 já existe, mas só um pequeno trecho, em condições precárias, está aberto. O impasse recai sobre o asfaltamento do chamado “trecho do meio”, que conectaria os dois extremos da rodovia – do Amazonas a Rondônia. Ainda assim, a estrada serve de porteira aberta para criminosos em geral. Bastou Bolsonaro anunciar que ela receberia asfalto novo para que o desmatamento disparasse: o número vinha caindo desde 2001. Em 2020, foi de 216 km²; em 2021, deu um triplo-carpado para 453 km²; no ano passado, chegou a 480 km². A estrada era inviável de nascença, mais um elefante branco, como a usina no Rio Xingu: “A BR-319 não tinha nenhum raciocínio econômico. Era tudo paranoia de que a Amazônia seria tomada pela cobiça internacional”, diz o biólogo Philip M. Fearnside, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). 

Esse delírio pode impactar uma área de 39 mil km² (maior que Alemanha e Holanda juntas) e bagunçar mais os regimes de chuva naquelas regiões. Em 2021, 15% dos 10,3 km² devastados em toda Amazônia Legal aconteceram na área e a estrada sequer se presta ao transporte de cargas. “Se for asfaltada, a rodovia BR-319 irá beneficiar até mesmo quadrilhas de roubo de carros. Além disso, as estradas vicinais ilegais ao longo da rodovia estão abrigando vários tipos de atividades criminosas, como grilagem de terras, desmatamento ilegal e garimpo”, diz Lucas Ferrante, também biólogo do Inpa. Uma pesquisa de 2020, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), estima que, com o asfaltamento, as emissões de gases do efeito estufa quadruplicariam na região nos próximos 30 anos, chegando a 8 bilhões de toneladas, o quádruplo do que o país emite em um ano. 

A EF-170, vulgo Ferrogrão, também fede um bocado. A ferrovia, que ligaria Sinop (MT) ao porto de Miritituba (PA), serviria somente para escoar a soja do Centro-Oeste; no fim da linha, a produção seguiria por uma hidrovia no Rio Tapajós. Para construí-la, seria necessário tirar um naco do Parque Nacional Jamanxim, que é uma Unidade de Conservação de Proteção Integral. Em 2017, o presidente Michel Temer sancionou a Lei 13.452 exclusivamente para este fim. Calcula-se que 2 mil km² de verde sumiriam de cara. 

O pior é que a lei, que está no centro do julgamento prestes a ser realizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), pode criar jurisprudência para outras obras. E a estrada de ferro abriria caminho para outros portos, hidrovias e rodovias. Essa infraestrutura exigiria mais energia; e aí quem garante que novas hidrelétricas também não seriam construídas? Os 993 km da Ferrogrão ainda impactariam mais duas Florestas Nacionais (Flonas) e os povos Kayapó, Munduruku e Panará – que não tiveram respeitado seu direito de consulta e consentimento livre, prévio e informado. É ou não é puro suco de Belo Monte? Depois disso tudo, com que moral o Brasil se sentaria à mesa de negociação climática? Precisamos relembrar ao governo que o caminho da cobiça não rende só mau cheiro.


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Este texto foi inicialmente publicado pelo site “Uma Gota no Oceano” [Aqui!].

Gigantes do agro compram soja de fazendeiros multados por plantio em terra indígena embargada em MT

Bunge, Cargill, Cofco, Amaggi, ADM do Brasil, Viterra e General Mills adquiriram soja e milho em área em que “lavagem de grãos” é admitida por produtores e servidores públicos

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Por André Campos e Naira Hofmeister, da Repórter Brasil, e Tatiana Merlino, João Peres e Leonardo Fuhrmann, de O Joio e O Trigo 

Um esquema ilegal de escoamento de grãos em Mato Grosso, admitido publicamente por fazendeiros e reconhecido por funcionários públicos, pode ter levado soja e milho plantados sem licenciamento em terras indígenas no estado – e dentro de áreas embargadas pelo Ibama – até armazéns de algumas das maiores empresas globais de commodities.

Uma investigação conjunta da Repórter Brasil e O Joio e O Trigo revela relações comerciais entre sete gigantes do agronegócio (Bunge, Cargill, Cofco, Amaggi, ADM do Brasil, Viterra e General Mills) e fazendeiros autuados pelo Ibama por cultivarem irregularmente dentro das terras indígenas (TIs) Pareci, Utiariti e Rio Formoso, do povo Paresí.

As negociações de soja e milho ocorreram em 2018 e 2019, período em que havia embargo sobre as áreas.

Terras indígenas estão localizadas em uma região de Mato Grosso que concentra grande parte da produção de grãos brasileira (Arte: O Joio e O Trigo)

Contudo, as notas fiscais de venda dos grãos acessadas pela reportagem não identificam as fazendas dentro das TIs como a local da produção – isso inviabilizaria os negócios, já que é ilegal plantar e também comprar produção de terras embargadas. Os documentos indicam outras propriedades agrícolas como a origem dos grãos, mas todas são vizinhas (em alguns casos, coladas) à TI e pertencentes aos mesmos produtores multados pelo Ibama por levarem adiante lavouras irregulares.

É o caso de Eleonor Ogliari, que em maio de 2018 tomou uma multa de quase R$ 9 milhões por manter atividade agrícola na terra indígena Pareci e por impedir a regeneração da mata nativa em 1,6 mil hectares do território. A mesma área foi embargada pelo Ibama semanas depois, em junho de 2018, por estar semeada com milho transgênico – a legislação brasileira veda o cultivo de organismos geneticamente modificados em terras indígenas.

As coordenadas geográficas das autuações do Ibama incidem sobre uma lavoura dentro da TI que é limítrofe à Fazenda Chapada do Sol – propriedade registrada em nome de Eleonor Ogliari e separada do território dos Paresí apenas pela estrada que o margeia. Foi dessa propriedade que Bunge, Cargill e Cofco compraram milho e soja em 2018 e 2019.

Fazenda Chapada do Sol (vermelho), identificada como origem da produção comercializada, é separada de lavoura na TI Pareci (verde) apenas por uma estrada local (Foto: Reprodução)

Ao todo, a reportagem identificou cinco produtores multados pelo Ibama em 2018 por produzirem dentro das terras indígenas e que fizeram vendas durante a vigência dos embargos nas áreas para grandes tradings internacionais de grãos.

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Fontes: autos de infração Ibama, notas fiscais e Cadastro Ambiental Rural

Essa proximidade entre as fazendas que constam nas notas fiscais como a origem da produção e as terras indígenas abre espaço para a chamada “lavagem de grãos”, quando um produtor mistura produção feita em unidades de conservação, áreas griladas ou embargadas com soja e milho plantados e colhidos legalmente, mascarando a procedência da parte irregular da lavoura.

Porém, no caso dos indígenas Paresí, a lavagem de grãos foi admitida publicamente por produtores e funcionários públicos que trabalham na região, em uma série de reportagens do programa Globo Rural, veiculada em março de 2019 – quando já havia embargo sobre a área.

Em um dos vídeos, um fazendeiro “parceiro” dos indígenas nas lavouras de soja dá entrevista: “o trabalho é feito por eles e eu forneço equipamentos e insumos. O resultado é dividido entre nós, meio a meio”, explicou Sérgio Stefanello ao repórter. Ele também dá a entender que os grãos eram declarados como sendo produzidos em suas propriedades fora da TI: “a soja vai sair em meu nome [porque] o tempo da burocracia não é o mesmo tempo da planta, não dá para esperar”, justificou.

Ao Joio e O Trigo, Stefanello confirmou que declarava como sua a produção feita em território tradicional: “Foi uma questão de urgência, a agricultura não espera. Era errado, mas justificável”, acredita.

Em outra reportagem da série, um diálogo entre Carlos Márcio Vieira Barros, da Coordenação Regional da Funai em Cuiabá, e o repórter confirma o esquema para escoar a soja plantada sem licença. O servidor público admite que a manobra “não é legal”. Agora, em entrevista aos autores deste texto, Barros disse não saber avaliar se o esquema era ilegal, mas o descreveu com detalhes: “As tradings como Bunge, Cargill, ADM e Amaggi podem sofrer punições econômicas internacionais se comprarem soja dos índios, então elas não compram [diretamente]. Normalmente, os índios vendem para uma empresa local que dilui, mistura com a [soja] dos fazendeiros, digamos assim, e vai como dos fazendeiros. Os índios são invisíveis na soja”, explica. A íntegra das entrevistas pode ser lida aqui.

Área de lavoura dentro da terra indígena Utiariti, em Mato Grosso, pode estar fornecendo grãos para multinacionais do agronegócio (Foto: Fellipe Abreu/O Joio e O Trigo)

Consultadas pela reportagem, a maioria das empresas garante manter um “rígido controle” sobre a situação socioambiental de seus fornecedores. A General Mills, proprietária de marcas famosas como Yoki, Kitano e Häagen-Dazs, informou que Edson Fermino Bacchi não é mais fornecedor nem “um parceiro de negócios fixo”, “tendo apenas fornecido pontualmente ingredientes para a companhia no passado”.

A Bunge não comentou sua relação com os produtores citados, mas assegurou que seu monitoramento “é capaz de identificar mudanças no uso da terra e no plantio de soja em cada uma das fazendas de onde origina” e que calcula se o volume de soja entregue está de acordo com a capacidade produtiva de uma propriedade, o que reduz o risco de triangulação. Já a Amaggi afirmou usar “imagens de satélites e informações geoespaciais” para fazer a rastreabilidade da origem da soja, mas tampouco comentou sobre os contratos investigados nesta reportagem.

ADM e Viterra não responderam nossas tentativas de contato. Após a publicação desta reportagem, a Abiove – Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais – informou que sua manifestação representava, também, o posicionamento das duas companhias. Cargill e Cofco haviam indicado, anteriormente, que a entidade seria sua porta-voz.

Em sua nota, a Abiove garantiu que a soja produzida “em áreas embargadas por órgãos de fiscalização ambiental e sobrepostas com Terras Indígenas [entre outros] não entra na cadeia produtiva do setor”. Mas, embora faça referência  “ao potencial risco de triangulação” dos casos apontados por esta reportagem, não se pronunciou especificamente a seu respeito, limitando-se a listar medidas que “são utilizadas rotineiramente” por suas associadas para reduzir o problema. A íntegra de todas as manifestações pode ser lida aqui.

Apesar das tecnologias aplicadas pelas empresas e esforços de associações setoriais para reduzir o risco de triangulação, ainda não há uma solução que efetivamente impeça esse procedimento, já que as técnicas de verificação levam em conta a origem declarada da soja pelo produtor.

Também procuramos os fazendeiros mencionados nesta reportagem para ouvir suas considerações. Os advogados de Eleonor Ogliari e José Carlos Acco informaram que seus clientes não comentariam os fatos apurados. Além disso, fizemos inúmeras tentativas de falar com Jacs Tadeu Ventura, Rogério Acco e Edson Fermino Bachi através de telefones e e-mails que constam em cadastros públicos e advogados ligados a eles, mas não foi possível localizá-los. O espaço permanece aberto para suas manifestações.

Duas décadas de produção

Os indígenas Paresí arrendam terras para plantio de grãos em larga escala desde pelo menos 2004, mas nunca conseguiram licenciar suas lavouras – que apesar disso, seguiram produzindo. Um acordo com o governo federal chegou a ser assinado em 2013, prevendo a retirada dos fazendeiros não indígenas do território, para que os indígenas pudessem assumir a produção, mas a área de lavoura precisava ser reduzida. Só que, ao contrário do previsto pelo pacto, a área plantada subiu de 16,1 mil para 16,6 mil hectares – e os não indígenas não arredaram o pé de dentro das TIs.

Em meados de 2018, no governo Michel Temer (MDB), o Ibama multou  produtores rurais e associações indígenas por desmatamento, produção de grãos sem licenciamento ambiental e plantio de transgênicos. A lista traz nomes que coincidem com os de signatários do pacto feito em 2013.

O indígena Arnaldo Zunizakae, liderança entre os sojicultores, diz que sem licenciamento não podem vender diretamente para multinacionais (Foto: Fellipe Abreu/O Joio e O Trigo)

Em 2019, com a chegada de Jair Bolsonaro (na época, PSL, hoje, PL) ao poder, tudo mudou. Logo nos primeiros meses da gestão, os então ministros do Meio Ambiente, Ricardo Salles (hoje deputado federal pelo PL-SP), e da Agricultura, Tereza Cristina (atual senadora pelo PP-MS), participaram da festa da colheita nas terras indígenas – que já estavam embargadas na época – conforme mostrou reportagem de O Joio e O Trigo. Além deles, o governador Mauro Mendes (União Brasil), também aliado de Jair Bolsonaro, esteve no encontro. A superintendência do Ibama em Mato Grosso alertou a direção do órgão em Brasília que a área não poderia receber plantios, mas isso foi ignorado pelas autoridades que compareceram ao evento.

Em setembro de 2019, o então presidente do Ibama Eduardo Fortunato Bim, desembargou as fazendas e cancelou as multas aplicadas, em uma medida vista por servidores como canetada para acomodar interesses de Jair Bolsonaro, que estava à frente da Presidência da República na época e apresentava os Paresí como exemplo de sua política de “integração” dos povos indígenas.

Depois disso, o Ministério Público Federal capitaneou a assinatura de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), abrindo espaço para a legalização da produção agrícola nas terras indígenas Rio Formoso, Pareci, Utiariti, e também nos territórios Tirecatinga e Irantxe, na mesma região – com algumas condições: que os fazendeiros não indígenas se retirassem da área e que houvesse licenciamento ambiental pelo Ibama – o que ainda não aconteceu. 

“A gente ainda não pode comercializar esse produto de maneira legal, ainda existe uma restrição muito grande”, admite Arnaldo Zunizakae, líder dos indígenas sojicultores entrevistado em agosto de 2022 pelo O Joio e O Trigo.

Zunizakae disse que a falta de licenciamento impede exportações, mas não veta vendas domésticas. “Nossa soja é comercializada aqui [no Brasil]. Essas empresas não podem exportar, se embarcar em um navio, a Bunge vai ter problema, a Amaggi vai ter problema, a Cargill vai ter problema. Eles sabem que eles vão ser punidos severamente por estar comprando soja de terra indígena. É mais uma política trabalhada para impedir que o indígena possa desenvolver agricultura nas suas terras. Infelizmente”, critica.

Já Ronaldo Zokezomaiake, um ex-presidente da cooperativa Copihanama, criada em 2018 e responsável pelo plantio de soja dentro dos territórios, diz que mesmo as vendas internacionais estão acontecendo – apesar da falta de licenciamento do Ibama. “Por enquanto, nós ainda estamos usando algumas empresas para fazer essa ponte [comercial]. O que nós produzimos aqui, entregamos para as empresas que nos financiam e daí elas dão continuidade, mandam para fora, para exportação. Agora, quando tivermos esse licenciamento, nós mesmos podemos fazer diretamente essa comercialização”, explica.

Por meio da Lei de Acesso à Informação, a reportagem perguntou ao Ibama se foi feita fiscalização na área após o embargo, incluindo o monitoramento do destino da produção, mas a autoridade ambiental informou que nada constava em sua base de dados. Tampouco houve sucesso nas tentativas de contato com a assessoria de imprensa. O espaço permanece aberto.

Atualização: Esta reportagem foi atualizada em 29/05/2023, às 14:30, para incluir a informação, enviada pela Abiove após a publicação, de que sua manifestação representava, também, o posicionamento de ADM e Viterra.


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Este texto foi originalmente publicado pela “Repórter Brasil” [Aqui!].

Os intrigantes recifes da foz do Amazonas

Ambiente ainda pouco conhecido faz parte de região potencialmente rica em petróleo

RPF-foz-do-amazonas-2023-03-site-02-1140Peixes jaguareçá (Holocentrus adscensionis) e fura-vasos (Heteropriacanthus cruentatus) sobre recife de origem biológica, a 95 metros de profundidade.  Greenpeace / Ronaldo Francini Filho

Por Gilberto Stam para a Pesquisa FAPESP

Em agosto ocorrerá mais uma expedição científica aos recifes da foz do rio Amazonas, um ambiente ainda não completamente reconhecido, permeado de incertezas e até recentemente visto como improvável. O biólogo Ronaldo Francini-Filho, da Universidade de São Paulo (USP), será um dos pesquisadores que participarão da exploração, a terceira que ele faz desde 2015 em busca de respostas mais precisas sobre aquela região.

Descobertos na década de 1970 por meio de amostras esparsas, que não chamaram muito a atenção, os recifes da foz do rio Amazonas estão na borda da plataforma continental, entre 70 e 220 metros (m) de profundidade, em média, e são formados por trechos de algas calcárias, corais pretos ou vermelhos, campos de esponjas naturais, areais cobertos por algas verdes e estruturas calcárias que podem chegar a 20 m de altura. Os recifes se estendem por 1.350 quilômetros (km), desde o estado do Amapá até a região central do estado do Maranhão, entre 150 e 200 km da costa.

Em 2014, biólogos, oceanógrafos e geólogos se surpreenderam ao retirar do mar, com dragas, pedaços de esponjas, algas calcárias, corais e peixes, porque, teoricamente, esses organismos não deveriam estar lá. Como detalhado em um artigo publicado em abril de 2016 na Science Advances, a água turva dos rios de regiões tropicais como o Amazonas dificulta a passagem de luz e forma um assoalho lodoso, supostamente inadequado para esses organismos. Além disso, a forte corrente de maré somada à descarga do Amazonas, que a cada segundo despeja no mar cerca de 200 mil metros cúbicos (m3) de água barrenta – o suficiente para encher a baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, em duas horas e meia –, deveria tornar o crescimento de recifes inviável.

Desde 2016, foram feitas algumas viagens científicas exploratórias à foz, que recebe as águas não só do leito principal do rio, mas também de afluentes, por ali chamados de igarapés, banhando extensos manguezais. Os resultados das explorações são, às vezes, divergentes, a começar pela própria definição do ambiente como um recife.

“As estruturas recifais ao norte da foz do rio Amazonas são formadas por rochas, sobre as quais cresceu uma fina camada de seres vivos”, diz o geólogo Alex Bastos, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), um dos autores de um artigo publicado em maio de 2022 na revista Marine Geology; no título do trabalho, recife está entre aspas. “Segundo algumas definições, um recife deve ter origem biológica”, justifica.

Peixe jaguareçá (Holocentrus adscensionis) e lagosta (Panulirus argus) sobre fundo de rodolitos e areia, a 102 metros de profundidade, na foz do AmazonasGreenpeace/Ronaldo Francini Filho

O geólogo Alberto Figueiredo, da Universidade Federal Fluminense (UFF), da equipe de pesquisadores que escreveram um artigo em agosto de 2022 em formato preprint no site Research Square (no título, recife também está entre aspas), diz que a importância atribuída à região por alguns pesquisadores e organizações é exagerada. “O recife da bacia sedimentar da foz do Amazonas não é contínuo e é formado principalmente por lajes calcárias construídas por algas”, observa. Segundo ele, as lajes carbonáticas não são exclusivas da bacia da foz do Amazonas, mas se estendem ao logo da borda da plataforma continental, do Amapá até Santa Catarina.

Figueiredo afirma: “A maior parte dos organismos que viviam sobre essas lajes está morta, com idades entre 15 e 20 mil anos”. Diferentemente, um estudo coordenado pelo geólogo Michel Mahiques, da USP, publicado em setembro de 2019 na Scientific Reports, mostrou que os recifes estão vivos e em crescimento.

A espessura da camada de organismos vivos sobre as rochas pode não ser um bom critério para avaliar a importância dos recifes, defende o oceanógrafo Thomás Banha, do Centro de Biologia Marinha (CEBIMar) da USP e primeiro autor de um artigo de opinião publicado na revista Frontiers in Marine Science em dezembro de 2022, em que vai na direção contrária à de Figueiredo ao defender a importância ecológica do recife. Segundo ele, essa cobertura pode variar de milímetros nas colônias de corais a mais de 1 metro nas de esponjas.

Recife da foz do Amazonas habitado por peixe-borboleta (Chaetodon sedentarius), caranguejo-aranha (Stenorhynchus seticornis) e camarão-limpador (Lysmata grabhami), a 97 metros de profundidadeGreenpeace/Ronaldo Francini Filho

“Os recifes da foz do rio Amazonas são parecidos com outros de regiões mais profundas da plataforma continental”, lembra Banha. Ali, segundo ele, vivem espécies importantes para a pesca, como o pargo (Lutjanus purpureus), entre outros 90 tipos de peixes que dependem dos recifes para alimentação e abrigo.

Em 2017, a organização não governamental Greenpeace lançou uma campanha em defesa da preservação dos recifes do rio Amazonas. Além de divulgar fotos da região, forneceu um navio de pesquisa e um submarino para um grupo de pesquisadores de quatro universidades brasileiras, inclusive Francini-Filho e o oceanógrafo Nils Edvin Asp Neto, da Universidade Federal do Pará (UFPA). A equipe publicou um artigo com os resultados da expedição na revista científica Frontiers in Marine Science em 2018.

A área precisa ocupada pelos recifes da foz do Amazonas não está definida. Em maio de 2016 na revista Science Advances, pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da USP lançaram uma primeira estimativa: cerca de 9,5 mil km2, pouco menos do que a cidade de Manaus. Em 2018, outro grupo, com especialistas da Paraíba, Rio de Janeiro e São Paulo, sugere na revista Frontiers in Marine Science uma área potencialmente seis vezes maior, com até 56 mil km2. “Não conhecemos as conexões entre as áreas visitadas, que levaram às diferentes estimativas sobre a região dos recifes”, afirma Bastos.

Sua importância biológica apenas começa a ser vislumbrada: os recifes da foz do Amazonas poderiam servir como um trampolim ecológico entre o mar do Caribe e o do Brasil. A maioria das espécies vive apenas em um desses locais e não consegue atravessar a pluma – a região rica em sedimentos onde deságua o rio Amazonas –, mas algumas vivem nos dois lados. “É possível que essas espécies tenham atravessado a pluma usando os recifes como corredor”, comenta Banha. É o caso do peixe-leão (Pterois volitans), espécie nativa dos mares da Ásia que chegou à Flórida, nos Estados Unidos, e depois na costa brasileira – já foi visto no litoral do Ceará, do Rio Grande do Norte e de Pernambuco.

Riqueza biológica e mineral

A região chamou a atenção também de empresas petrolíferas, por causa das supostas reservas de óleo e gás, à semelhança das reservas descobertas nas vizinhas Guiana Francesa, Suriname e Guiana. Desde o fim de 2022, a Petrobras mantém um navio-sonda no litoral do Amapá e poderá começar em breve a fazer perfurações para verificar a qualidade do óleo e a viabilidade de sua exploração.

Esponjas (Verongula gigantea) sobre plataforma calcária, a 102 metros de profundidadeGreenpeace/Ronaldo Francini Filho

Se de fato vier a ser instalado na região um polo petrolífero, há risco de eventuais vazamentos de óleo. Seus impactos sobre o recife, todavia, ainda são incertos. Para o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a maior preocupação é saber para onde o óleo que vazasse poderia ser levado e como a empresa exploradora poderia detê-lo.

A Petrobras procurou pesquisadores de universidades brasileiras para trabalhar com suas equipes nas respostas desejadas pelos órgãos ambientais. Um deles foi Nils Asp, da UFPA.

“Participei de três reuniões com a empresa entre 2021 e 2022, mas depois não me chamaram mais”, conta. Asp criticou o modelo numérico em hidrodinâmica usado pela BP, sócia da Petrobras nesse empreendimento, sobre o percurso do óleo que eventualmente escapasse dos poços. Segundo ele, os cálculos previam que a forte corrente marinha do norte do Brasil levaria o óleo para o norte, rumo ao Caribe, sem tocar a costa do Amapá, ainda que criando problemas para países vizinhos.

Para Asp, essa abordagem dá pouca importância à complexidade geográfica da costa, especialmente à do Amapá, recortada por rios repletos de lagos, várzeas e manguezais. Empurrado pela maré alta, o óleo poderia invadir áreas onde vivem comunidades de pesca artesanal.

A dispersão do óleo depende também do vento que sopra do mar em direção à costa. A força é tanta que, em 2004, empurrou para o manguezal do Parque Nacional do Cabo Orange, no município de Oiapoque, no Amapá, um foguete lançado na Guiana Francesa que havia caído no mar dias antes.

Segundo Asp, a modelagem não menciona possíveis riscos ambientais aos recifes da foz do rio Amazonas. Esse ambiente se estende para além da fronteira com a Guiana Francesa e fica a apenas algumas dezenas de quilômetros do chamado bloco 59, área adquirida pela Petrobras para exploração.

Ouriços sobre banco de rodolitos, a 91 metros de profundidadeGreenpeace/Ronaldo Francini Filho

Em nota enviada a Pesquisa FAPESP, a Petrobras afirma que os recifes não estão em risco: “Na área das perfurações, em profundidade maior do que 2 mil m, não há indicação da presença de bancos de corais, algas calcárias, esponjas e outros organismos presentes em formações biogênicas no fundo”.

De acordo com o comunicado, a empresa realizou um levantamento do assoalho da região onde o poço poderia ser perfurado para se certificar de que não há recifes. “As chances de um incidente desse tipo são diminutas e a Petrobras está entre as empresas de referência no setor nas medidas de precaução, sempre tentando conter riscos”, diz a nota.

Francini-Filho não está convencido de que os recifes estejam livres de riscos. Segundo ele, a única forma de barrar o óleo que flutua em direção à costa é usar um dispersante, substância que o transforma em gotículas. Mas esse composto químico faria as gotículas afundarem e chegarem aos recifes.

Área de preservação

Desde 2007, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, estuda a implantação de uma unidade de conservação na plataforma continental do Pará, inicialmente para proteger a reprodução de camarões. A partir de 2016, as publicações científicas motivaram a extensão da proteção aos recifes, prevendo uma área de 25 mil km2, entre a costa norte e sul do Amapá.

“Dependendo do tipo de área protegida a ser criada, a exploração de petróleo deverá ser restrita ou excluída, a partir da análise das instâncias governamentais e de acordo com a participação da sociedade”, comenta o oceanógrafo Rafael Magris, do ICMBio.

A Petrobras informa em seu comunicado que “pretende empregar todo o conhecimento operacional e as tecnologias necessárias para a preservação e manutenção das características físicas e biológicas do ambiente”. Decidir o futuro da região será um dos próximos desafios da nova equipe do Ministério do Meio Ambiente.

Projeto
Ecologia e conservação do Grande Sistema Recifal da Foz do Amazonas (no 22/10690-3); Modalidade Bolsa de Doutorado; Pesquisador responsável Ronaldo Bastos Francini Filho (USP); Bolsista Thomás Nei Soto Banha; Investimento R$ 173.283,84.

Artigos científicos

BANHA, T. N. S. et alThe Great Amazon Reef System: A fact. Frontiers in Marine Science. v. 9, n. 8. dez. 2022.
FRANCINI FILHO, R. B. et alPerspectives on the Great Amazon Reef: Extension, biodiversity, and threats. Frontiers in Marine Science. v. 5, n. 142. 23 abr. 2018.
MAHIQUES, M. M. et alInsights on the evolution of the living Great Amazon Reef System, equatorial west Atlantic. Scientific Reports. v. 9, 13699. 23 set. 2019.
MOURA, R. L. et al. An extensive reef system at the Amazon river mouthScience Advances. v. 2, n. 4. 22 abr. 2016.
SANTOS FILHO, J. R. et alResizing the extension of the mesophotic “reefs” in the Brazilian equatorial margin using bioclastic facies and seabed morphologyResearch Square. Preprint. 12 ago. 2022.
VALE, N. F. Distribution, morphology and composition of mesophotic “reefs”on the Amazon Continental MarginMarine Geology.v. 447, n. 106779. mai. 2022.


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Este texto foi inicialmente publicado pela Pesquisa FAPESP [Aqui! ].

UOL mostra que a UERJ indicou a raposa para inspecionar irregularidades cometidas em seu galinheiro

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Em mais uma reportagem assinada pela dupla Igor Mello e Ruben Berta, o portal UOL mostra que, sob pressão da sequência de revelações sobre situações “esquisitas” cercando o uso de dinheiro público em um conjunto de “projetos especiais”, a reitoria da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) indicou dois de seus procuradores para compor duas comissões de sindicância para apurar as denúncias feitas na série de reportagens do UOL sobre as folhas de pagamento secretas da universidade.

O problema é que, como revela essa nova reportagem, dois dos membros dessas comissões constam nas folhas de pagamento secretas dos projetos suspeitos dos quais deverão apurar eventuais irregularidades. Em outras palavras, a reitoria da UERJ cometeu o erro grave de colocar potenciais investigados para investigar. Em outras palavras, a reitoria da UERJ colocou a raposa (no caso duas) para tentar encontrar o que está de errado em seu galinheiro.

Um dos problemas cruciais desta situação vexaminosa não é nem mais o fato de que milhões de reais foram entregues a cabos eleitorais em pleno período eleitoral sob o véu de projetos executados por uma instituição pública de ensino superior. É que esta parte não cabe mais negação após o primoroso trabalho jornalístico realziado pela dupla Mello e Berto.  O maior vexame, ao menos neste momento, é ver que a reitoria da UERJ ainda não entendeu a péssima repercussão dos fatos junto à população. 

Só isso explica esse comportamento bizarro de não verificar se os membros de comissões de sindicância teriam sido beneficiários dos esquemas que deverão investigar.  Esse comportamento não apenas compromete a credibilidade das comissões de sindicância, mas também aprofunda a percepção de que a reitoria da UERJ está tentando impedir que sejam feitas as devidas apurações dos fatos. Aliás, ao anunciar que vai retirar as “raposas” da investigação do que ocorreu de errado em seu galinheiro, a reitoria da UERJ só fez aumentar o tamanho já colossal do vexame.

Há que se lembrar que, enquanto o dinheiro jorrava fácil nos tais “projetos especiais”, as estruturas formais da UERJ continuavam sobrecarregadas e subfinanciadas, o que só aumenta o tamanho do escândalo em torno dos pagamentos feitos dentro das folhas secretas de pagamento.

Enquanto isso, os membros beneficiários do esquema revelado por Igor Mello e Ruben Berta, que são o governador Claúdio Castro e deputados (estaduais e federais) continuam literalmente incólumes, enquanto a imagem da UERJ chafurda na lama.

Marina Silva está sendo frita, e os próximos dias vão indicar a altura do fogo

marina frita

Se alguém ainda tinha dúvida que os cardeais do governo Lula já decidiram que não é possível conviver com as ideias pragmáticas de Marina Silva, as declarações do agora (de novo) petista Randolfe Rodrigues não deixam mais espaço para isso. É que, como em muitos outros governos, em meio aos muitos sinais de fritura de Marina Silva, Randolfe em uma entrevista ao portal UOL, disse  o justamente contrário. 

randolfe fritura

Como já vimos esse tipo de fritura em fogo brando em outros governos do PT, incluindo a que a própria Marina foi submetida em 2008 quando ela teve vários entreveros com Dilma Rousseff por causa de várias ações anti-ambientais que emanavam diretamente de dentro da Casa Civil.

O curioso é que agora está levando bem menos tempo para que Marina Silva seja frit , apesar de ter posições bastante moderadas sobre a necessidade de impor mais restrições ao modelo de destruição da Amazônia brasileira em troca de umas poucas moedas. Mas tudo indica é que o governo Lula, ao iniciar a fritura pública de Marina Silva, vai abraçar de vez o programa que Jair Bolsonaro implementou em seus quatro anos governo.

Assim, agora que está claro que Marina Silva está sendo frita, o tempo de fritura dependerá da altura do fogo a que será submetida pelos seus desafetos dentro do próprio governo Lula, a começar por Randolfe Rodrigues.

A maioria das compensações de carbono da Chevron são no minimo”inúteis” ou pior, diz relatório

E o plano “net-zero” da gigante do petróleo ignora aproximadamente 90% de suas emissões finais

Vladimir Sindeyeve/NurPhoto/AP

Esta história foi originalmente publicada pelo  The Guardian  e é reproduzida aqui como parte da  colaboração Climate Desk.

Por Nina Lakhani 

Uma nova investigação sobre a promessa climática da Chevron descobriu que a empresa de combustíveis fósseis depende de compensações de carbono “lixo” e tecnologias “inviáveis”, que fazem pouco para compensar suas vastas emissões de gases de efeito estufa e, em alguns casos, podem realmente estar causando danos às comunidades.

A Chevron, que registrou US$ 35,5 bilhões em lucros no ano passado, é a segunda maior empresa de combustíveis fósseis dos EUA, com operações que se estendem do Canadá e Brasil ao Reino Unido, Nigéria e Austrália.

Apesar das grandes expansões nos cinco continentes, a Chevron disse que “aspira” a atingir zero emissões líquidas de upstream até 2050. tecnologias de captura e armazenamento (CCS).

Uma nova pesquisa da Corporate Accountability , uma organização transnacional sem fins lucrativos de vigilância corporativa, descobriu que 93% das compensações que a Chevron comprou e contou para suas metas climáticas de mercados voluntários de carbono entre 2020 e 2022 eram ambientalmente problemáticas demais para serem classificadas como algo que não fosse inútil ou lixo. .

Uma compensação de carbono é caracterizada como tendo baixa integridade ambiental, ou sem valor, se estiver vinculada a uma floresta ou plantação ou projeto de energia verde, incluindo os que envolvem hidrelétricas, que não leva a reduções adicionais de gases de efeito estufa, exagera benefícios ou riscos emissões, entre outras medidas. Muitas das compras de compensação da Chevron concentram-se em florestas, plantações ou grandes barragens.

De acordo com o relatório compartilhado exclusivamente com o Guardian , quase metade das compensações “inúteis” da Chevron também estão ligadas a supostos danos sociais e ambientais – principalmente em comunidades no sul global, que também são frequentemente as mais afetadas pela crise climática.

“A agenda de ações climáticas inúteis da Chevron é destrutiva e imprudente, especialmente à luz da ciência climática que ressalta que o único caminho viável a seguir é uma eliminação gradual e equitativa dos combustíveis fósseis”, disse Rachel Rose Jackson, da Corporate Accountability.

O relatório, A destruição está no centro de tudo o que fazemos, ocorre em meio a uma semana de protestos globais de comunidades afetadas pelos negócios de petróleo e gás da Chevron, enquanto a empresa sediada na Califórnia se prepara para sua reunião anual de acionistas em 31 de maio.

No domingo, em Richmond, uma cidade de maioria negra e parda com 115.000 habitantes, a nordeste de San Francisco, ativistas se reuniram em frente à extensa refinaria de petróleo da Chevron. Em 2012, 15 mil pessoas precisaram de atendimento médico após um grande incêndio causado por  negligência criminosa da empresa. As taxas de asma são muito mais altas em Richmond do que as médias estadual e nacional.

O relatório argumenta que o uso generalizado de compensações sem valor prejudica severamente a ambição de ação climática da Chevron, que em qualquer caso é limitada a uma pequena fração de seus negóciosA aspiração de zero líquido da Chevron   se aplica apenas a menos de 10 por cento da pegada de carbono da empresa – as emissões a montante da produção e transporte de petróleo e gás, excluindo as emissões a jusante ou de uso final da queima de combustíveis fósseis para aquecer casas, fábricas de energia e dirigir carros.

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Este texto foi retirado do site “Mother Jones” [Aqui!].

Ambientes faz chamada para contribuições ao dossiê “Povos indígenas e território”

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O Volume 5, Número 2 de AMBIENTES terá um Dossiê sobre “Povos indígenas e território”.

A publicação está prevista para dezembro de 2023.

As submissões devem ocorrer até 10 de setembro de 2023.

Dossiê sobre “Povos indígenas e território”

A questão indígena vem ganhando notoriedade em escala mundial na articulação entre luta pelos territórios ancestrais e enfrentamento das crises ambiental e civilizatória de nosso tempo. Não é mais possível falarmos de alterações climáticas, eventos extremos, proteção de corpos hídricos e preservação da geobiodiversidade sem mencionar o fundamental papel que os povos originários desempenham. A Ecologia Política, desde sua constituição enquanto campo acadêmico-político, demonstra significativo diálogo de saberes entre os científico-acadêmicos e os ancestrais, notadamente aqueles oriundos das matrizes de racionalidade indígenas. A Geografia Ambiental, por sua vez, encontra no estudo (e nas propostas de ação advindas da pesquisa) dos povos indígenas e de seus territórios frutífera interface para a constituição de objetos híbridos.

Ambientes, através do dossiê Povos Indígenas e Território, convida para a reflexão sobre os povos originários através de seus territórios e ambientes, o sentido de ancestralidade territorial e a indissociabilidade sociedade-natureza, as diversas ameaças e ofensivas que os territórios indígenas vêm sofrendo por parte do Estado e dos agentes do capital, e as resistências (e proposições de existência) nos processos de luta. Chamamos para o debate a respeito de experiências em Pindorama / Brasil ou em outros espaços de Abya Yala / América, das potencialidades e limites de áreas protegidas como Reservas Extrativistas, Florestas Nacionais e Terras Indígenas, de práticas espaciais indígenas como autodemarcações, retomadas, acampamentos e construção de redes transnacionais, das intersecções entre classe, raça e gênero (racismo ambiental, feminismos indígenas…), da cosmologia e dos encantados dando sentido e corpo à relação humana com a natureza não-humana, entre vários outros assuntos sobre povos indígenas e território.

Além de artigos científicos, serão muito bem-vindos resenhas, entrevistas e relatos de luta.

Para maiores informações sobre como enviar submissões para a  Ambientes, basta clicar [Aqui!].

Ogronegócio: Marina Silva usa audiência para tirar a máscara de modernidade do latifúndio agro-exportador

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A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, prestou um grande serviço para o Brasil ao usar ao utilizar a expressão “ogronegócio” para explicar as recentes decisões anti-ambientais tomadas pelo congresso nacional sob impulso da chamada bancada ruralista, também conhecida como Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).  Ainda que não tenha não tenha cunhado o termo, ela nos brindou com o uso dessa definição perfeita do latifúndio agro-exportador em uma audiência pública da Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados no último dia 24/5.

Ainda que Marina Silva tenha tentado contemporarizar ao afirmar que só uma parte do latifúndio agro-exportador age como “ogronegócio”, a verdade é que raros são raros os exemplos de grandes produtores rurais que adotam práticas sustentáveis. A imensa maioria gosta mesmo é desmatamento e agrotóxicos em suas propriedades, onde frequentemente ainda se encontra a prática hedionda do trabalho escravo. Por isso, não há nada disso de “agro”, pois o negócio desse pessoal é mesmo o “ogronegócio”.

E ainda há que se enfatizar que o “ogronegócio”  não sobreviveria sem os polpudos subsídios governamentais que chegam todos os anos para alimentar uma pauta de exportação que acaba servindo como ração animal em outras partes do mundo. Produzir alimentos mesmo é com a agricultura familiar que nem uso os mesmos métdos, nem, tampouco, recebe os bilhões de reais em subsídios que são dados anualmente para o “ogronegócio” continuar sua forma desastrosa de agricultura.

Trabalho escravo: 25 trabalhadores são resgatados em fazenda de café na região de Encruzilhada (BA)

DPU atuou na operação junto com auditores fiscais do MTE e membros do MPT, SJDH, PF e PM-BA

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O Grupo Especial de combate ao trabalho escravo resgatou, essa semana, 25 trabalhadores rurais em condições análogas à escravidão na colheita em uma fazenda de café, no município de Encruzilhada, na Bahia. A equipe da operação foi formada pela Defensoria Pública da União (DPU), auditores fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), representantes do Ministério Público do Trabalho (MPT), da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do Estado (SJDH), da Polícia Federal (PF) e da Polícia Militar da Bahia.

Informalidade e condições desumanas

As irregularidades começaram a ser identificadas na segunda-feira (22). Os trabalhadores, vindos de diversos municípios do interior do Estado, foram encontrados em situação de informalidade, sem registro trabalhista. Os safristas, como são chamados, também não foram submetidos a exame admissional.

Segundo os relatos, os pagamentos seriam feitos apenas no final do trabalho. Além disso, várias carteiras de trabalho foram retidas pelo responsável, motivo que os impediu de irem embora.

Na colheita, os trabalhadores atuavam sem equipamentos de segurança e vestimentas adequadas à função, muitos deles descalços ou com apenas sandálias. Na área, não havia instalações sanitárias, nem espaço para refeições. Devido às condições climáticas da região –fria e úmida – e ao vestuário inadequado, pelo menos três deles apresentavam sintomas de doenças e foram encaminhados, após o resgate, a unidades de saúde do município.

De acordo com a equipe, as necessidades fisiológicas dos empregados eram feitas ao ar livre e a água que bebiam era transportada em vasilhames de água sanitária reutilizadas.

A situação dos alojamentos fornecidos pelo empregador também estava precária. Banheiros em péssimo estado de funcionamento e com poucos chuveiros, o que levava ao compartilhamento do ambiente entre homens e mulheres. Alguns trabalhadores cozinhavam dentro de pequenos quartos, o que expunha o grupo ao risco de incêndio e intoxicação com gás. Crianças e adolescentes também foram encontradas residindo nos alojamentos.

Estima-se que, inicialmente, o grupo contava com cerca de 40 trabalhadores, que havia chegado ao estabelecimento há pouco mais de um mês. No momento da fiscalização, no entanto, apenas 25 estavam no local; os outros já haviam ido embora por conta das péssimas condições.

A equipe também apurou que um estabelecimento em localidade próxima dava “crédito” aos trabalhadores a preços muito superiores aos praticados no mercado. “Há um mercadinho próximo à fazenda que praticava preços abusivos. 1kg de café custava 50 reais. Eles eram obrigados a comprar no mercadinho e, praticamente todo o dinheiro que recebiam, era gasto lá”, afirmou a defensora federal Izabela Vieira Luz.

A defensora também pontuou que não havia horário de almoço. Os trabalhadores faziam pequenas pausas, às vezes de 10 minutos, para colherem a maior quantidade de grãos possível. “O horário de trabalho não era de acordo com a lei. Eles entravam 6h da manhã e saíam 17h. Muitos trabalhavam de sábado e domingo sem hora para terminar”, afirmou.

Interdição e Reparação

Constatada a situação de falta de registro e degradância das condições de trabalho e alojamento, retenção de documentos e não pagamento de salários, foi determinada a interdição das frentes de serviço e alojamentos pelos auditores fiscais, com a paralisação imediata das atividades e a retirada dos trabalhadores do local. O representante da empresa foi notificado para prestar esclarecimentos sobre a situação.

Com a interdição, as pessoas ficaram alojadas provisoriamente em uma escola municipal, onde receberam alimentação adequada e acompanhamento do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas). O amparo, intermediado por membros da SJDH e da Secretaria de Assistência Social do município, que forneceu alojamento provisório, refeições e instalações para reuniões da força-tarefa, foi fornecido até que os auditores fiscais providenciassem o cálculo das parcelas rescisórias dos contratos de trabalho e a DPU e MPT elaborassem o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).

Na quarta-feira (24), o proprietário da fazenda compareceu à audiência e reconheceu a situação inadequada, prontificando-se a fazer os pagamentos das parcelas rescisórias a que os contratados tinham direito, além de providenciar o retorno deles às cidades de origem, etapa que será monitorada pela SJDH. No total, foram pagos aproximadamente 100 mil reais. Eles ainda serão encaminhados para receber as parcelas do seguro-desemprego como trabalhadores resgatados.

A ação fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego prosseguirá com a lavratura dos Autos de Infração diante das irregularidades constatadas e a possível inserção das empresas responsáveis pela situação na Lista Suja do Ministério do Trabalho, divulgada periodicamente. Além disso, haverá o pedido de indenização por dano moral por parte do Ministério Público do Trabalho, sem prejuízo da repercussão criminal, que ficará a cargo da Polícia Federal, uma vez que a prática de reduzir trabalhadores a condição análoga à escravidão é crime previsto no artigo 149 do Código Penal brasileiro, com pena de reclusão de dois a oito anos.

Além da defensora federal, integraram a operação a procuradora Manuella Gedeon, os auditores fiscais do MTE, Liane Durão e Mário Diniz; o coordenador de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas e Combate ao Trabalho Escravo da SJDHDS, Admar Fontes Júnior, e membros da Polícia Militar e Federal.