Em coletiva representantes da Mineradora Samarco (Vale+ BHP Billiton) reconhecem risco de rompimento de barreiras remanescentes em Mariana

Diretor da Samarco diz que não é o caso de pedir desculpas à população

De acordo com o diretor de operações e infraestrutura da mineradora, Kleber Terra, o momento é de continuar apurando as causas do acidente e priorizar o atendimento estrutural às vítimas
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FOTO: MARIELA GUIMARAES / O TEMPO Representantes da Samarco durante entrevista coletiva

JULIANA BAETA

“Não é o caso de pedir desculpas à população de Mariana”, disse o diretor de operações e infraestrutura da Samarco, Kleber Terra, sobre a tragédia causada pelo rompimento da barragem do Fundão, durante coletiva nesta terça-feira (17) para tratar da segurança das outras barragens que estão em risco. Segundo ele, o momento agora é de continuar apurando as causas do acidente e priorizar o atendimento estrutural às vítimas. A coletiva aconteceu na unidade industrial de Germano, em Mariana.

A empresa admitiu, 11 dias após o rompimento da barragem de Fundão, que as outras duas barragens vizinhas – Germano e Santarém – foram abaladas com o acidente, correm risco de arrebentar e estão passando por manutenções de urgência. Para conter os riscos de rompimento na barragem de Germano, os trabalhos irão durar cerca de 45 dias.

De acordo com Terra e os demais representantes da mineradora presentes na coletiva, José Bernardo, engenheiro civil geotécnico, e Germano Lopes, gerente geral de projetos estruturantes, a margem de segurança das barragens de Santarém e de Selinha é de 20% a mais do recomendado pela norma brasileira, que determina um fator de segurança de 1,5 em condições normais, e de 1,3 em condições adversas.

Os trabalhos da empresa, segundo os a Samarco, estão concentrados no reforço das estruturas para que um novo rompimento não aconteça. Blocos de rocha serão retirados de minas da própria mineradora para que sejam feitos os aterros de reforço no complexo de Germano.

“Tem o risco e nós, para aumentarmos o fator de segurança e reduzirmos ele, estamos fazendo as ações emergenciais necessárias. São blocos de rocha, que nós tiramos da mina e levamos para o local pra fazer o aterro de reforço das estruturas. O aterro será construído de baixo para cima, para escorar o dique”, explicou o engenheiro civil geotécnico José Bernardo. 

FONTE: http://www.otempo.com.br/cidades/diretor-da-samarco-diz-que-n%C3%A3o-%C3%A9-o-caso-de-pedir-desculpas-%C3%A0-popula%C3%A7%C3%A3o-1.1171298

Tragédia de Mariana: Associação Brasileira de Antropologia lança documento público sobre o incidente

SOBRE O ROMPIMENTO DAS BARRAGENS DE REJEITO EM MARIANA, MINAS GERAIS

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A Associação Brasileira de Antropologia (ABA) vem a público manifestar seu pesar e sua solidariedade a todas as vítimas, humanas e não humanas, do rompimento das barragens de rejeitos Fundão e Santarém em Mariana, Minas Gerais. Como associação científica cujas pesquisas se referem, em muitas situações, a comunidades atingidas por grandes empreendimentos minerários, vimos nos somar às vozes da sociedade brasileira que exigem a responsabilização das empresas envolvidas, Vale-BHP Billinton- Samarco, bem como cobrar a celeridade nas ações voltadas para o restabelecimento das vidas dos ecossistemas e comunidades atingidas. Lembramos, neste último caso, que não se trata apenas de indivíduos que perderam casas e propriedades, mas de coletividades que, ao longo da bacia do Rio Doce, assistem ao desaparecimento das condições que sustentavam suas práticas, usos e formas de viver.

Enfatizamos a trágica situação das comunidades Paracatu de Baixo e Bento Rodrigues, sendo que essa última, soterrada, teve a especificidade do seu ser, fazer viver, bruscamente interrompida com esse incidente.

Ressaltamos que estudos antropológicos têm evidenciado muitas falhas no licenciamento ambiental de grandes obras, incluindo os projetos de mineração. Estudos de Impacto Ambiental geralmente falhos e mal feitos; licenciamentos fragmentados; licenças concedidas com número excessivo de condicionantes, as quais nem sempre são cumpridas nas fases apropriadas do licenciamento; ausência de participação efetiva da sociedade civil e, sobretudo, dos grupos atingidos; audiências públicas que não cumprem a sua função precípua, mas ocorrem como mero dispositivo burocrático – no que tem se transformado, por fim, o processo de licenciamento como um todo -, são alguns dos elementos destacados por pesquisadores desta Associação.

Algumas dessas características podemos, desde já, reconhecer no licenciamento das estruturas operadas pela Samarco e implicadas no rompimento das barragens. Verifica-se, inicialmente, uma confusão entre as licenças concedidas, suas revalidações e fusões, com sobreposições de projetos, o que dificulta a avaliação de viabilidade socioambiental das sucessivas intervenções, em especial seus efeitos sinérgicos e cumulativos, o que enseja o subdimensionamento dos impactos.

O Relatório de Impactos Ambientais do Projeto Unificação e Alteamento das Barragens de Rejeito Germano e Fundão indicava, por sua vez, a necessidade de ampliação das barragens existentes ou da implantação de novas barragens para atender à operação de uma usina que já se encontrava em instalação. Isso evidencia que a empresa havia investido na ampliação da capacidade de produção, negligenciando o aumento dos riscos envolvidos.

A desconsideração da população afetada é outro aspecto que deve ser destacado. Na fase da Licença Prévia e da Licença de Instalação para Alteamento e Unificação das Barragens de Germano e Fundão, a Samarco S/A afirmou, ao classificar os impactos face às expectativas geradas na população, que não identificou durante os estudos ambientais receio da população entrevistada, em relação ao risco ou à segurança das barragens de Germano e Fundão. Ora, essa afirmação, contrariada por outros estudos já realizados na comunidade de Bento Rodrigues, é bastante grave, pois levou à classificação de impactos como de baixa magnitude, com a previsão de apenas um programa de comunicação social para mitigação dos efeitos, medida mínima e insuficiente.

O estudo desses licenciamentos deixa transparecer um longo caminho ainda a ser percorrido para a efetivação dos direitos humanos socioambientais, garantidos na Constituição de 1988 e em diversos tratados internacionais, dos quais o Brasil é parte. A luta dos(as) trabalhadores(as), movimentos socioambientais e das comunidades impactadas por grandes empreendimentos requer que esses novos direitos sejam incorporados ao Direito Minerário. Por influência do setor minerário, evidenciada em financiamentos de campanhas eleitorais, não foram incluídas no Projeto de Lei do Novo Código de Mineração, em tramitação na Câmara dos Deputados, as mudanças necessárias para a proteção das comunidades, dos seus territórios e dos(as) trabalhadores(as). O desastre ocorrido no dia 05 de novembro último expõe de uma forma muito triste e cruel, as consequências irreversíveis do não cumprimento da garantia desses direitos.

Por fim, preocupa o Projeto de Lei 2.946/2015 enviado pelo governador Pimentel para ser votado em caráter de urgência pela Assembléia Legislativa do estado de Minas. Nele, retira-se da sociedade civil e dos grupos atingidos a possibilidade de participação nas decisões sobre a mineração e demais projetos; cria-se uma superintendência de projetos prioritários com poderes para intervir no licenciamento, em qualquer de suas fases, a fim de conclui-lo e, de forma ainda mais preocupante, desvincula das decisões as anuências de órgãos como a FUNAI, o IPHAN e a Fundação Palmares, responsáveis pelas políticas territoriais que envolvem povos indígenas, quilombolas e tradicionais, bem como o patrimônio histórico e cultural, frequentemente impactados por esses projetos. Tal PL, na esfera estadual, associa-se ao PL 654/2015 do Senador Romero Jucá, na esfera federal, assim como à PEC 215 e à revisão do Código da Mineração, configurando grande golpe aos direitos constitucionalmente assegurados aos povos indígenas, quilombolas e tradicionais.

Entendendo que o rompimento das barragens resulta de um conjunto de negligências do Estado brasileiro no acompanhamento da garantia dos direitos constitucionais, a ABA vem se pronunciar no intuito se solidarizar com a população atingida e requerer que:

1. O Conselho Nacional de Direitos Humanos notifique os organismos internacionais dos quais o Brasil é parte, sobre as violações de direitos humanos praticadas pela SAMARCO S.A, Vale e BHP Billiton, signatárias do Pacto Global do setor empresarial, e em especial o descumprimento do programa APELL for Mining;

2. O Ministério Público Federal, o Ministério Público de Minas Gerais, e o do Espírito Santo, se empenhem na investigação e responsabilização dos danos causados pelo rompimento das barragens;

3. Que sejam arquivados o PL Estadual (MG) 2.946/2015, o PL Federal 654/2015, a PEC 215 e a revisão do Código da Mineração, nas respectivas esferas de tramitação.

Associação Brasileira de Antropologia e seu Comitê Povos Tradicionais, Meio Ambiente e Grandes Projetos

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FONTE: http://conflitosambientaismg.lcc.ufmg.br/noticias/sobre-o-rompimento-das-barragens-de-rejeito-em-mariana-minas-gerais/

 

Tragédia em Mariana: matéria do El País coloca dedo na ferida da mineração que devasta em troco de retorno econômico miserável

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Desde o início da cobertura da tragédia causada pela Mineradora Samarco (Vale + BHP Billiton) eu notei uma cobertura pífia da mídia corporativa brasileira em relação aos problemas essenciais relacionados aos custos sociais e ambientais da mineração que, em retorno, traz retornos baixíssimos às comunidades diretamente afetadas pela atividade.  Assim, enquanto as mineradoras ficam na posição de win-win (vencer ou vencer), as comunidades locais ficam na posição de loose-loose (perder ou perder).

Ontem, o jornal espanhol El País publicou uma matéria que vai direto a essa ponto crucial, enquanto mostra a posição subalterna do Estado brasileiro frente ao poder econômico das mineradores, ainda anuncia que as coisas poderão piorar ainda mais se as corporações conseguirem empurrar completamente sua agenda na modificação do chamado “Código da Mineração”.

Em cima de tudo isso, ainda há que se reconhecer que o melhor cobertura sobre a tragédia de Mariana continue vindo da mídia internacional, o que mostra que a subordinação às corporações que exploram as riquezas nacionais não para dentro do aparelho de Estado.  Essa talvez seja efetivamente a maior tragédia com que tenhamos enfrentar caso não queiramos a repetições infinita do que aconteceu à Mariana. Simples, mas definitivamente trágico.

Mariana, a dependência da mina que paga pouco à região que devastou

Tragédia evidencia que retorno econômico da mineradora é pequeno diante dos danos

Samarco terá que pagar 250 milhões de reais por desastre em Mariana

HELOÍSA MENDONÇA

Moradores voltam ao vilarejo de Bento Rodrigues depois da tragédia. / ANTONIO CRUZ  (AGÊNCIA BRASIL)

A tragédia de Mariana trouxe à tona novamente os riscos da mineração para as áreas do entorno das minas ao mesmo tempo que evidenciou a lógica de dependência econômica dessas cidades que contam com a atividade como principal fonte de renda dos municípios. O rompimento das duas barragens da Samarco, que contabiliza ao menos 7 mortos, 18 desaparecidos e causou danos incalculáveis, também deixou claro que o retorno econômico que a mineradora dá a cidades, como Mariana, se torna muito pequeno diante dos estragos gerados pela atividade.

No ano passado, a Samarco, controlada pela Vale e pela australiana BHP, pagou em royalties pela exploração em Minas Gerais cerca de 54 milhões de reais, sendo que desse total 20 milhões ficaram em Mariana. O valor que a cidade recebeu não chega a 1% do lucro líquido da mineradora em 2014, que chegou a 2,8 bilhões de reais. A quantia repassada, no entanto, está dentro da lei. Segundo a legislação atual, as mineradoras são obrigadas a repassar até 2% do seu faturamento líquido de Compensação Financeira pela Exploração de Recursos (CFEM), dos quais 65% fica com o município da mina, 23% com o Estado e 12% vai para a União. A proporção é criticada por prefeitos de cidades mineradoras que cobram uma compensação maior.

“Os valores são muito pequenos, irrisórios quando você avalia os vários problemas que chegam junto com as mineradoras. São cidades bastante castigadas pelo impacto das minas. Por isso queremos tanto que o novo marco legal, discutido há anos, seja aprovado o mais rápido possível no Congresso“, explica o presidente da Associação dos Municípios Mineradores de Minas (AMIG) e prefeito de Congonhas, José de Freitas Cordeiro (PSDB), o Zelinho. O projeto prevê que as mineradoras paguem o dobro do percentual atual: os royalties passariam de até 2% para 4%. Em comparação com outros países, os percentuais estão bastante defasados. Na Índia, por exemplo, a alíquota do setor pode chegar a 10%.

Para Zelinho, os moradores de cidades mineradoras estão cada vez mais preocupados com a presença de minas já que a cada dia fica mais evidente que “não há barragens de rejeitos 100% seguras”. “Criou-se um pânico generalizado. Foi uma catástrofe muito grande. O prejuízo que houve não tem preço que pague. O momento também é de repensar essas licenças ambientais, de rever a distância que essas comunidades precisam estar dessas barragens”, explica.

À esquerda, imagem tirada da região de Mariana após o rompimento das barragens. À direita a imagem feita antes da tragédia no dia 21 de julho. 

DigitalGlobe/Divulgação

Para aumentar o temor de um novo capítulo da tragédia, a Samarco informou nesta semana que a barragem Germano, localizada no mesmo complexo em que as duas outras contenções de rejeitos se romperam, requer um reforço estrutural. Nesta sexta-feira, o diretor de Projetos e Ecoeficiência da empresa, Maury Souza Júnior, informou que uma das paredes de sustentação da barragem está com coeficiente de segurança abaixo do mínimo, ainda que tenha garantida que o local está estável.

Prefeito contra paralisação

O futuro incerto da Samarco em Mariana, que teve suas atividades embargadas, não preocupa apenas os acionistas da companhia, mas também os trabalhadores da empresa e o prefeito da cidade, Duarte Júnior (PPS). No início da semana, ele declarou ser contra a paralisação definitiva das atividades da mineradora, alegando que 80% das arrecadação de Mariana vem das atividades mineradora que gera cerca de 1.800 empregos diretos e 2.000 indiretos.

De janeiro a outubro deste ano, Mariana recebeu 24,3 milhões de reais de Cfem. “A Cfem me rende 3,5 milhões reais por mês, sem ela teremos que rever a folha de pagamento e refazer cortes”, explicou Duarte Júnior.

O assessor técnico da Prefeitura de Mariana, Isreal Quirino, explica que uma interrupção definitiva da companhia impactaria não apenas a arrecadação do royalties, mas uma cadeia de atividades dependentes. “Minas Gerais traz no próprio nome a mineração. Dezenas de cidades giram entorno da atividade e a participação da Samarco na região é muito importante. Não se pode mudar uma matriz, um viés econômico assim da noite pro dia, a toque de caixa. O que precisamos agora é discutir uma legislação mais adequada para a exploração mineral”, afirma.

Outra discussão em curso é quem deve ser chamado a pagar pelos estragos de Mariana. Nesta semana, a presidenta Dilma Rousseff, criticada pela demora em ir até às áreas afetadas, anunciou a primeira multa para a Samarco, determinada pelo Ibama, no valor de 250 milhões de reais, menos de 10% do lucro líquido da empresa em 2014. É provável que outras multas, vindas de prefeituras e dos Estados afetados, sejam determinadas nas próximas semanas. A presidenta citou nominalmente as controladoras Vale e a australiana BHP como responsáveis pela tragédia. Na sexta-feira, a consultoria de risco Eurasia distribuiu a clientes boletim prevendo mais incerteza para o setor e pouca mudança legal prática no curto prazo, apesar das pressões. “De maneira mais ampla, o acidente traz mais incerteza para o setor da mineração no Brasil, que vem enfrentando baixos preços e a recessão. O grande risco é que a Vale a BHP possam ser consideradas passíveis de punição no caso de a Samarco não poder pagar pelos danos.”

FONTE: http://brasil.elpais.com/brasil/2015/11/13/politica/1447439535_624567.html?id_externo_rsoc=FB_CM