Homenagem celebra a atuação do Procurador Regional dos Direitos do Cidadão do MPF ao longo de carreira dedicada à justiça social e ao diálogo com movimentos populares
A deputada Marina do MST (PT) fará a entrega da Medalha Tiradentes ao Procurador da República Dr. Júlio José Araújo Júnior
O Procurador da República Dr. Júlio José Araújo Júnior, atual Procurador Regional dos Direitos do Cidadão Adjunto do Ministério Público Federal (MPF), será agraciado com a Medalha Tiradentes, uma das mais altas honrarias do Estado do Rio de Janeiro, em sessão solene a ser realizada no Centro Cultural da Justiça Federal nesta terça-feira (27), às 18h. A condecoração, que será entregue pela deputada Marina do MST (PT), celebra sua trajetória dedicada à justiça social, à defesa dos direitos humanos e ao diálogo com movimentos populares.
Com formação pela Universidade de São Paulo (USP), mestrado e doutorado em Direito Público pela UERJ, o homenageado possui uma carreira marcada pelo compromisso com causas estruturantes. Coordenou diversos grupos de trabalho sobre pautas como demarcação de terras indígenas, direitos quilombolas e dos trabalhadores rurais Sem Terra, reforma agrária popular, sistema prisional e educação. Dr. Júlio Araújo liderou ainda iniciativas de combate à violência de Estado, atuando no enfrentamento à letalidade policial e intolerância religiosa, e de aproximação do Ministério Público com a sociedade, através dos projetos “MPF na Comunidade” e “MPF em Movimento”.
O homenageado tem ainda importante incidência na reparação do povo negro pelos crimes durante a escravização, na discussão sobre a justiça de transição e as violações de direitos humanos durante a ditadura civil-militar e na luta pela proteção das famílias em situação de vulnerabilidade durante a pandemia. Além disso, acompanhou a comissão de soluções fundiárias do TRF 2, o Fórum de Reforma Agrária e Segurança Alimentar no estado do RJ e criou, em parceria com o NUTH, o grupo interinstitucional de moradia adequada na área central da cidade do Rio de Janeiro.
Autor dos livros “Direitos Territoriais Indígenas: Uma Interpretação Intercultural” (finalista do Prêmio Jabuti 2019) e “Ministério Público e Movimentos Sociais: Encontros e Desencontros”, Dr. Júlio também foi diretor da Associação Nacional dos Procuradores da República (2021-2023) e integrou o Conselho Nacional do MP.
Concedida a personalidades que exemplificam liderança, integridade e serviço público, a Medalha Tiradentes reforça o papel do homenageado como um “defensor da Democracia e dos direitos fundamentais”.
“Dr. Julio José Araujo Junior certamente demonstra essas qualidades em sua carreira como Procurador da República, e sua contribuição merece ser reconhecida e celebrada pela dedicação e compromisso com os movimentos sociais e com as pessoas em situação de vulnerabilidade social. Precisamos dar visibilidade e reconhecimento àqueles que não titubeiam nas suas tarefas públicas e fortalecem os direitos das classes trabalhadoras”, afirma Marina do MST.
Serviço
Sessão Solene de Entrega Medalha Tiradentes ao Procurador Dr. Júlio José Araújo Júnior
Dia 27 de maio, às 18h
Centro Cultural da Justiça Federal – Av. Rio Branco, 241 – Centro
Pela primeira vez, edição especial da pesquisa traz uma análise comparada das informações socioambientais divulgadas pelas maiores marcas de moda no Brasil
Desde 2018, o Instituto Fashion Revolution Brasil desempenhou um papel pioneiro ao impulsionar a transparência nas grandes marcas, e o ITMB se consolidou como uma das ferramentas mais importantes nesse processo. A pesquisa, que, entre 2018 e 2023, expandiu sua análise de 20 para 60 marcas, avaliou e ranqueou a divulgação pública de informações sociais e ambientais dessas empresas. Isso permitiu a criação de uma extensa base de dados sobre os desafios socioambientais da moda em nosso país.
Pela primeira vez, o ITMB apresenta uma edição comparativa, que oferece um balanço desses últimos seis anos da pesquisa. Nessa análise, são avaliados como e o que as maiores marcas e varejistas no Brasil divulgaram sobre suas políticas, práticas e impactos sociais e ambientais. O estudo examina os desafios persistentes e a divulgação de boas práticas adotadas ao longo do período, proporcionando uma visão ampla sobre os avanços, retrocessos e estagnações da indústria.
Além da análise comparativa, a pesquisa deste ano incluiu um estudo de impacto com as marcas participantes, visando compreender os efeitos e impactos do próprio ITMB. Os resultados mostram que 68% das marcas reconhecem que o Índice impulsionou suas práticas de sustentabilidade e transparência, enquanto 72% percebem mudanças internas como resultado da participação no projeto. As conclusões confirmam que medir a transparência das marcas pode ser um verdadeiro motor de mudança, levando a melhorias contínuas, ressaltando a necessidade de um engajamento cada vez maior da indústria nesse processo.
Entre 2018 e 2023, houve um avanço na transparência na moda: a pontuação média das marcas subiu de 17% para 22%
No relatório comparativo de 2024, foram destacados quatro temas-chave para a análise: meio ambiente, direitos humanos, governança e rastreabilidade, com foco nas áreas prioritárias e nas mudanças observadas ao longo dos anos. Apesar desse progresso na pontuação média de transparência (de 17% em 2018 para 22% em 2023), o avanço das marcas ainda é considerado lento, especialmente frente aos desafios sociais e ambientais perpetuados por essa indústria.
Na seção de meio ambiente foram comparados tópicos fundamentais para direcionar a moda no combate aos impactos climáticos, como emissão de gases de efeito estufa e circularidade. Houve um aumento significativo na divulgação de emissões de gases de efeito estufa pelas marcas, passando de 17% em 2019 para 45% em 2023 (nos Escopos 1 e 2) e,
referente à cadeia de fornecimento, de 10% em 2019 para 40% em 2023 (Escopo 3). No entanto, em relação à circularidade, poucas empresas informam quantos produtos são projetados para serem reciclados ao fim da vida útil, evidenciando que práticas para a moda circular ainda estão em fase inicial, com avanços tímidos: de 6% em 2021 para 8% em 2023.
A transparência avançou em ritmo insuficiente para enfrentar as violações de direitos humanos do setor
Na seção de Direitos Humanos, são discutidos temas como direitos trabalhistas, trabalhadores migrantes e o trabalho escravo contemporâneo no setor. Dentre os temas analisados pelo Índice, o que apresentou menor crescimento em transparência ao longo dos anos foi a divulgação de informações sobre salários justos ao longo da cadeia de fornecimento. A pontuação média das marcas nesses indicadores passou de 3% em 2022 para 6% em 2023.
Quanto à igualdade de gênero e racial, notou-se que a questão racial ainda não é uma prioridade para grande parte das marcas. Embora a divulgação de programas de desenvolvimento de carreira para reduzir desigualdades de gênero internamente tenha crescido de 16% em 2021 para 27% em 2023, os programas voltados para a desigualdade racial apresentaram um aumento bem mais tímido, subindo de 6% para apenas 13% no mesmo período. Além disso, é importante destacar que a transparência sobre ações voltadas para reduzir a desigualdade de gênero e racial é mais baixa no nível da cadeia de fornecimento. Entre 2022 e 2023, a divulgação de ações com foco na promoção de igualdade de gênero nas instalações dos fornecedores passou de 5% para 7% e sobre igualdade racial e étnica passou de 2% para 3%.
Apesar de um expressivo aumento na transparência da divulgação de listas de fornecedores, mais da metade das empresas ainda não publica essas informações
Em Governança, o ITM mostrou que a transparência é impulsionada por exigências regulatórias, visto que as marcas de capital aberto tendem a ser mais transparentes sobre o tema. Das 60 marcas analisadas em 2023, 21 eram listadas em bolsas de valores, com uma pontuação média de 51%, em contraste com apenas 12% das 39 empresas de capital fechado.
A seção de Rastreabilidade foi a que apresentou o maior crescimento na pontuação média geral, passando de 12% em 2018 para 25% em 2023. Focada na divulgação das listas de fornecedores, ela abrange três níveis: fornecedores diretos, instalações de processamento e fornecedores de matéria-prima. A transparência sobre a rastreabilidade permite mapear e monitorar riscos sociais e ambientais, facilita a mitigação colaborativa de problemas e promove uma mudança real nas cadeias de fornecimento.
Para Isabella Luglio, Coordenadora do projeto, “A edição comparativa do ITMB revela que, embora tenhamos que celebrar alguns avanços da transparência do setor nos últimos anos, ainda há muito a ser feito pelas marcas para enfrentar os impactos ambientais da moda e proteger os trabalhadores mais vulneráveis ao longo da cadeia de produção. A análise das divulgações feitas nos últimos anos não só destaca o que foi realizado, mas também aponta os próximos passos necessários para cobrar transparência das marcas, pressionando-as a adotar estratégias que enfrentem a crise climática e assegurem os direitos humanos no setor”.
O Fashion Revolution é um movimento global e, no Brasil, é registrado desde 2018 como uma organização da sociedade civil que luta para acelerar a transição da moda brasileira rumo à justiça social e climática, com o objetivo de ser uma força para o bem. Atuamos por meio da comunicação, educação, colaboração e mobilização.
Organizações de direitos humanos responsabilizam o Grupo Bayer pelas consequências catastróficas da agricultura industrial, como o cultivo de soja no Brasil. Foto: IMAGO/Pond5 Imagens
Por Hermann Pfeiffer para o “Neues Deutschland”
A empresa química e farmacêutica Bayer viola os princípios da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Quatro associações latino-americanas de direitos humanos estão convencidas disso. Centro de Estudios Legales y Sociales (Argentina), Terra de Direitos (Brasil), Base-IS (Paraguai) e Fundación Tierra (Bolívia) são apoiados pela Organização de Ajuda Episcopal Misereor e pela Coordenação contra os Perigos Bayer (CBG), que tem sido existente desde 1978 para a protecção ambiental e empregos seguros no grupo Leverkusen. As organizações apresentaram recentemente uma queixa da OCDE contra a Bayer AG.
“A empresa não conseguiu abordar os graves riscos ambientais e para os direitos humanos associados ao seu modelo de negócio na região”, explica Sarah Schneider, especialista em agricultura e alimentação global da Misereor. Ela critica que os efeitos do usode sementes geneticamente modificadase de agrotóxicos não tenham sido adequadamente monitorados.
Segundo os reclamantes, a empresa promove um modelo agrícola que leva à insegurança alimentar, escassez de água, desmatamento extremo, perda de biodiversidade, graves impactos na saúde e conflitos de terra com comunidades indígenas e agrícolas na América do Sul. Segundo a CBG, mais de 50% das terras agrícolas no Brasil, Argentina, Bolívia e Paraguai são cultivadas com sementes de soja geneticamente modificadas. A Bayer AG é líder na comercialização de pesticidascomo o controverso glifosatoe sementes de soja geneticamente modificadas que são resistentes a este herbicida de amplo espectro. A denúncia da OCDE documenta quatro casos específicos na Argentina, Brasil, Paraguai e Bolívia.
“Com a denúncia mostramos que as pessoas da nossa região sofrem intoxicações e doenças graves devido ao cultivo da soja”, enfatiza Abel Areco, diretor-geral da organização Base-IS. As fontes locais de água seriam contaminadas e as comunidades indígenas seriam privadas do seu território. “Isso destrói seu modo de vida e afeta seu acesso aos alimentos”, explica.
O que é notável na abordagem das organizações é o nível original de discussão. Os críticos da Bayer referem-se aos seus princípios na sua queixa à organização das nações industrializadas OCDE, em Paris. Organizações não governamentais descobriram o procedimento de reclamação associado como uma alternativa gratuita às ações judiciais nos tribunais estaduais.
As Diretrizes da OCDE contêm recomendações abrangentes para um comportamento responsável por parte das empresas multinacionais. A gama inclui, entre outras coisas, direitos humanos e aspectos ambientais, interesses do consumidor e direito da concorrência. Um total de 51 países, incluindo os Estados Unidos e quase todos os membros da UE, incluindo a Alemanha, ratificaram as directrizes.
“Em sua natureza jurídica, é soft law”, escrevem sócios do escritório de advocacia internacional Freshfields Bruckhaus Deringer em uma análise. O escritório de advocacia voltado para negócios geralmente representa empresas e governos nacionais. Segundo o escritório de advocacia, o processo não termina com uma sentença executória. Mas o ponto de contacto nacional da OCDE, neste caso localizado no Ministério Federal dos Assuntos Económicos, em Berlim, apela às empresas criticadas para que comentem. Poderá então haver mediação.
Mesmo que as empresas não respondam, a OCDE tem um relatório final que é publicado no website do ponto de contacto. As empresas afetadas que recusam ou não têm bons argumentos correm o risco de danos significativos à sua imagem. Esta é a base do verdadeiro poder de aplicação das Diretrizes da OCDE. Além disso, os relatórios finais da OCDE podem tornar-se a base para ações judiciais. Isso aconteceu por causa do acidente na barragem de Brumadinho, no Brasil, contra a alemã TÜV Süd e por causa dos casos de envenenamento na Índia contra a fabricante suíça de pesticidas Syngenta.
O CBG já tinha aproveitado a assembleia geral virtual de acionistas no final de abril para apontar os riscos dos medicamentos da Bayer, das cadeias de abastecimento e da comercialização de pesticidas proibidos em toda a UE em países do sul global. “Em palavras e atos, reais e virtuais, o conselho de administração e o conselho fiscal foram confrontados com críticas à empresa, a fim de mostrar aos gestores os efeitos colaterais de sua busca implacável por lucros”, diz o diretor-gerente da CBG, Marius Stelzmann. Antes da assembleia geral, as organizações submeteram a reclamação à OCDE. O ponto de contacto da OCDE em Berlim tem até ao final de julho para decidir sobre a admissibilidade da queixa e iniciar a mediação.
Mais de 13.000 aldeões nigerianos podeminiciais ações judiciais contra empresas petrolíferas, decide tribunal superior em Londres
Manifestantes reúnem-se em frente ao tribunal superior de Londres, em Julho, devido aos derrames de petróleo da Shell no delta do Níger. Fotografia: Vuk Valcic/Zuma Press Wire/Shutterstock
Por Sandra Laville para o “The Guardian”
Milhares de aldeões nigerianos podem apresentar queixas de direitos humanos contra a empresa de combustíveis fósseis Shell devido à poluição crónica das suas fontes de água e à destruição do seu modo de vida, decidiu o tribunal superior de Londres.
A Sra. May decidiu esta semana que mais de 13.000 agricultores e pescadores das comunidades Ogale e Bille, no delta do Níger, tinham o direito de intentar ações judiciais contra aShell por alegadas violações do seu direito a um ambiente limpo.
O juiz decidiu que era passível de análise se a poluição tinha violado fundamentalmente o direito dos aldeões a um ambiente limpo ao abrigo da constituição nigeriana e da Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos. As reivindicações sob esses direitos não têm prazo de prescrição.
A Shell disse que a sua subsidiária nigeriana, a Shell Petroleum Development Company of Nigeria (SPDC), aceitou a responsabilidade pelos derrames que causou e compensou as partes afectadas quando exigido pelos regulamentos nigerianos relevantes. Afirmou que também corrige todos os derramamentos de seus ativos, independentemente da causa. A Shell plc nega que tenha um dever de diligência diretamente para com os requerentes.
A Shell disse em resposta à sentença que os requerentes não conseguiram identificar o derramamento ou derramamentos específicos que teriam causado o dano, apesar de o tribunal ter ordenado que isso fosse feito.
Matthew Renshaw, parceiro da equipe internacional do Leigh Day, que representa os moradores, disse: “Esta decisão é um momento significativo na batalha de oito anos das comunidades Ogale e Bille para fazer com que a Shell assuma a responsabilidade pela poluição por petróleo que tem arruinaram suas terras.
“Durante esse período, a Shell recorreu repetidamente ao uso de aspectos técnicos para tentar bloquear e atrasar as reivindicações dos nossos clientes. Segundo a lei constitucional nigeriana, a Shell já não poderia argumentar que não tem responsabilidade pela poluição porque esta ocorreu há mais de cinco anos.”
Renshaw acrescentou: “Esperamos agora avançar sem mais demoras para um julgamento, onde as reivindicações dos nossos clientes por uma limpeza completa e compensação pela destruição do seu modo de vida possam ser plenamente ouvidas”.
Há três anos, o Supremo Tribunal decidiu por unanimidadeque “há um bom argumento discutível” de que a Shell plc (a empresa-mãe sediada no Reino Unido) é legalmente responsável pela poluição causada pela sua subsidiária nigeriana.
Mas o caso continuou numa série de disputas jurídicas entre a Shell e os requerentes.
Um porta-voz da Shell disse sobre o último julgamento: “Acreditamos fortemente no mérito do nosso caso.O petróleo está sendo roubado em escala industrial no delta do Níger. Esta criminalidade é uma importante fonte de poluição e é a causa da maioria dos derrames nas reivindicações de Bille e Ogale.
“Independentemente da causa, a SPDC limpa e remedia áreas afetadas por derrames provenientes das suas instalações ou rede de gasodutos, trabalhando em estreita colaboração com reguladores, comunidades locais e outras partes interessadas. Acreditamos que os litígios pouco fazem para resolver o problema real no delta do Níger: derrames de petróleo devido a roubo, refinação ilegal e sabotagem, com os quais o SPDC é constantemente confrontado e que causam a maior parte dos danos ambientais.”
Um porta-voz acrescentou: “A Shell não tem planos de deixar a Nigéria. Como afirmado anteriormente, a intenção da Shell é reduzir o seu envolvimento na produção de petróleo onshore na Nigéria, mantendo ao mesmo tempo as suas posições em águas profundas e de gás integradas no país.”
A decisão desta semana significa que os requerentes irão agora se preparar para um julgamento. Uma audiência acontecerá nos dias 12 e 13 de dezembro para mais argumentos jurídicos.
Este texto escrito originalmente em inglês foi publicado pelo jornal “The Guardian” [Aqui!].
Na imagem, a coordenadora da COEQTO Maryellen Crisóstomo ao lado do presidente do CNDH André Carneiro. Foto: Geíne Medrado/Ascom COEQTO
Por Geíne Medrado, ASCOM COEQTO
A Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins (COEQTO) e a Comunidade Quilombola Rio Preto denunciaram uma série de violências e violações aos Direitos Humanos sofridas pelos Territórios Quilombolas do Tocantins. A denúncia foi feita em audiência pública realizada na última sexta-feira, 27, pelo CNDH, em Palmas-TO, com participação do Núcleo Especializado de Defesa dos Direitos Humanos (NDDH) da Defensoria Pública do Estado do Tocantins (DPE), movimentos sociais e sociedade civil.
A Comunidade Quilombola Rio Preto, que fica localizada no município de Lagoa do Tocantins foi reconhecida pela Fundação Cultural Palmares, no dia 25 de outubro deste ano após sofrer ataques violentos. Mesmo com o reconhecimento do Governo Federal, assim como em outros quilombos do Estado, o território é disputado por fazendeiros devido à falta de regularização.
Sem segurança, as 50 famílias de Rio Preto estão intimidadas e sitiadas em virtude da violência que se agravou no início de setembro depois que uma decisão judicial em desfavor dos agressores concedeu o direito à reintegração e manutenção de posse do território à comunidade.
Na audiência com o CNDH, Rita Lopes, presidente da Associação da Comunidade Quilombola Rio Preto, denunciou a situação de violência e violação aos Direitos Humanos da comunidade e pediu segurança às famílias que seguem sofrendo ameaças e intimidações, limitando o direito de ir e vir da comunidade, bem como a utilização das terras para suas atividades de subsistência. Atividades simples do dia a dia não estão sendo realizadas por medo de novos ataques.
“O Quilombo Rio Preto vem sofrendo série de ameaças à dignidade, à nossa existência e inclusive à nossa memória e nossos cemitérios também estão sendo ameaçados. Foi fechada a casa de arroz, a casa de farinha e a escola. Por mais que a gente venha pedindo socorro, no papel mudou, mas na prática, infelizmente, nada melhorou. Fazemos várias ações levando a polícia local e vários órgãos públicos. Eles prometeram fazer esse policiamento, mas infelizmente não foi cumprido. Esse é um espaço para pedir socorro mais uma vez. Eu espero que o Quilombo Rio Preto e suas memórias sejam protegidos”, disse Rita Lopes.
A Coordenadora da COEQTO, Maryellen Crisóstomo, reforçou a preocupação com a situação de Rio Preto, pediu proteção às lideranças quilombolas e relatou a realidade dos outros mais de 40 territórios Quilombolas do Tocantins, que têm o direito à regularização negligenciado pelo Estado.
Ainda durante a agenda de reuniões do CNDH em Palmas, a COEQTO se reuniu, na quarta-feira, 25, com o presidente do Conselho, André Carneiro, reportando a situação do Quilombo Rio Preto e as violações de Direitos a outras comunidades quilombolas do Tocantins.
O presidente do CNDH ouviu as demandas coletivas e reforçou que o Conselho irá trabalhar na produção de relatório e recomendações aos órgãos públicos responsáveis para melhorar a segurança dos quilombos no Tocantins.
E em relação às violações aos Direitos Humanos das Comunidades Quilombolas, disse que tratarão como prioridade a segurança das famílias e as recomendações ao poder público para regularização dos territórios quilombolas, por meio da aprovação de Decreto.
Vídeos em que jovens exibem suas compras da gigante chinesa de roupas Shein são populares no TikTok. O varejista levou apenas alguns anos para se tornar um concorrente sério de marcas de fast fashion como Zara e H&M no Ocidente. A Shein copiou seu modelo de negócios e o tornou ainda mais rápido ao produzir roupas ‘sob demanda’. Isso tem ramificações para trabalhadores têxteis, consumidores e meio ambiente.
Por Yara Van Heugten para o “Follow the Money”
‘Na verdade, eu deveria estar muito envergonhada’, Elena disse a seus 29 mil seguidores no TikTok no início de junho. ‘Como você pode ver, eu pedi algumas coisas na Shein.’ Ela diz isso rindo e mostra duas sacolas plásticas brancas da loja virtual chinesa. ‘Vou sair de férias em breve’, explica Elena. Ela comprou seis pares de sandálias, 16 tops, dois macacões, uma saia, dois sutiãs, três colares e um par de brincos. O custo: 400 euros.
O vídeo já foi visto mais de 570 mil vezes e curtido 25 mil vezes. A seção de comentários mostra que o comportamento de compra de Elena não é incomum entre os adolescentes e jovens de 20 e poucos anos que a seguem. ‘Oh meu deus, eu fiz a mesma coisa hoje.’ ‘Se encomendar um valor superior a 180 euros, tem de pagar taxas de serviço, por isso peço sempre em vários lotes.’ ‘Eu pensei que eu era ruim, haha.’
Vídeos em que os jovens desempacotam, personalizam e comentam seus pedidos de Shein (pronuncia-se She-in) são populares no TikTok (#sheinhaul). As centenas de milhares de vídeos de influenciadores formam um fluxo contínuo de publicidade para a marca que foi vista mais de 11,3 bilhões de vezes em todo o mundo. Isso transformou Shein namarca de moda mais pesquisada no Google em 2022 e uma séria concorrente dos titãs da moda rápida H&M e Zara.
Milhares de jovens compartilham suas compras da loja virtual Shein no TikTok (#sheinhaul)
Porque a Shein é ainda mais barata: você compra camisetas e vestidos lá pelo preço de um cappuccino. É mais rápido: a Zara já foi elogiada por seu ciclo de produção de três semanas, mas a Shein inventa, fabrica e vende produtos em menos de uma semana. E produz muito mais. Segundo Sheng Lu, professor associado da Universidade de Delaware, a H&M oferece cerca de 25 mil produtos diferentes anualmente, e a Zara cerca de 35 mil. A Shein vende 1,3 milhão de produtos diferentes no mesmo período. Isso é 40 a 50 vezes mais.
E o modelo ultrarrápido da Shein está funcionando. A varejista chinesa está crescendo rapidamente. Em uma rodada de investimentos em maio de 2023, os investidores avaliaram a Shein em 66 bilhões de dólares – três vezes mais do que o Grupo H&M.
Como funciona a Shein? Como ficou tão grande tão rapidamente? E como o método operacional do varejista afeta as pessoas que fazem as roupas, os consumidores e o meio ambiente?
Um modelo revolucionário
Em 2009, Wang Xiaohu descobriu que seu parceiro de negócios havia desaparecido. Eles administravam um negócio de comércio eletrônico de roupas, eletrônicos, louças e muito mais. Xu Yangtian, mais tarde chamado de Chris Xu, não estava no escritório nem em casa. No ano passado, Wang disse àrevista norte-americana Wired que Xu não atendia o telefone e havia alterado as senhas de suas contas comerciais.
Wang não falou com ele desde então.
Em 2011, ele descobriu que Xu havia aberto uma nova loja virtual de roupas: She Inside , que ele encurtou para Shein em 2015. Xu usou o modelo que eles testaram juntos. Ele não desenhava as roupas sozinho – revolucionário para uma empresa de moda – mas as comprava diretamente dos fornecedores. Apenas pequenas quantidades por item: 100 a 200 peças. A quantidade de compra só era aumentada se um produto vendesse bem.
A empresadisse ao The Wall Street Journal que a Shein ainda usa esse modelo: produzir uma quantidade mínima de itens, aumentar a escala se um produto se mostrar popular. Essa é a razão dos preços extremamente baixos, explicou Shein . ‘Muito pouco de nossa mercadoria não é vendido. É assim que podemos ser tão econômicos.’
Shein evita responsabilidades usando um ‘jogo bizantino de estrutura corporativa’
Há outro motivo, porém: a Shein sabe exatamente o que seu público-alvo deseja. Seja uma tendência circulando no TikTok – como as roupas rosa choque de #bimbocore – ou roupas caras de grife usadas por uma celebridade em uma nova postagem no Instagram, você pode encontrar quase instantaneamente algo semelhante na Shein.
Quando um entrevistador da revista Time perguntou ao vice-presidente David Wang no início de julho como a Shein sabe o que os clientes querem, ele respondeu : ‘Se você é um consumidor que passa muito tempo navegando, descobrindo e refletindo, basicamente você está projetando. É basicamente análise de comportamento, e então você agrega, e isso se torna um padrão.’
Em outras palavras: a Shein acompanha de perto o que seus usuários fazem no aplicativo e na web e deduz disso o que deve fazer. De acordo com os blogueiros de tecnologia Packy McCormick e Matthew Brennan, a empresa combina os dados do aplicativo com os dados de pesquisa do Google e a inspiração que reúne navegando pelos sites concorrentes.
Roubo de design
Enquanto isso, centenas de marcas e artistas afirmam nas redes sociais que a Shein está produzindo cópias idênticas de seus trabalhos e vendendo-as por uma fração do preço. Na semana passada, surgiram as notícias de que a H&M está processando a Shein por roubo de design. A empresa já foi processada pela marca de jeans Levi’s, pela empresa de moda Ralph Lauren e pela marca de calçados Dr Martens.
No início de julho, três estilistas americanos de quem a Shein roubou designs anunciaram um processo contra a empresa. Eles argumentamque, devido ao processo de design baseado em dados da Shein, um padrão de infração criminosa sistemática de propriedade intelectual está embutido no modelo de negócios.
De acordo com os designers, a empresa conseguiu evitar qualquer responsabilidade até agora usando um ‘jogo bizantino de estrutura corporativa’. ‘Como mencionado, a Shein argumenta regularmente que qualquer entidade que está sendo processada não tem acesso às informações mantidas pela empresa responsável pelo design.’
Portanto, os demandantes estão invocando uma lei originalmente projetada para combater o crime organizado (Racketeer Influenced and Corrupt Organizations Act, RICO). “Isso pode fornecer os remédios necessários para combater esses erros bem organizados distribuídos por uma série de atores e entidades relacionados”, explicam.
Esta lei permite processar conjuntamente crimes de empresas aparentemente independentes.
Uma série de empresas
De fato, quem tenta desvendar a empresa Shein não pode ignorar o fato de que ela envolve uma série de empresas e que a inter-relação entre elas não é transparente, de modo que nunca fica totalmente claro quem é o responsável.
Quando Xu fundou a She Inside em 2011, ele nomeou a empresa por trás dela como Nanjing Diangshang Information Technology. Em 2015, ele também iniciou a Zoetop Business em Hong Kong, para a qual transferiu os direitos da marca Shein. Em 2017, ele abriu uma nova empresa, Guangzhou Xiyin International Import & Export, para enviar roupas para o exterior.
Há também uma empresa em Cingapura (Roadget Business), uma sede europeia em Dublin (Infinite Styles Ecommerce) e uma empresa de investimentos nas Ilhas Virgens Britânicas: Beauty of Fashion Investment.
A julgar pela página da Shein no LinkedIn, a empresa agora considera a Roadget Business como sua sede. O proprietário final da rede de empresas é uma empresa de investimentos com sede nas Ilhas Cayman chamada Elite Depot.
Isso é conveniente: as empresas chinesas que se registram no exterior evitam o escrutínio rigoroso do governo chinês se quiserem abrir o capital no exterior. E é isso que Shein quer, segundo a agência de notícias Reuters: a empresa quer abrir o capital nos Estados Unidos. Uma vantagem adicional das Ilhas Cayman é que as empresas não precisam pagar impostos sobre seus lucros.
O nome do fundador Xu não aparece em nenhum dos relatórios anuais e estatutos encontrados pela Follow the Money, nem mesmo no relatório anual da sede de Cingapura. Não está claro quem é o dono do Elite Depot.
As pessoas que acessam o app diariamente recebem pontos que podem ser trocados por descontos
A Shein não divulga dados financeiros, mas de acordo com o último relatório anual da Roadget Business, a empresa faturou mais de 5 bilhões de dólares em 2021 e obteve lucro de 220 milhões de dólares. Fontes anônimas disseram ao The Wall Street Journal que um ano depois, em 2022, Shein obteve quase cinco vezes mais receita (23 bilhões de dólares) e quatro vezes mais lucro (800 milhões de dólares). Comparativamente, a Inditex, controladora da H&M e da Zara, faturou 21 e 35 bilhões de dólares em vendas, respectivamente.
Outra coisa chama a atenção no relatório anual europeu. A diferença entre o valor total que a Shein paga a seus fornecedores e a receita que obtém de seus consumidores é de apenas 20%. Isso é surpreendente, já que essa margem é de 53% na H&M e de 57% na Inditex. Isso não apenas explica por que os preços da Shein são tão baixos, mas também por que ela vende seus produtos de forma tão agressiva: para obter um pouco mais de lucro, a empresa precisa vender grandes quantidades adicionais.
Loja virtual x Candy Crush x TikTok
Influenciadores como Elena desempenham um papel importante nesse processo. Eles atraem novos usuários para o aplicativo Shein em troca de roupas grátis e 10 a 20 por cento de comissão. Enquanto estiver nele, o lojista faz de tudo para prender a atenção do usuário. Para pessoas com mais de 30 anos, o aplicativo parece confuso e intrusivo: a loja virtual encontra o Candy Crush e o TikTok.
Há transmissões ao vivo e um canal de vídeo que lembra o TikTok, com um fluxo interminável de videoclipes, e os usuários podem postar fotos de si mesmos usando seus itens favoritos em uma página pessoal.
A Shein entende que quanto mais tempo as pessoas gastam em seu aplicativo, maior a probabilidade de encontrarem algo que desejam. Assim, as pessoas que acessam o app diariamente recebem pontos que podem ser trocados por descontos. ‘Jogar fora’ é impossível, pois Shein adiciona de 5 a 10 mil novos produtos todos os dias.
E se a usuária estiver hesitante, o app a ajuda a tirar suas dúvidas.
Por exemplo, sempre há uma oferta especial que expira em pouco tempo, comentários positivos aparecem abaixo de quase todos os produtos (você ganha pontos por deixar um comentário) e, no checkout, você é incentivado a adicionar um pouco mais às suas compras carrinho: ‘Mais dois euros por um brinde’, ‘Peça mais 20 euros e ganhe 30 por cento de desconto’.
‘Parece que a Shein está encorajando ativamente os jovens a comprar o máximo de merda possível’
Shein não é o único a usar esses truques de sedução. Mas a escala em que a empresa os aplica é. Em setembro de 2022, a ONG suíça Public Eye pesquiou quais truques de sedução quinze varejistas de moda aplicam em suas lojas online. A Shein provouser o líder absoluto: seu aplicativo usa dezoito táticas diferentes. H&M e Zara usam respectivamente seis e quatro.
Marijn Sax, que obteve seu PhD pela Universidade de Amsterdã em um estudo sobre ambientes on-line manipuladores, acha que o aplicativo Shein é muito sofisticado. ‘É sujeira sobre sujeira sobre sujeira. Muitos truques usados por Shein não são explicitamente proibidos, mas como um estudioso da ética, acho a estrutura como um todo muito problemática.’
Sax pesa suas palavras e depois acrescenta: ‘Vamos contar como é: parece que a Shein está encorajando ativamente os jovens a comprar o máximo de merda possível. A influência é permitida, mas torna-se manipulação se os consumidores começarem a fazer escolhas que não fariam de outra forma. A Autoridade para Consumidores e Mercados proíbe isso. Mas judicialmente, algo assim é difícil de comprovar. A Shein alegará que vende produtos que os consumidores provavelmente desejam de qualquer maneira.’
Hotéis caros, champanhe e selfies com funcionários
Em junho deste ano, Shein levou seis influenciadores americanos para a China e Cingapura para uma viagem com todas as despesas pagas. “Muitos de vocês perguntaram mais sobre a Shein, e criamos [a viagem] como uma forma de dar aos nossos clientes uma visão dos bastidores de nossas operações e modelo de negócios sob demanda”, explicou a empresa no Instagram.
As influenciadoras, mulheres de cor ou mulheres de tamanho grande, vlog sobre isso em abundância. Nós as vemos bebendo champanhe na frente do espelho em luxuosos quartos de hotel e em um jantar de dez pratos com os principais executivos da empresa. Em vídeos editados em T, eles compartilham suas opiniões sobre o centro de inovação, sede e fábrica de reluzentes que puderam visitar, localizado a duas horas de Guangzhou.
‘Eu esperava que esta instalação estivesse tão cheia de pessoas trabalhando como escravos’, disse Destene Sudduth a seus 4 milhões de seguidores no Instagram. ‘Mas, na verdade, fiquei agradavelmente surpreso […] Honestamente, todo mundo estava trabalhando normalmente, relaxado, sentado. Eles nem estavam suando. Éramos nós que suamos andando por toda a instalação.
No total, a Shein tem impressionantes 5.400 fornecedores, escreveua empresa em seu primeiro relatório de sustentabilidade no início de 2023. O varejista não divulgou quem são.
Mesmo assim, a influenciadora plus size Dani Carbonari (478 mil seguidores) acreditou em tudo o que a equipe de marketing de Shein estava mostrando para ela: ‘Consegui entrevistar uma mulher que trabalhava no departamento de corte de tecidos, e vocês me conhecem, [sou] uma jornalista investigativa, então fiz a ela todas as nossas perguntas. Ela ficou muito surpresa com todos os rumores que estavam sendo espalhados nos Estados Unidos. Ela me contou sobre sua família, seu estilo de vida, seu trajeto, seus horários. [..] Acho que minha maior lição desta viagem é: seja um pensador independente, obtenha os fatos e veja com seus próprios olhos.’
‘Não quero pensar no que aconteceria se um incêndio começasse lá’
Os ‘rumores’ que Carbonari se refere a se originarem de uma investigação da ONG suíça Public Eye e de um documentário do canal de televisão britânico Channel 4. No final de 2021, a Public Eye localizou dezessete fornecedores Shein nas regiões de Guangdong e Jiangsu. Com a ajuda de um investigador local, eles descobriram que os trabalhadores da Shein trabalham em turnos de até 14 horas por dia. De acordo com a lei chinesa, uma semana de trabalho não pode exceder 40 horas, mas uma semana de trabalho padrão em um fornecedor da Shein é de 75 horas. Não há prêmio de horas extras.
O relatório da investigação inclui fotos das fábricas. Depois de inúmeros acidentes fatais em fábricas de roupas, é impressionante que as fábricas de Shein ainda tenham uma configuração tão insegura. As janelas estão trancadas, não há saídas de emergência e grandes sacolas de roupas e rolos de tecido bloqueiam corredores e escadas. ‘Eu não quero pensar sobre o que aconteceria se um incêndio começasse lá’,disse o investigador que visitou a fábrica ao Public Eye.
Untold , o documentário feito pelo Channel 4 em outubro de 2022, também pintaum quadro diferente das páginas do Instagram dos influenciadores.
Em uma fábrica apertada e escura, um jornalista disfarçado como funcionário corta tecidos em alta velocidade no formato necessário. Se ela for muito devagar, o supervisor grita para ela se apressar. Ela ganha cerca de cinco centavos por hora; se ela cometer um erro, dois terços de seu salário serão descontados.
Uma noite, ela visita a fábrica às três horas. Seus colegas ainda estão no trabalho. ‘Pessoas de classe baixa, que não têm um diploma adequado, não têm escolha a não ser trocar tempo por dinheiro’, explica o trabalhador da produção.
Acredita-se que as pessoas mais abaixo na cadeia de produção da Shein estejam trabalhando em condições ainda piores. A Bloomberg News teve roupas de algodão da Shein testadas em laboratório. A conclusão foi que, com base nas características genéticas, o algodão usado provavelmente veio da região chinesa de Xinjiang. O governo chinês está detendo mais de 1 milhão de uigures em campos de detenção e os forçando a trabalhar, inclusive em plantações de algodão.
Segundo a Shein, a empresa não tem fornecedores em Xinjiang, tem “tolerância zero para trabalho forçado” e respeita os direitos humanos.
As violações dos direitos humanos são uma consequência lógica do modelo de negócios ultrafast fashion de Shein, argumenta Nynke Eggen – sua consultoria, The Sustainability Club, aconselha marcas sobre empreendedorismo responsável. ‘Quando grandes volumes de roupas devem estar prontos alguns dias após serem encomendados, isso leva a grandes cargas de trabalho e horas extras excessivas nas fábricas.’
Ela diz que isso também se aplica ao fornecimento de materiais como o algodão. ‘Uma marca deve fazer pesquisas para saber de onde vêm os materiais e em que condições eles são adquiridos. Você dificilmente pode fazer essa pesquisa com prazos de entrega tão curtos.’
‘Cometi um grande erro’, disse a influenciadora Carbonari em um vídeo ao vivo em seu canal do Instagram uma semana depois de voltar da China. Após a viagem, ela enfrentou duras críticas de seguidores e completos desconhecidos. ‘Eu deveria ter feito mais pesquisas.’ Ela encerrou sua colaboração com Shein.
Encomendas de avião
“Como todas as empresas, estamos em uma jornada de sustentabilidade”, escreveu o fundador da Shein, Xu, no prefácio do relatório de sustentabilidade de sua empresa. Embora ele não desempenhe formalmente nenhum papel nas várias empresas por trás de Shein, ele continua sendo o CEO para declarações públicas. Ele assina como ‘Sky Xu’, um nome que não apareceu em fontes públicas antes.
‘No entanto, o que nos diferencia é nossa ambição de liderança’, continua ele, ‘sustentado pelo uso de tecnologia inovadora para reduzir o desperdício de estoque e fornecer produtos a preços acessíveis para clientes em todo o mundo.’
Shein costumava se gabar da sustentabilidade de seu modelo sob demanda. Durante uma entrevista à Time Magazine no início de julho, o vice-presidente Wang disse : ‘Somos moda sob demanda. Nós tentamos descobrir o que você quer. E então nós fazemos isso para você. Portanto, sempre temos números de estoque de um dígito muito, muito baixos. Considerando que [outros varejistas] têm que projetar coisas e, em seguida, armazená-las, comercializá-las e depois vendê-las. E então eles têm sobras. ‘Temos muito, muito poucas sobras’, afirma Wang.
O consultor de sustentabilidade Eggen considera o modelo de Shein ‘perfeito como tal’. ‘Ficarei muito entusiasmado se outras empresas usarem esse modelo para reduzir estoques desnecessários. Mas, no caso deles, não faz sentido pelos volumes e pela forma como produzem.’
Shein usa essas alegações para desviar a atenção de onde está o verdadeiro impacto ambiental de seu modelo de negócios. A empresaafirmou que até 2022, a Shein foi responsável por mais de 9 milhões de toneladas de emissões de carbono. Quase metade de todos os países do mundo emite menos, incluindo Luxemburgo, Moçambique e Costa Rica.
Mais da metade das emissões da Shein vêm de materiais e produção. Suas roupas são feitas principalmente de poliéster (64 por cento), um material derivado do petróleo. Menos de 1% das roupas de Shein vem de materiais reciclados.
Um terço das emissões de carbono da Shein vem do envio de pacotes para os consumidores. A empresa faz isso de avião, conforme revela seu portal de rastreamento. Aqueles que encomendarem algo receberão uma atualização quando o voo com a encomenda deixar a China.
‘Um terço é muito’, diz Eggen. ‘Outras empresas geralmente enviam produtos para um centro de distribuição na Europa primeiro. De lá, os produtos são transportados até os clientes em caminhões”.
Além disso, você também tem problemas ambientais causados pela Shein, pois os consumidores descartam as roupas depois de usá-las poucas vezes por estarem com defeito ou fora de moda. Shein não fala uma palavra sobre isso em seu relatório de sustentabilidade.
O que acontece com esses produtos depois? ‘Em princípio, reciclamos itens defeituosos em novos materiais. Nesse caso, não podemos porque os tecidos da Shein são de qualidade muito baixa para serem usados em novos fios’, diz Sympany, um dos maiores colecionadores de tecidos da Holanda. ‘Então a reciclagem de baixo teor é a única opção que resta, por isso é transformada em um material isolante, por exemplo.’
A Sympany revende roupas sem nenhum defeito. Isso acaba em outros lugares na Europa, Oriente Médio, Ásia e África por meio de intermediários. E essa não é a única maneira pela qual as roupas de Shein chegam aos países de baixa renda.
Revendedores em países de baixa renda mostram seus produtos Shein no TikTok
250 peças por 40 euros
Em 14 de março de 2023, Xiongjie Zhang da China fez um apelo no Facebook: ‘Sou um fornecedor da Shein com sede em Guangzhou, China. Tenho 200 mil peças em estoque. Estou procurando um revendedor.’ De preferência nas Filipinas, Malásia ou Vietnã.
Shein exige que façamos entregas rápidas. Se as vendas não forem boas, o estoque de tecidos ficará por sua conta
O modelo sob demanda da Shein pode resultar em estoques pequenos na própria empresa, mas certamente não nos fornecedores. Um fornecedor da Sheinreclamou sobre isso em um artigo de notícias chinês.
“A Shein exige que façamos entregas rápidas, o que significa que os fornecedores precisam preparar os acessórios com antecedência antes de poderem produzir. […] Se as vendas não forem boas, o estoque de tecidos e acessórios ficará por sua conta.’
Dezenas de vídeos do TikTok e páginas do Facebook mostram as enormes quantidades de sobras de roupas de Shein que acabam em países de baixa renda.
Em um dos vídeos, um homem filipino abre um fardo de roupas com uma faca Stanley. Sacos de plástico com ‘SHEIN’ impresso em letras pretas saem do buraco. O vídeo é parecido com o da holandesa Elena, mas esse fardo é dez vezes maior. ‘Somos um revendedor oficial da Shein’, diz a legenda. Ele vende os fardos por 2.500 pesos filipinos (41 euros) por 250 peças: cerca de 20 centavos cada.
‘Você não pode estar falando sério’, Eggen exclamou quando ouviu isso. ‘Isso prova que este modelo não pode funcionar com preços tão baixos. E isso faz sentido. Uma pequena produção significa relativamente muito tempo de preparação. Essa linha de produção deve ser configurada com as linhas de cores corretas e as instruções corretas. Só então a velocidade de produção aumenta. Para uma peça de roupa de 3 euros, você precisa de cada segundo para ser eficiente. É aí que está a margem da fábrica. Portanto, se você precisa fazer 100 peças, mas sabe que outras 3.000 podem chegar, é melhor fazer isso de uma só vez. É lógico que os fornecedores façam essa aposta.’
Ela ri. ‘Merda. Mesmo esta parte do Shein não é sustentável. Isso é algo que o mundo precisa saber.
Follow the Money escreveu para Shein fazendo perguntas durante esta investigação, mas não recebeu resposta.
Este artigo escrito originalmente em inglês foi publicado pela “Follow the Money” [Aqui!].
As ONGs destacam que o processo de entrada no bloco deve ser visto como uma oportunidade de correção de rumos e pedem maior participação
13 de abril — Em carta enviada, ontem, ao secretário-geral da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), Mathias Cormann, Anistia Internacional Brasil, Human Rights Watch, Transparência Internacional – Brasil e WWF-Brasil alertaram sobre retrocessos recentes para os direitos humanos, o meio ambiente, a transparência, o combate à corrupção e o fortalecimento da democracia, agravados no governo do presidente Jair Bolsonaro.
O documento destaca a preocupação das organizações de que o convite para que o Brasil inicie discussões formais para a entrada no bloco, recebido em janeiro, transmita a mensagem equivocada de que a OCDE não está atenta ao desmonte em políticas e órgãos ambientais e de combate à corrupção no Brasil, e a ataques sistemáticos praticados contra os direitos humanos.
Mauricio Voivodic, diretor executivo do WWF-Brasil afirma que “diante do desmonte ambiental no Brasil – retrocesso legislativo, paralisação de fiscalização e redução de orçamento – todas as iniciativas que visem parar a escalada de destruição são válidas. Esta carta é mais um esforço de colocar o país num rumo coerente com a ciência e com os países que se preocupam com um futuro sustentável e climaticamente justo”.
Para Jurema Werneck, diretora executiva da Anistia Internacional Brasil, “a população está tendo seus direitos violados dia após dia. O processo de entrada do Brasil na OCDE pode contribuir para que Estados nacionais através de seus representantes contribuam para que o país possa retomar seus compromissos e deveres em relação aos direitos humanos”.
A carta reconhece que a inclusão do Brasil em órgãos multilaterais pode ser positiva para o país, pois incentiva a adoção de boas práticas em diversas áreas de políticas públicas e o fortalecimento do Estado de Direito. Ressalta, no entanto, a necessidade de uma ampla e efetiva participação da sociedade civil na construção do roteiro (o roadmap), que guia o processo de adesão de um país ao bloco, na avaliação independente do cumprimento das políticas recomendadas pela OCDE e na formulação de planos de ação para uma eventual adesão.
“É fundamental garantir máxima transparência e participação social no processo de adesão do Brasil à OCDE, para que situações graves no país sejam avaliadas com independência, garantindo que o interesse público predomine sobre o interesse do governo por um troféu político.” alerta Bruno Brandão, diretor executivo da Transparência Internacional – Brasil.
Para discutir medidas de transparência e alternativas para uma participação mais aprofundada da sociedade civil nesse processo, em direção a um desenvolvimento sustentável e socialmente justo, na carta, as organizações solicitam uma reunião com o secretário-geral da OCDE.
Grupo parlamentar de esquerda faz uma “questão menor” sobre a situação dos direitos humanos no Brasil. O governo Merkel respondeu que “não tem conhecimento”
O presidente de direita do Brasil, Jair Bolsonaro, e o ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Heiko Maas, em abril de 2019. Na época como agora, os direitos humanos não são um problema. Marcos Corrêa/PR
Por Mario Schenk para o Amerika21
Nas relações germano-brasileiras, o governo alemão está aparentemente ignorando as violações de direitos humanos no país sul-americano para não comprometer o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul. No entanto, ela está visivelmente relutante em criticar o presidente extremista de direita Jair Bolsonaro. Isso fica claro a partir daresposta do governo federal em 2 de outubro a uma “pequena questão” do grupo parlamentar de esquerda.
Vários parlamentares do partido Die Linke perguntaram ao governo que conhecimento eles tinham sobre as violações dos direitos humanos em geral e sobre o governo de Bolsonaro desde o início da crise do coronavírus. Eles também perguntaram como o governo alemão avalia a política de saúde e que medidas tomou para apoiar os grupos indígenas e economicamente desfavorecidos da população que estão particularmente sob risco de pandemia.
O Governo Merkel, portanto, “não tem conhecimento” sobre a impunidade das violações de direitos humanos durante a crise do coronavírus. Esta avaliação pode surpreender, tendo em vista os inúmeros relatos de descumprimento da proteção e ataques impunes a povos indígenas por madeireiros ou a população negra e pobre por parte das autoridades de segurança. A polícia continuou suas operações nas favelas nos tempos do coronavírus, embora tenham sido proibidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por causa da pandemia. Como resultado, o número de vítimas de violência policial fatal nas favelas ao redor do Rio de Janeiro em abril aumentou 43% em comparação com o ano anterior. 80% deles eram negros, informou aDeutsche Welle no início de junho.
Além disso, o Relator Especial das Nações Unidas sobre Toxinas e Direitos Humanos, Baskut Tuncak, recomendou ao Conselho de Direitos Humanos da ONU no início de setembro que uma “investigação internacional independente da atual situação dos direitos humanos no Brasil com foco especial no meio ambiente, saúde pública, direitos trabalhistas e defensores dos direitos humanos” seja iniciada. O governo Bolsonaro não está cumprindo seu mandato de proteção aos povos indígenas e ambientalistas e está aceitando vítimas da pandemia corona , segundo relatório da ONU.
O Itamaraty parece ter recebido este relatório com desinteresse. Correspondentemente, o porta-voz dos direitos humanos do grupo parlamentar de esquerda, Michel Brandt, associou ao governo federal da Alemanha uma “indiferença à situação dos direitos humanos no Brasil”.
Apenas o desmatamento ilegal na Amazônia é visto por Berlim “com grande preocupação”, como mostra a resposta do governo Merkel. Para tal, mantém um “diálogo político estreito e contínuo” com os ministérios e autoridades responsáveis.
No entanto, Berlim não critica a política de saúde do governo Bolsonaro. É amplamente conhecido que Jair Blsonaro minimiza o coronavírus até hoje, e recusou-se a tomar medidas contra a pandemia, tendo torpedeado as exigências locais e estaduais, como restrições de contato. Os críticos de Bolsonaro o acusam de ter contribuído significativamente para o fato de mais de cinco milhões de brasileiros já estarem infectados com o coronavírus e mais de 150 mil pessoas terem morrido em decorrência do vírus.
Recentemente, um estudo mostrou uma conexão entre as altas taxas de infecção nos municípios e os altos índices de aprovação do Bolsonaro. Seus partidários freqüentemente seguem a retórica do presidente e deliberadamente violam as regras impostas localmente. O estudo ainda falava do “Efeito Bolsonaro”.
Independentemente disso, o governo Merkel chegou à avaliação de que “o governo brasileiro tomou medidas durante a crise da COVID-19 para melhor preparar e equipar adequadamente o sistema público de saúde para o combate à pandemia”.
A minimização da situação no Brasil pelo governo alemão segue um cálculo: “Em vez de combater as violações dos direitos humanos pelo governo Bolsonaro e identificar claramente as significativas consequências sociais e de sanitários do coronavírus para a população brasileira, o governo Merkel prefere se ater aos interesses econômicos” , concluiu o político de esquerda Brandt. Quando se trata de proteger os interesses das indústrias automotiva, química e de carne alemãs, eles colocam as questões ambientais e de direitos humanos em segundo lugar. Porque com a mesma “grande preocupação” que o governo tem a ver com a a crescente rejeição dos parceiros europeus ao acordo UE-Mercosul.
Quando a pandemia do coronavírus se alastrou de forma particularmente grave na América Latina em junho, o ministro das Relações Exteriores, Heiko Maas, exortou os 26 países latino-americanos e caribenhos a fortalecerem as relações econômicas e a implementarem rapidamente o acordo UE-Mercosul. Diante da crise econômica associadaao coronavírus, este acordo comercial é “um elemento muito importante” para superá-la, segundoMaas.
A resposta do Governo alemão mostra que este reluta em criticar as violações dos direitos humanos, quando os interesses econômicos essenciais são afetados. “Claro, Maas não pode admitir publicamente que se trata de proteger os mercados de vendas dos produtos alemães”. Em vez disso, ele prefere justificar seu comportamento paciente sob o pretexto de um diálogo necessário, disse a porta-voz da política de desenvolvimento da facção de esquerda, Helin Evrim Sommer, à Amerika21. Durante a visita de Estado a Maas em abril de 2019, o tema da proteção dos direitos humanos só apareceu marginalmente na declaraçãofinalconjunta , ao contrário do que foi anunciado previamente , critica Sommer.
Este artigo foi escrito inicialmente em alemão e publicado pelo Amerika21 [Aqui!].
A edição de sexta-feira (26) da revista Science traz uma carta assinada por 602 cientistas de instituições europeias pedindo para que a União Europeia (UE), segundo maior parceiro comercial do Brasil, condicione a compra de insumos brasileiros ao cumprimento de compromissos ambientais.
Por Edison VeigaDe Bled (Eslovênia) para a BBC News Brasil
Em linhas gerais, o documento faz três recomendações para que os europeus continuem consumindo produtos brasileiros, todas baseadas em princípios de sustentabilidade. Pede que sejam respeitados os direitos humanos, que o rastreamento da origem dos produtos seja aperfeiçoado e que seja implementado um processo participativo que ateste a preocupação ambiental da produção – com a inclusão de cientistas, formuladores de políticas públicas, comunidades locais e povos indígenas.
O grupo de cientistas tem representantes de todos os 28 países-membros da UE. O teor da carta ecoa preocupações da Comissão Europeia – órgão politicamente independente que defende os interesses do conjunto de países do bloco político-econômico – que há cerca de quatro anos vem estudando como suas relações comerciais impactam o clima mundial.
AFP. Amazônia perdeu 50 mil km² de matas nos últimos 7 anos
Pesquisador de questões de uso do solo, políticas de mitigação climática, combate ao desmatamento e cadeias produtivas, o brasileiro Tiago Reis, da Universidade Católica de Louvain, é um dos autores da carta.
Em entrevista à BBC News Brasil, ele afirmou que a publicação do texto tem como objetivo mostrar às instituições europeias que a comunidade científica entende a questão como “prioritária e extremamente relevante”.
“A iniciativa é importante, sobretudo neste momento em que sabemos que a Comissão Europeia está estudando o assunto e formulando uma proposta de regulação para a questão da ‘importação do desmatamento'”, disse o cientista.
O artigo foi divulgado nesta quinta-feira. Procurado pela reportagem da BBC News Brasil, o Ministério do Meio Ambiente ainda não respondeu ao pedido de entrevista sobre o tema.
Sustentabilidade e direitos humanos
“Exortamos a União Europeia a fazer negociações comerciais com o Brasil sob as condições: a defesa da Declaração das Nações Unidas sobre os direitos dos povos indígenas; a melhora dos procedimentos para rastrear commodities no que concerne ao desmatamento e aos conflitos indígenas; e a consulta e obtenção do consentimento de povos indígenas e comunidades locais para definir estrita, social e ambientalmente os critérios para as commodities negociadas”, diz a carta veiculada no periódico científico.
THIAGO FORESTI. Exportações para a UE representaram 17,56% do total do Brasil em 2018
A carta ressalta que a UE comprou mais de 3 bilhões de euros de ferro do Brasil em 2017 – “a despeito de perigosos padrões de segurança e do extenso desmatamento impulsionado pela mineração” – e, em 2011, importou carne bovina de pecuária brasileira associada a um desmatamento de “mais de 300 campos de futebol por dia”.
Segundo dados do Ministério da Economia, as exportações para a UE representaram 17,56% do total do Brasil em 2018 – um total de mais de US$ 42 bilhões, com superávit de US$ 7,3 bilhões. A exportação de carne responde por cerca de US$ 500 milhões deste total, minério de ferro soma quase US$ 2,9 bilhões e cobre, US$ 1,5 bilhão.
De acordo com dados divulgados em novembro pelo ministérios do Meio Ambiente e da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, a Amazônia enfrenta índices recordes de desmatamento.
Os sistemas do Projeto de Monitoramento do Desmatamento da Amazônia Legal por Satélite (Prodes) registraram um aumento de 13,7% do desmatamento em relação aos 12 meses anteriores – o maior número registrado em dez anos. Isso significa que, no período, foram suprimidos 7.900 quilômetros quadrados de floresta amazônica, o equivalente a mais de cinco vezes a área do município de São Paulo.
A principal vilã é a pecuária. Estudo realizado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) em 2016 apontou que 80% do desmatamento do Brasil se deve à conversão de áreas florestais em pastagens.
Atividades de mineração respondem por 7% dos tais danos ambientais.
Principal autora do texto, a bióloga especialista em conservação ambiental Laura Kehoe, pesquisadora da Universidade de Oxford, acredita que, como forte parceria comercial, a Europa é corresponsável pelo desmatamento brasileiro.
“Queremos que a União Europeia pare de ‘importar o desmatamento’ e se torne um líder mundial em comércio sustentável”, disse ela. “Nós protegemos florestas e direitos humanos ‘em casa’, por que temos regras diferentes para nossas importações?”
“É crucial que a União Europeia defina critérios para o comércio sustentável com seus principais parceiros, inclusive as partes mais afetadas, neste caso as comunidades locais brasileiras”, afirmou a bióloga conservacionista Malika Virah-Sawmy, pesquisadora da Universidade Humboldt de Berlim.
THIAGO FORESTI. “Queremos que a União Europeia pare de ‘importar o desmatamento’ e se torne um líder mundial em comércio sustentável”, defende bióloga Laura Kehoe
A carta dos cientistas apresenta preocupações, mas a aplicação dos tais compromissos como condições para tratativas comerciais depende de regras a serem criadas pela Comissão Europeia. Se o órgão acatar as sugestões, será preciso definir de que maneira o Brasil – e outros parceiros comerciais da UE – precisaram criar organismos e estabelecer as métricas para o cumprimento das exigências.
Medidas do governo Bolsonaro
De acordo com o brasileiro Tiago Reis, foram dois meses de articulação entre os cientistas europeus para que a carta fosse consolidada e os signatários, reunidos.
“Criamos o texto acompanhando a evolução do novo governo brasileiro. Estávamos preocupados com as promessas de campanha, mas quando essas promessas passaram a ser concretizadas, com edição de decretos, decidimos que precisávamos fazer algo”, disse ele.
“Existe, hoje, um discurso no Brasil que promove a invasão de terras protegidas e o desmatamento. Isso gerou sinais de alerta na comunidade científica internacional.”
A carta publicada pela Science ainda afirma que o governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) trabalha “para desmantelar as políticas anti-desmatamento” e ameaça “direitos indígenas e áreas naturais”. Além de ser assinada pelos 602 cientistas europeus, a carta tem o apoio de duas entidades brasileiras, que juntas representam 300 povos indígenas: a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil.
THIAGO FORESTI. Em Mato Grosso, floresta amazônica dá lugar a pastagens
Logo no dia 2 de janeiro, primeiro dia útil do mandato, Bolsonaro publicou decretos transferindo órgãos de controle ambiental para outras pastas, reduzindo a atuação do Ministério do Meio Ambiente.
O Serviço Florestal Brasileiro, por exemplo, foi realocado no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – pasta comandada por Tereza Cristina, ligada à bancada ruralista. Outros três órgãos foram cedidos para o Ministério do Desenvolvimento Regional.
A incumbência de demarcar terras índigenas, antes sob responsabilidade da Fundação Nacional do Índio (Funai), também foi transferida para o Ministério da Agricultura. A própria Funai foi remanejada. Antes vinculada ao Ministério da Justiça, acabou subordinada ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, comandado por Damares Alves.
Mais recentemente, funcionários do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) têm sido alvo de exonerações.
Na semana passada, o Ibama arquivou processos contra a produção de soja em áreas protegidas em Santa Catarina. E o próprio presidente Bolsonaro, via redes sociais, desautorizou no início deste mês operação em andamento contra a exploração ilegal de madeira em Rondônia.
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Este artigo foi inicialmente publicado pela BBC News Brasil [Aqui!]
A América Latina passa por um processo de expansão do setor minero-metalúrgico, em especial o Brasil, que ocupou em 2013 o segundo lugar entre os maiores exportadores de minério do mundo. A dependência econômica da região em relação a essa atividade é alarmante e sujeita às vulnerabilidades das altas e baixas cíclicas nos preços das commodities, que geram crises estruturais no setor
O período 2003-2013 representou um megaciclo das commodities, em que as importações globais de minérios foram valorizadas por um aumento de 630% (US$ 38 bilhões para US$ 277 bilhões). Ao longo desses anos, aprofundou-se a dependência econômica do Brasil na exportação, principalmente, de minério de ferro. Há a realização de projetos de larga escala com apoio governamental, em uma tentativa de impulsão da economia
O projeto do minero-porto do Açu se insere nessa lógica, sendo que sua ideia original data de 1999, como uma ambição do governo do Estado do Rio de Janeiro, representado pelo então governador Anthony Garotinho. Este foi sucedido por sua esposa Rosinha Garotinho, que deu continuação ao projeto, o qual sempre foi defendido como de interesse público. Através de reuniões privadas, houve a associação do projeto com Eliezer Batista, que o repassou para seu filho, Eike Batista. A partir daí se desenvolve um complexo sistema de relações empresariais, que dificultam, além do entendimento do caso, a imputação de responsabilidade dos envolvidos.