Escândalo das verbas secretas do governo do Rio de Janeiro chega ao procurador e chefe do gabinete do reitor da UERJ

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O Portal UOL publicou nesta 4a. feira mais uma reportagem assinada pelos jornalistas Igor Mello e Ruben Berta sobre o emprego das chamadas verbas secretas enviadas pelo governador Cláudio Castro para execução de projetos “especiais” pela Fundação Ceperj e pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Desta vez o foco da reportagem está no próprio gabinete do reitor Mário Sérgio Alves Carneiro, pois envolve o chefe daquela repartição, o procurador Bruno Garcia Redondo.

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Segundo apontam Mello e Berta, “a esposa, a sogra, o cunhado, ex-sócios e até um ex-personal trainer do procurador da Uerj Bruno Garcia Redondo aparecem em uma lista de 18 pessoas que receberam, em pouco mais de um ano, R$ 5 milhões em verbas públicas para bolsas de pesquisa sob suspeita”. Ainda segundo a reportagem, “os pagamentos estão registrados nas chamadas folhas secretas da Uerj, reveladas pelo UOL em 2022”.  É importante lembrar que parte desses dados só se tornou pública após o Tribunal de Contas do Estado (TCE) ter solicitado as folhas de pagamento à Uerj.

Curiosamente, além de ser chefe de gabinete do reitor da Uerj, Bruno Garcia Redondo ainda teve tempo para ser, segundo a reportagem, atuar como coordenador em dois desses projetos, tendo recebido R$ 375,5 mil brutos, entre junho de 2021 e agosto de 2022, para complementar o salário mensal de mais de R$ 20 mil que recebe como procurador da instituição. Mas, além disso, a esposa do procurador, a também advogada Fernanda de Paula Fernandes de Oliveira, recebeu outros R$ 180 mil brutos em um desses projetos, mesmo sendo funcionária comissionada da Secretaria Estadual de Agricultura, onde se encontrava nomeada para um projeto de inovação em escolas públicas.

Agora que Mello e Berta tiraram, digamos, o gato de dentro do saco, vamos como se darão as apurações dos fatos que são mostrados nesta reportagem por parte dos órgãos fiscalizadores. Mas nunca é demais lembrar que a própria criação da Procuradoria da Uerj em 2020 foi motivo de questionamentos, mas a sua criação foi apresentada como uma forma de ajustar a carreira dos advogados da Uerj “às demais carreiras jurídicas” do estado do Rio de Janeiro. 

Outra matéria também assinada por Igor Mello e Ruben Berta, traz as respostas de alguns dos beneficiados pela concessão de bolsas nos projetos especiais da Uerj, a começar pelo próprio Bruno Redondo e sua esposa Fernanda de Paula Fernandes de Oliveira. A reportagem intitulada “Cabide da Uerj: Bolsistas ligados a procurador negam irregularidades” traz explicações das mais diversas para fatos bem difíceis de serem explicados.

Um detalhe a mais é que houve uma tentativa de também criar uma procuradoria na Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf), mas a proposta acabou sendo barrada pelo Conselho Universitário (Consuni) da instituição sediada em Campos dos Goytacazes. Com esse escândalo envolvendo o procurador e chefe de gabinete Bruno Redondo, quem reclamou da decisão tomada pelo Consuni da Uenf pode agora estar respirando aliviado. 

Sob comando de Wladimir Garotinho, Prefeitura de Campos quer instalar lixódromo em área experimental do Colégio Agrícola Antonio Sarlo

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Como se a situação das áreas experimentais existentes no espaço do Colégio Agrícola Antonio Sarlo (CAAS) (hoje anexado à Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf)) já não fosse desafiadora o suficiente para professores, servidores e estudantes que ali realizam suas atividades diárias; agora a Prefeitura Municipal de Campos dos Goytacazes resolveu acrescentar uma nova camada de dificuldade ao pretender instalar um lixódromo em uma área adjacente a pontos de realização de pesquisas e aulas.

O Blog do Pedlowski teve acesso ao MODELO DE CONTRATO DE COMODATO – PEV ALDEIA” que foi apresentado pela Prefeitura Municipal de Campos dos Goytacazes, via a Secretaria Municipal de Serviços Públicos, para ocupar e usar gratuitamente uma área de 1,6 hectares pelo prazo de dois anos para usar como depósito de entulhos.

Se não bastasse a proposta de criar mais um desses espaços horrorosos onde todo tipo de entulho é jogado ao relento, o fato de se querer usar um espaço destinado à realização de ensino, pesquisa e extensão beira os raios da irresponsabilidade e do desvio de finalidade.

Com certeza transformar uma área de 1.600 metros quadrados em depósito de lixo (que é do que se trata esse comodato) estava nos planos de quem transferiu o CAAS para ser cuidado pela Uenf em 2018. Aliás, de lá para cá, pouco ou nada se fez para cumprir as promessas feitas para justificar a referida transferência. Mas daí se concordar em transformar parte do terreno em um lixão, já é demais. Com a palavra o reitor da Uenf!

Peixes com “níveis mais altos de herbicidas no mundo” são encontrados em bacia dominada por monoculturas de soja na Argentina

sabalo-Parana-996x567Curimbatás (Prochilodus lineatus) são altamente consumidos em toda a bacia do Paraná. Crédito da imagem: Jonas Techy Potrich/Wikimedia Commons, sob licença Creative Commons (CC BY-SA 3.0)

Os peixes do Río Salado, afluente do Paraná (o maior rio sul-americano depois do Amazonas), mostrarão restos de novos inseticidas, herbicidas e fungicidas aplicados em cultivos transgênicos de soja, milho e algodão que abundam nessa bacia fluvial.

Embora os efeitos em peixes e humanos ainda não estejam completamente certos, os autores aconselham sobre a necessidade de medidas extremas de precaução em um dos cursos de água mais importantes do país, que provê alimento tanto no âmbito local como para exportação.Estudio planta que “se necessita urgentemente aumentar a distância entre os cultivos transgênicos dependentes de agrotóxicos e os ecossistemas aquáticos, assim como melhorar a abordagem dos riscos ambientais”. Rafael Lajmanovich, responsável pela pesquisa,  disse ao SciDev.Net que essa distância deveria ser de 1.000 metros como mínimo.

Os pesquisadores analisam sedimentos do rio, músculos e vísceras de 16  peixes comprados de pescadores ao longo de 100 quilômetros de alta produtividade agrícola.

No tecido muscular, há “concentrações muito altas” do inseticida cipermetrina (até 204 microgramas por quilo); do fungicida piraclostrobina (50 μg/kg); dos herbicidas glifosato (187 μg/kg), junto com seu ácido de degradação AMPA (3116 μg/kg), e glufosinato de amônia (677 μg/kg).

Antes deste trabalho, os maiores níveis de glifosato registrados em peixes eram “menores a 10 ug/k” e “não havia” informações sobre a presença de glufosinato, assegurou Lajmanovich em um correio eletrônico.

“É necessário aumentar urgentemente a distância entre os cultivos transgênicos dependentes de pesticidas e os ecossistemas aquáticos, assim como melhorar o tratamento dos riscos ambientais”.

Publicado em: “Cocteles de residuos de plaguicidas en peces Prochilodus lineatus del río Salado (América del Sur): Primer registro de altas concentraciones de herbicidas polares”.

Um estudo sobre os efeitos de herbicidas polares publicado em 2021 detectou níveis máximos de AMPA de 300 ug/k no tecido muscular e de 650 ug/k no fígado de peixes Hoplosternum littorale (mais conhecidos como cascudos) da mesma província, precisou em outro e-mail Andrea Rossi, uma das autoras. Embora não tenho sido encontradas  evidências de danos celulares ou efeitos neurotóxicos, é possível encontrar alterações nos parâmetros hematológicos dos espécimes amostrados.

A exposição aguda às quantidades encontradas nesta ocasião, sem nenhuma dúvida, poderia gerar efeitos “múltiplos”, tanto em peixes como em humanos, que incluíam genotoxicidade (capacidade de causar danos genéticos) e disrupção hormonal, associada ao aparecimento de tumores, malformações , disfunções do aparelho reprodutor, neurotoxicidade ou problemas imunológicos, explica Lajmanovich.

Entre 2019 e 2022, o mesmo investigador ―professor titular da Cátedra de Ecotoxicologia da Universidade Nacional do Litoral― fez várias advertências semelhantes sobre os efeitos combinados do glifosato com o arsénico e com os microplásticos .

Os autores reconhecem que a alta solubilidade dos agrotóxicos faz com que a determinação dos níveis de contaminantes seja “problemática”, embora essa mesma solubilidade provoca que sua toxicidade aumente em ambientes aquáticos, onde as membranas dos peixes facilitam a absorção.

Nesse sentido, o médico  Eric Speranza – que há 14 anos encontrou altos níveis de hidrocarbornetos em curimbatpas próximos da cidade de Buenos Aires – disse por telefone que está satisfeito que foi possível medir o glifosato e o glufosinato no tecido muscular do peixe.

“Está evidenciando o impacto da atividade agrícola sojeira”, avisou o investigador do Laboratório de Química Ambiental y Biogeoquímica das universidades argentinas de La Plata e Arturo Jauretche.

Em relação a uma possível vedação provincial sobre a pesca, Speranza é cautelosa, já que se trata de uma medida que “requer ter em conta fatores econômicos e sociais, como as próprias pessoas que vivem dessa atividade”.

Fontes do Servicio Nacional de Sanidad y Calidad Agroalimentaria –encarregado de controlar a segurança dos alimentos de origem animal e vegetal na Argentina – diz ao SciDev.Net que o relatório “recebeu relativa importância”, pois eles têm dúvidas sobre sua metodologia,  , por exemplo, em relação à quantidade de exemplares analisados.

A agência atualmente não mede vestígios de herbicidas em peixes; limites máximos de resíduos (LMR) são estabelecidos apenas para vegetais. Mesmo assim, eles sugerem que os valores encontrados não representam risco à saúde humana. No caso da soja para consumo, por exemplo, o LMR para glifosato é de 5.000 μg/kg.

No entanto, os autores do trabalho insistem em que “a contaminação por agrotóxicos do Rio Salado representa uma ameaça prejudicial à viabilidade da população de peixes e outros organismos aquáticos, e um grande risco para os consumidores”.

Propõe-se uma regulação clara sobre os níveis máximos toleráveis ​​para essas substâncias, permitindo uma melhor abordagem da situação.

Diversas tentativas da SciDev.Net para obter uma declaração oficial sobre medidas futuras por parte do governo de Santa Fé foram infrutíferos até o fechamento deste texto

Link para o resumo do artigo na Science of the Total Environment


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Este artigo foi produzido pela edição de América Latina e Caribe de  SciDev.Net [Aqui!].

Sensor de papel detecta agrotóxico em alimentos de modo rápido e barato

maça agroDispositivo criado na USP se assemelha a um medidor de glicose usado por diabéticos; ao entrar em contato com a superfície de frutas e legumes, ele identifica e mensura a quantidade do fungicida carbendazim – amplamente empregado no Brasil, apesar de proibido (foto: acervo dos pesquisadores)

Por Maria Fernanda Ziegler | Agência FAPESP

Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveram um sensor eletroquímico de papel kraft capaz de detectar em tempo real a presença de pesticida em frutas e verduras. Ao entrar em contato com maçãs ou repolhos, por exemplo, o sensor, ligado a um dispositivo eletrônico, identifica a presença e mensura a quantidade do fungicida carbendazim – amplamente utilizado no Brasil, apesar de proibido.

O trabalho, apoiado pela FAPESP por meio de três projetos (18/22214-619/13514-9 e 22/03758-0), envolveu grupos dos institutos de Física (IFSC-USP) e de Química (IQSC-USP) do campus de São Carlos. Os resultados foram divulgados na revista Food Chemistry.

“Para verificar a presença de pesticidas em alimentos por meio de abordagens convencionais é preciso triturar uma amostra, submetê-la a processos químicos demorados para só então detectar a substância. Os sensores vestíveis, como o que desenvolvemos para o monitoramento contínuo da concentração de pesticidas na agricultura e na indústria de alimentos, eliminam a necessidade desses procedimentos complexos. Fica muito mais fácil, barato, além de ser muito mais confiável para um supermercado, restaurante ou importador fazer a verificação”, afirma Osvaldo Novais de Oliveira Junior, professor do IFSC-USP.

O novo dispositivo tem grande sensibilidade e se assemelha aos medidores de glicose [glicosímetro] utilizados por diabéticos. Para medir a quantidade de agrotóxico em alimentos, o sensor eletroquímico capta a presença do fungicida e o resultado pode ser acessado, em questão de minutos, por meio de um aplicativo de celular.

“Nos testes que realizamos, o dispositivo teve sensibilidade semelhante à do método convencional. Tudo de uma forma mais rápida e barata”, conta José Luiz Bott Neto, pós-doutorando e autor correspondente do artigo que descreve o desenvolvimento da ferramenta.

Como funciona

Como explica Bott Neto, o dispositivo é basicamente um substrato de papel modificado com tinta de carbono e submetido a um tratamento eletroquímico em meio ácido para a ativação de grupos carboxílicos – o que permite fazer a detecção.

“Utilizamos o mesmo sistema empregado na serigrafia [estamparia de roupas] para fazer a transferência da tinta condutora de carbono para a tira de papel kraft, criando assim um dispositivo baseado em eletroquímica. O dispositivo é confeccionado com três eletrodos de carbono e mergulhado em uma solução ácida para a ativação dos grupos carboxílicos. Em outras palavras, átomos de oxigênio são adicionados na estrutura do eletrodo de carbono. Ao entrar em contato com uma amostra contaminada com carbendazim, o sensor induz uma reação de oxidação eletroquímica que permite a detecção do fungicida. Assim, a quantidade de carbendazim é medida via corrente elétrica”, explica Bott Neto à Agência FAPESP.

Para desenvolver o dispositivo, os pesquisadores avaliaram a estabilidade e o impacto da estrutura do papel na construção dos sensores. “Além do desenvolvimento do dispositivo, o trabalho teve uma parte voltada para entender a questão das propriedades do papel na fabricação do dispositivo”, conta o pós-doutorando Thiago Serafim Martins.

Melhor opção

Os pesquisadores analisaram dois tipos de papel: o kraft e o pergaminho. Ambos se mostraram estáveis o suficiente para a construção dos sensores. Porém, segundo Martins, a natureza porosa do papel kraft conferiu maior sensibilidade ao sensor e aos grupos carboxílicos formados durante a ativação eletroquímica.

Ele explica que a fabricação dos eletrodos em papel abre a possibilidade para diversas aplicações. “Existem eletrodos comerciais feitos com plástico ou cerâmica. No nosso trabalho, conseguimos desenvolver sensores eletroquímicos com papel, um material muito mais maleável, o que amplia o seu uso em vários campos, não apenas na agricultura ou no setor alimentício, mas em outras áreas como a da saúde, por exemplo”, diz.

O artigo Optimized paper-based electrochemical sensors treated in acidic media to detect carbendazim on the skin of apple and cabbage pode ser lido em: www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0308814623000456?via%3Dihub.


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Este texto foi originalmente publicado pela Agência FAPESP [Aqui!].

Sistema bancário dos EUA está em uma espiral histérica, e por motivos bem reais

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Como em 2008, o sistema bancário dos EUA está em uma espiral histérica, graças à quebra de dois bancos, o Silicon Valey Bank  (SVB) e Signature Bank (SB), que representaram respectivamente a segunda e a terceira maiores falências da história daquele país.  Como as causas estruturais dos problemas do SVB e do SB estão disseminadas em todo o sistema financeiro estadunidense, isso já está tendo repercussões nos mercados de ações globais, o Brasil incluso.

Uma crise financeira global viria em péssima hora para o sistema capitalista que ainda sofre com as consequências trazidas pela pandemia da COVID-19, com o risco de atingir um setor extremamente sensível que são as empresas de tecnologia que é altamente carente de novos investimentos.

O curioso é que a crise que agora pode atingir as empresas de tecnologia podem ter efeitos contraditórios sobre outros segmentos, a começar pelo das hipotecas, que lembramos foi o que causou a crise do sistema financeira de 2008. 

De toda forma, o que estamos vendo é que a manutenção de altos níveis de especulação financeira é uma certeza de crises cíclicas nos bancos, na medida em que a espiral de apostas por parte dos especuladores torna insustentável o cumprimento das obrigações tomadas. Como não há outro caminho a ser trilhado a estas alturas do campeonato, outras crises certamente virão. Resta apenas quem vai sobreviver a esta que está apenas começando e já causa tanto estrago.

Marketing acadêmico: Editora da Unioeste lança livro que discute a relação [dialética] do Homem com a Natureza em Karl Marx

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A relação dialética do homem com a natureza: Estudos histórico-filosóficos sobre o problema da natureza em Karl Marx

Autor: Wolfdietrich Schmied-Kowarzik
Tradução: Rosalvo Schütz
Revisão da tradução: Hans-Georg Flickinger

Nessa obra, Wolfdietrich Schmied-Kowarzik trava um debate científico-filosófico sobre a natureza, em que fica evidente que Marx expressa uma preocupação com a natureza, com a terra, com o solo, e isto é evidenciado em sua crítica à produção burguesa de valores que pressupõe o trabalho e a natureza, uma vez que, para ele, trabalho é uma relação metabólica entre o homem e a natureza. Para que haja valores de uso, são necessários dois fatores: o substrato material, que a natureza oferece, e o trabalho, com o qual o homem transforma a natureza para satisfazer as suas necessidades. É pelo trabalho que o homem se apropria dos recursos da natureza, imprimindo-lhes forma útil à sua vida e, atuando assim sobre a natureza externa e inorgânica, ele a modifica e transmuda a si mesmo.

A relação do homem com a natureza, em Marx, no entanto, não deve ser entendida apenas como condição necessária do intercâmbio material entre o homem e a natureza, pois Marx fala, em O capital, que o trabalho envolve: 1) o próprio trabalho, que é também intercâmbio entre trabalho e trabalho (os diversos ramos de trabalho); 2) uma atividade que se aplica à natureza, o objeto universal do trabalho humano; e 3) seus meios, ferramentas, instrumentos, com os quais o homem transforma a natureza. Schmied-Kowarzik pensa a relação homem-natureza de modo outro que aquele das categorias orientadas pelos fins da racionalidade utilitarista das ciências e técnicas modernas.

O autor se opõe àqueles que acusam Marx de não ter se preocupado com os problemas ambientais. Tal acusação não procede, pois a crítica de Marx à sociedade burguesa é, precisamente, porque a lógica de sua produção – sua “racionalidade” – econômica reduz o homem e a natureza a simples objeto de lucro. Essa crítica de Marx significa que, enquanto a sociedade capitalista estiver erigida, não cessarão a degradação humana e a ambiental, ecológica. Do mesmo modo que a produção da economia capitalista visa à produção de mais-valia como resultado da exploração do tempo da força humana de trabalho, promovendo a degradação do ser humano, para Marx, tal produção causa também a degradação da natureza, uma vez que a busca do lucro é realizada a partir da exploração dos recursos naturais, não considerando os limites da natureza. O pensamento de Marx denuncia, pois, a pilhagem da natureza, a destruição ambiental, e antecipa, com isso, muitas ideias do discurso ecológico atual, já que sua crítica à economia política do capital não se manteve desvinculada da crítica à degradação do homem e de suas condições de existência, dadas pela natureza.

Adquira a obra: http://www.unioeste.br/edunioeste/ 

Amazônia concentra 90% da área queimada no Brasil no primeiro bimestre de 2023

Foram 487 mil hectares queimados no bioma; confira os dados do Monitor do Fogo divulgados nesta segunda-feira (13)

Fire Monitoring in the Amazon in July, 2021Monitoramento de Queimadas na Amazônia em Julho de 2021

Queimada feita em uma área de desmatamento recente na Amazônia

A Amazônia foi o bioma mais queimado no Brasil nos dois primeiros meses do ano, com 487 mil hectares atingidos pelo fogo. A área equivale a quatro vezes a capital paraense Belém e representa 90% de tudo o que queimou no país no período. Os dados foram divulgados nesta segunda-feira (13) pelo Monitor do Fogo, iniciativa do MapBiomas em parceria com o IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia).

“O principal fator para o fogo na Amazônia nesse período é a ocorrência do fogo em formações campestres, principalmente ao norte do Bioma. Ainda que seja um número alto para a época de chuvas, é 25% menor que os 654 mil hectares que pegaram fogo no bioma em janeiro e fevereiro do ano passado”, comenta Vera Laisa Arruda, pesquisadora no IPAM responsável pelo Monitor do Fogo.

Entre os estados em todos os biomas, Roraima foi o que mais queimou nos meses de janeiro e fevereiro. Foram 259 mil hectares, ou 48% de toda a área queimada no Brasil. Roraima, Mato Grosso e Pará, os últimos com 90 mil e 70 mil hectares queimados, concentram 79% do fogo ocorrido no Brasil no período.

“O padrão de área queimada em Roraima pode estar relacionado a características climáticas e ambientais únicas do estado. Roraima está localizado no hemisfério norte, enquanto a maior parte dos demais estados se localiza no hemisfério sul. Dessa forma, enquanto o período de seca em boa parte do país ocorre entre os meses de maio a setembro, em Roraima os meses de seca ocorrem entre dezembro e abril”, explica Felipe Martenexen, pesquisador no IPAM e responsável pelo mapeamento da Amazônia no Monitor do Fogo.

Campos, como os lavrados roraimenses, foram o tipo de vegetação mais afetado: na Amazônia, os 266 mil hectares que pegaram fogo entre janeiro e fevereiro de 2023 eram de formações campestres, ou 55% da área queimada no bioma; no Brasil, a proporção chega a 84% .

“As vegetações campestres têm um papel fundamental na manutenção dos ciclos naturais essenciais para a vida, como o do carbono e do nitrogênio, além de contribuírem para a absorção e distribuição de água pelo solo. Por essa relação interdependente e complementar, medidas de proteção da biodiversidade devem considerar ecossistemas como um todo para serem efetivas”, acrescenta Vera Arruda.

O Cerrado foi o segundo mais queimado em janeiro e fevereiro, com 24 mil hectares atingidos pelo fogo. A época de chuva em regiões do bioma dificulta o alastramento dos incêndios. No total, o Brasil teve 536 mil hectares queimados nos dois meses, uma área 28% do que a registrada no mesmo período em 2022

Aumento de trabalhos análogos à escravidão no país preocupa especialistas

Casos recentes demonstram necessidade de mais políticas públicas no combate a cenário que alcançou em 2022 o maior número de denúncias dos últimos dez anos

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O início de 2023 trouxe novamente à tona casos de trabalhadores em situações análogas a de escravidão no Rio Grande do Sul e outros estados brasileiros. Segundo o Ministério Público do Trabalho, as 1973 denúncias envolvendo o trabalho de pessoas em condições análogas a de escravidão em 2022 representam o índice mais alto dos últimos dez anos, além de ser o dobro do número apresentado em 2012, quando 857 denúncias foram registradas.

Uma das situações que causam o maior impacto na sociedade brasileira é o de Bento Gonçalves (RS), que possuía cerca de 200 trabalhadores provenientes da Bahia, em sistema de trabalho análogo à escravidão, com condições degradantes nos alojamentos, jornadas de trabalho superiores a 14 horas diárias, além de torturas recorrentes.

“O resgate de trabalhadores não envolve só a retirada do local de exploração, mas também o trabalho conjunto para o respeito a seus direitos básicos, tais como o pagamento das verbas rescisórias, a emissão de guia de seguro-desemprego,  possibilidade de retorno ao local de origem, com o auxílio de centros de assistência social”, explica Izabela Borges, advogada do escritório Aparecido Inácio e Pereira Advogados Associados. 

O que caracteriza as situações de trabalho como análogas a escravidão

Alguns elementos caracterizam a chamada “escravidão contemporânea”, entre eles:

  • Trabalho forçado: ato que envolve a limitação do direito de ir e vir;
  • Servidão por dívida: como ocorre quando há um cativeiro atrelado a dívidas, muitas vezes fraudulentas
  • Condições degradantes de trabalho: quando se nega o respeito à dignidade humana, colocando em risco a saúde e vida do trabalhador;
  • Jornada exaustiva: quando o trabalhador é levado ao completo esgotamento dado à intensidade da exploração, também colocando em risco sua saúde e vida.

Demonstrado qualquer um destes fatores no ambiente de trabalho, o responsável poderá ser condenado na seara criminal, de acordo com art. 149 do Código Penal, que considera crime a redução à condição análoga à de escravidão.

Na esfera trabalhista, as mais importantes punições resultam das Ações Civis Públicas, ajuizadas normalmente pelo Ministério Público do Trabalho, que pleiteiam indenização por danos morais coletivos.

Outra consequência para as empresas é a imagem comprometida no mercado nacional e internacional, como no caso ocorrido em Bento Gonçalves, que apesar de ter sido firmado um termo de ajustamento de conduta, prejudicou de maneira significativa a imagem das empresas envolvidas. 

Denúncias são vitais para resgates

Nos últimos dez anos, mais de 15 mil pessoas foram resgatadas do trabalho análogo à escravidão no Brasil, também segundo o Ministério Público do Trabalho. As denúncias podem ser feitas pelo portal do Ministério Público do Trabalho e há também um site específico para a ação:https://bit.ly/3Yn1ndr, não sendo necessária a identificação do denunciante.

Desde 1995, as fiscalizações e resgates de trabalhadores são realizados pelo GEFM, coordenado por auditores-fiscais do Trabalho, em parceria com o Ministério Público do Trabalho, a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal, o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União, entre outras instituições. 

“É importante que sejam implementadas políticas públicas direcionadas ao combate ao trabalho em condição análoga à de escravo, para que o país possa se orgulhar de combater um ciclo de exploração racial, o qual fora mantida por muitos anos de forma disfarçada pelos interesses econômicos, desinteressados na abolição efetiva da exploração humana”, finaliza a especialista.

Sobre a advogada Izabela Borges Silva

Izabela Borges Silva é advogada do escritório Aparecido Inácio e Pereira Advogados Associados e inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil/SP sob o n.º 337.111

Software antiplágio popular promete identificar textos do ChatGPT

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Por Pesquisa Fapesp

A empresa norte-americana Turnitin informou que irá lançar até abril um novo software capaz de detectar textos produzidos por ferramentas de inteligência artificial (IA) generativa como o ChatGPT. A ideia é que a solução seja incorporada ao seu software homônimo de detecção de plágio, que é utilizado por mais de 15 mil instituições de ensino superior no mundo.

Segundo a companhia, a nova ferramenta tem precisão de até 97% e uma taxa muito baixa de falsos positivos, menos de 1 para 100. Desde o lançamento do ChatGPT, em novembro de 2022, empresas de todo o mundo têm se esforçado para desenvolver ferramentas capazes de identificar textos produzidos por IA generativa. Mas muitas soluções lançadas até aqui são imprecisas. “Nosso modelo foi treinado especificamente para redação acadêmica e se baseia em um banco de dados abrangente, que não se restringe a conteúdos disponíveis para o público”, disse Annie Chechitelli, diretora de produtos da Turnitin, segundo o site da empresa.

Mike Sharples, professor emérito de tecnologia educacional da Open University, do Reino Unido, disse à revista Times of Higher Education que o desenvolvimento da ferramenta é fundamental para a Turnitin manter a competitividade de seu software. Adverte, porém, que a baixa taxa de falso positivo ainda precisa ser verificada de forma independente. Taxas elevadas de falso positivo são um dos pontos fracos dos softwares lançados para detectar textos feitos pelo ChatGPT – a chance de que um aluno seja falsamente acusado de usar inteligência artificial para fazer trabalhos escolares põe em xeque a credibilidade das ferramentas. Os testes com o novo Turnitin serão fundamentais para recomendar ou não seu uso. “Será que ele pode ser enganado se houver pequenos ajustes no texto?  E se o usuário passar o texto por outra ferramenta de IA para que seja reformulado?”, indagou Sharples, em sua conta no Twitter.


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Este texto foi originalmente publicado pela Pesquisa Fapesp [Aqui!].

Debate sobre extrativismo: onde chegar se não…

A transição energética e a descarbonização consomem enormes recursos. O fato de virem do Sul Global mostra um padrão de exploração bem conhecido

palm oilEm outros lugares, regiões inteiras precisam abrir caminho para os recursos que uma economia descarbonizada precisa neste país. Como aqui durante a derrubada e queima de uma futura plantação de óleo de palma. Foto: CHAIDEER MAHYUDDIN/AFP

Por Anne Tittor para o Neues Deutschland

A redução das alterações climáticas é agora considerada um dos desafios mais importantes do século XXI. A ação rápida é agora mais importante do que nunca para limitar o aquecimento global. A descarbonização desempenha aqui um papel central, ou seja, a redução das emissões que contêm carbono, em particular, afastando-se dos combustíveis fósseis e dispensando matérias-primas que contenham carbono. A descarbonização é um alicerce necessário e central para atingir as metas climáticas, mas ainda não é um passo suficiente. No entanto, no debate político atual, o foco está principalmente na viabilidade técnica da descarbonização, e não em um grande número de medidas necessárias em termos de uma desejável transformação socioecológica.

Na Alemanha, sob esta palavra-chave, o foco está principalmente na reestruturação da indústria automotiva, na situação social nas áreas de mineração de linhito e nos setores industriais intensivos em energia ou nos eixos de conflito entre diferentes grupos sociais. Mas os conflitos de transformação socioecológica não existem apenas em países altamente industrializados. Assim que a base de matéria-prima é descarbonizada, essa descarbonização afeta também os fornecedores de energia e matéria-prima. Afinal, matérias-primas renováveis ​​também precisam ser produzidas e energia precisa ser produzida. Ambos ocupam grandes áreas de terra. Um terço da terra arável da Alemanha seria atualmente necessário para substituir o petróleo bruto usado na produção de plásticos da Alemanha por matérias-primas renováveis.

Descarbonização do driver de conflito

Transição Energética Ecossocial

A demanda por uma transição energética ecossocial que não mais se aproprie de territórios e matérias-primas do Sul Global de forma colonial e extrativista também está sendo levantada por grupos ambientalistas e ativistas do Sul Global. Por exemplo, no “Manifesto dos Povos do Sul – Por uma Transição Energética Ecossocial” de 10 de fevereiro de 2023, traduzido para o alemão pelo Escritório de Informação da Nicarágua.

Por meio do acesso a matérias-primas, energia e terra, a descarbonização atua como um impulsionador de conflitos socioecológicos (de transformação) no Sul Global. Com base na socióloga argentina Maristella Svampa, os conflitos socioecológicos são entendidos como disputas associadas ao acesso e controle de recursos naturais e territórios. Implicam diferentes interesses e valores num contexto de grande assimetria de poder e expressam-se em diferentes concepções de território, ambiente e natureza. O termo socioecológico enfatiza que a sociedade e a natureza estão inseparavelmente inter-relacionadas. Os conflitos socioecológicos são, portanto, disputas sobre apropriações naturais, sua necessidade com esforços de descarbonização,

O mundo continua a ser caracterizado por relações de poder e dependências estruturais que são uma consequência duradoura do colonialismo e se mantêm no comércio e na política externa. Os países do Sul Global recebem principalmente o papel de fornecedores de matérias-primas. Essas suposições são nitidamente condensadas na frase de efeito do extrativismo. Os processos de descarbonização requerem determinadas matérias-primas (incluindo minérios e metais) e quantidades de energia, bem como acesso a terras para posterior valorização de territórios para o cultivo de biomassa (soja, dendê, madeira, etc.) grandes barragens e parques eólicos). Em suma, a base material da descarbonização tem custos socioecológicos de acompanhamento.

Os processos de descarbonização andam de mãos dadas com a mudança material na base de recursos da sociedade. Uma mudança na base de materiais para longe das substâncias fósseis está sendo buscada e já foi iniciada. No sentido geológico, »fósseis« refere-se a fontes de energia que se desenvolveram em petróleo, gás natural e carvão através da inclusão de restos de animais e plantas das primeiras eras geológicas na rocha. Estes liberam grandes quantidades de CO 2 quando queimados . Estratégias “pós-fósseis” são, portanto, chamadas de estratégias que iniciam um afastamento desses combustíveis e são consideradas fontes de energia com baixo teor de CO 2 ou livre de CO 2 .

Além disso, existem várias matérias-primas metálicas e minerais extraídas por meio da mineração, que não são renováveis, mas também não se qualificam como materiais fósseis. Tudo isso, bem como toda a gama de matérias-primas renováveis, provavelmente continuará sendo necessário à medida que as estratégias de descarbonização ganharem força. A base de recursos da sociedade pós-fóssil não inclui apenas recursos renováveis, mas também depende centralmente de minérios e sais. Exatamente como uma economia e uma sociedade pós-fósseis podem parecer é algo aberto e contestado.

Muito uso da terra

Além de matérias-primas metálicas, grandes quantidades de energia renovável e a massiva infraestrutura associada, quanto mais a descarbonização avança, mais terra para matérias-primas renováveis ​​ela precisa. Até agora, o uso da terra tem sido analisado principalmente em campos muito específicos, como a política de biocombustíveis. Essas análises mostraram que o cultivo de agrocombustíveis está associado à perda de propriedade da terra por pequenos agricultores, ao enfraquecimento da soberania alimentar e a pressões socioecológicas significativas, como desmatamento, poluição da água e perda de biodiversidade. Embora a discussão sobre agrocombustíveis tenha diminuído no país, no entanto, a produção mundial do mesmo está aumentando ano após ano (com exceção do ano corona de 2020) e um crescimento adicional está previsto na próxima década. Como parte do “Acordo Verde Europeu”, cotas de mistura mais altas da UE estão novamente sendo discutidas, e muitas estratégias de descarbonização incluem significativamente mais agrocombustíveis.

Várias estratégias políticas, incluindo as estratégias de bioeconomia, pretendem usar matérias-primas renováveis ​​não apenas para biocombustíveis, mas também para um grande número de outros usos materiais e energéticos no curso da descarbonização. Até agora, prevaleceu um entendimento de bioeconomia que se resume à substituição de matérias-primas fósseis por renováveis. No entanto, muitas vezes é ignorado que isso é simplesmente impossível porque grandes áreas de terra não estão disponíveis. A terra arável disponível na Terra já é escassa. Além disso, os debates atuais sobre crises socioecológicas são muitas vezes conduzidos separadamente uns dos outros e as áreas da terra são planejadas várias vezes: enquanto os pesquisadores da ETH Zurich querem plantar mais 900 milhões de hectares de floresta por razões de proteção do clima, Especialistas em biodiversidade propõem a designação de 1,7 bilhão de hectares de áreas protegidas para a conservação da biodiversidade. Ao mesmo tempo, os defensores da bioeconomia querem expandir drasticamente a área de cultivo de matérias-primas renováveis.

O fato de que no curso da descarbonização há um aumento acentuado dos conflitos socioecológicos, especialmente sobre a terra, tem a ver com um argumento estrutural: as fontes de energia renováveis ​​consomem muito mais terra do que os combustíveis fósseis, justamente por terem um consumo energético significativamente menor. densidade . O cientista ambiental canadense Vaclav Smil comparou um total de cerca de 50.000 quilômetros quadrados de uso da terra para energia fóssil com um uso de terra de 398.000 quilômetros quadrados para energias renováveis. Isso inclui 263.000 quilômetros quadrados para biocombustíveis modernos, 131.000 para hidrelétricas e 40.800 para eólica.

À data do cálculo, o consumo terrestre de energias renováveis ​​é quatro vezes superior ao das energias fósseis – ainda que as primeiras gerassem apenas 3,8 por cento da energia na altura. Muitas dessas áreas de terra exigidas estão ocupadas no Sul Global. Isso estabelece condições extrativistas em diferentes áreas importantes para a descarbonização. Se houver também um aproveitamento de materiais além do energético, por exemplo, substituindo o plástico à base de petróleo pelos chamados bioplásticos à base de matérias-primas renováveis, o problema torna-se ainda mais agudo. Quanto mais a descarbonização avança, mais extenso extrativismo pós-fóssil e com ele os conflitos de transformação socioecológica ameaçam se tornar.

Um padrão de exploração

O extrativismo pós-fóssil inclui a extração e cultivo de recursos renováveis, que está associado a altos custos socioecológicos, a produção em larga escala de energias renováveis ​​e os requisitos associados de recursos minerais e metálicos. Além disso, há um aumento maciço na demanda por eletricidade. Isso, por sua vez, exacerba os conflitos sobre energias renováveis ​​com seus altos requisitos de terra. Em particular, projetos de barragens e plantações de madeira estão voltando com a descarbonização, apesar de seus efeitos socioecológicos problemáticos. Todos os esforços de descarbonização também exigem a expansão da infraestrutura em grande escala.

O extrativismo é, portanto, seguindo Maristella Svampa, um padrão de divisão transnacional do trabalho no capitalismo contemporâneo, que requer cada vez mais matérias-primas e energia e, portanto, exerce uma pressão cada vez maior sobre os recursos naturais e territórios nas áreas rurais periféricas do mundo . Isso aprofunda a posição desigual dos países no sistema mundial e agrava ainda mais a atual crise socioecológica. Nas regiões mineradoras, o extrativismo aparece como um modelo socioterritorial baseado na superexploração dos recursos naturais e na ampliação dos limites de uso para áreas antes consideradas improdutivas do ponto de vista do capital. Essa compreensão do extrativismo acentua a dimensão territorial um pouco mais do que outras definições e sublinha que

O fenômeno do extrativismo pode ser visto como um padrão na história latino-americana, mas o debate sobre o extrativismo surgiu principalmente na última década. O termo é usado principalmente de forma crítica para se referir aos custos socioecológicos consequentes da extração extensiva de matérias-primas.

Expansão do extrativismo agrário

Durante muito tempo, o debate sobre o extrativismo concentrou-se nos combustíveis fósseis carvão, gás natural e petróleo, além da mineração de metais. Mas, nos últimos anos, surgiram padrões extrativistas em muitos outros campos. Vários trabalhos atuais discutem o conceito de extrativismo agrícola, também em relação aos agrocombustíveis. Inicialmente, o foco estava principalmente em soja e óleo de palma cultivados em grandes plantações, mas recentemente também em cana-de-açúcar, frutas cítricas e flores cortadas. Para o extrativismo agrícola em particular, é importante determinar com mais precisão o que é extraído e como. Por um lado, existem nutrientes no solo que são removidos a tal ponto que não podem mais se regenerar. Em 2015, a ONU declarou que o solo usado para agricultura intensiva é um “recurso não renovável”. Como a qualidade do solo está em constante declínio e o solo está constantemente sendo usado em excesso, grandes quantidades de fertilizantes artificiais são usadas. O extrativismo agrícola é, portanto, na verdade “agricultura mineira” do lado material ou biofísico.

Devido à forte dependência de substâncias fósseis, essa forma de cultivo exacerba o extrativismo clássico; ao mesmo tempo, apesar das grandes quantidades de insumos fósseis, não pode parar a degradação do solo. O extrativismo agrícola também está associado a uma forma particular de produção praticada pelo agronegócio, voltada para a produção de grandes quantidades de mercadorias para exportação. Essa exportação ocorre com pouco ou nenhum processamento. Além disso, é característica uma alta concentração da cadeia de valor em apenas algumas empresas, ao mesmo tempo em que falta um relacionamento econômico mais próximo com outras empresas locais.

Além disso, o extrativismo agrícola leva à deterioração das oportunidades de trabalho e/ou das condições de trabalho. Ele conta com o uso de equipamentos modernos e tecnologias digitais e assim contribui para a »agricultura sem agricultores«. Os efeitos colaterais são a degradação do solo, poluição da água, perda de biodiversidade, desmatamento e concentração de terras. Devido ao uso generalizado de agrocombustíveis e ao aumento do uso material e energético da biomassa cultivada, é provável uma expansão do extrativismo agrícola no futuro.

Água e florestas

Vários trabalhos também falam do extrativismo no setor florestal, em particular análises do Chile. Ali, paisagens, ecossistemas e relações homem-natureza foram redesenhados dentro de um modelo extrativista em enormes plantações de árvores de empresas privadas. A terra foi outrora utilizada pelos indígenas mapuches para a pecuária extensiva ou agricultura de subsistência e é considerada por eles como seu território histórico. Como resultado, há intensos conflitos pelo uso da terra e da água.

O paralelo com o extrativismo agrário não reside apenas nesses conflitos de uso da terra e da água e na forte e irreversível conversão de grandes áreas de terra para o cultivo de produtos prioritariamente exportados. Este tipo de economia também requer muita terra, mas quase nenhum trabalhador. As comunidades locais estão sendo expulsas, os ciclos ecológicos estão sendo alterados, a produção está sendo estabelecida para o mercado mundial e os padrões coloniais estão sendo ligados. Essas plantações de árvores são frequentemente declaradas como projetos de reflorestamento e, às vezes, cofinanciadas com fundos do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Uma vez que a madeira como matéria-prima renovável também está se tornando mais importante como material de construção no contexto da descarbonização e as primeiras usinas a carvão estão agora sendo operadas com lascas de madeira em vez de carvão,

Além disso, grandes usinas hidrelétricas também podem ser classificadas como projetos extrativistas. Aqui também está ocorrendo uma transformação em larga escala e irreversível dos territórios. Cerca de quatro milhões de pessoas por ano são reassentadas por causa das barragens. Embora a água não seja apropriada diretamente, é a energia que é extraída e exportada. A assimetria nas relações de poder faz com que os lucros sejam desviados para lugares distantes, enquanto os locais arcam com os custos socioecológicos. Como as grandes barragens raramente são usadas para abastecimento local de energia e água, mas geralmente fornecem eletricidade principalmente para setores como mineração ou agronegócio, elas fazem parte da “geografia do extrativismo”.

Projetos de grandes barragens foram duramente criticados nas décadas de 1980 e 1990 por causa de seu problemático impacto social e ambiental e desde então foram removidos da agenda política de desenvolvimento. Mas diante da descarbonização, eles foram ajudados a renascer. Enquanto isso, atores como o Banco Mundial e muitos bancos privados – e cada vez mais também o capital chinês – estão financiando projetos de barragens. Este desenvolvimento foi ainda reforçado pelo estabelecimento do MDL. Nesse quadro, os países industrializados podem investir nos países em desenvolvimento, em vez de reduzir as emissões em casa. Setorialmente, os maiores projetos na área de energia eólica e hidrelétrica têm sido os mais financiados – apesar de seus custos socioecológicos problemáticos. Porque há um novo consenso em torno da estratégia de baixo carbono .

Narrativas Verdes

Devido às muitas semelhanças que surgem nos padrões de implementação e nas consequências do agroextrativismo, dos grandes projetos de barragens, das grandes plantações florestais e de biomassa e das infraestruturas associadas, faz sentido trazer esses projetos para um termo comum: »extrativismo pós-fóssil «. Esta é uma estratégia de desenvolvimento que promove a valorização das zonas rurais periféricas com base na terra e em recursos renováveis ​​e de base biológica e contribui para a descarbonização. Isso também inclui a mineração intensiva e em larga escala de matérias-primas metálicas e minerais para as tecnologias correspondentes.

O extrativismo pós-fóssil anda de mãos dadas com uma promessa de desenvolvimento, principalmente de prosperidade e empregos para as respectivas regiões. No local, as justificativas climáticas e ambientais para os respectivos projetos desempenham um papel secundário – contrariando sugestões do debate como “ecoextrativismo”, “extrativismo renovável”, “extrativismo verde” ou “extrativismo alternativo”. Pós-fóssil descreve a base material do extrativismo, o que não altera as formas de fiscalização e os efeitos socioecológicos. Ecológico ou “verde” é apenas a narrativa apropriada que acompanha os projetos.

A esse respeito, não estamos em uma fase de extrativismo pós-fóssil, mas o extrativismo pós-fóssil está aumentando à medida que a descarbonização avança. Até agora, apenas complementou o extrativismo fóssil, porque, embora a eliminação do carvão e do petróleo tenha sido anunciada em mais de 100 países, seus volumes de produção ainda não estão diminuindo em escala global. As energias pós-fósseis têm uma densidade energética menor do que os combustíveis fósseis e a descarbonização requer grandes quantidades de energia (renovável). Portanto, o acesso à terra e, portanto, também os conflitos socioecológicos provavelmente aumentarão acentuadamente à medida que a descarbonização avança, porque a forma de descarbonização praticada até agora requer quantidades consideráveis ​​de matérias-primas e ocupa grandes áreas de terra, especialmente para produção de energia.

Rompimento das relações extrativistas

No que diz respeito às consequências socioecológicas no local – a destruição dos ecossistemas, a impossibilidade de estratégias anteriores de subsistência , a perda da soberania alimentar e da biodiversidade – os vários extrativismos pouco diferem. Os conflitos em torno do extrativismo pós-fóssil já respondem por cerca de 40% dos conflitos socioecológicos em todo o mundo (excluindo o setor metalúrgico).

Vários desses conflitos existem há mais tempo do que o conceito de descarbonização, mas atualmente estão chegando ao auge. Portanto, esses conflitos socioecológicos também devem ser vistos como conflitos de transformação, ao invés de usar esse termo apenas para as disputas sobre as indústrias carbonífera e automobilística neste país. Muitas convulsões sociais – incluindo a descarbonização – andam de mãos dadas com uma relação Norte-Sul específica que não deve ser negligenciada. Além disso, a conceituação como conflitos de transformação sócio-ecológica sublinha que estes não são uma coisa do passado, mas provavelmente se intensificarão no futuro.

Se você descobrir a conexão estrutural entre descarbonização e custos socioecológicos no Sul Global, não estará de forma alguma isentando os governos dos países do sul de sua responsabilidade. Como já foi mostrado ao longo do debate sobre o extrativismo, tanto os governos quanto as próprias classes dominantes têm interesse em aprofundar os projetos extrativistas e os estão promovendo ativamente – seja para gerar receita do Estado ou simplesmente para lucrar. Além disso, há também esforços de descarbonização em países do Sul, que não acontecem apenas por causa das relações de poder internacionais e das condições do mercado mundial, mas às vezes são motivados pelo desejo de soberania energética ou proteção do clima.

Enquanto a descarbonização for projetada para ser apenas uma tentativa de colocar os padrões fósseis em uma base biológica, ela ajudará a perpetuar as relações extrativistas. Porque até agora apenas a base material da economia foi gradualmente alterada, mas as infraestruturas, as relações sociais e as expectativas crescentes não mudaram, também porque atores poderosos tentam segurá-los a qualquer preço. Os conflitos são multiplicados devido à densidade energética estruturalmente maior das substâncias fósseis em comparação com as renováveis ​​ou renováveis. Um projeto socialmente justo de descarbonização teria que levar esse fato em consideração, em vez de sugerir que o atual modelo de produção e consumo pode ser continuado – apenas com uma base de matéria-prima diferente.

Em vez disso, é necessário um projeto político direcionado da transformação socioecológica. Cotas de mistura e reciclagem ou o desenho da lei da cadeia de suprimentos fazem a diferença. Uma reviravolta real no transporte, por exemplo, teria um impacto ainda mais sério – longe da automobilidade individual em vez de uma mera reviravolta. A questão mais importante é se os políticos deste país estão traçando o caminho para uma redução drástica no consumo de energia e matérias-primas. Até agora, porém, não parece.

O artigo é uma versão resumida de »Extrativismo pós-fóssil? A Multiplicação de Conflitos Sócio-Ecológicos no Sul Global através da Descarbonização«, publicado em Prokla 210: Conflitos de Transformação Sócio-Ecológica e Estratégias de Esquerda. 53º ano, número 1, março de 2023, Bertz + Fischer, 196 páginas, 15€.


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Este texto escrito originalmente em alemão foi publicado pelo jornal “Neues Deutschland” [Aqui!].