Vazamentos de óleo em cadeia: contaminações e impunidade na Baía da Guanabara

Mancha de óleo na Baía da Guanabara atingiu colônia de pescadores em Jurujuba, Niterói Foto: Márcia Foletto

Por Camiela Pierobon para o “Nexo”

No dia 1º de outubro de 2024, um caminhão-tanque carregado com emulsão asfáltica colidiu com um caminhão-bitrem que transportava gasolina e óleo diesel, no quilômetro 130 da BR-116. A colisão ocorreu sobre o Rio Suruí, na comunidade de Suruí, em Magé — uma área de manguezal habitada historicamente por famílias de pescadores artesanais e catadores de caranguejo. O que poderia parecer um caso isolado, no entanto, revela as conexões entre acidentes cotidianos e os impactos de uma engrenagem maior: a da indústria petroquímica, marcada por recorrentes vazamentos de petróleo, óleos e produtos químicos nos corpos hídricos que chegam à Baía de Guanabara, Rio de Janeiro. Ainda não se sabe exatamente quanto material foi lançado no rio, que deságua diretamente na Baía. Estimativas apontam entre 20 e 50 mil litros de substâncias derivadas da indústria petroquímica foram despejadas nas águas e lamas do manguezal. Esse não foi um evento inédito: em 2018, o mesmo Rio Suruí já havia sido contaminado por outro acidente envolvendo um caminhão-tanque que derramou óleo diesel em suas águas.

Uma das primeiras pessoas a se deparar com o acidente foi Rafael Santos Pereira, presidente da ACAMM (Associação de Caranguejeiros e Amigos do Mangue de Magé) — e um dos principais interlocutores da pesquisa Pescando Plásticos, realizada junto ao Centro de Estudos Brasileiros Behner Stiefel da Universidade Estadual de San Diego, sobre os efeitos da indústria petroquímica na vida cotidiana dos pescadores artesanais da Baía de Guanabara. Em nossa conversa, Rafael chamou atenção para um dado importante: a colisão entre os caminhões não aconteceu em um dia qualquer. O 1º de outubro marca o início do defeso do caranguejo-uçá, período em que a captura é proibida por lei devido ao ciclo reprodutivo da espécie. Naquele momento, os corpos dos caranguejos estavam moles e expostos, sem a proteção rígida da carapaça, o que os tornava extremamente vulneráveis à contaminação. As fêmeas estavam carregadas de ovas, o que reforça a gravidade do impacto ecológico no processo reprodutivo da espécie. O episódio nos leva a refletir sobre os efeitos de longa duração que vazamentos de óleo — muitas vezes classificados como de pequeno porte — podem provocar em ecossistemas frágeis e interdependentes como os manguezais.

A colisão entre os caminhões não foi o único evento ocorrido em 2024. Em abril, um vazamento de tolueno — substância altamente tóxica derivada do petróleo — no rio Guapiaçu em Guapimirim interrompeu a captação de água no Sistema Imunana-Laranjal, responsável pelo abastecimento de cerca de dois milhões de pessoas em cidades da região metropolitana do Rio de Janeiro, como Niterói, São Gonçalo, Itaboraí e parte de Maricá. A contaminação aconteceu nas proximidades do ponto de captação do sistema, obrigando a Cedae (Companhia Estadual de Águas e Esgotos) a suspender temporariamente o fornecimento, gerando dias de incerteza e desabastecimento para a população urbana. Embora tenha ganhado alguma repercussão pública, um ano e meio depois, os responsáveis ainda não foram identificados nem responsabilizados.

Outros vazamentos, de escala muito menor, também ocorrem com frequência. Embora menos visíveis e espetaculares, são percebidos cotidianamente pelos pescadores artesanais que compartilham as informações por meio do aplicativo WhatsApp. É preciso destacar, também, os vazamentos derivados dos furtos de combustível a partir da perfuração dos dutos da Transpetro por grupos de milicianos. As manchas de óleo no espelho d’água, mudanças na coloração e no cheiro da água, além do gosto alterado do peixe, são sinais reconhecidos por quem conhece intimamente a Baía de Guanabara e as espécies que ali habitam. Ainda assim, esses vazamentos raramente são denunciados. Por conta das limitações legais e econômicas é praticamente impossível denunciar ou mesmo obter compensações financeiras por incidentes de pequena escala, mesmo que esses pequenos vazamentos os impactem diretamente. Diante disso, muitos pescadores optam pelo silêncio. Publicizar tais vazamentos pode desencadear desconfiança sobre a qualidade do pescado, afetando diretamente as vendas e, consequentemente, a renda das famílias que dependem da pesca para a manutenção de suas vidas.

A questão dos vazamentos de óleo na Baía de Guanabara envolve múltiplas escalas e temporalidades, refletindo um problema ambiental complexo e persistente

A questão dos vazamentos de óleo na Baía de Guanabara envolve múltiplas escalas e temporalidades, refletindo um problema ambiental complexo e persistente. O episódio mais emblemático diz respeito aos grandes desastres que deixaram marcas profundas na história da baía. Lembremos aqui do vazamento ocorrido em 18 de janeiro de 2000, quando aproximadamente um milhão e trezentos mil litros de óleo combustível foram despejados nas águas, cobrindo todo o fundo da Baía de Guanabara com uma densa camada de petróleo. O óleo se espalhou por cerca de 40 km², atingindo áreas protegidas, como a Área de Proteção Ambiental  (APA) de Guapi-Mirim, um ecossistema vital para a fauna e flora local.

O desastre dos anos 2000 permanece como uma ferida aberta na memória dos pescadores artesanais, que ainda hoje sentem os impactos psicológicos, sociais e ambientais decorrentes do vazamento. Para essas comunidades, o episódio não é apenas um registro histórico, mas uma realidade vivida que atravessa gerações, afetando a biodiversidade, a produtividade das espécies marinhas e, consequentemente, suas formas de subsistência e de vida compartilhada.

Na perspectiva dos pescadores, o desastre resultou em diversas violações. A primeira delas diz respeito ao próprio vazamento: mais de duas décadas depois, os pescadores afirmam que os impactos socioambientais ainda são sentidos. Os manguezais, segundo eles, nunca se recuperaram totalmente, e diversas espécies de peixes e crustáceos não voltaram a atingir a mesma diversidade e abundância de antes do desastre.

No caso dos caranguejeiros de Magé, a lembrança do vazamento de 2000 não é apenas simbólica — ela se materializa no próprio ato da “cata” do caranguejo. Ao “bracearem” — termo utilizado para descrever o gesto de afundar o braço na lama até alcançar os caranguejos em suas tocas —, é comum que encontrem resíduos de óleo a cerca de um metro de profundidade. Nas reflexões compartilhadas por eles, ainda que o desastre tenha ocorrido há 25 anos, suas consequências seguem presentes. As florestas de manguezal, segundo relatam, não conseguem se regenerar plenamente. As raízes não ultrapassam certa profundidade, o que impede o desenvolvimento saudável das árvores. Embora programas de reflorestamento estejam em curso, os pescadores observam que essas áreas se mantêm como “florestas eternamente jovens”: as árvores crescem até certa altura, os troncos permanecem finos, e, antes de amadurecerem, caem — dando lugar a novas árvores, que repetem o mesmo ciclo.

A segunda violação ocorreu no processo de compensação financeira. A Petrobras, como empresa responsável pelo derramamento de óleo, foi legalmente obrigada a fornecer indenizações aos pescadores pelos danos causados. No entanto, a grande maioria dos pescadores artesanais com quem conversei afirma que nunca recebeu essas indenizações. Eles relataram que apenas as grandes organizações de pesca foram convocadas para negociações, mas essas entidades não representam a maioria dos pescadores artesanais e não têm capilaridade na Baía de Guanabara. Além disso, denunciam que essas organizações cadastraram trabalhadores de outras áreas, como motoristas de ônibus e pedreiros, para receber as indenizações, enquanto os pescadores artesanais foram negligenciados nesse processo. Alguns pescadores acreditam que houve apropriação indevida desses recursos por parte dessas entidades. Esse é um tema que merece investigação aprofundada, tanto para responsabilizar os culpados se de fato houver, quanto para esclarecer as dúvidas sobre o que ocorreu naquele período.

Ampliar a compreensão sobre as responsabilidades da indústria petroquímica nos vazamentos de óleo implica considerar não apenas os grandes desastres ambientais que ganham destaque na mídia, mas também os de menor escala, como os envolvendo caminhões, furtos de combustível e os pequenos vazamentos que muitas vezes passam despercebidos do público mais amplo. Embora isoladamente esses episódios possam parecer pouco significativos, seu efeito acumulado ao longo do tempo representa uma ameaça concreta e contínua às bacias hidrográficas, aos ecossistemas sensíveis dos manguezais e à vida das comunidades pesqueiras que dependem desses ambientes para sua subsistência. Essa acumulação silenciosa contribui para o desgaste ambiental e social que se perpetua e se amplifica, muitas vezes invisível para o grande público. Reconhecer e investigar essas múltiplas escalas de impacto é fundamental para responsabilizar de forma justa os agentes envolvidos, promover a reparação das comunidades afetadas e orientar políticas públicas que protejam os territórios e assegurem a sustentabilidade desses ecossistemas vitais para a região metropolitana do Rio de Janeiro.

Camila Pierobon é pós-doutoranda PIPD/CAPES no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional (UFRJ). Integra os grupos de pesquisa NuCEC (Núcleo de Pesquisas em Cultura e Economia/UFRJ) e ResiduaLab (Laboratório de Estudos Sociais dos Resíduos/Uerj). A pesquisa que deu origem a este texto foi realizada com apoio do Centro de Estudos Brasileiros Behner Stiefel, da Universidade Estadual de San Diego.


Fonte: Nexo

Pescadores artesanais usam aplicativo para monitorar Baía de Guanabara

Tecnologia vai facilitar denúncias de vazamento de petróleo e gás

ahomar app

O aplicativo faz o mapeamento de onde estão os pescadores artesanais da Baía de Guanabara e onde estão ocorrendo violações socioambientais. | Imagem: Reprodução

Por Redação Ciclo Vivo

A tecnologia vai ajudar pescadores artesanais a proteger a Baía da Guanabara, símbolo do Rio de Janeiro e fonte de subsistência para milhares de famílias. Por meio do aplicativo “De Olho na Guanabara”, pescadores de toda a baía terão, ao alcance das mãos, uma forma de denunciar irregularidades ambientais ligadas, sobretudo, à indústria de petróleo e gás na região.

O aplicativo, desenvolvido pela 350.org e pela Associação dos Homens e Mulheres do Mar da Baía de Guanabara (Rede Ahomar), foi lançado na última sexta-feira (26), em um evento na Ilha de Paquetá, no Rio de Janeiro, com a presença de lideranças das comunidades pesqueiras e representantes dos governos municipal e estadual e do Ministério Público.

Baía de Guanabara
A Baía de Guanabara é um dos cartões postais do Rio de Janeiro e um ecossistema ameaçado pela poluição. Foto: Lucas Campoi na Unsplash

Dezenas de derrames e irregularidades ambientais ligadas à produção e ao transporte de combustíveis fósseis foram registrados na baía nos últimos anos, de maneira dispersa, pelos pescadores artesanais que circulam pelo local. No entanto, a maioria sequer foi investigada, por questões como a dificuldade em precisar o ponto do vazamento e a ausência de um canal que reúna os vários órgãos que precisam ser informados das ocorrências.

A ideia é que, pelo celular, os pescadores, moradores e ambientalistas tenham uma ferramenta de registro e denúncia dos frequentes impactos ambientais na Baía da Guanabara provocados pelo setor de petróleo e gás na região. Será possível compartilhar com as autoridades competentes fotos e vídeos dos vazamentos, bem como identificar por georreferenciamento o local exato dos derrames e em tempo real.

A denúncia, após verificação da coordenadoria da Rede Ahomar, ficará registrada no mapa e em um passo seguinte, será encaminhada para os órgãos de fiscalização oficiais do governo brasileiro (IBAMA, ICMbio, Marinha, entre outros).

Como denunciar

Desde o lançamento do aplicativo em prol da proteção e preservação da Baía de Guanabara, algumas denúncias já foram aprovadas e podem ser vistas neste mapa – destacadas em laranja. Isso porque cada ponto publicado foi verificado antes de se tornar público.

aplicativo Baía de Guanabara
Imagem: Reprodução

Para aproveitar ao máximo a ferramenta, os pescadores estão recebendo treinamento e acompanhamento do uso do aplicativo pela Rede Ahomar. Para registrar as denúncias, é preciso ser membro das associações de pescadores artesanais da região, se inscrever no site e receber uma senha de acesso. É uma forma de garantir a credibilidade dos registros. Outro ponto importante é que os dados dos denunciantes são protegidos, de forma a impedir que sofram represálias.

Veja como saber mais sobre o projeto De Olho na Guanabara, acompanhar as denúncias e ajudar a propagar as irregularidades, de forma a preservar este importante patrimônio natural. 


Fonte: Ciclo Vivo

Um mês depois de o tolueno interromper o abastecimento de água em cinco cidades do Rio, autoridades ainda não sabem onde produto químico vazou

Cedae continua a usar carvão ativado e realiza testes diários no Canal de Imunana, onde fica a captação da estação de tratamento que abastece mais de dois milhões de pessoas

sistemaSistema Imunana-Laranjal, em São Gonçalo, teve o funcionamento interrompido após ser constata a presença de tolueno na água — Foto: Fabiano Rocha/Agência O Globo

Por Jéssica Marques para “O GLOBO”

Um mês depois de um vazamento de tolueno, substância altamente tóxica, provocar o fechamento do Sistema Imunana-Laranjal, em São Gonçalo, e deixar mais de dois milhões de consumidores com as torneiras secas por pelo menos três dias, as autoridades ainda não descobriram a origem do produto químico. Apesar de o fornecimento de água ter sido normalizado, um estudo feito pelo Comitê da Bacia da Baía de Guanabara, em parceria com o laboratório de química da PUC-Rio e a ONG Guardiões do Mar, mostra que o tolueno ainda aparece, em baixa concentração, às margens e ao longo dos rios Guapiaçu e Macacu, que abastecem a estação de tratamento da Cedae. Um pontos de coleta em que a substância foi detectada fica na saída para a Baía de Guanabara.

Enquanto o mistério do tolueno não é desvendado, as medidas de segurança para manter o abastecimento estão sendo mantidas. A Cedae continua a usar carvão ativado no tratamento da água e realiza testes diários no Canal de Imunana, onde fica a captação. Também estão fechados pequenos canais para evitar que a água contaminada deságue nos rios Macacu Guapiaçu, na altura das regiões da Vala Preta e do Rio Preto, trecho onde foram encontradas as maiores concentrações de tolueno. A área é cercada por fazendas, vizinha ao gasoduto desativado da Petrobras e fica a três quilômetros do Canal de Imunana.

A medida de fechar os canais, no entanto, reduziu à metade o nível de água nos rios Guapiaçu e Macacu, que abastecem a estação de tratamento. Antes da crise, os cursos d’água tinham uma profundidade média de quatro metros, agora está com apenas dois, de acordo com o estudo. A Cedae descartou o risco de desabastecimento pelos próximos 30 dias, mas alertou que a estiagem que vem atingindo a região é preocupante. “Quanto aos próximos meses, a previsibilidade depende da meteorologia e do acompanhamento diário dos níveis dos rios”, afirmou a companhia em nota.

Medo do pescado

Moradores, fazendeiros e pescadores reclamam do bloqueio. Eles alegam prejuízos com os alagamentos das margens e a mortandade de peixes. Na última segunda-feira, a Associação Homens do Mar (Ahomar), uma organização criada para defender os direitos dos pescadores, convocou uma reunião com representantes de Inea, Ibama, Ministério Público Federal, Cedae e ICMBio para discutir medidas diante da possível contaminação dos pescados e dos manguezais.

— Houve uma mortandade muito grande no início de abril. As autoridades dizem que não há risco de ter pescado contaminado pelo tolueno, mas nenhum estudo foi feito que comprove essa afirmação. Desde que houve o vazamento, as pessoas estão com medo de comprar nossos peixes. Precisamos de respostas e, acima de tudo, de transparência — cobrou o presidente da associação, Alexandre Anderson.

O professor e oceanógrafo do Departamento de Química da PUC-RJ Renato Carreira, que conduziu o estudo sobre a presença de tolueno nos rios Guapiaçu e Macacu, explica que não há risco de contaminação dos peixes.

— O tolueno é um solvente, como é comercializado. Ele pode ser usado em tinta e tem várias aplicações na indústria. O fato de ser apenas tolueno na água, muda muito os impactos. Ou seja, ele por si só, em baixa quantidade, não é uma preocupação em contaminar pescado. O animal pode até ingerir o tolueno, mas, rapidamente, o elimina. A mortandade que aconteceu no início de abril segue também sendo um mistério — afirmou o professor.

A agricultora Maria Inez, de 54 anos, conta que, dias antes do surgimento do tolueno, uma tempestade causou uma enchente e deixou os canais cheios. Com o fechamento das comportas, a água não teve por onde escoar e ficou acumulada, atingindo plantações.

— Perdemos toda a safra do milho. Disseram que fariam uma negociação com os moradores sobre uma possível indenização pelas perdas, mas nada foi definido. Fizemos, então, uma nova plantação, que só deve estar pronta para colheita em julho. Isso, com certeza, vai atrasar a entrega da safra ao Ceasa para as festas de São João, além de encarecê-la — afirmou a agricultora.

A água que fica represada pelas barreiras apresenta coloração escura e mau cheiro. Bombas instaladas pelo Instituto Estadual do Ambiente (Inea) trabalham durante o dia para fazer um procedimento de aeração — que é a produção de oxigênio na água, o que ajuda na evaporação do tolueno. Segundo técnicos, o tolueno, por ser um solvente químico aromático, evapora facilmente. Ele é utilizado como matéria-prima na produção de cola, esmalte, perfumes, adesivos e corantes, além de estar presente em processos na indústria do couro, ramo historicamente presente na região afetada, devido à criação de bovinos em Guapimirim e Itaboraí, sendo também utilizado na fabricação de pesticidas e defensivos agrícolas. Beber um copo de água que contenha traço de tolueno (isto é, muito diluído) pode gerar náuseas e tontura. Já a ingestão regular de altas doses pode causar danos aos rins e ao fígado, levando até a casos de câncer.

Diante da falta de respostas, o Inea deve ampliar a área monitorada para os rios Guaraí (Guapimirim), Caceribu (Itaboraí) e Guaxindiba (São Gonçalo) nas próximas semanas, visando mapear se houve o derramamento da substância em outros pontos. A ideia é rastrear a presença do produto químico, que pode ter origem em outra cidade. A Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente (DPMA) já ouviu representantes de 26 empresas do Polo GasLub (antigo Comperj), mas a investigação ainda está em andamento.

O superintende do Ibama, Rogério Rocco, disse que o governo federal está disposto a ajudar a descobrir de onde vazou o tolueno:

— Os órgãos estão com dificuldade de encontrar a origem do vazamento. Por isso, está se pedindo uma apuração federal. Temos interesse federal em ajudar por se tratar de uma região que tem duas unidades de conservação, a APA de Guapimirim e a Baía de Guanabara. Desde então, temos nos reunido para discutir uma estratégia de ação federal.

Um desafio

Para Maurício Marinho, gestor da Área de Proteção Ambiental (APA) de Guapimirim e da Estação Ecológica Guanabara, disse que achar os responsáveis pelo vazamento é um desafio para o poder público:

— A situação mais crítica é que não se tem a origem de onde surgiu o produto, ainda que os níveis estejam caindo. Em 70 anos do funcionamento, o Sistema Imunana-Laranjal nunca precisou ser interrompido. E, até agora, não foi possível voltar à situação anterior. Além disso, os fazendeiros estão impedidos de produzir em uma área que equivale a mil campos de futebol. Quando se depara com a presença isolada de tolueno num vazamento, levanta-se a questão de quais seriam as atividades criminosas que estariam usando o componente em sua formação pura.

Procurado, o Inea ressaltou que atualmente “não há tolueno na área de captação e na estação de tratamento de água e que todo o entorno está sendo monitorado diariamente pela Cedae, pelo Inea e por outros órgãos”. A Cedae informou que seu último relatório não aponta a presença de tolueno na água tratada pela estação. O Sistema Imunana-Laranjal fornece água para consumidores de Niterói, São Gonçalo, Itaboraí, Maricá e Paquetá, na capital.


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Fonte: O Globo

Portal Viu produz reportagem mostrando as dúvidas que persistem sobre incidente do tolueno na Baía da Guanabara

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Depois de um mês da tragédia ambiental no Sistema Imunana-Laranjal, que abastece os municípios de Niterói, São Gonçalo, Itaboraí, Maricá, Ilha de Paquetá e Rio de Janeiro, as autoridades governamentais, de proteção ao meio ambiente e a Polícia Civil ainda não descobriram quem foi o responsável pelo vazamento do solvente químico tolueno no manancial.

O desastre chegou a provocar a interrupção na captação de água pela Cedae no dia 3 de abril, após ser detectada altas concentrações da substância tóxica no sistema hídrico.

O Portal Viu produziu uma excelente reportagem sob a batuta da competente jornalista Cláudia Freitas que segue publicada abaixo.

Presidente do Crea-RJ: ‘Poluição de tolueno que contaminou água de Niterói pode ter o mesmo impacto ambiental de Mariana e Brumadinho’

“O que aconteceu no manancial do segundo maior sistema de abastecimento de água do Estado do Rio, o Imunana-Laranjal, foi um desastre que pode ter o mesmo impacto ambiental das tragédias de Mariana e Brumadinho. O acidente mostra o risco atrelado à indústria petroquímica e a importância dos royalties pagos para que os órgãos públicos tenham condições de fazer ações de redução de risco. Isso não exime o fato de se descobrir os responsáveis e cobrar deles o ressarcimento pelos prejuízos”

CREA RJ TOLUENOO presidente do Inea, Renato Bussiere, o secretário de Ambiente, Bernardo Rossi, e o presidente do Crea-RJ, Miguel Fernández, no marco zero da contaminação de tolueno no Rio Guapiaçu 

Por CREA-RJ

A avaliação é do presidente do Crea-RJ, o engenheiro Miguel Fernández, que esteve em inspeção técnica no Canal Imunana, em Guapimirim (RJ). Acompanhado do engenheiro Miguel Fernández y Fernández, o presidente do Crea visitou nesta sexta-feira, dia 12 de abril, o marco zero da tragédia, no município de Itaboraí, onde há um acampamento com cerca de 200 pessoas, entre técnicos da Transpetro, Cedae, Inea, e de concessionárias como Águas do Rio, além de agentes da Polícia Ambiental e bombeiros.

O acampamento da gestão da crise do tolueno recebeu também visitas do secretário de Ambiente e Sustentabilidade estadual, Bernardo Rossi, do presidente do Instituto Estadual do Ambiente (Inea), Renato Jordão Bussiere, além de uma comissão da Alerj formada pelos deputados Rodrigo Amorim (PTB), Professor Josemar (Psol) e Luiz Paulo (PSD), que é engenheiro. O secretário de Ambiente afirmou que surgiu uma “lagoa de tolueno” numa área de 20 quilômetros quadrados, o equivalente ao município de Nilópolis, na Baixada. Naquele local, a quantidade do produto é de 800 microgramas por litro, quando o tolerável pelo Conama é de apenas 30.

Em reunião no trailer da Ambipar – contratada pela Petrobras – o deputado Luiz Paulo questionou o secretário de Ambiente sobre como as autoridades estão preparadas para lidar com uma chuva forte na região, que poderá aumentar a gravidade da contaminação. No caso de necessidade, os técnicos da Cedae informaram que estão prontos para suspender novamente o abastecimento de água do sistema Imunana-Laranjal. O secretário Bernardo Rossi disse reconhecer até a hipótese de fazer um desvio no canal.

O deputado Luiz Paulo lembrou que será preciso descontaminar todo o solo e ter um plano de contingência para que eventos como este não voltem a afetar o abastecimento de água.

“Vistoriamos toda aquela região e verificamos a gravidade do desastre ambiental com tolueno, que é um hidrocarboneto derivado do petróleo, em uma área bastante grande, fazendo fronteira com o Polo Gaslub. É necessário descontaminar todo o solo que está poluído e, mais ainda, ter um plano de contingência para que eventos como este não afetem o abastecimento de água”, afirmou o deputado Luiz Paulo, que sobrevoou a área com os deputados.

Técnicos da Cedae afirmam que a contaminação ameaça os manguezais da Baía de Guanabara. Vizinha à área do desastre, a APA de Guapimirim também está ameaçada, o que pode levar o MPF a entrar no caso.

Uma das barreiras instaladas para conter o tolueno no Rio Guapiaçu, em Itaboraí

Uma das barreiras instaladas para conter o tolueno no Rio Guapiaçu, em Itaboraí

A Cedae já conseguiu estabilizar a produção de água e zerar a contaminação no sistema Imunana-laranjal, mas o solo está contaminado. Basta uma chuva forte para colocar o sistema novamente em risco, prejudicando cerca de 2 milhões de pessoas.

O presidente do Crea-RJ, engenheiro Miguel Fernández, percorreu a área do Rio Guapiaçu contaminada por tolueno. Miguel constatou que a área está repleta de barreiras para conter o produto químico, que está concentrado numa área de cerca de 20 quilômetros quadrados, em fazendas próximas ao Polo Gaslub Itaboraí, da Petrobras, o antigo Comperj.

Os técnicos da Cedae explicaram ao presidente do Crea que a produção da água foi estabilizada. A água do Canal Imunana — que faz parte do sistema de abastecimento de Niterói, São Gonçalo, Itaboraí, Maricá e Paquetá – está sendo monitorada de hora em hora, na captação, em Guapimirim, com o emprego de um medidor de oxigênio dissolvido on-line. Na estação de bombeamento, técnicos da Cedae trabalham diuturnamente colocando carvão ativado para purificar a água. No início foram usadas 30 bolsas de 500 quilos cada. Na sexta-feira, os técnicos estavam empregando 12 bolsas.

O Sistema Imunana-Laranjal é composto pelo Canal de Imunana, que capta e leva a água dos rios Guapiaçu e Macacu até a elevatória de água bruta através de um canal no município de Guapimirim. A água é então bombeada até a Estação de Tratamento de Água (ETA) do Laranjal.


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Fonte: CREA-RJ

Projeto da Uerj estuda tartarugas como indicadores de poluição na Baía de Guanabara

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Pesquisa do Laboratório de Genética Marinha (LGMar), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), examina a poluição na Baía de Guanabara através da observação de tartarugas-verdes na região. No mês de agosto, um artigo com os resultados do trabalho realizado em 2022 foi publicado em um periódico científico. O estudo identificou bactérias também patogênicas humanas nas amostras, ou seja, que podem causar doenças em seu hospedeiro. 

Ainda no segundo semestre de 2023, a equipe realizou a segunda edição da campanha “Caminhos das tartarugas cariocas”, coletando e analisando 84 animais nas águas da Marina da Glória e da Fortaleza de São João, zona sul do Rio de Janeiro, e no Clube Naval de Charitas, em Niterói. No momento, os pesquisadores examinam esses dados para, posteriormente, divulgar novas conclusões.

Tartarugas como biomonitores

Na literatura científica, biomonitores geralmente são organismos tolerantes à contaminação ambiental, que respondem simultaneamente a diferentes agentes poluentes, refletindo, assim, o nível de degradação do ecossistema.

De acordo com os pesquisadores, a tartaruga-verde (Chelonia mydas) é a espécie mais abundante no litoral brasileiro, é longeva e passa a maior parte da vida em ambientes costeiros, exposta a bactérias resistentes a antibióticos, oriundas do escoadouro humano, o que a torna um bom indicador de poluição marinha.

Durante a ação, a equipe, composta por alunos de Biologia e Oceanografia, além de servidores técnicos da Universidade, utilizou uma rede com malha apropriada para capturar as tartarugas. Em seguida, elas foram medidas, examinadas e tiveram amostras de seu tecido recolhidas para estudos genéticos e microbiológicos.

O perigo da resistência antimicrobiana

Segundo Gisele Lobo Hajdu, coordenadora do projeto e professora do Instituto de Biologia Roberto Alcântara Gomes (Ibrag), da Uerj, a investigação surgiu da necessidade de estudar a resistência antimicrobiana (RAM), que ocorre quando microrganismos são expostos a antibióticos, utilizados para tratar as infecções, em particular, as de origem bacteriana. Como consequência, os medicamentos se tornam ineficazes e surgem as superbactérias.

A resistência antimicrobiana é um problema de saúde pública há algum tempo. O uso sem controle de antibióticos na criação de animais para consumo humano é uma das maiores fontes de resistência microbiana. A RAM pode causar mortes e dificultar o controle de doenças infecciosas, ameaçando a saúde e a economia, devido aos altos custos com o tratamento por essas infecções. “Dada a troca frequente de bactérias e genes de resistência aos antimicrobianos entre espécies e ambientes, é crucial compreender e identificar as ligações entre os organismos humano, animal e ambiental”, explica a bióloga.

Trabalho durante o ano

As amostras são trabalhadas ao longo do ano, identificando os vários contaminantes presentes no tecido, sangue e fluidos dos animais. Além do trabalho de coleta, os alunos da Uerj promovem atividades de conscientização a respeito da poluição dos mares, com exposições, feiras de ciências e mutirões de limpeza das praias.

O projeto conta com a participação de pesquisadores das universidades Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Federal Fluminense (UFF), Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e da ONG Caminho Marinho.

Baía da Guanabara, um paraíso intoxicado pela indústria do petróleo e gás

No dia 11 de novembro publiquei neste blog um texto sobre a situação de calamidade criada na Baía da Guanabara pela indústria de petróleo e gás que transformou um rico ecossistema em uma zona aberta de sacrifício, com a instalação de múltiplos terminais e pontos de despejos de todo tipo de poluição química. Pois bem, no dia de ontem, o jornal O Globo publicar uma matéria intitulada “Paraíso hostil: óleo, lixo, esgotos e efluente tóxicos. tudo vai parar na Baía da Guanabara” de autoria do jornalista Rafael Galdo (ver imagem abaixo).

paraiso hostil 1

A matéria faz uma descrição bem elaborada dos diferentes tipos de fontes de lançamento de poluentes no interior do ecossistema da Baía da Guanabara, e traz um mapa que aponta para a situação razoavelmente heterogênea em termos de níveis de degradação, bem como os principais “players” envolvidos na chegada de substâncias químicas que afetam a vida em uma região de alto interesse ecológico (ver mapa abaixo).

paraíso tóxico

O interessante é que, muito em função da ação de monitoramento realizado pela Associação Homens do Mar da Baía da Guanabara (Ahomar), há um conhecimento relativamente forte das principais fontes de poluição em pontos principais da baía. Tal conhecimento deveria estar permitindo, por exemplo, que órgãos ambientais (i.e., INEA e IBAMA) realizassem ações para coibir atividades ilegais e que atentam contra a integridade ecológica da Baía da Guanabara.  Entretanto, como relatado na matéria assinada por Rafael Galdo, isto aparentemente não está ocorrendo na forma e intensidade necessárias para se evitar uma degradação ainda maior.

O que me parece evidente é que além dos problemas já tradicionais de lançamento de esgotos in natura e de lixo, o crescimento desenfreado e descontrolado das atividades de petróleo e gás representam atualmente o maior risco ambiental e social não apenas para o interior da Baía da Guanabara, mas também para os mais de 11 milhões de habitantes localizados no seu interior ou entorno. 

Apesar deste ser um tema “batido”, me parece que em 2022 há que se cobrar uma ação mais diligente dos órgãos ambientais e também da comissão de meio ambiente da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), na medida em que os riscos existentes poderão gerar ainda um evento de grandes proporções no interior da Baía da Guanabara.

Finalmente, há que se enfatizar a importância do trabalho do pescadores da Ahomar que estão desenvolvendo ações de monitoramento das atividades poluidoras, sem as quais não teríamos como saber o que está acontecendo em um dos mais belos cartões postais do Brasil que foi transformado em “paraíso hostil”.

Pescadores denunciam que novo vazamento de óleo próximo da Reduc lançou mais poluição na Baía de Guanabara

oleo rio iguaçu

Ontem (08/12/2021) ocorreu novo vazamento de óleo próximo à Refinaria Duque de Caxias (REDUC) que atingiu o rio Iguaçu, o manguezal e as águas da Baía de Guanabara, além de atingir aquele Território Pesqueiro de onde os pescadores artesanais tentam diariamente tirar o sustento de suas famílias. O fato foi comunicado nesta tarde pela coordenação do Baía Viva por meio de WhatsApp ao Secretário Estadual do Ambiente e Sustentabilidade (SEAS), Thiago Pampolha, e ao presidente do Instituto Estadual do Ambiente (INEA), Philipe Campelo, para os quais foi enviado um vídeo feito hoje no local, com pedido de providências para apurar a origem do vazamento de óleo e avaliar o dano ambiental e os impactos ao Território Pesqueiro.

Desde 2020, a partir de denúncias feitas em conjunto pela Colônia de Pesca de Duque de Caxias e o Movimento Baía Viva, o Ministério Público Federal de São João de Meriti apura as responsabilidades pelo despejo ilegal de substância química denominada pelos pescadores de “Água Vermelha” que vez por outra tem vazado para a Baía de Guanabara.

Também desde o ano passado, por denúncias feitas pelas duas organizações, o MPF de São João de Meriti apura as responsabilidades pelo vazamento de substâncias químicas pela BRASKEM que tem vazado periodicamente de forma ilegal para as águas da Baía de Guanabara.

“Estamos em plena Década do Oceano e da Restauração dos Ecossistemas (ONU, 2021-2030), mas infelizmente as baías fluminenses continuam sendo sacrificadas pela poluição industrial, esgotos não tratado e lixo. As comunidades pesqueiras passam por forte empobrecimento provocado pela intensa e crescente poluição; e muitas famílias de pescadores estão passando por insegurança alimentar. Até quando esta Impunidade Ambiental vai continuar!?”, ressalta indignado Sérgio Ricardo Potiguara cofundador do Baía Viva .

Vários vídeos sobre a poluição provocada pela REDUC e a BRASKEM estão disponíveis no canal YouTube Baía Viva Movimento e no site: http://www.baiaviva.com

Baía da Guanabara: de área paradisíaca à latrina da indústria do petróleo e gás

Diz a lenda (ou seria a história) que quando os conquistadores portugueses chegaram à Baía de Guanabara em 1502 a confundiram com um grande rio, o que veio a dar o nome à cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Mas a despeito da eventual confusão, o encontro com aquele ecossistema causou forte impacto nos portugueses, na medida em que sua beleza só era par para a riqueza da vida marinha, fato esse que explicava o fato de existirem populações originárias que viviam do que retiravam do interior da baía.

Passados pouco mais de quinhentos anos, a Baía da Guanabara ainda me impacta, pois parte de sua beleza tem sobrevivido ao aumento exponencial das fontes de agressão ambiental ao seu rico ecossistema. Cruzar a ponte que une as cidades do Rio de Janeiro e Niterói é sempre um momento de contemplação, pois a baía ainda é bela. 

Entretanto, a realidade objetiva é que a Baía da Guanabara foi transformada em uma espécie de latrina química a céu aberto, seja pela inexistência de um sistema de esgotos sanitários que colete e trata os rejeitos urbano-industriais que são diariamente lançados “in natura” nas suas águas.  Entretanto, um elemento que agravou fortemente a degradação da Baía da Guanabara foi sua transformação em um dos principais (senão o principal) nós da indústria de petróleo e gás no Brasil, o que implicou na construção de um grande número de estruturas (ver abaixo mapa produzida pela Marinha Brasileira, prestando atenção nas linhas de cor rosa).

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Apenas à guisa de um exemplo mais detalhado é interessante ver o mapa produzido pela Petrobras mostrando a localização dos diversos terminais destinados à armazenagem de Gás Liquefeito de Petróleo (GLP) no interior da Baía da Guanabara (ver figura abaixo).

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Mas os riscos potenciais de explosões e vazamentos causados pela forte aglomeração de estruturas de armazenamento e transporte tem sido agravado por operações diárias de manutenção de navios e plataformas que, muitas vezes ocorrem de forma despercebida e ilegal. Tais operações despejam todo tipo de produto químico nas águas da Baía da Guanabara, sem que haja a devida fiscalização pelos órgãos ambientais (a começar pelo IBAMA).

Felizmente, por iniciativa da Associação Homens do Mar da Baía da Guanabara (Ahomar) que criou a chamada “Patrulha Ambiental da Pesca”, estamos tendo a oportunidade de ter acesso a uma documentação visual dessas operações que envolvem desde o descarte de poluentes até o fundeio ilegal de dezenas de navios  (ver vídeos abaixo)

O fato é que todo esse custo ambiental não tem como ser compensado, visto que não apenas o montante de poluição  causada pela indústria de petróleo e gás que chega na Baía da Guanabara está sendo omitido pelas petroleiras (a começar pela Petrobras) que a transformaram em uma latrina tóxica a céu aberto.  O problema é que além de ter sido transformada em uma latrina tóxica (e objetivamente em uma espécie de bomba relógio), a Baía Guanabara possui um potencial altamente explosivo, o que é exponencializado pela proximidade entre si dos múltiplos terminais que foram construídos em seu interior.

Aliás, há que se lembrar que apenas o “bairro/cidade” da Ilha do Governador possui hoje uma população estimada em torno de 200 mil pessoas que estão hoje literalmente de “cara para o gol” em caso de algum tipo de incidente de maiores proporções no interior da baía. O caso da Baía da Guanabara é um excelente exemplo empírico do que seria a “Doença Holandesa” O problema é que, talvez de forma inédita, em seu ecossistema estão hoje colocados todos os elementos (e em condição agravada) dos impactos derivados da exploração do petróleo e gás no chamado Sul Global.

Denúncia: Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos demora a agir após crime no Rio de Janeiro

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Por Flávia Lima Moreira para o arayara

O pescador e defensor climático Alexandre Anderson enfrentou uma situação de alto risco na última semana. Seu irmão, Anísio Souza foi executado a menos de mil metros de sua casa na quinta-feira, 12, em Magé, na baixada Fluminense. Ao saber do crime, Alexandre procurou imediatamente contato com o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDH). Esperou mais de 9 horas para obter o primeiro retorno.

“Estamos chocados. Ficamos sem escolta. Expostos. Passaram duas viaturas em frente às nossas casas, mas sequer pararam. Estamos permanentemente em risco”, relatou Alexandre Anderson, atual presidente da AHOMAR (Associação Homens e Mulheres do Mar da Baía de Guanabara), organização comunitária que trabalha pela garantia dos interesses dos pescadores, incluindo os direitos a pescar nas áreas permitidas por lei sem sofrer intimidações e de seguir denunciando a poluição causada por empresas dos setor fóssil.

Alexandre Anderson enfrenta uma constante luta contra os incorporadores de terras, os interesses corporativos e as autoridades governamentais. Em função de seu ativismo, foi vítima de dois atentados. Outros membros da AHOMAR já foram assassinados.

Em fevereiro de 2020, ele participou de um encontro de Defensores Climáticos que aconteceu em Curitiba. Ao lado de Alexandre, estiveram presentes na capital paraense defensores climáticos de mais de 20 países de todos os continentes.

Diante desse passado recente a demora no atendimento PPDH soa ainda mais preocupante.

O crime

No início da noite de quinta-feira, 12, às 20h, na praia de Mauá, em Magé, o ex-pescador artesanal Anísio Souza foi executado. Abordado no portão em frente à sua casa, ao chegar do trabalho, com seu filho Cristian, de seis anos de idade, Souza foi alvejado com diversos tiros que atingiram sua cabeça. Segundo testemunhas, os tiros foram disparados por homens encapuzados que estavam em um Onix prata. Aos 47 anos, Anísio Souza deixa esposa e três filhos.

A violência e brutalidade do assassinato chocaram a comunidade pesqueira local. Os relatos dos moradores são de medo, insegurança e ausência do Estado.

Lado a lado os irmãos fizeram, por anos, o necessário enfrentamento pela defesa do meio ambiente e pela manutenção dos territórios pesqueiros.

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Este texto foi originalmente publicado pelo Instituto Internacional Arayara [Aqui!].