Deserto Verde e a rearticulação dos defensores da monocultura do eucalipto no território fluminense

Monocultura de eucalipto em expansão na região de Morro do Coco, norte do município de Campos dos Goytacazes 

Por Rede Alerta contra Desertos Verdes (RADV)

A retomada do debate em torno da monocultura do eucalipto no estado do Rio de Janeiro, capitaneada por grupos empresariais, setores do governo Claudio Castro (PL) e representantes de órgãos federais, exige uma reflexão crítica sobre os rumos da política agrária fluminense e seus possíveis impactos socioambientais.

O Fórum Florestal Fluminense (FFF), criado em 2008, vem se consolidando como um espaço estratégico de articulação entre representantes do setor industrial, governo do estado, de associações de classe e de órgãos de pesquisa federais e estaduais. Sua atuação recente, entretanto, revela a retomada de antigos projetos de expansão da monocultura do eucalipto — propostas já questionadas e barradas no passado pela sociedade civil organizada, em defesa dos interesses ambientais e territoriais da população fluminense.

É importante destacar que o Fórum Florestal Fluminense, surgiu a partir de uma parceria entre a Associação Profissional dos Engenheiros Florestais do Rio de Janeiro (APEFERJ), o Instituto BioAtlântica (IBio), a então empresa Aracruz Celulose (atual Suzano) e federações empresariais como a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (FIRJAN). Dentre os objetivos principais do Fórum Florestal Fluminense, podemos citar: discutir normas de licenciamento ambiental, fomentar políticas de incentivo à silvicultura industrial e a ampliação da cadeia produtiva florestal no estado. Desde sua origem, o Fórum defende a criação de mecanismos que facilitem a entrada, no território fluminense, de grandes empresas do setor de papel e celulose — especialmente a Suzano, já consolidada nos estados vizinhos do Espírito Santo e de São Paulo. 

Entre 2008 e 2016, o Fórum Florestal Fluminense promoveu diversos encontros em municípios como Campos dos Goytacazes, Nova Friburgo, Macaé e Rio Claro. Após um período de inatividade, o Fórum Florestal Fluminense retomou suas ações em outubro de 2021 e intensificou sua atuação em agosto de 2022, quando promoveu um evento no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro. Na ocasião, apresentou propostas para o “desenvolvimento florestal” no estado do Rio de Janeiro a representantes políticos, incluindo candidatos de “esquerda”, que pleiteavam o governo estadual e o parlamento fluminense.

Cabe destacar que, dentre os atores que compõem o Fórum, a FIRJAN tem se destacado como principal porta voz da expansão da monocultura do eucalipto no estado. A entidade vem promovendo eventos de grande visibilidade, como o seminário “Economia Verde: Firjan, Governo e Especialistas Analisam o Potencial Econômico da Silvicultura no RJ”, realizado em maio de 2023, lotando o auditório da própria FIRJAN.

Nesse encontro, lideranças empresariais como Eduardo Eugênio Gouvêa Vieira (então presidente da FIRJAN) e Paulo Hartung, ex-governador do Espírito Santo e presidente da Indústria Brasileira de Árvores (IBÁ) defenderam a silvicultura industrial como solução para “gerar empregos”, “recuperar áreas degradadas” e reduzir a dependência da madeira importada no estado do Rio de Janeiro — o que, segundo eles, representaria modernização e sustentabilidade econômica para o espaço agrário fluminense. Estiveram presentes também no evento, Thiago Pampolha – então Secretário de Estado do Ambiente e Sustentabilidade (SEAS) e Vice-governador do Estado do Rio de Janeiro, Diogo Ladvocat – representante da Suzano, Joésio Perin – Vice-Presidente na STCP Engenharia, entre outros representantes de setores empresariais e da política fluminense. 

Entretanto, esse discurso da chamada “economia verde”, propagado por representantes do setor industrial, precisa ser questionado. Apesar de se autoproclamarem como defensores do reflorestamento e da sustentabilidade, o modelo promovido por esses grupos, baseia-se em plantações homogêneas de eucalipto — uma monocultura voltada majoritariamente à produção de celulose para exportação. Na prática, trata-se de um modelo agroexportador, altamente dependente de grandes extensões de terra, que tende a acentuar conflitos fundiários, aumentar a concentração da terra, pressionar os recursos hídricos, impactar a biodiversidade regional e aumentar a insegurança alimentar. Esses problemas e muitos outros já foram amplamente documentados em estados onde existe a monocultura do eucalipto em larga escala e a atuação da Suzano, tais como o Espírito Santo e a Bahia.

Muito embora o Rio de Janeiro ainda não possua extensas áreas de eucalipto (pouco mais de 20 mil hectares), novos empreendimentos estão sendo planejados, especialmente no Norte Fluminense. Destaca-se a atuação recente da empresa Tree Agroflorestal S.A, que projeta o plantio de cerca de 30 mil hectares de eucalipto em Campos dos Goytacazes — município historicamente marcado pela concentração fundiária, pelos conflitos no campo, pelo desmatamento e pela monocultura.

 Em recente publicação nas suas redes sociais, o prefeito de Campos, Wladimir Garotinho afirmou:

“O desenvolvimento da nossa cidade segue firme! Antes, terras sem uso e improdutivas agora estão sendo arrendadas para o plantio de eucalipto. Já temos uma empresa investindo R$ 80 milhões nesse projeto, gerando mais de 100 empregos! Essa conquista só foi possível graças à alteração na lei municipal, que agora permite o plantio de eucalipto em áreas específicas, garantindo um uso sustentável e estratégico dessas terras. Seguimos trabalhando para atrair mais investimentos e transformar o agronegócio em um dos grandes motores da nossa economia!”

Mas não parou por aí: ele afirmou que esse investimento só foi possível com a aprovação da Lei Municipal nº 9.333/2023 que revogou a Lei Municipal nº 7.282/2002, facilitando o cultivo de eucalipto no município. Com isso, o intuito é, a curto prazo, viabilizar o aumento do cultivo de eucalipto no município, para que a médio prazo, possa se instalar uma empresa de celulose em Campos. Ninguém tem dúvida, pelas tentativas anteriores e pelas articulações em curso, que essa empresa seria, preferencialmente, a SUZANO.

Buscando antecipar-se às críticas sociais e ambientais decorrentes das experiências negativas da monocultura do eucalipto em outros estados, o Fórum Florestal Fluminense, com apoio da FIRJAN e de setores do governo estadual, tem defendido a atualização dos dados sobre as terras disponíveis nos chamados Distritos Florestais (Decreto 45.597/2016), que somam um total de 600 mil hectares, sendo 324 mil hectares com “potencial” para a monocultura do eucalipto.

Figura 1: Áreas dos Distritos Florestais do Estado do Rio de Janeiro

Fonte: http://www.seas.rj.gov.br

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¹ Atualmente, existem cinco Distritos Florestais no Rio de Janeiro, que abrangem municípios das regiões Norte1 (Campos dos Goytacazes, Cardoso Moreira, Italva, São Francisco do Itabapoana e Bom Jesus de Itabapoana), Norte 2 (Campos dos Goytacazes, Quissamã, Carapebus, Conceição de Macabu Santa Maria Madalena e Macaé), Noroeste (Itaperuna, Laje do Muriaé, Miracema, Santo Antônio do Pádua e São José de Ubá), Serrana (Carmo, São Sebastião do Alto e Cantagalo) e Médio Paraíba (Paraíba do Sul, Paty do Alferes, Rio das Flores, Quatis, Valença e Vassouras).

A criação dos Distritos Florestais, alinhada com a mudança na legislação, através da aprovação da Lei Estadual nº 9.972/2023 (Política Estadual de Desenvolvimento Florestal), foi festejada por defensores da monocultura do eucalipto no evento da FIRJAN, pois as facilidades criadas pela nova legislação poderão garantir viabilidade para o projeto dos Distritos Florestais e da silvicultura industrial sair do papel. 

Com a nova lei, o governo estadual fará o licenciamento prévio dos Distritos Florestais, assim cada empresa ou grande produtor que se instalar nessas regiões precisará só de uma licença autodeclaratória. Essa lei facilitadora para a introdução da monocultura do eucalipto em larga escala foi aprovada pelos deputados estaduais no apagar das luzes da legislatura anterior (2019 – 2022) e o govenador Claudio Castro, sancionou no início do seu segundo mandato (janeiro de 2023), “passando a boiada” do licenciamento ambiental e “escancarando” o território fluminense para a monocultura do eucalipto. 

Essa estratégia em curso é vendida como uma forma de ordenamento produtivo de espaços ditos “abandonados” e, com isso, busca-se neutralizar críticas sobre os impactos fundiários, produtivos e ambientais da expansão da monocultura do eucalipto no RJ. Ao mesmo tempo em que afirmam existir terras suficientes para implantar projetos industriais, omitem os riscos de novas formas de territorialização do capital, que podem se dar por meio da subordinação de pequenos produtores à lógica empresarial do setor celulósico-papeleiro, marcado inclusive, pelo endividamento dos produtores que participaram da última tentativa frustrada de exportar essa atividade industrial para a região, empreendida pela então Aracruz Celulose\Fibria e pelo pai do atual prefeito de Campos e na época govenador do estado RJ, o senhor Anthony Garotinho.  Projeto fracassado que teve continuidade nas gestões de Sérgio Cabral\Carlos Minc e do governador Pezão, deixando um passivo de dívidas, abandono e perda de terras por partes dos produtores no Norte e Noroeste Fluminense.

A atual ofensiva em defesa da monocultura do eucalipto no Rio de Janeiro, liderada por setores empresariais e legitimada pelo Fórum Florestal Fluminense, representa, portanto, um projeto de reconfiguração territorial que ameaça a diversidade ambiental e social no estado do RJ. Sob o rótulo da “sustentabilidade” e da “economia verde”, observa-se a tentativa de expansão de um modelo produtivo concentrador, com graves implicações socioambientais, que representará, novamente, sérios riscos, para termos a formação de um deserto verde no estado do Rio de Janeiro.

A Rede Alerta contra os Desertos Verdes (RADV) vem a público avisar a sociedade que a rearticulação de grupos ligados à implantação da monocultura do eucalipto em larga escala tem avançado, sobretudo na alteração de legislações, tanto no campo estadual quanto municipal, com claro intuito de facilitar a expansão da área plantada com eucalipto e a chegada de uma grande empresa de papel e celulose. Tudo isso, com apoio político e utilização de recursos públicos, inviabilizando a construção de um projeto de reforma agrária popular e agroecológico, afetando a segurança hídrica nas bacias hidrográficas do estado e a soberania territorial fluminense.

Por todas essas razões, conclamamos a sociedade civil, os movimentos sociais, pesquisadores, universidades e outros setores, a reafirmar a necessidade de um debate público amplo, com diferentes segmentos da sociedade, com a presença das populações do campo que poderão ser afetadas pela monocultura do eucalipto. É necessário reorganizar as forças progressistas no campo estadual, para que sejam capazes de denunciar os impactos dessa política e propor alternativas de uso do território que priorizem a vida, a diversidade e a justiça socioambiental. 

Uma grande oportunidade está em curso, com o Projeto de Lei nº 5516/2025, de autoria da Deputada Estadual Marina do MST, que tem por finalidade alterar a Lei Estadual nº 9.972/2023 e a Lei Estadual nº 5.067/2007, tendo como objetivo, reforçar a proteção de solos, águas e biodiversidade na Política Estadual de Desenvolvimento Florestal, estabelecendo com nitidez a diferença entre floresta e monocultura

Mais do que nunca, é hora de irmos à luta!

Rede Alerta contra Desertos Verdes (RADV)

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Fonte: Rede Alerta contra Desertos Verdes (RADV)

‘Deserto verde’: agricultores vencem a batalha contra a gigante brasileira-sueca da celulose na Bahia

A produção de eucalipto é dominada por grandes multinacionais que convertem terras agrícolas e florestas em plantações de monocultura de árvores

Plantação de eucalipto na Baixa Verde de propriedade da Veracel Celulose.

Plantação de eucalipto na Baixa Verde, pertencente à Veracel Celulose. O Brasil é o maior produtor mundial dessa planta de rápido crescimento e alta demanda hídrica. Fotografia: Sara Van Horn

Por Sara Van Horn em Eunápolis (BA) para o “The Guardian” 

Fileiras retas de clones de eucalipto ladeiam o assentamento da Baixa Verde, no nordeste do Brasil. As árvores geneticamente idênticas contrastam fortemente com os trechos de Mata Atlântica – um dos ecossistemas com maior biodiversidade do planeta – que ainda permanecem dispersos pela região.

Cercada por quase 100.000 hectares de plantações de eucalipto, Baixa Verde é um raro exemplo de vitória local sobre uma multinacional no Brasil. O assentamento rural deve sua existência a quase duas décadas de batalhas judiciais por direitos de propriedade da terra – mas a luta ainda não acabou.

Após lutarem para manter suas terras, as famílias agora enfrentam uma crise de segurança sem precedentes, marcada por confrontos armados, incêndios criminosos e ameaças de morte, parte de uma onda de violência impulsionada por uma disputa de terras que se intensificou desde 2024.

Vista aérea de uma extensão de árvores em fileiras organizadas.

Um terreno de eucaliptos pertencente à Veracel Celulose. A produção normalmente envolve a conversão de terras agrícolas e florestas em plantações de monocultura. Fotografia: Jhedys Kann

Os conflitos sobre direitos de propriedade da terra são um problema antigo na região. A obtenção de títulos de propriedade é geralmente vista como uma legitimação da apropriação de terras de comunidades tradicionais, e a população local suspeitava que a Veracel Celulose – uma empresa de produção de celulose pertencente em conjunto à empresa sueco-finlandesa Stora Enso e à gigante brasileira de celulose Suzano – estivesse plantando eucaliptos em terras públicas.

Em 2008, Ercilio Souza, um dos fundadores do assentamento da Baixa Verde, e Juenildo Oliveira Farias visitaram os arquivos do governo para consultar documentos públicos. Encontraram a página que comprovava que os 1.300 hectares em disputa pertenciam ao governo. “Sempre soubemos que era terra pública”, afirma Souza.

Com o documento em mãos, reuniram 91 famílias da região e se uniram ao Movimento Luta pela Terra (MLT), uma organização política e social que luta pela reforma agrária. Sua primeira ação foi ocupar uma área de uma plantação de eucaliptos utilizada pela Veracel, acusando a empresa de usar terras públicas.

Dois anos após a ocupação inicial, o MLT obteve o reconhecimento estatal de que a empresa não era proprietária legal do terreno plantado pela Veracel. “Este documento foi uma vitória não apenas para o movimento local pelos direitos à terra, mas para todos os movimentos sociais do Brasil ”, afirma Jhedys Lemos Farias, que cresceu no acampamento e hoje é uma das líderes do MLT.

Um homem está em um quintal com roupas estendidas no varal. Ao fundo, vê-se uma plantação de eucaliptos.

Ercilio Souza em suas novas terras, anteriormente uma plantação de eucaliptos. Souza sempre suspeitou que essas terras fossem de propriedade pública. Fotografia: Sara Van Horn

Após anos de entraves e batalhas judiciais, o estado da Bahia firmou um acordo com a Veracel e o MLT em 2016, restituindo 1.300 hectares de terras da Veracel ao governo e concedendo a cada família um lote grande o suficiente para cultivar seus próprios alimentos. Das 61 famílias restantes, 53 já se mudaram para seus novos lotes.

“Conquistar o direito à terra significa que agora temos um lugar para cuidar dos nossos mais jovens”, diz Lemos Farias.

Apesar da perda do terreno, um representante da Veracel afirma que a empresa sempre operou com “transparência, responsabilidade social e ambiental” e respeito pela população local. “A empresa nunca foi condenada por grilagem de terras e reafirma que suas áreas de produção são legalmente regulamentadas e operam com as licenças ambientais necessárias.”

No entanto, nos anos que se seguiram ao acordo, as famílias afirmam ter sofrido ameaças de morte, tiroteios, casas incendiadas, produtos agrícolas roubados e plantações destruídas.

Um homem está de pé ao lado de um rio vermelho com margens gramadas.

Jhedys Lemos Farias junto a um rio perto do bairro da Baixa Verde. Os moradores locais dizem que o rio secou desde o início da produção de eucalipto. Fotografia: Sara Van Horn

Segundo o MLT, o conflito agora se concentra em parcelas de terra que permanecem ocupadas por agricultores filiados ao sindicato local, a Federação dos Trabalhadores Rurais e da Agricultura Familiar (Fetag). Quando estava prestes a perder a posse da terra em disputa, a Veracel doou 300 hectares vizinhos ao sindicato – doação confirmada pela direção da Fetag, de acordo com a gravação de uma audiência pública realizada com a Defensoria Pública Nacional da Agricultura da Bahia.

Nos últimos quatro anos, seis líderes do MLT foram colocados sob vigilância protetiva pelo programa brasileiro de proteção a defensores de direitos humanos, comunicadores e ambientalistas. O governo recomendou que alguns desses líderes se mudassem, mas, por lealdade ao movimento e por sua ligação com a terra que conquistaram com tanto esforço, eles se recusaram.

Devido às ameaças de morte que tem recebido, Souza diz que tem dificuldade para dormir à noite. “Estou com muito medo de que algo aconteça à minha família”, afirma. “Há muita perseguição por aqui. Nossas tendas foram incendiadas, assim como nossos canaviais.”

Uma mulher sentada num banco em frente a uma casa de madeira.

Marli dos Santos em frente a uma casa temporária enquanto aguarda a desocupação de seu terreno. Ela encontrou cápsulas de balas na grama a poucos metros de distância. Fotografia: Sara Van Horn

A MLT afirma que oito famílias não se sentem suficientemente seguras para cultivar seus terrenos, que permanecem ocupados por agricultores supostamente associados à Veracel.

A Veracel afirma que, nos últimos 15 anos, destinou “mais de 20.000 hectares a iniciativas de reforma agrária, seja por meio de acordos judiciais, doações ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), doações diretas ou vendas, para resolver conflitos em curso no território”.

A empresa também afirma que “a criação dos assentamentos – desde o projeto até o parcelamento e a definição dos lotes – foi conduzida inteiramente pelo governo estadual, sem interferência da empresa” e “não comenta conflitos entre movimentos sociais”.

Marli dos Santos é uma das duas pessoas que ainda vivem no antigo acampamento. Ela conta que tem sido assediada por homens armados que cercaram sua casa e atiraram no chão em frente à sua residência. Como não há ninguém por perto, Santos – que mora sozinha – acredita que os tiros foram uma tentativa de intimidá-la e impedi-la de retomar o terreno que lhe foi designado.

Em agosto, o estado da Bahia autorizou a remoção dos agricultores Fetag que ainda permanecem em lotes da Baixa Verde – mas a decisão ainda não foi cumprida.

A Fetag não respondeu ao pedido de comentário.

BAlém de se defenderem de ameaças e violência, a conversão de terras antes utilizadas para a monocultura de eucalipto em áreas de produção alimentar é agora o principal desafio para as comunidades da Baixa Verde. A produção de eucalipto é dominada por grandes multinacionais quedesde a década de 1960 , vêm convertendo terras agrícolas e florestas em plantações de monocultura, impulsionadas pela demanda global.

O Brasil é o maior produtor mundial de eucalipto, uma planta de rápido crescimento e que consome muita água , cuja polpa é exportada para a fabricação de papelão e produtos de papel. A maior parte da polpa de eucalipto do país é exportada para a Europa, onde é utilizada na fabricação de produtos de papel frequentemente comercializados como uma alternativa renovável aos plásticos – apesar dos danos ambientais causados ​​pela monocultura.

Na Bahia, a proliferação dessas fazendas rendeu ao povoamento o apelido de “deserto verde”, devido à perda da vida selvagem e à grave escassez de água e terra enfrentada pelas famílias que vivem perto das plantações de eucalipto.

Vista aérea de terrenos agrícolas rodeados por plantações verdes.

Os terrenos agrícolas do povoado da Baixa Verde, perto de Veracel. Fotografia: Arquivo MLT

Souza cresceu na região e se lembra do rio antes da área ser transformada pela monocultura de eucalipto, promovida pela Veracel. “Costumávamos atravessá-lo de canoa. Era cheio”, diz ele. “Depois que a Veracel chegou, secou.” Ele atribui a escassez de água à chegada da empresa em 1991.

A Veracel afirma que “adota um sistema de gestão em mosaico, no qual o eucalipto é cultivado em áreas de planalto, enquanto vales, nascentes e vegetação nativa são preservados. Este modelo garante a proteção do solo, a conservação da vida selvagem e a manutenção dos recursos hídricos”. A empresa também afirma que “realiza monitoramento contínuo de microbacias em sua área de atuação” e “desenvolve projetos de reflorestamento e restauração florestal em áreas próximas a comunidades”.

No estado vizinho de Minas Gerais, a região de eucaliptos de Turmalina viu seu nível de água subterrânea cair 4,5 metros nos últimos 45 anos, de acordo com pesquisadores da Universidade Federal de Minas Gerais.

A vegetação em monoculturas de eucalipto absorve 26% da água da chuva , restaurando os níveis do lençol freático – em comparação com os 50% de absorção associados à floresta nativa. Três quartos das famílias de agricultores entrevistadas em Minas Gerais relataram que suas plantações foram afetadas pela escassez de água.

O cultivo de eucalipto também acarreta um risco elevado de incêndios florestais. As plantações são tão inflamáveis ​​que o Chile descartou o eucalipto como uma solução climática viável após uma série de grandes incêndios em suas plantações.

Apesar dos riscos ambientais, as plantações de eucalipto continuam a desempenhar um papel significativo no mercado de carbono, com as árvores sendo vendidas como créditos de carbono para empresas poluidoras de combustíveis fósseis, a fim de compensar suas emissões. Apesar da oposição de ativistas, em maio do ano passado, o governo brasileiro aprovou uma lei que exclui o eucalipto da lista de indústrias que necessitam de licença ambiental.


Fonte: The Guardian

Na esteira do Projeto do Semiárido, monoculturas de soja e eucalipto

Na prática, recursos do Projeto de Lei do Semiárido vão financiar monoculturas de árvores e de soja

A mídia corporativa local anuncia que o Senado Federal deverá votar nesta 3a. feira o Projeto de Lei No. 1440/2019, também conhecido pela alcunha de “Projeto do Semiárido”, que deverá  conceder aos municípios do Norte e Noroeste benefícios do semiárido. A justificativa encontrada para essa equiparação à região Nordeste em termos de benefícios que compensem o ressecamento associado à escassez das chuvas.

Curiosamente o “Projeto do Semiárido” tem como um dos suas principais apoiadoras a Federação de Indústria do Rio de Janeiro (Firjan) que, por outro lado, é uma das inspiradoras da criação de um deserto verde no Norte Fluminense, a partir da implantação de grandes plantios de eucalipto.

🌱 Notícia boa para Campos! 📢, O desenvolvimento da nossa cidade segue  firme! Antes, terras sem uso e improdutivas agora estão sendo arrendadas  para o plantio de eucalipto. Já temos uma empresa ...

Wladimir Garotinho: entre o “Projeto do Semiárido” e o apoio ao Deserto Verde

É o famoso acendendo “uma vela para Deus e outra para o diabo”.  Afinal, se os municipios do Norte e Noroeste Fluminense estão assim tão prejudicados pela escassez de chuvas, como é que se explica o apoio à implantação de monoculturas de árvores, como faz a Firjan?

No plano municipal, há que se lembrar que é a Secretaria Municipal de Agricultura (SEMA) quem apoia de forma muito animada a implantação de outra monocultura voraz no consumo de águas que é a da soja.   Assim, somando-se os planos da Firjan e da SEMA teremos que qualquer financiamento que saia para o “Projeto do Semiárido” será, na prática, para apoiar monoculturas que causam alto consumo e ainda a contaminação dos recursos hídricos via o uso intensivo de agrotóxicos.

O Secretário Municipal de Agricultura, Almy Junior, participa de “colheita da soja” : semiárido que é bom, nada

Por outro lado, sobre a recuperação da cobertura vegetal via projetos de reflorestamento usando espécies da Mata Atlântica não há uma palavra sequer.  E se levarmos em conta que grande parte do ressecamento que vivemos no Norte e Noroeste Fluminense se devem à derrubada quase total das florestas para o plantio de outras monoculturas e de pastagens, esse esquecimento deixa ainda mais explícito que o “Projeto do Semiárido” oscila entre as mais puras formas de cinismo e de farsa.

E uma coisa é certa: sem correções profundas de rumo, qualquer dinheiro que vier parar por aqui por causa desta lei será para aprofundar os problemas existentes e não o contrário. 

Consequências inescapáveis da chegada do Deserto Verde em Campos dos Goytacazes

Em 2004 fui um dos autores de um capítulo no livro “Conflito social e meio ambiente no estado do Rio de Janeiro” cujo título era “Transgredindo escalas e estabelecendo parcerias inusitadas na luta pela justiça ambiental: o caso da mobilização contra a monocultura de eucalipto no Rio de Janeiro”. O capítulo era essencialmente uma análise das alianças inusitadas ocorridas naquele período para impedir a chegada dos grandes plantios de eucalipto no território campista, tendo unido representantes dos ceramistas, pesquisadores das universidades locais, ambientalistas e dirigentes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).  Na conclusão daquele capítulo, colocamos uma espécie de alerta no sentido de que aquele era um conflito inconcluso e que cedo ou tarde, o espectro do deserto verde iria novamente pairar sobre nossas cabeças.

Eis que agora pouco mais de duas décadas daquela tentativa frustrada de implantar a monocultura de árvores no território de Campos dos Goytacazes, estamos assistindo a uma nova tentativa, agora com o apoio explícito do prefeito Wladimir Garotinho e do seu secretário de Agricultura, Almy Junior.  As informações que me chegam de fontes que conhecem as transações que estão ocorrendo no mercado de terras (a maioria improdutivas) é que milhares de hectares já foram adquiridos por empresários capixabas, e que efetivamente a ideia é transformar o Norte Fluminense em um imenso deserto verde. Assim, ainda que os anúncios bilionários de investimentos sejam irreais, o espectro do deserto verde está realmente mais próximo do que esteve no início do século 21.

Agora, o que não está se mostrando ( e eu irei fazê-lo com a lupa científica nos próximos anos) é que essa tentativa não for tiro com pólvora molhada, o que está se preparando trará amplas consequências sobre o meio ambiente, a saúde humana e até a capacidade de circulação em um BR-101 já sobrecarregada com a falta de duplicação no trecho entre Campos dos Goytacazes (RJ) e Anchieta (ES).

A primeira coisa é que grandes plantios de eucalipto não geram empregos, mas acabam destruindo mais do que criam.  Assim, em uma região que já possui déficit de empregos, a chegada da monocultura de árvores gerará mais desemprego e mais êxodo rural, o que contribuirá para a ampliação das favelas. 

Em segundo lugar, plantios de eucalipto demandam um grande uso de agrotóxicos, principalmente no combate às formigas que encontram nas mudas um amplo pasto. Com isso, viveremos a ampliação do uso de substâncias químicas altamente tóxicas, o que deverá causar mais adoecimento nos trabalhadores e espalhar a contaminação via os corpos hídricos. Como vivemos em um município que já possui um sistema de saúde sobrecarregado por doenças oriundas da monocultura de cana, a perspectiva é que nos próximos anos e décadas assistamos a uma piora do quadro de saúde, sem que haja a devida cobertura  de serviços de saúde.

O que são desertos verdes? | Super

Em terceiro lugar,  monoculturas de árvore em escala industrial, principalmente em ciclos de plantio/colheita altamente velozes, há um aumento na demanda hídrica.  Em especial, o eucalipto demanda muita água para cumprir um processo de crescimento rápido que possa gerar a matéria prima para a produção de celulose que certamente é o alvo da expansão do deserto verde em terras campistas.  Com isso, como já vivemos em uma região em que o fornecimento de água é altamente pressionado, o futuro se desenha como bastante desafiador.

Em quarto lugar, há que se mencionar que certamente o principal comprador das árvores plantadas em Campos dos Goytacazes e municípios vizinhos será a Suzano Papel cuja planta estabelecida em Aracruz (ES) precisa de mais de matéria prima para operar nos níveis de competição que seus acionistas demandam. Com isso, a via de transporte preferencial terá de ser a BR-101, visto que inexiste outra forma de acesso viável, tanto para Aracruz como para as unidades portuárias existentes ou em construção na região.  Com isso, imaginemos o que vai acontecer quando a produção dos eucaliptais começar a ser transportada pela via realmente existente, a BR-101.

'Agora tudo é eucalipto': trabalhadoras rurais denunciam danos ambientais  causados pela Suzano – Brasil de Fato

Um quinto e importante aspecto se refere às pressões sociais em prol da reforma agrária.  A transformação de Campos dos Goytacazes em um deserto verde é também uma forma de impedir que a reforma agrária prospere.  Os últimos anos têm mostrado que uma retomada das ações do MST e de outros movimentos sociais em prol da utilização do grande estoque de terras improdutivas em assentamentos de reforma agrária.  Ao transformar terras improdutivas em mais um deserto verde, as oligarquias agrárias que ainda dominam a política municipal e regional procuram se prevenir contra o “mau exemplo” da agricultura familiar e da produção de alimentos saudáveis.  Por mais contraditório que possa ser, vender as terras por preços aquém do que se poderia obter do governo federal via desapropriações faz sentido, pois a ordem social existente se baseia justamente na desigualdade de acesso à terra, nos campos e nas cidades.

Por isso tudo é que não se pode ignorar os esforços de implantação do deserto verde em Campos dos Goytacazes. É que aqui está se dando mais um capítulo que coloca de frente um para o outro, modelos de sociedade e de desenvolvimento econômico e social.   E uma última nota: como não comemos celulose nem casca de eucalipto,  não deve ser difícil de se estender a urgência da tomada de posição por parte daqueles que não querem ver o deserto verde instalado em Campos dos Goytacazes.

Alerta a Wladimir Garotinho: eucalipto adora água e gera desertos verdes

Mudanças na esfera familiar: notas sobre eucalipto e mulheres em Mato  Grosso do Sul | Movimento Mundial pelas Florestas Tropicais

Das duas uma: ou o prefeito Wladimir Garotinho está mal informado sobre as consequências nefastas da monocultura de eucalipto ou ele não se importa.  Mas independente da resposta, eu precisa levar em conta que não para combinar o discurso de que é preciso reclassificar o clima regional para “sem-árido” e ficar apoiando em público a transformação de parte do território campista em um deserto verde.  A conta simplesmente não fecha. 

Por outro lado, já me chegaram notícias do aumento de casos de intoxicação por contato com agrotóxicos na região próxima do Distrito de Travessão onde estão sendo implantados alguns desses empreendimentos de monoculturas de árvores.  

Esse aumento de casos, principalmente de trabalhadores rurais que manejam equipamentos que aplicam agrotóxicos nos plantios de eucalipto, será seguido pelo aumento de casos por ingestão crônica de agrotóxicos, visto que parte dos venenos utilizados nos plantios em grande escala de árvores migra rapidamente para os corpos aquáticos.

Por outro lado, conflitos sociais têm aparecido nas novas fronteiras do deserto verde que estão aparecendo no Brasil, visto que há um deslocamento inevitável de comunidades que ocorre na medida em que os plantios de eucalipto avançam no território.

Assim, se o prefeito Wladimir Garotinho considera uma boa transformar parte de município em um deserto verde e com grande potencial de contaminação, há que se dizer que essa é uma péssima ideia.  Assim, nem tudo o que “acontece” é desejável ou necessário.

Finalmente, acho interessante que se prepare melhor as unidades hospitalares existentes no município para que identifique e trate os contaminados pelo trabalho nos eucaliptais. 

O deserto verde avança no Brasil com a expansão das monoculturas de eucalipto para produção de celulose

188374Plantação de árvores na perspectiva de uma formiga. Foto: Imagens/imagem Pond5

Por Norbert Suchanek para o JungeWelt

Todas as manhãs, um ônibus após o outro transporta milhares de trabalhadores da comunidade de Ribas do Rio Pardo até aquele que é hoje o maior canteiro de obras do Brasil. Uma planície de areia vermelha bem definida e nivelada, com vários campos de futebol em tamanho, nos quais dezenas de enormes guindastes de construção, alcançando o céu azul, estão erguendo monstruosos andaimes de aço e salas de produção, e ao mesmo tempo, máquinas de construção de estradas estão asfaltando tudo o que podem : Trata-se do projeto de celulose “Cerrado”, que custa cerca de quatro bilhões de euros da Suzano, já a maior produtora brasileira de celulose. A expectativa é que a nova fábrica entregue anualmente 2,55 milhões de toneladas de matéria-prima de papel proveniente de eucaliptos geneticamente modificados, aumentando a produção total da Suzano para 13,5 milhões de toneladas por ano.

O projeto, apoiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES) e pelo governo do estado de Mato Grosso do Sul, trouxe mais de dez mil trabalhadores da construção civil do Sul e Nordeste do Brasil, de São Paulo e de países como Colômbia, Venezuela, Cuba, Argentina e Haiti à comunidade, que originalmente tinha cerca de 20 mil habitantes, que não estava preparada para esta “explosão demográfica”. Os preços dos terrenos e os aluguéis de apartamentos dispararam. O assentamento operário com 1.280 leitos, construído por uma empresa terceirizada na periferia da cidade, é apenas uma gota no oceano.

Os dias de empregos no mega canteiro de obras estão contados há muito tempo. A fábrica, que fica a apenas dez quilômetros de Ribas do Rio Pardo, tem conclusão prevista para junho do próximo ano. De acordo com um comunicado da empresa, a operação das instalações e as plantações de madeira empregarão cerca de 3.000 pessoas de forma permanente, muito poucas das quais virão da indústria da construção, atualmente em expansão.

A parte mais importante do projeto Cerrado é a matéria-prima: o eucalipto. As plantações uniformes de árvores já estão se espalhando pela região como um mar. Outrora conhecida como “Terra do Gado”, Ribas do Rio Pardo e comunidades vizinhas como Três Lagoas, Santa Rita do Pardo, Água Clara e Brasilândia são dominadas pelo eucalipto há vários anos. O boom das plantações de árvores começou na região no início dos anos 2000 e se acelerou com a conclusão das três primeiras fábricas de celulose em 2009, 2012 e 2017 em Três Lagoas, duas das quais pertencem à empresa Suzano e uma à empresa Eldorado Brasil.

Onde há poucos anos onças e pumas vagavam pela floresta intacta do Cerrado caçando tamanduás, veados, antas e outros animais selvagens, ou gado pastando para o consumo de carne do Brasil, hoje os paus de eucalipto estão enfileirados. De acordo com a Associação dos Produtores e Consumidores de Plantações Madeireiras (Reflore-MS), um total de 1,4 milhão de hectares em Mato Grosso do Sul já foram plantados com clones da espécie arbórea australiana de rápido crescimento. Este ano serão acrescentados mais 300 mil hectares de plantações de eucalipto: 822 hectares por dia.

De acordo com o atual plano de manejo florestal, a própria Suzano possui 169,3 mil hectares de floresta protegida de Cerrado e 458,4 mil hectares de áreas de eucalipto na região, que planeja expandir para 600 mil hectares até meados de 2024 para operar a nova fábrica. Para alegria da Secretaria de Estado do Meio Ambiente, Desenvolvimento, Ciência, Tecnologia e Inovação (Semadesc) de Mato Grosso do Sul, Ribas do Rio Pardo se tornará a “capital mundial do eucalipto”.

A matéria-prima do papel mato-grossense já é vendida para 36 países da Ásia, América do Norte, América Central, América do Sul, Europa, Oriente Médio e África, sendo a China, de longe, o maior comprador. No ano passado o país importou 2,384 milhões de toneladas.

O que o governo do estado e a indústria de celulose comemoram é, para a rede contra os desertos verdes (Rede Alerta contra os Desertos Verdes ), uma catástrofe ecológica e social. A Suzano é responsável pelo desmatamento do Cerrado, pela poluição e pela escassez de água, bem como pela destruição de solos férteis, segundo a rede, que descreve as monoculturas madeireiras como “desertos verdes”. “A expansão das monoculturas e das suas cadeias logísticas e industriais está causando a perda da biodiversidade e de qualidade de vida tanto no campo como na cidade”, queixa-se a rede.

Os ambientalistas denunciam especialmente o plantio pela Suzano de duas espécies de eucalipto geneticamente manipuladas – aprovadas pelo governo brasileiro: a variedade H421, aprovada em 2015 e que visa fornecer mais polpa por hectare, e a variedade 751K032, permitida desde 2021 e que, assim como a soja geneticamente manipulada conhecida da empresa genética Monsanto, é resistente ao herbicida total glifosato.

“Mato Grosso do Sul é o estado com maior produção de eucalipto, principalmente pelos incentivos fiscais às empresas de celulose e pela disponibilidade de terras antes utilizadas para a pecuária”, explicou o advogado trabalhista Leomar Daroncho em simpósio de cientistas, ativistas e atingidos pela monoculturas de árvores e plantações transgênicas de eucalipto, que ocorreu em junho na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). “Em grandes áreas, a vegetação nativa, o Cerrado, foi retirada para o plantio de eucalipto transgênico”.

As pequenas famílias de agricultores e as explorações pecuárias que anteriormente não venderam as suas terras às empresas de celulose estão agora presas às monoculturas e queixam-se de que os riachos e poços estão a secar e os operadores das plantações pulverizam regularmente pesticidas. A situação é particularmente dramática para os sobreviventes do povo Ofayé no município vizinho de Brasilândia. Sua reserva indígena restante, de 484 hectares, está cercada por dezenas de milhares de hectares de monocultura de eucalipto. Uma ilha de Cerrado no mar de plantações madeireiras que foi demarcada como território indígena na década de 1990, mas ainda não foi “homologada”, ou seja, reconhecida, pelo governo brasileiro.

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 Colheita de madeira em escala industrial. Joa Souza/imago

“Em pouco tempo vimos a expansão do Geneucalyptus no limite da reserva. Vimos como inúmeras árvores nativas, com cem ou duzentos anos, foram derrubadas mecanicamente em poucos minutos e substituídas por eucaliptos”, reclamou o cacique Ofayé, Marcelo da Silva Lins, durante o simpósio. O estado está agora a tornar-se cada vez mais seco e o clima local está a tornar-se cada vez mais quente.

De acordo com um relatório publicado em dezembro de 2022 pela Environmental Paper Network (EPN), uma rede global de mais de 150 grupos ambientalistas e organizações não governamentais, sabe-se que os clones de eucalipto de rápido crescimento drenam a água do solo. “A enorme expansão destas plantações, em conjunto com as alterações climáticas, está lentamente a transformar o reservatório de água continental da região numa área de seca. O restante vegetação natural será danificado, enquanto a agricultura tradicional e a agricultura de subsistência se tornarão impossíveis.”

O risco de grandes incêndios florestais também aumenta. Durante os períodos de seca, as plantações de madeira poderiam facilmente pegar fogo. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), responsável pelo monitoramento florestal via satélite, o número de incêndios na região do eucalipto multiplicou-se a partir de 2018, passando de cerca de 1.000 a 3.000 incêndios florestais por ano para mais de 10.000 incêndios em 2020. Um total de 20 mil hectares de floresta de eucalipto foram queimados naquela época no Mato Grosso do Sul. E, finalmente, o uso crescente de herbicidas como o glifosato ou insec=ticidas dirigidos contra formigas cortadeiras está envenenando os cursos de água e a ameaçar a vida selvagem e os meios de subsistência da restante população local que ainda não foi deslocada.

No Brasil, as empresas de celulose costumam afirmar que suas plantações de eucalipto não substituem áreas florestais naturais, mas sim substituem fazendas agrícolas ou degradadas anteriormente utilizadas. Um estudo publicado em 2013 pela Universidade Federal de Goiás mostra que, entre 2002 e 2010, mais de 61% das novas florestas de eucalipto foram criadas em áreas intactas de Cerrado. Apenas 26 por cento das plantações de madeira substituíram pastagens para gado e cerca de 13 por cento substituíram áreas anteriormente utilizadas para outros fins. Em comparação com os anos de 2005 e 2011, a área de eucalipto mais que quadruplicou em detrimento do Cerrado, especialmente no Mato Grosso do Sul, afirma o estudo.

Também é importante mencionar que as fazendas tradicionais de gado no Cerrado são significativamente menos prejudiciais do que as plantações madeireiras industriais. Por um lado, as áreas de pastagem fornecem mais habitat para a flora e a fauna naturais do que as monoculturas madeireiras australianas. Por outro lado, embora os pecuaristas desmatem ou queimem a floresta, deixam em pé algumas árvores de sombra e, sobretudo, as raízes das árvores e arbustos permanecem no solo, o que é uma diferença fundamental. O ecossistema do Cerrado está adaptado aos incêndios florestais há milhares de anos. Cerca de 70% da sua biomassa encontra-se no subsolo, protegida do fogo. Suas plantas têm raízes profundas e poderosas que armazenam grandes quantidades de água para sobreviver a incêndios florestais e longos períodos de seca. Portanto, após a limpeza, elas podem brotar novamente e o ecossistema pode se recuperar. Algumas pastagens da região do Cerrado que são consideradas degradadas pelos agricultores estão, na verdade, regenerando o Cerrado.

Em última análise, os grandes criadores de gado não fecham as portas apenas porque venderam as suas terras à indústria da pasta de papel. Com o lucro que obtêm, costumam adquirir terras mais baratas em outras áreas que ainda não foram desmatadas para criar novas pastagens.

A Suzano, porém, se vê como a salvadora do clima que protege o Cerrado. Nenhuma árvore foi derrubada na região para suas plantações madeireiras. »Na Suzano seguimos uma política de produção responsável e, por isso, introduzimos uma política de desmatamento zero. “Todas as nossas florestas de eucalipto estão localizadas em áreas que já eram cobertas por outras culturas”, afirma a empresa. O cultivo do eucalipto tem impactado positivamente a atmosfera devido à conversão de terras antes utilizadas para agricultura, disse o diretor da Suzano, Aires Galhardo, em entrevista ao portal Celulose .

É por isso que a empresa – tal como outras empresas de plantações de madeira – quer ser recompensada com dinheiro do comércio internacional de carbono. “O eucalipto cresce rapidamente e ajuda a absorver o dióxido de carbono da atmosfera e, assim, devolver oxigênio puro à natureza”, escreve Suzano sobre seu projeto de proteção climática “Carbono Cerrado”, de Ribas do Rio Pardo. “O papel das florestas de eucalipto é fundamental para os esforços da humanidade na neutralização dos gases de efeito estufa responsáveis ​​pelo aquecimento global.” Toda a produção de celulose é baseada em plantações renováveis ​​de eucalipto para abastecer a nova fábrica em Ribas do Rio Pardo. »As mudas utilizadas são criadas com tecnologia de clonagem e possuem uma das bases genéticas mais avançadas para a formação de florestas para produção de celulose.«

Embora as obras da maior fábrica de celulose de eucalipto do mundo, no Rio Pardo, ainda estejam a todo vapor, seus dias recordes já parecem estar contados. A empresa chilena de madeira e celulose Arauco aparentemente está planejando uma instalação ainda maior no bairro às margens do rio Sucuriú. Será o maior projeto de celulose do mundo, superando a Suzano, o que criará enormes oportunidades de emprego e crescimento, disse o então governador do Mato Grosso do Sul, Reinaldo Azambuja, quando o projeto foi anunciado no ano passado. A construção da nova fábrica de celulose próxima ao município de Inocência, no Rio Sucuriú, que tem cerca de 8.400 habitantes, está prevista para começar em janeiro de 2025 e empregará no máximo 12 mil trabalhadores da construção civil nesta fase. Quando entrar em operação, em 2028, a empresa precisará de cerca de 380 mil hectares de plantações de madeira na região, dos quais Arauco afirma já ter adquirido 60 mil hectares.

Ainda falta as licenças ambientais para o projeto Sucuriú, mas isso parece ser apenas uma formalidade. O governador do Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel, do Partido Social Democrata Brasileiro (PSDB), e seu secretário estadual do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação, Jaime Verruck, também o acolhem de forma exagerada. Por isso viajaram para a sede da Arauco no Chile em junho passado junto com seu antecessor e colega de partido, Reinaldo Azambuja, para – segundo anúncio do governo – conhecer com seus próprios olhos a tecnologia “avançada” da empresa chilena.


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Este texto escrito originalmente em alemão foi publicado pelo jornal “JungeWelt” [Aqui!].

Firjan e o espectro do deserto verde no Norte e Noroeste Fluminense

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Deserto Verde no Espírito Santo: por cima tudo verde, mas sem vide por dentro

Os planos de tornar as regiões Norte e Noroeste Fluminense em uma réplica do “Deserto Verde” implantado no Espírito Santo pela agora defunta Aracruz Celulose não são novos. Tanto isto é verdade que ainda no de 2012, o meu então orientando Felipe Correia Duarte defendeu a dissertação intitulada “A expansão da monocultura de eucalipto no Noroeste Fluminense e seu potencial para a geração de conflitos socioambientais” no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Políticas Sociais. Neste estudo, Duarte detalhou as estratégias que estavam sendo empregadas pela Aracruz Celulose (que depois foi Fibria e hoje é parte do conglomerado da Suzano Papel) para convencer proprietários rurais a ingressarem nos seus programas chamados de “Fomento Florestal”.

Agora, passados 11 anos desde aquela estudo rigoroso, recebo notícias que a Federação das Indústrias do estado do Rio de Janeiro (Firjan) está com planos grandiloquentes que envolvem o plantio de algo em torno de 260 a 600 mil hectares de eucalipto no Norte e Noroeste Fluminense.  Os debates em torno desse projeto tem aparecido a conta gotas em notícias da própria Firjan, mas fui informado que recentemente houve uma reunião para estabelecer as estratégias para concretizar planos que prometem mudar dramaticamente a paisagem regional.

A primeira coisa que se pode dizer é que tudo o que não se precisa neste momento é de plantios massivos em duas regiões que já sofrem com escassez hídrica a ponto de se estar tramitando um projeto de lei, o PL 1.440/19, de autoria do prefeito Wladimir Garotinho, quando era deputado federal, que visa  caracterizar o Norte e  o Noroeste Fluminense como regiões de clima semiárido. Como existem estudos que mostram o papel nefasto que os plantios extensivos de eucalipto sobre os recursos hídricos em função da demanda dessa espécie por água, sequer pensar em instalar este tipo de atividade no Norte/Noroeste Fluminense é um completo absurdo.

Em segundo lugar há que se dizer que as plantações de eucalipto em escala industrial não apenas escasseiam os recursos hídricos, mas contribuem com a elevação da poluição aquático em função do alto uso de agrotóxicos e fertilizantes químicos.  Assim, além de termos a perspectiva do escasseamento da água, haverá ainda o aumento da poluição química.

A terceira questão se relaciona ao aumento do êxodo rural, visto que a expansão da monocultura de árvores está diretamente associada à expulsão de populações rurais que ficam incapacitadas de obter seu sustento por causa da hegemonia de uma forma particularmente ostensiva de utilização dos solos e recursos hídricos.

Como tive minha atenção chamada para esta tentativa da Firjan de realizar ou participar da expansão desenfreada do eucalipto em nossa região, a minha expectativa é falar mais sobre este assunto. Desde já deixo clara a minha oposição à mais essa tentativa de implantação do deserto verde, quando o que se realmente precisa é de sistemas agrícolas que produzam comida saudável .

Finalmente, há que se lembrar aos planejadores da Firjan que o município de Campos dos Goytacazes aprovou em 2002, a Lei Municipal Nº 7282 de 26 de agosto de 2002 que estabeleceu, entre outras coisas, que o plantio total de eucalipto para fins industriais, não poderá ser superior a 3% (três por cento) do território do Município.

Pescadores tradicionais sufocados por deserto verde da Fibria S.A temem pelo futuro

Deserto Verde – os monocultivos de eucalipto – controlado pela Fibria S.A ameaça sobrevivência de pescadores tradicionais da região Sul da Bahia, que são criminalizados por defender seus direitos territoriais e a RESEX Cassurubá.

©Thomas Bauer

Reportagem / imagens: Thomas Bauer / CPT Bahia

Edição: Elvis Marques / CPT Nacional

Os olhos dos pescadores tradicionais mais antigos chegam a brilhar quando falam da riqueza dos manguezais, que fazem parte do Banco dos Abrolhos, situado no litoral Sul da Bahia. De acordo com vários estudos, na região dos Abrolhos localiza-se a maior biodiversidade marinha do Atlântico Sul. A região de longas costas, encontro de diversos rios com o mar, chama atenção pela elevada produtividade de pescado e mariscos, devido à grande quantidade de nutrientes dos rios, do mar e da própria vegetação que margeia o estuário [ambiente aquático de transição entre um rio e o mar].

Os mais velhos dizem que aqui nunca faltava peixe, caranguejo, guaiamum, camarão, siri, sururu, ostras, aratu, entre outros. A fartura era de encher os olhos e gerava um conforto muito grande para as famílias, numa das áreas pioneiras de ocupação e povoamento da Bahia e do Brasil. Décadas atrás, a região contava com uma frondosa Mata Atlântica, rica biodiversidade e inúmeras espécies endêmicas que, ao longo dos anos, principalmente com a abertura da BR-101 no ano de 1973, de Vitória (ES) para Salvador (BA), e chegada dos monocultivos [inicialmente mamão papaia e, a partir dos anos 1980, eucalipto], sofreu grandes impactos. No Sul baiano, o município de Caravelas também é conhecido mundialmente pelo Arquipélago de Abrolhos, onde podem ser avistadas as baleias que anualmente passam pela região.

RESEX em meio ao mar de eucalipto

Analista ambiental do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e atualmente chefe da Reserva Extrativista (RESEX) Cassurubá, localizada no município de Caravelas, Marcelo Lopes destaca que a reserva foi criada em junho de 2009. Hoje, a área conta com 100.687 hectares, e incide sobre os municípios de Alcobaça, Caravelas e Nova Viçosa.

A demanda da criação da reserva foi apresentada pelos próprios pescadores e pela comunidade local a partir de um conflito instalado com uma empresa que pretendia implantar em terras da União uma fazenda de camarão, o que ameaçava a sobrevivência das famílias pesqueiras e marisqueiras tradicionais. Diversas parcerias entre a comunidade, universidades, órgãos públicos, ONG’s, entre outras, contribuíram para impedir a implantação desse projeto e foram decisivas para a criação da RESEX no território do estuário e parte dos corais do Arquipélago.

Criado há oito anos, o atual grupo responsável pela gestão da RESEX, coordenado por Marcelo Lopes, prioriza em seu trabalho a organização social das comunidades – aproximadamente 1.600 famílias de pescadores que vivem em Cassurubá. Mas os desafios não param nesta região. Questionado sobre os monocultivos de eucalipto que chegam a sufocar os mangues e a zona de amortecimento da RESEX e a implantação do terminal portuário em 2002 da empresa Fibria S.A, Marcelo tem uma posição clara. Confira o vídeo:

 

A Fibria S.A., fundada em 2009, foi constituída a partir da fusão da empresa Aracruz e Votorantim Celulose e Papel, e é uma empresa brasileira de capital aberto e, hoje, líder mundial na produção de celulose branqueada. A empresa exporta o produto para mais de 40 países. Os dois maiores acionistas são a Votorantim S.A., que possui 29,16% das ações e o Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), com 29,02% das ações, ou seja, o próprio governo brasileiro. São estes dois grupos que definem todas as diretrizes, a política e os diretores da própria Fibria S.A, que ainda possui 43% das ações em circulação (free float) vendidas no mercado financeiro.

A empresa conta atualmente com três fábricas no estado do Espírito Santo. Além destas, uma fábrica em construção no estado do Mato Grosso e inúmeros monocultivos de eucalipto em várias regiões do país, inclusive no extremo sul da Bahia, como é o caso de Caravelas. 90% da área deste município é ocupada pelo cultivo de eucalipto, segundo denúncia da vereadora Julinda Moraes, apresentada em Audiência Pública realizada no ano de 2014 na cidade de Teixeira de Freitas, a cerca de 80 quilômetros de Caravelas, para discutir os impactos causados pela monocultura do eucalipto na região. Notícia sobre esse fato foi publicada pela Agência Câmara.

A partir do eucalipto, a empresa produz uma pasta química com base de celulose, material comumente utilizado, por exemplo, para a fabricação de papel. Para se ter uma ideia, apenas na Alemanha o consumo de papel (papel toalha, copos de papelão, papel para impressora, lenço de nariz, e etc) anualmente exige per capita de 235 quilos de papel. Em comparação, no Brasil o consumo per capita é de 43 quilos de papel. Neste sentido, é importante mencionar que os consumidores e investidores dos países importadores são corresponsáveis diante desta expansão que provoca sérios danos socioambientais.

 Violento processo de desterritorialização em andamento

Impressiona, desde a aterrissagem no aeroporto de Teixeira de Freitas até a cidade de Caravelas, o profundo processo de desterritorialização tanto na terra como daqueles que trabalham vinculados ao mar. A expansão do eucalipto, que ocupa hoje antigas áreas rurais de perder de vista, tem provocado sérios danos socioambientais e, em muitas situações, graves conflitos territoriais, inclusive mortes, como a do quilombola Diogo Oliveira Flozina, de 27 anos, pai de dois filhos, que teve sua casa invadida por três policiais à paisana, que, segundo testemunhas, mataram o jovem dentro de sua própria residência.

As famílias do Quilombo Volta Miúda, situado no município de Caravelas, local onde Diogo morava, conforme reportagem do portal Geledés (Instituto da Mulher Negra), acreditam que o quilombola foi morto por incomodar os interesses de produtores de eucalipto. O caso ocorreu no ano de 2011. “O quilombo de Volta Miúda é certificado pela Palmares, tem 120 famílias em estado de preocupante pobreza e sobrevivem com muito sacrifício por conta da dominação das empresas de eucalipto. Na região, vive em conflito com polícia e empresários, além da Volta Miúda, cerca de mais 7 comunidades que se sentem isoladas, sem apoio e cobertura nenhuma dos poderes públicos”, contextualiza a reportagem do Geledés.

A esta denúncia somam-se várias outras, como o ressecamento e a contaminação do solo da região, o desaparecimento de centenas de cursos d’água e nascentes, o desmatamento da Mata Atlântica, o declínio da agricultura familiar e a expulsão de dezenas de milhares de pessoas para as grandes cidades, como denunciado em recente Carta Aberta do I Seminário de Fortalecimento Comunitário da RESEX Cassurubá, que ocorreu no final do mês novembro de 2017.

Além destes impactos, os pescadores alertam que o terminal portuário e a dragagem do canal do Tomba, ambos em de Caravelas, afetam negativamente os manguezais e todo ecossistema da RESEX Cassurubá. Com a dragagem, o canal – que antes servia apenas para a navegação de pequenas embarcações durante a maré alta – foi alargado e, em alguns pontos, chega a 20 metros de profundidade. Esta intervenção da Fibria S/A garante hoje a passagem de embarcações de grande porte, cada uma carregada com cargas equivalentes a 80 e/ou 100 carretas de toras de eucalipto, dia e noite, independente do nível da maré. Muitas das embarcações deixam o porto sobrecarregado e, frequentemente, algumas toras caem no rio e no canal, o que tem provocado graves acidentes e prejuízos para os pescadores tradicionais e seus barcos.
  Frequentemente, algumas toras caem no rio e no canal, o que tem provocado graves acidentes.

O terminal portuário no município de Caravelas, no Sul da Bahia.

Diversos pescadores suspeitam que o alargamento do canal também tem afetado a cadeia alimentar na região e, consequentemente, a baixa na produção de pescados e mariscos na região. Como o fluxo e a força da água aumentou consideravelmente a partir da dragagem, toda maré grande avança por cima das terras e derruba o que encontra pela frente, causando erosões, como pode ser visto na praia da Barra. Além disso, a força da água retira dos manguezais muitos nutrientes que antigamente ficavam guardados no estuário e perto da costa; em seguida, o pouco que ainda resta perto da costa é afetado novamente na hora da dragagem. Durante este processo, todo o material é retirado do fundo do mar e suspenso pela draga. Em seguida, dispersado nas correntes que levam os nutrientes para longe. Tanto que, segundo os pescadores mais antigos, nunca antes foi possível encontrar o camarão longe da costa, perto da Ilha Coroa Vermelha, o que pode ser um indicador de um processo de migração dos animais para buscar alimentos em locais mais distantes, ou seja, a alteração de toda a cadeia alimentar.

Outro impacto visível, principalmente na Ilha Pontal do Sul, que fica ao lado da boca do Canal do Tomba, é a morte dos manguezais. O material da dragagem (sedimentos) é despejado no final do Canal, em direção ao mar. As correntes marítimas, por sua vez, devolvem para o canal e às praias esse material, o que tem sufocado os mangues, como é possível notar na Ilha, que pode desaparecer num futuro breve.

Há oito anos foi produzido um estudo ambiental pela H.M Consultoria de Projetos e Engenharia Ltda e Aracruz Celulose S.A, intitulado “Dragagem do Acesso ao Canal do Tomba Caravelas/BA” (Relatório Técnico HM RT-007-08, 10 Volumes), o qual afirma que “as atividades de dragagem no meio ambiente marinho da região não impactam os recifes e corais, sendo detectáveis apenas impactos pontuais, de baixa magnitude e rapidamente reversíveis, que não ocasionam efeitos deletérios permanente ao meio ambiente”. O que tem sido questionado através de um parecer independente da Coalizão SOS Abrolhos, que engloba diversas entidades, ONG´s e universidades. O documento produzido por este grupo sobre o estudo ambiental da Aracruz Celulose do dia 23 de abril de 2009 chega a afirmar que “é imprescindível que a Aracruz Celulose reconheça e assuma os impactos ambientais e socioeconômicos de suas operações no município de Caravelas, para que a partir daí, possamos ter uma discussão técnica fundamentada sobre as alternativas para mitigação e compensação destes impactos”.

Embarcação da Fibria S.A ao entrar pelo canal do Tomba com mangue seco.

Diante das graves denúncias apresentadas pela comunidade local e por organizações, a Assessoria de Comunicação da empresa Fibria S.A foi procurada para comentar sobre a problemática, entretanto, até a publicação desta reportagem, não obteve-se resposta.

Protesto dos pescadores

Diante destes impactos e das reivindicações não atendidas pela empresa Fibria S/A, não restou outra alternativa aos pescadores tradicionais, que organizaram um protesto nos dias 22 e 23 de  julho de 2017 para chamar a atenção das autoridades. Essa foi a segunda manifestação dos pescadores que ocorreu neste ano – a primeira foi realizada no dia 1º de julho. O pescador Chanto fala sobre a última mobilização:

O protesto pacífico durou quase dois dias, mas foi interrompido por uma ordem judicial concedida pelo juiz da cidade de Teixeira de Freitas, que acusou quatro pescadores e o movimento autônomo de violar o direito da empresa e ir e vir, bem como perda de lucros cessantes, tanto no local do embarque como na fábrica em Aracruz. Como o foco do protesto foi a empresa Fibria S.A., os participantes do ato garantem que outra acusação feita pelo juiz, de ter obstruído o canal e impedido o tráfego e entrada de outros barcos, não é verdade.

A pescadora Maria Braz, filha do município de Alcobaça, que há 40 anos reside em Caravelas e conhece a região como a palma da mão, lembra-se dos tempos de fartura. Segundo a mulher, com a instalação da Fibria S.A. na região muitas coisas mudaram. “Nós não somos errados, protestar diante desse desastre que está acontecendo. É um direito nosso. Cada dia a gente passa mais dificuldades”, ressalta ela.

Na verdade, os pescadores não esperavam e nem queriam que a tensão entre a Fibria S/A e os mesmos chegasse a este extremo. Os pescadores veem essa criminalização como uma forma de intimidação. Entretanto, ciente de seus direitos, os pescadores garantem que mesmo sofrendo esse processo de criminalização não vão desistir de lutar por seu território e a comunidade tem despertado diante da perda de seu espaço. Para os pescadores, a empresa mostrou mais uma vez como desrespeita as famílias de pescadores tradicionais dentro de seu território. Juntos, os pescadores estão conscientes de que perder o seu território tradicional significaria a extinção do pescador artesanal local e do seu modo de vida, bem como a destruição dos manguezais com sua infinita biodiversidade, possível de acontecer diante dos danos socioambientais já causados dentro da RESEX Cassurubá e da sua zona de amortecimento.

FONTE: https://www.cptnacional.org.br/publicacoes-2/destaque/4165-pescadores-tradicionais-sufocados-por-deserto-verde-da-fibria-s-a-temem-pelo-futuro

 

 

Na surdina, (des) governo do Rio de Janeiro opera para transformar o Norte Fluminense num deserto verde

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Em meio a uma crise sem precedentes nas finanças públicas seria de se esperar que o (des) governo do Rio de Janeiro não estivesse se ocupando de entregar mais dinheiro público para as corporações privadas.

Mas quem esperou por isso, se enganou. E pior, como mostra a notícia abaixo,  tirada do site do Instituto Estadual do Ambiente (Inea),  há uma intervenção forte de transformar porções inteiras do território fluminense num deserto verde, como aquele que já cobre e causa danos ambientais incalculáveis no Espírito Santo.

A matéria mostra ainda que o Norte Fluminense, em especial o município de Campos dos Goytacazes, ocupa um lugar especial nos planos de transformação do Rio de Janeiro num deserto verde.  Agora, quem é que neste (des) governo teve o trabalho de vir ao Norte Fluminense para explicar a criação dessas “áreas prioritárias” para a desertificação verde para segmentos econômicos que possuem contribuições significativas como os ceramistas e os agricultores familiares?

O mais impressionante nesta matéria propaganda do Inea é a sugestão de que se pretende a partir da monocultura de árvores (principalmente o eucalipto) estabelecer qualquer tipo de recuperação ambiental em nossa região. A prática, e para verificar isto é só visitar o norte do Espírito Santo, é de que os plantios comerciais de árvores implicam na geração de graves problemas ambientais e sociais. 

Em suma, quem é que quer e a quem interessa que o Norte e o Noroeste Fluminense virem um deserto verde?

Governo define áreas prioritárias para prática da silvicultura no Estado

Institucional

O Governo do Estado publicou, no último dia 11 de março, o decreto nº 45. 597 de 10/03/2016 que define as áreas destinadas aos distritos florestais onde será incentivada a prática da silvicultura (cultivo de florestas). A finalidade é estimular a atividade econômica, uma vez que os produtores poderão comercializar produtos da base florestal, o que contribuirá para a geração de novas oportunidades de emprego e renda para regiões estagnadas ou de baixo dinamismo econômico.

Estudos técnicos indicam que o Rio de Janeiro possui mais de dois milhões de hectares de áreas aptas para a atividade de silvicultura, correspondendo a terras, hoje, destinadas a pastagens, na sua maioria, com baixa produtividade.

Apesar do potencial para a silvicultura econômica, o estado possui apenas cerca de 20 mil hectares de florestas plantadas, o que corresponde, aproximadamente, a 0,4% do seu território. Como consequência, o Estado do Rio de Janeiro importa dos demais estados da federação quase 90% dos produtos de base florestal.

Os Distritos Florestais onde serão desenvolvidas a silvicultura, abrangem áreas de grande potencial para implantação e desenvolvimento de atividades de silvicultura econômica, integrando fomento florestal e recuperação de áreas degradadas e/ou abandonadas, a fim de incorporá-las ao processo produtivo com plantios florestais.

“A implantação dos distritos florestais terá o potencial de atrair investimentos para o estado e vai agregar produtores, fornecedores e empresas beneficiadoras de produtos de base florestal. Tudo isto compartilhado com políticas públicas integradas de fomento à produção florestal, em conjunto com ações efetivas de recuperação de áreas degradadas”, disse o secretário estadual do Ambiente, André Corrêa.

A expectativa é de que no médio prazo o Estado do Rio de Janeiro seja auto suficiente na produção de insumos madeireiros e, no longo prazo, gerador de excedente para exportação.

Para isto, foi feito um amplo estudo no âmbito do Projeto de Elaboração do Zoneamento Ecológico Econômico do Estado (ZEE-RJ), realizado pela Secretaria de Estado do Ambiente (SEA), em parceria com as Secretarias de Agricultura e Pecuária; e de Desenvolvimento Econômico, Energia, Indústria e Serviços que resultou na indicação de cinco áreas prioritárias para implantação de distritos florestais, somando, aproximadamente, 631 mil hectares. Deste total, cerca de 334 mil hectares (53%) possuem potencial para o desenvolvimento de florestas plantadas, área suficiente para fazer frente à demanda atual de insumos madeireiros no estado, da ordem de 120 mil hectares, e ainda gerar excedente para exportação, a médio e longo prazo.

Na definição dos limites dos Distritos Florestais foram levados em conta diversos fatores de exclusão/limitação à implantação da silvicultura econômica, nomeadamente:

a) Áreas Revestidas de Vegetação; b) Áreas de Preservação Permanente; c) Unidades de Conservação; d) Áreas Prioritárias para Conservação da Biodiversidade; e) Solos inadequados ou inaptos; f) Declividades e Altitude; g) Áreas de Uso Urbano e Peri-urbano; h) Assentamentos da Reforma Agrária; i) Terras Quilombolas; j) Terras Indígenas.

A expectativa é de que os Distritos Florestais se constituam em “território de desenvolvimento florestal integrado ” onde, além das ações de fomento florestal, serão implementadas políticas públicas complementares e articuladas, de cunho econômico, social e ambiental, conjugadas com ações efetivas de recuperação de áreas degradadas, com prioridades nas áreas de preservação permanente e reservas legais.

Os cinco distritos florestais abrangem, parcialmente, áreas de 25 municípios, sendo a maioria deles localizados na Região Norte-Noroeste do Estado que são as regiões que hoje apresentam os menores índices de cobertura florestal nativa.

Os cinco distritos florestais são:

Distrito Florestal Norte 1 – abrange parcialmente os municípios de Campos, Cardoso Moreira, Italva, São Francisco de Itabapoana e Bom Jesus de Itabapoana

Distrito Florestal Norte 2 – abrange parcialmente os municípios de Campos, Quissamã, Carapebus, Conceição de Macabu, Santa Maria Madalena e Macaé

Distrito Florestal Noroeste – abrange parcialmente os municípios de Itaperuna, Laje do Muriaé, Miracema, Santo Antônio de Pádua e São José de Ubá

Distrito Florestal Serrano – abrange parcialmente os municípios de Carmo, São Sebastião do Alto e Cantagalo

Distrito Florestal Médio Paraíba – abrange parcialmente os municípios de Paraíba do Sul, Paty dos Alferes, Rio das Flores, Quatis, Valença e Vassouras.​

Veja mapa com as áreas prioritárias para a criação dos distritos florestais:

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FONTE: http://www.inea.rj.gov.br/Portal/Noticias/INEA0117352&lang=#ad-image-0

Nuvens de Veneno

NUVENS

O filme “Nuvens de Veneno”, do cineasta e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Beto Novaes, reafirma Mato Grosso como campeão nacional em uso de venenos agrícolas, principalmente no plantio de grãos.

Em 25 minutos, o documentário mostra os riscos da cultura do agrotóxico para quem pulveriza as lavouras e para quem come os alimentos.

O filme foi lançado em Cuiabá, em um evento na Escola de Saúde Pública, que abordou a saúde do trabalhador da cidade e do campo em Mato Grosso.

Convido a todos a assistir e compartilhar o filme, no link abaixo:

http://muralvirtual-educaoambiental.blogspot.com.br/2013/12/nuvens-de-veneno.html

Esse modelo se desenvolva, em parte, pela desinformação da sociedade que não cobra das autoridades mais seriedade e responsabilidade sobre o tema.

Enquanto isso, segue no congresso, projeto que facilita registro de novos agrotóxicos do senador Ruben Figueiró (PSDB-Mato Grosso do Sul). O projeto de Lei PLS 209/13 fixa em 180 dias o prazo máximo para a liberação de novos defensivos agrícolas no mercado, projeto esse, que é para atender uma das principais queixas das empresas de agrotóxicos.

FONTE: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=263604637124438&set=a.147638088721094.33444.130765053741731&type=1&theater