Sob a batuta de Bolsonaro, Câmara dos Deputados deve aprovar o PL do Veneno que aumentará o legado tóxico imposto pelo agronegócio aos brasileiros

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A aprovação do Pacote do Veneno deverá ampliar o processo de contaminação por agrotóxicos, inclusive do leite materno que já ocorre nas áreas de maior uso dessas substâncias

Apesar da imensa tsunami de venenos agrícolas aprovados pelo governo Bolsonaro desde janeiro de 2019, a Câmara dos Deputados deverá aprovar hoje o primeiro componente do chamado “Combo da Destruição“, o Projeto de Lei 6299/2002 que é popularmente conhecido (e como muita justiça) como “Pacote do Veneno“.

A aprovação do “Pacote do Veneno” trará uma série de consequências drásticas para o processo de aprovação e comercialização de agrotóxicos no Brasil, incluindo a concentração total de poderes no Ministério da Agricultura e a possibilidade de produção e uso de compostos que sejam conhecidos como serem causadores de câncer. Haverá ainda a possibilidade de que determinados agrotóxicos sejam vendidos sem a necessidade do preenchimento do chamado “receituário agronômico“, o que para todos os fins impedirá que sejam conhecidos os volumes vendidos e os compradores de determinados compostos, o que aumentará o nível de descontrole em uma área extremamente sensível para o meio ambiente e a saúde humana.

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As razões para esse “passa boiada” nos mecanismos que controlam o uso, produção e comercialização de agrotóxicos estão ligadas principalmente às demandas do latifúndio agro-exportador que depende dessas substâncias para tocar seu modelo agrícola que só é precariamente viável se associado a um uso intenso de venenos e de sementes geneticamente modificadas.  Mas a passagem dessa boiada também interessa às grandes corporações multinacionais que vendem venenos agrícolas que estão proibidos em seus países-sede como é o caso das multinacionais alemãs Bayer e BASF. São os interesses dessas corporações que também explicam a volúpia com a qual se procura desmontar a legislação existente e impor uma versão mais frouxa e ainda mais pró fabricantes de venenos agrícolas.

Os custos ambientais e sociais da aprovação do Pacote do Veneno serão gigantescos

O Brasil ocupa hoje de forma sólida a posição de principal consumidor de agrotóxicos do planeta, incluindo dezenas de substâncias que já estão banidas em outros mercados por serem altamente tóxicos e trazerem graves consequências ambientais e para a saúde humana.  Os efeitos dessa dependência química do latifúndio agro-exportador já estão fartamente documentados na literatura científica (e cito como exemplo o livro mais recente da professora Larissa Bombardi com uma boa fonte de referência sobre os impactos dos agrotóxicos).

A virtual aprovação do Pacote do Veneno deverá aumentar não apenas o consumo de produtos altamente perigosos ( muitos deles fabricados por empresas europeias mas proibidos de uso na Comunidade Europeia), mas consequentemente o nível de contaminação ambiental e de doenças causadas pelo contato e o consumo de alimentos contendo resíduos desses agrotóxicos.

Sendo bastante objetivo, considero quase inevitável a aprovação do Pacote do Veneno dado o controle que a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), a bancada ruralista, tem no congresso nacional. Nos restará a obrigação de aumentarmos os esforços para informar sobre os graves riscos que estarão sendo criados pelo desmantelamento da legislação vigente.  Além disso, haverá que se ampliar as alianças com movimentos sociais e organizações não-governamentais que hoje atuam em nível global para enfrentar o lobby da indústria química e lutar por um modelo agroecológico que acabe com a dependência existente aos agrotóxicos.

Greenpeace premia Arthur Lira com a Motosserra de Ouro 2021

O objetivo do protesto pacífico foi chamar a atenção para os desmontes ambientais promovidos no Congresso Nacional, sob o comando do presidente da Câmara

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Entrega do Prêmio Motosserra de Ouro Edição 2021 ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL)

Brasília, 17 de agosto de 2021 – Na manhã desta terça-feira, o Greenpeace Brasil realizou um protesto pacífico no Anexo II do Congresso Nacional. Ativistas encenaram a entrega do Prêmio Motosserra de Ouro Edição 2021 ao presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). Na ação, participantes vestidos de gala desfilaram por um tapete vermelho e acompanharam a entrega do prêmio a um homem caracterizado de Arthur Lira, exibindo seu crachá de “funcionário do mês do (des)governo Bolsonaro” e segurando um molho de chaves.

“O presidente da Câmara vem seguindo à risca seu compromisso com o projeto de destruição ambiental de Bolsonaro, prova disso é que, em seis meses de mandato, Lira conseguiu aprovar o pior texto do PL do Licenciamento Ambiental e, recentemente, o PL da Grilagem. São projetos como estes que impulsionam o desmatamento, o fogo e a violência contra povos indígenas e do campo, além de agravar a emergência climática. Por tudo isso, Lira tem se mostrado o grande merecedor do prêmio Motosserra de Ouro Edição 2021 e é hora de entregarmos esse troféu a ele”, declarou Thais Bannwart, porta-voz de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil.

Imagens da premiação disponíveis para download aqui

Devido à pandemia, o Congresso Nacional está fechado para circulação de pessoas e as votações estão acontecendo em sistema remoto, sem participação da sociedade. Enquanto o povo brasileiro está preocupado com vacina e comida, e atento aos crescentes escândalos de corrupção envolvendo o governo federal, Lira tem aproveitado o momento para passar a boiada na Câmara dos Deputados. Neste segundo semestre, ainda deve trazer para o plenário o PL do Veneno (6.299/2002) e projetos de lei contra povos indígenas (por exemplo, o PL 490/2007 e o PL 191/2020).

“As chaves que o Lira de mentira carregava na encenação de hoje simbolizam a casa do povo fechada a sete chaves pelo próprio Arthur Lira, que se aproveita desse período de distanciamento social e age de maneira antidemocrática, pautando e aprovando projetos sem a devida participação da sociedade e transparência nas votações”, comenta Thais.

Há uma semana, a ONU divulgou o relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), que alerta sobre a emergência climática que estamos vivendo e revela que a influência humana é responsável por alta de 1,07°C na temperatura global. O Brasil tem um papel fundamental no enfrentamento da crise do clima e o desmatamento da Amazônia, que segue batendo recordes mês a mês, é a principal fonte de emissões de gases do efeito estufa no país. Por isso é primordial alcançarmos o desmatamento zero com leis para conter a ação humana na destruição ambiental.

“Estamos diante de uma crise climática que se agrava com os recordes de queimadas e desmatamento, mas em vez de prevenir e combater o crime ambiental, Lira e seus aliados no Congresso optam pelo enfraquecimento das políticas de proteção ambiental, das atividades de fiscalização e atuam para legalizar o ilegal”, completa Thais.

Veja o que disseram os parceiros

As organizações da sociedade civil, como Observatório do Clima, Instituto Socioambiental (ISA), Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS) e Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN) também participaram da ação, fazendo coro à denúncia do papel extremamente danoso que Arthur Lira vem desempenhando como presidente da Câmara, ao passar as boiadas da política antiambiental do governo Bolsonaro.

Na opinião de Adriana Ramos, associada do Instituto Socioambiental (ISA), a atuação de Lira frente aos retrocessos que vem sofrendo o meio ambiente e o clima é coerente com a premiação dada pelo Greenpeace. “A atuação do presidente da Câmara ao viabilizar a aprovação de legislações importantes sem o devido debate, sabendo dos impactos negativos que essas legislações terão ao meio ambiente e ao clima no Brasil, qualifica ele para receber o prêmio”.

“Em apenas seis meses à frente da Presidência da Câmara, o deputado Arthur Lira já se igualou ao antiministro Salles nos danos à política ambiental. Viabilizou a votação de duas leis com conteúdo muito ruim, um texto sobre licenças ambientais que na prática implode com o licenciamento no país e a Lei da Grilagem. Toda semana anuncia pautas com retrocessos ambientais. Além disso, leva os processos diretamente ao plenário, com relatórios que aparecem de última hora, praticamente ninguém consegue ler antes de votar. Um verdadeiro desastre”, afirma Suely Araújo, especialista sênior em Políticas Públicas do Observatório do Clima.

Segundo André Lima, consultor sênior de Política e Direito do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), quando se analisa os retrocessos permitidos pelo Presidente da Câmara com os do ex-ministro do Ministério do Meio Ambiente, Ricardo Salles, os prejuízos podem ser bem maiores. “Arthur Lira conseguiu em seis meses, fazer um estrago na política e na legislação ambiental brasileira, maior até do que o próprio Salles em dois anos e meia de gestão no executivo. Sobretudo por pautar projetos de lei, absolutamente contrários à política ambiental e climática brasileira, como o PL 3729 e PL 266. Por essa razão ele merece o prêmio Motosserra de Ouro. E isso também é uma sinalização ao Rodrigo Pacheco, que se ele não segurar a boiada no Senado, também passa a ser merecedor deste prêmio”, declarou.

Para Guilherme Eidt, assessor em Políticas Públicas do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), Lira faz jus e merece ser lembrado com essa premiação do Greenpeace. “A estrutura de governança ambiental do país está sendo desmontada, e a participação social nos espaços de construção de políticas públicas é negada. O governo federal já demonstrou desinteresse em defender o meio ambiente, os povos indígenas e as comunidades tradicionais. E, o atual presidente da Câmara dos Deputados está a serviço daqueles que lucram com o desmatamento e a extração ilegal de madeira, que flertam com a mineração em Terras Indígenas e áreas protegidas, promovem a grilagem de terras públicas e negam as mudanças climáticas. Lira parece não ter compromisso com o futuro do Brasil, está em compasso com o presidente da República, e juntos são responsáveis pelos piores retrocessos nas políticas socioambientais do país. Faz jus e merece ser lembrado com essa premiação do Greenpeace”.

Site investigativo francês mergulha “no reino do agronegócio” brasileiro na Amazônia

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Grande parte do deflorestamento amazônico vem do agronegócio. CARL DE SOUZA / AFP

O site investigativo francês Mediapart publicou na quinta-feira (29), a quinta parte de uma grande reportagem especial na Amazônia brasileira. Depois da “imposição da doutrina paranoica do regime militar brasileiro na Amazônia”, ou “como o mito da Natureza infinita permite a economia da destruição”, “Como a estrada e as obras abrem o caminho para o desmatamento” e “Amazônia: terra, fogo e violência”, dessa vez os jornalistas franceses se debruçaram sobre o “reino do agronegócio”  brasileiro.

 “O onipotente setor do agronegócio está se organizando para se apresentar como imprescindível no Brasil”, afirma a reportagem do site investigativo francês Mediapart. Para a equipe de jornalistas franceses, trata-se “uma batalha de ideias e uma luta política que envolve campanhas publicitárias recorrentes e que tem dramáticas consequências ecológicas e sociais na Amazônia”.

“Ao longo da BR-364 que corta o estado de Rondônia, o agronegócio está espalhando sua força até onde a vista alcança. Milhares de caminhões de transporte de grãos desfilam sem parar diante dos olhos do gado impassível”, relata Mediapart. “A paisagem alterna entre pastagens, campos de cultivo e terras devastadas ou em vias de se tornarem. A entrada de cada pequena cidade é adornada com estátuas de vacas ou seus tratadores, acompanhadas de outdoors em apoio a Jair Bolsonaro, ilustra a reportagem, dando o clima local em Rondônia.

“Desamazonização”

“Com o novo presidente do Congresso [Arthur Lira] eleito no início de 2021, particularmente sensível aos seus temas, os ruralistas consideram o momento ‘extremamente favorável’ para avançar seus muitos projetos”, diz o texto. O pesquisador Ricardo Gilson, da UNIR (Universidade Federal de Rondônia), entrevistado por Mediapart, afirma que “há um processo de ‘desamazonização’, a destruição é considerada um elogio ao progresso”, lamenta.

O site francês contextualiza dizendo que, “além de sua ofensiva política, os ruralistas aumentaram suas campanhas de comunicação. Eles não usam mais o termo ‘negócios’, renomeando-se apenas como ‘agro’, falam em ‘agrocidadãos’ com um discurso nacionalista e recrutando personalidades conhecidas, como o ex-jogador de futebol Pelé. Nessa batalha ideológica, triunfa a cultura do agronegócio, contra a cultura da floresta e de quem vive nela”, afirma Mediapart.

Guerra de dados

Segundo o site francês, para apoiar essa nova doutrina, uma “verdadeira batalha sobre o controle de dados está em andamento”. “Apesar do reconhecimento internacional, os dados dos satélites que monitoram o desmatamento são regularmente questionados pelo atual governo, e os funcionários do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) que os administram sofrem pressão do governo Bolsonaro”, publica o site.

Mediapart faz questão de destacar que embora a contribuição do agronegócio para o PIB brasileiro seja inegável, o desenvolvimento prometido na verdade afeta apenas um pequeno número de beneficiários. “Existem mais de 5 milhões de agricultores no Brasil, mas 25 mil são responsáveis ​​por 50% do PIB agrícola”, diz Eduardo Assad, pesquisador da Embrapa, ao site investigativo.

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Este texto foi originalmente publicado pela RFI [Aqui!].

Jair Bolsonaro está sob pressão

Investigações e protestos em massa contra o chefe de estado de direita no Brasil

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“Um bom Bolsonaro é um Bolsonaro preso”: A solidariedade com os protestos no Brasil também foi mostrada na metrópole catalã de Barcelona. Foto: imagens imago / ZUMA Wire
Por Peter Steiniger para o “Neues Deutschland”

“Fora com o Bolsonaro!” Em mais de uma centena de cidades em todo o Brasil, as pessoas protestaram no sábado contra a desastrosa política de saúde durante a pandemia corona em seu país . O impeachment do líder extremista de direita Jair Bolsonaro foi convocado em manifestações e comícios. O início de tal impeachment, solicitado pela oposição, é bloqueado pelo presidente da Câmara de Deputados e apoiador do Bolsonaro, Arthur Lira. De acordo com os organizadores, cerca de 800 mil pessoas participaram das manifestações. Os protestos foram, portanto, maiores do que nos dias anteriores de ação em 29 de maio e 19 de junho.

Os protestos foram alimentados pela abertura pelo Supremo Tribunal Federal de uma investigação sobre o Bolsonaro na sexta-feira em conexão com a corrupção na compra da vacina indiana Covaxin. Durante semanas, uma comissão investigativa do Senado trouxe novos detalhes à luz sobre como a proteção da população contra o coronavírus foi sabotada pelo governo de Bolsonaro. O vírus ameaça particularmente as camadas mais pobres da população em condições de vida precárias na periferia das grandes cidades e os povos indígenas do vasto país.

Em vários lugares fora do Brasil, incluindo cidades alemãs como Berlim, Colônia, Münster e Friburgo, ações de solidariedade com o movimento de protesto contra Bolsonaro aconteceram neste final de semana.

O presidente Jair Bolsonaro atacou os manifestantes nas redes sociais e as conectou com os manifestantes. Ao mesmo tempo, ele criticou a cobertura da mídia e reiterou sua afirmação de que a oposição queria chegar ao poder no próximo ano por meio da manipulação eleitoral. Nas pesquisas, o político de esquerda Lula Inácio Lula da Silva está claramente à frente de Bolsonaro.

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Este texto foi escrito inicialmente em alemão e publicado pelo jornal “Neues Deutschland” [Aqui!].

Na posse de Lira e Pacheco, governo Bolsonaro declara guerra ao Brasil

Arthur Lira (à dir.), Rodrigo Pacheco (centro) e Jair Bolsonaro (à esq.) participam da sessão de abertura do ano legislativo, no Plenário do Congresso Nacional, em Brasília - DIDA SAMPAIO/ESTADÃO CONTEÚDO

Na posse de seus aliados Rodrigo Pacheco (DEM/MG) como presidente do Senado Federal e Arthur Lira (PP/AL) como presidente da Câmara de Deputados, o presidente Jair Bolsonaro entregou um pacote de projetos que representam uma declaração de guerra aos trabalhadores brasileiros e aos povos indígenas.  No pacote estão incluídos temas explosivos como a privatização da Eletrobras, a permissão para atividades de mineração em terras indígenas e o homeschooling, mas também houve espaço para apresentar as PEC 32/2020 da Reforma Administrativa que deverá destroçar as carreiras dos servidores públicos, e precarizar ainda mais a qualidade dos serviços prestados aos mais pobres.

Enquanto isso, a direção do PT aparentemente operou para que a deputada Marília Arraes (PT/PE) agisse para inviabilizar a eleição para a mesa diretora da Câmara de Deputados do deputado João Daniel (PT/SE) por ele ser mais ligado à esquerda do próprio partido. Essa rasteira realizada contra João Daniel permite antever qual será o papel do PT nos duros embates que terão de ser de travados nas ruas e no parlamento para impedir que a agenda de destruição do governo Bolsonaro tenha êxito. Em suma: não se poderá contar com a maioria do PT para este combate, pois a opção feita está claramente em conviver pacificamente com um governo que está agindo para desmontar o Estado brasileiro para beneficiar principalmente o grande capital multinacional, a começar pelos grandes bancos que hoje se refastelam com a dívida pública brasileira.

O momento que vivemos é certamente um dos mais complexos da história recente do Brasil, pois o êxito da agenda do governo Bolsonaro tornará o Brasil uma economia cada vez mais dependente do setor primário que não gera empregos e serve apenas para concentrar ainda mais a riqueza, enquanto se produz efeitos devastadores sobre a Natureza e os povos tradicionais.

A opção como sempre será sair às ruas para mobilizar a classe trabalhadora e a juventude. O problema é que com o avanço da pandemia e o surgimento de variantes ainda mais contagiantes do SARS-COV-2, isto implicará em desafios ainda maiores para se gerar o nível de mobilização que será capaz de impedir a aprovação desse pacote que equivale a uma verdadeira declaração de guerra ao Brasil e aos segmentos mais pobres da nossa população.

Bolsonaro está se livrando de possíveis processos de impeachment, mas a conta será salgada

A eleição de seus aliados como presidentes do parlamento dá ao presidente Bolsonaro um impulso na corrida pela reeleição no próximo ano. Porém, a nova aliança com os partidos de centro-direita do Centrão não é grátis

bolso flagO presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, celebra cerimônia para abaixar a bandeira nacional do Brasil durante a noite, no Palácio da Alvorada, em meio ao surto da COVID-19, em Brasília, Brasil, em 15 de julho de 2020. REUTERS / Ueslei Marcelino

Por Thomas Spleen, Rio de Janeiro, para o  Neue Zürcher Zeitung

Quem quiser governar o Brasil deve, mais cedo ou mais tarde, aliar-se aos partidos do chamado Centrão, ou seja, os partidos de centro-direita. Politicamente, você sempre inclina a balança. O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, sabe disso, porque nos trinta anos de sua carreira política foi membro de quase todos esses partidos em algum momento. O mais irônico é que ele jurou na campanha eleitoral de 2018 que a política do pós-xadrez típica do Centrão acabaria de uma vez por todas. Em vez disso, uma “nova política” começa com seu mandato, sem os partidos de centro-direita marcados pela corrupção.

Mas o mais tardar com a vitória dos dois deputados do Centrão Arthur Lira e Rodrigo Pacheco na eleição dos presidentes do Congresso na noite de segunda-feira, Bolsonaro finalmente voltou à rejeitada “velha política”. Ele já havia buscado e encontrado o apoio do Centrão nos últimos meses, quando foi duramente atingido devido à catastrófica corona política e ao envolvimento de seus filhos em diversos escândalos. Os votos deram-lhe uma minoria de bloqueio para evitar possíveis processos de impeachment.

64 pedidos de impeachment provavelmente irão desaparecer na gaveta

Isso só pode ser iniciado pelo presidente da Câmara dos Representantes. Este cargo está nas mãos do confidente do Bolsonaro, Arthur Lira, desde segunda-feira à noite. O advogado, cuja carreira política é orlada por denúncias de corrupção, provavelmente vai colocar na gaveta todas as 64 ações de impeachment contra o Bolsonaro que foram apresentadas até o momento. Ele também ajudará o presidente a finalmente aprovar sua agenda política no Congresso. Isso inclui leis mais flexíveis sobre a aquisição de armas e uma redução nas regulamentações ambientais. Rodrigo Pacheco também preside o Senado com um político do Centrão que enfrenta o Bolsonaro.

Mas o presidente brasileiro pagará caro por esse apoio. Nos últimos dias, ele teria cortejado os favores do Centrão com cargos importantes no governo e orçamentos extras generosos para os constituintes, conforme relatado por fontes internas. Para isso, ele agora terá de dispensar alguns de seus seguidores leais para abrir espaço para os novos amigos no gabinete. Sua promessa feita na eleição de 2018 de encher seu governo de especialistas e não de aliados foi quebrada para sempre.

A crescente influência dos novos aliados é devastadora para a  economia brasileira. Com a entrada do Centrão no governo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, pode ter que esquecer a liberalização da economia. Em vez de privatizar as empresas estatais não lucrativas, as posições mais lucrativas agora serão divididas entre os novos aliados. E nos discursos inaugurais dos dois novos presidentes do congresso na segunda-feira, dada a situação de pandemia ainda tensa, outra rodada de ajuda custosa contra a crise causada pelo coronavírus foi solicitada. O Brasil não pode pagar por isso.

Mas desde que a ajuda contra a crise causada pelo coronavírus expirou no final do ano, a popularidade do Bolsonaro diminuiu. Além disso, muitos cidadãos culpam o presidente pela falta de oxigênio para os pacientes da COVID-19 em algumas regiões e pelo lento início da vacinação. No meio da segunda onda corona, mais de mil brasileiros morrem todos os dias. Caso a luta contra a pandemia e, portanto, a recuperação econômica tenha sucesso, o “Centrão” pode servir de base para a reeleição de Bolsonaro no final de 2022. No entanto, os partidos do centro são muito sensíveis ao estado de espírito das pessoas. Se cair contra o Bolsonaro, os lados serão trocados durante a noite. A presidente de esquerda Dilma Rousseff teve recentemente essa experiência dolorosa. Ela foi destituída do cargo em 2016 pelo até então aliado Centrão.

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Este artigo foi escrito originalmente em alemão e publicado pelo  Neue Zürcher Zeitung [Aqui!].