Meio Ambiente é só mais um obstáculo no Acordo Mercosul-União Europeia

Para professora da Escola Superior de Propaganda e Marketing  de São Paulo (ESPM SP), faltou engajamento do governo na fase final de negociações

IMG_1336-730x450O Parlamento Europeu votou a favor de uma emenda à Política Comercial Comum da UE que foi descrita como uma rejeição do Acordo Comercial UE-Mercosul em sua forma atual.

São Paulo, 7 de outubro de 2020 – O Parlamento Europeu aprovou uma resolução nesta quarta-feira (7/10) condicionando a conclusão do acordo UE-MERCOSUL a mudanças significativas de rumo da política ambiental de países do bloco sul-americano. Após 20 anos de negociações, o acordo ainda depende da aprovação de várias instâncias europeias, incluindo os parlamentos nacionais de todos os 27 Estados-Membros. Mesmo em caso de aprovação unânime, o acordo ainda demorará de um a dois anos para entrar em vigor.

“O fechamento do acordo em 2019, em meio a recordes de desmatamento, foi algo muito mal visto pela sociedade civil europeia e por uma parte significativa de políticos de diversos espectros. Também existe a resistência de setores do agronegócio europeu. Esse clima adverso já levou as lideranças parlamentares de diversos países a se declararem contra o acordo”, afirma Carolina Pavese, professora de Relações Internacionais da ESPM SP.

Para a professora, o fator ambiental não é a única variável relevante no revés. O esfriamento da relação do Brasil com países do MERCOSUL e da UE têm ainda mais peso. “O presidente não realizou nenhuma visita diplomática a países da UE desde o início de seu mandato e também não colocou as relações com os países do MERCOSUL como prioritárias na sua política externa. Para bons acordos comerciais, é necessário primeiro abrir as portas com diplomacia”, afirma Carolina.

O Acordo EU-Mercosul e seus compromissos socioambientais para inglês ver

 

Comissão Europeia promete impor parâmetros de proteção ambiental e segurança alimentar no seu acordo com Mercosul, mas vai fazê-lo com o governo Bolsonaro?

A Comissão Europeia emitiu ontem (28/06) um comunicado oficial onde informa que se finalmente chegou a um acordo de comércio com o Mercosul onde são apontados os vários aspectos potencialmente positivos que o mesmo deverá trazer para os dois blocos comerciais que juntos reunem um Produto Doméstico Bruto de R$ 90 trilhões.

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Mas olhando para além das amenidades que este tipo de comunicado traz, me deti em dois aspectos básicos: 1) as proteções sociais, ambientais e trabalhistas, e 2) a imposição das normas de segurança alimentar da União Europeia (EU) sobre os produtos vindos do Mercosul.

No tocante ao primeiro item, o comunicado da Comissão Europeia traz a informação de que a EU e o Mercosul se comprometem a implementar efetivamente o Acordo Climático de Paris , e que “um capítulo do acordo com o Mercosul será dedicado ao desenvolvimento sustentável, o qual abrangerá questões como o manejo sustentável e a conservação das florestas, o respeito aos direitos trabalhistas e a promoção de uma conduta empresarial responsável“.  Este capítulo deverá “oferecer às organizações da sociedade civil um papel ativo para avaliar a implementação do acordo, incluindo quaisquer preocupações com direitos humanos, sociais ou ambientais“. 

Além disso, a Comissão Europeia informa que acordo também “estabelecerá um novo fórum para trabalhar em conjunto em uma abordagem mais sustentável da agricultura e, como parte do diálogo político sob o Acordo de Associação, abordará os direitos das comunidades indígenas“.  

Em relação a esta primeira questão, fico apenas me perguntando se alguém na Comissão Europeia realmente acredita que será possível executar essas diretivas em um Brasil sob o governo Bolsonaro ou todas essas colocações são apenas para inglês ver (o que é explicável porque brevemente o Reino Unido estará fora da EU e apenas olhando para esse comunicado com a devida indiferença).  O mais provável é que essas garantias todas tenham sido colocadas e já se informou ao representantes do governo Bolsonaro que ninguém realmente pretende levá-las a sério.

Já em relação àss normas de segurança alimentar da EU, o comunicado informa que “as mesmas permanecerão inalteradas e todas as importações terão de cumprir os rigorosos padrões da UE, como é o caso hoje”. Além disso, o comunicado informa ainda que “as disposições sobre segurança alimentar e saúde animal e vegetal acordadas reforçarão a cooperação com as autoridades dos países parceiros e acelerarão o fluxo de informação sobre quaisquer riscos potenciais através de um sistema de informação e notificação mais directo e eficiente“.  

Aqui a coisa mais interessante a se perguntar é se alguém na EU tem noção de que mesmo hoje os alimentos que chegam na Europa vindos do Brasil estão com limites muito acima dos tolerados por suas próprias diretrizes. O mais provável é que  este item seja também para inglês ver, e que neste quesito haverá pouca ou nenhuma preocipação com a segurança alimentar dos europeus. É que se houvesse, a EU começaria por exigir o banimento de todos os agrotóxicos que já baniu nos países europeus e continuam a ser abundamente usados no Brasil, a começar pela Atrazina, pelo Acefato e pelo Paraquat.

A verdade é que somente a pressão política organizada vai impedir que este acordo sirva apenas para tornar os ultrarricos ainda mais ricos, enquanto o meio ambiente e a saúde humana são tratados como externalidades negativas e, portanto, plenamente ignoráveis.

Agrotóxicos e transgênico podem ser barreira para exportação para Europa

 

A rainha do agrotóxico e transgênico

Por Viviane Vaz

A ministra de Agricultura Katia Abreu veio à Bruxelas esta semana com uma difícil missão: convencer os europeus a aumentarem as exportações brasileiras de produtos agropecuários por meio da assinatura de um acordo sanitário entre Brasil e a União Europeia (UE). Pelo twitter, a ministra se mostrou otimista com a recepção das autoridades europeias no Parlamento Europeu e na Comissão Europeia -instituições fundamentais para criação e execução das leis na UE. Os europeus, porém, também sinalizaram que não estão dispostos a abrir mão de certas regras de vigilância sanitária, sobretudo no que diz respeito ao uso de agrotóxicos e a produção de alimentos transgênicos –amplamente difundidos no Brasil.

Uma fonte do Parlamento Europeu explicou à reportagem que entre as questões que preocuparam os eurodeputados nesta terça-feira tratam sobre os organismos geneticamente modificados (OGM) e os agrotóxicos, alem da proteção à floresta amazônica. “Eles querem ter certeza que os produtos importados do Brasil não contêm transgênicos”, disse a fonte. Para isso, os exportadores brasileiros terão de adotar regras que parte da bancada ruralista tenta derrubar no Brasil. A Câmara dos Deputados aprovou em abril o projeto que acaba com a exigência de afixar o símbolo de transgenia nos rótulos de produtos geneticamente modificados (OGM) destinados a consumo humano. O texto modifica a Lei 11.105/2005 que determina a obrigação da informação em todos os produtos destinados a consumo humano que contivessem ou fossem produzidos com OGM ou derivados, por exemplo, milho, soja, arroz, óleo de soja e fubá. Uma pesquisa realizada pela UE mostra que 62% dos europeus é contra o consumo e a produção de transgênicos no bloco. Na Europa, o consumidor ainda pode verificar nas etiquetas se o alimento que esta levando para casa é transgênico ou não.

Sobre o uso de agrotóxicos proibidos pela UE existentes na agricultura brasileira, a fonte do Parlamento Europeu afirmou que “o problema terá que ser resolvido de alguma forma para que o comercio seja aberto”. Em abril deste ano, o diretor da Associação Brasileira de Agroecologia (ABA), Paulo Petersen alertou para o fato de que 22 dos 50 princípios ativos mais empregados em agrotóxicos no Brasil estão banidos em outros países. “Estamos em uma situação de total descontrole, o Estado não cumpre o processo de fiscalização como deveria e a legislação para o uso de agrotóxicos também não é cumprida,” disse. “Desde 2009 o Brasil assumiu a posição de primeiro consumidor mundial de agrotóxico. O consumo daria 5,5 quilos por brasileiro por ano”, completou.

A reportagem também perguntou à ministra como o Brasil pretende convencer os europeus a importarem mais do Brasil –apesar da lista de agrotóxicos que eles não consomem. “Somos um dos maiores exportadores do mundo porque toda a nossa utilização de agroquímicos estão de acordo com as normas internacionais”, defendeu a ministra.

No entanto, a Agência Internacional de Pesquisas do Câncer (Iarc, em inglês), órgão da Organização Mundial de Saúde (OMS), classificou em março deste ano cinco pesticidas como “provavelmente” e “possivelmente” carcinogênicos. Quatro deles, apesar do risco de causarem diferentes tipos de câncer, ainda estão liberados no Brasil: glifosato, malation, diazinon e parationa metílica. De acordo com pesquisa da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) de 2013, na lista dos agrotóxicos proibidos em outros países ainda em uso no Brasil estão o Tricolfon, Cihexatina, Abamectina, Acefato, Carbofuran, Forato, Fosmete, Lactofen, Parationa Metílica e Thiram. “São lixos tóxicos na União Europeia e nos Estados Unidos. O Brasil lamentavelmente os aceita”, afirmou em abril deste ano a toxicologista Márcia Sarpa de Campos Mello, da Unidade Técnica de Exposição Ocupacional e Ambiental do Instituto Nacional do Câncer (Inca), vinculado ao Ministério da Saúde.

Em Bruxelas, Kátia Abreu abordou a questão da produção agrícola com uso de agrotóxicos sob um prisma fortemente empresarial. “Se a Europa quer um produto com zero de agroquímicos o que temos que prever é o aumento do custo de produção exorbitante, se aqueles que estão dispostos a comprar estão dispostos a um protocolo privado que prevê limites menores do que os aceitados internacionalmente, e estiverem dispostos a pagar pelo custo, não temos problema”, afirmou à reportagem, ainda na sede da Missão do Brasil junto à UE.

Questionada se o Brasil estaria disposto a fazer um esforço para atender o mercado europeu, a ministra foi categórica. “Não temos que fazer esforços, temos que aceitar ou não um protocolo privado de determinado grupo empresarial que comercializa na Europa que queira agroquímicos abaixo dos níveis reconhecidos internacionalmente. Isso não é um esforço, isso é um negócio, se quiserem nos encomendar um produto desta natureza, somos habilitados a produzir, só que com custo de produção diferente”, disse.

Para fechar o “negócio”, eis uma lista geral publicada pela Comissão Europeia que todos os exportadores devem seguir, entre elas “regras sobre resíduos, pesticidas, remédios veterinários e contaminantes na comida e sobre a comida”,  “regras especiais sobre comida e alimento geneticamente modificado” e “requerimentos de etiquetamento” de alimentos:

O Comissário Europeu para Saúde e Segurança de Agricultura, Vytenis Andriokaitis, afirmou à delegação brasileira presente que o Brasil é um parceiro estratégico e concorda com a abertura das negociações para um acordo sanitário. “Se tivermos abordagem produtiva, podemos resolver os problemas de ambos os lados. O importante é a reciprocidade”, completou. Em definitiva, a reciprocidade de regras sanitárias será boa noticia para europeus e brasileiros, se o padrão a ser seguido pelos dois blocos seja o de quem pratica uma agricultura menos carregada de substâncias tóxicas e cancerígenas.

Viviane Vaz é jornalista e escreve de Bruxelas, Bélgica

FONTE: http://www.contraosagrotoxicos.org/index.php/528-agrotoxicos-e-transgenico-podem-ser-barreira-para-exportacao-para-europa

Embargo contra Rússia? Europa se afoga em seus próprios alimentos

Embargo contra Rússia? Europa se afoga em seus próprios alimentos

Em resposta à sanções impostas a seu país, Vladimir Putin proibiu a importação de alimentos europeus por um ano, mostrando que a decisão de seguir cegamente os EUA foi um tiro no pé

Por Cauê Seignemartin Ameni*, em Parallaxis, com informações do The Guardian

Em poucas semanas a resposta russa contra as sanções imposta pela UE e EUA vem surtindo efeitos dramáticos na exportação de alimentos e podem aprofundar a recessão do velho continente. A proibição do Kremlin a importação de 28 países da UE, mais EUA, Canadá, Noruega e Australia por um ano, fez com que quantidades de peras francesas, salsichas alemãs, pimentas polonesas e peixe escocês periguem apodrecer nos armazéns. Ano passado, as exportações da UE à Russia, alcançaram 11 bilhões de euros – cerca de 10% do total das exportações do bloco europeu, segundo o Eurostat. Segundo o primeiro ministro húngaro, Viktor Orbán, as sanções contra a Rússia foram um tiro contra o pé. Vejamos alguns países:
 
  • Alemanha: os produtos agrícolas alemães exportados para a a Rússia em 2013 chegaram a 1,6 bilhão de euros — mais alto que qualquer outro país da UE -, cerca 3,3% do total de exportações. O item mais vendido era carne de porco: das 750 mil toneladas de porco comprada pelos russos, no valor de mais de 1 bilhão de euros, cerca de 1/4 era alemão. 
  • França: O país que chegou a exportar 1 bilhão de euros em alimento para a Rússia ano passado, é atingido com o embargo. Cerca de 27 mil exportadores de frutas e legumes estão sendo prejudicados. No total, 50 mil toneladas/ano, saem de um país para o outro. Mais 50 mil toneladas são exportadas para a Rússia via Benelux e Báltico, girando um comércio de 48 milhões de euros/ano. Dessas 100 mil toneladas, 54% são maçãs, 20% batatas, 8% tomates e pepinos, 6% peras e 6% couves-flor.
  • Espanha: O país está contando as feridas: frutas, carne e verduras foram incluídas nas sanções da Rússia contra a Europa, mas vinho e azeite de oliva não estão na lista. Cerca de 30 mil toneladas de tomates, pêssegos e laranjas mandarim exportadas anualmente para a Rússia não encontrarão mercado num continente já afogado em excesso de produtos não comercializados.
  • Polônia: A mais surpreendente resposta às sanções russas foi campanha de publicidade distribuída pelas redes sociais, conclamando os poloneses a “comer mais maçãs, para derrotar Putin”. Mas o principal problema não são as maçãs, mas os legumes perecíveis. “As maçãs podem ser armazenadas por até nove meses, mas vegetais como a páprica têm de ser comercializados imediatamente depois de colhidos; e 40% do que produzimos sempre foi destinado ao mercado russo” – queixou-se Roman Sobczak, presidente do grupo produtor Polish Paprika. O preço de vários vegetais já caiu a menos da metade.
  • Reino Unido: O peixe cavala, um dos itens mais valiosos dos estoques de pescado da Escócia, perderá 20% do seu estoque comprado pelos russo – equivalente a 16 milhões de libras.
 
As restrições comerciais criarão uma lacuna de 9,5 bilhões de dólares no mercado de alimentos. Para preenche-lo, a Rússia já está em negociações com países da América Latina, Nova Zelândia, Cazaquistão e Belarus. 
 
Diante disso, pode-se concluir com as palavras de Luc Barbier, membro da Federação dos Produtores Franceses de Frutas: “Os russos continuarão a comer maçãs, tomates e pêssegos, a diferença é que não comerão produto europeu. Comerão pêssegos, maçãs e tomates importados da Ásia, do Brasil, da África do Sul… Quer dizer: quando eles [os russos] reabrirem o mercado para nós, precisaremos de vários anos para reconquistar parte do mercado. É terrível”.
 
*Cauê Seignemartin Ameni é cientista político
FONTE: http://www.revistaforum.com.br/blog/2014/08/sancoes_russia/