Em manifesto, organizações repudiam financiamento do Banco do Brasil à gigante da carne BRF

ONGs assinam carta de repúdio a linha de crédito bilionária e apontam falta de compromisso da instituição com o combate à crise climática

caged chickens

São Paulo, 19 de dezembro de 2022 — Organizações de proteção animal e de defesa do consumidor assinam manifesto enviado ao Banco do Brasil repudiando a renovação de linha de crédito no valor de R $1,5 bilhão para a BRF, uma das maiores empresas processadoras de carne do mundo. As organizações alegam que o empréstimo vai na contra-mão da sustentabilidade e que a instituição deve passar a redirecionar suas concessões de crédito a modos de produção agrícola sustentáveis.

“É inadmissível que uma instituição como o Banco do Brasil vá na direção oposta de todas as recomendações para uma economia sustentável que ajude o Brasil a mitigar os efeitos da crise climática”, afirma Taís Toledo, gerente de relações corporativas da Sinergia Animal, organização internacional de proteção animal e uma das signatárias da carta. 

Além da Sinergia Animal, também assinam a carta o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal, a World Animal Protection, a Mercy for Animals, Animal Equality e o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor.

O agro e a crise climática

Conforme as organizações relatam em seu manifesto, para que se atinja as metas do Acordo de Paris e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, segundo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), de 2021, deve haver uma transição significativa dos atuais modos de produção de alimentos para práticas mais sustentáveis, baseadas mais na produção de vegetais e menos na de carne animal.

“A indústria agropecuária representa justamente o oposto do que devemos almejar para evitar a completa catástrofe climática. Ela é uma das principais responsáveis pela perda de biodiversidade, pelo desmatamento e por cerca de um terço de todas as emissões globais de gás metano”, afirma Toledo. A longo prazo, o gás metano possui um impacto até 25 vezes maior do que o de dióxido de carbono.

Segundo o relatório do IPCC, se não houver reduções imediatas e em larga escala nas emissões de gases de estufa, evitar que o aumento de temperatura em 1,5°C ou 2°C pode ser impossível. “Quando se trata da pecuária, o CO2 é emitido principalmente por mudanças no uso da terra – por exemplo, o desmatamento para abrir áreas para pastagem ou cultivo de grãos, como a soja, para alimentação animal – enquanto o metano é predominantemente resultado da digestão dos animais explorados para consumo humano”, relatam as ONGs em seu manifesto.

A percepção dos brasileiros sobre o clima

“81% dos brasileiros acima de 18 anos consideram a crise climática uma questão importante, segundo o IPEC. Por isso, não podemos aceitar nem nos calar quando instituições como o Banco do Brasil usam o dinheiro do cidadão brasileiro para agredir a segurança das futuras gerações do meio-ambiente nacional”, explica Toledo. Ainda segundo o levantamento do IPEC, de 2021, 77% dos brasileiros atribuem o aquecimento global principalmente à ação humana. 

“Assim, pedimos que o Banco do Brasil faça um reconhecimento público da necessidade de se afastar de financiamentos na produção pecuária intensiva e de redirecionar as concessões de crédito a práticas agrícolas sustentáveis”.

Sobre a Sinergia Animal:

A Sinergia Animal é uma organização internacional que trabalha em países do Sul Global para diminuir o sofrimento dos animais na indústria alimentícia e promover uma alimentação mais compassiva. A ONG é reconhecida como uma das mais eficientes do mundo pela renomada instituição Animal Charity Evaluators (ACE)

Indústria da carne perda US$ 130 milhões em uma semana. Que percam muito mais!

O jornal “O ESTADO DE SÃO PAULO” publicou ontem uma matéria assinada pelos jornalistas Cristián Favaro e José Roberto Gomes dando conta que apenas em uma semana os exportadores de carne perderam a bagatela de US$ 130 milhões por causa das fraudes reveladas pela operação “Carne Fraca” da Polícia Federal (Aqui!)

carne podre

A minha reação a esta notícia? Que percam mais, muito mais! É que por detrás da choradeira disseminada pela A Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) existe uma ampla rede de cumplicidades com todas as consequências trazidas pela forma com que essa indústria se oligopolizou no Brasil. 

E essas consequências incluem desmatamento na Amazônia, trabalho escravo, condições degradantes dentro das plantas industriais, poluição de corpos hídricos, mal trato animal, e por aí vai.

Aliás, já disse e repito: as revelações trazidas pela “Carne Fraca” tornam mais atual do que nunca a discussão da realização de uma ampla reforma agrária para que possamos passar para um modelo mais sustentável e socialmente mais justo de produção de alimentos. É que, ao contrário do que tem sido imposto pelo latifúndio agro-exportador, existem saídas para todos os males que são causados pela dependência da nossa economia à formas que são social e ambientalmente degradantes como é o caso do modelo dos “Campeões Nacionais” que turbinaram a JBS FRIBOI e a BRF.

E não esqueçamos que se esse caso fosse na China ou nos EUA, as repercussões contra os responsáveis por elas variariam do fuzilamento à prisão perpétua. Enquanto isso, aqui no Brasil o que vemos é o apelo oportunista a um nacionalismo xinfrim cuja finalidade é evitar quaisquer punições aos controladores dessas corporações que apostaram na impunidade para aumentar seus lucros já astronômicos.

E para quem quiser se informar mais sobre os graves problemas que cercam a indústria da carne, sugiro a leitura do livro “Cadeia Industrial da Carne” que pode ser baixado (Aqui!).

Por que a defesa nacionalista da indústria da carne é um tremendo “nonsense”

O escândalo de grandes proporções econômicas que foi desencadeado pela operação “Carne Fraca” da Polícia Federal do Paraná está servindo como pano de fundo para um debate de cores nacionalistas para a defesa da indústria da carne, envolvendo até setores da esquerda brasileira.

Como alguém que já esteve em várias plantas industriais e coletou dados sobre as linhas de aquisição de gado bovino nos estados de Goiás, Mato Grosso e Rondônia, considero essa uma discussão que beira o completo “nonsense”.  É que além dos graves danos ambientais associados à expansão da pecuária extensiva, temos ainda problemas com o trabalho escravo, o massacre dos povos indígenas, e ainda as condições degradantes que cercam o trabalho dentro dessas plantas industriais.

Uma informação que eu raramente ofereço é que diminui bastante o consumo de carne bovina depois de realizar um périplo de mais de 8.000 Km nos estados de Goiás, onde pude ver de perto as condições em que os animais eram transportados para serem abatidos nas plantas industriais. Uma visão que particularmente me impressionou foi o gado apertado em currais embaixo de um sol escandante e faminto. Tudo isso para agilizar  o processo de abate e passagem pela linha de produção, coisa que me foi dita duraria questão de minutos após o animal ser morto.

Além disso,  há o fato de que grupos como o JBS/FRIBOI e BRF se tornaram gigantes da indústria da carne, tendo se alastrado por vários continentes onde controlam parte não apenas do comércio, mas também da produção. Esse perfil de empresa que está presente nos mercados globais tem perfeito conhecimento dos riscos que se corre ao adulterar produtos para posterior comercialização.  Em outras palavras, de nacional mesmo só a mais valia que elas extraem a partir da apropriação da Natureza e da exploração dos trabalhadores.

Além disso, por mais localizado que seja o problema da venda de produtos impróprios, este é o menor dos problemas envolvendo a oligopolização do comércio da carne animal, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo.

Antes de fazer qualquer defesa dessas marcas, o que a esquerda deveria estar questionando é o modelo produtivo que possibilitou a ascensão do Brasil no mercado global da carne animal, e de todos os custos sociais e ambientais que esse processo acarretou. 

Mas que ninguém espere de mim a defesa dessas corporações, pois elas já tem os governos e a mídia corporativa.  Particularmente me preocupo apenas com suas vítimas diretas (os ecossistemas naturais, pequenos agricultores e povos indígenas) e indiretas (nós, os consumidores de seus produtos caros e adulterados).

Finalmente, que pelo menos esse escândalo sirva para que possamos voltar a tratar de forma séria a questão da reforma agrária e do processo de produção de alimentos com um duplo olhar sobre a proteção do ambiente e da saúde dos cidadãos transformados em consumidores. É que a Carne Fraca mostra que o sistema de produção de alimentos ensejado pela Revolução Verde está caindo de podre.

Carne, Osso: documentário sobre moedor de gente da indústria da carne no Brasil

Para quem está ficando penalizado com a situação das empresas da indústria da carne flagradas adulterando seus produtos para manter suas fantásticas taxas de lucro, estou postando abaixo o documentário “Carne, Osso” produzido pela ONG  Repórter Brasil para mostrar as condições absurdamente duras que prevalecem no trabalho cortidiano dentro 

dos s frigoríficos brasileiros de abate de aves, bovinos e suínos (Aqui!).

O documentário mostra que quem trabalha em um frigorífico se depara diariamente com uma série de riscos que a maior parte das pessoas sequer imagina. Tais riscos incluem a exposição constante a facas, serras e outros instrumentos cortantes; realização de movimentos repetitivos que podem gerar graves lesões e doenças; pressão psicológica para dar conta do alucinado ritmo de produção; jornadas exaustivas até mesmo aos sábados; ambiente asfixiante e, obviamente, frio – muito frio.

 Ao longo de dois anos, a equipe da ONG Repórter Brasil percorreu diversos pontos nas regiões Sul e Centro-Oeste à procura de histórias de vida que pudessem ilustrar esses problemas.  O filme alia imagens impactantes a depoimentos que caracterizam uma realidade que deve ser encarada com a devida seriedade pela iniciativa privada, pela sociedade civil e pelo poder público.

Talvez após assistir a este documentário, possamos ter um debate mais qualificado sobre o consumo da carne e seus impactos sociais e ambientais no Brasil. E além disso, espero que ninguém mais caia na ladainha de que os donos dessas empresas representam algum tipo de injustiçado social após a ação da Polícia Federal.

 

Justiça do Trabalho condena BRF ao pagamento de R$ 1 milhão por trabalho análogo ao escravo

MPT/PR flagrou condições análogas à escravidão em fazenda de reflorestamento arrendada pela BRF Foods

BRF Foods/Divulgação

O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região apreciou recurso ordinário e julgou procedente ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho para condenar a “BRF Foods” – dona das marcas “Sadia” e “Perdigão” – ao pagamento de indenização por danos morais coletivos, fixada em R$ 1 milhão.

Caso – De acordo com informações do MPT, fiscalização promovida pelo órgão, em 2012, apurou irregularidades e práticas análogas à escravidão numa fazenda localizada no município de Iporã, que era arrendada pela empresa alimentícia.

O Ministério Público do Trabalho constatou, dentre outras irregularidades, jornada excessiva, condições precárias dos alojamentos e contaminação da água fornecida aos trabalhadores para consumo.

Signatário da ação, o procurador do Trabalho Diego Jimenez Gomes falou sobre as irregularidades: “A situação encontrada configura trabalho degradante, já que foram desrespeitados os direitos mais básicos da legislação trabalhista, causando repulsa e indignação, o que fere o senso ético da sociedade”.

A empresa alimentícia arguiu, em sede de contestação, que as atividades de reflorestamento eram feitas por empresa terceirizada, o que afastaria, em tese, a sua responsabilidade.

Decisão – O TRT-9 não acolheu as razões de defesa da empresa, destacando que a empresa também é responsável pela garantia de um meio ambiente de trabalho saudável. 

Além da condenação cível, a BRF Foods deverá cumprir diversas obrigações quanto à higiene, saúde, segurança e medicina do trabalho em relação a todos os trabalhadores que, de forma direta ou indireta, atuem na atividade de reflorestamento.

BRF Foods – A BRF é oriunda da fusão entre as empresas alimentícias Sadia e Perdigão, além de ser detentora de outras marcas, como “Batavo”, “Elegê” e “Qualy”. A empresa possui  49 fábricas e  mais de 100 mil funcionários no país.

Em 2013 a receita líquida da BRF Foods foi R$ 30,5 bilhões e o lucro líquido consolidado foi de R$ 1,1 bilhão.  

FONTE: http://www.fatonotorio.com.br/noticias/justica-do-trabalho-condena-brf-ao-pagamento-de-r-1-milhao-por-trabalho-escravo/18351/