Jean Wyllys, seu mea culpa incompleto, e os limites de um identitário

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Por uma conjunção de ordem de espera em uma lista de entrevistados, pude ouvir com a devida atenção a uma entrevista com o ex-deputado e ativista social autoexilado Jean Wyllys na qual ele, entre outras coisas, realizou uma espécie de mea culpa sobre a percepção de que os identitários não se preocupam com aqueles que não estão dentro de determinados rótulos de identidade. Segundo o que eu entendi da fala de Wyllys, identitários como ele se preocupam sim com as múltiplas dimensões pelas quais a opressão se dá, seja ela na forma homofobia, violência contra as mulheres, a discriminação racial, e por aí vai.

Essa postura de Wyllys foi para mim uma tentativa de resposta e até de autocrítica contra os eventuais excessos daqueles que dentro de uma determinada “identidade” se esquecem de também denunciar as outras formas pelas quais as pessoas são oprimidas.  Nesse sentido, a explicação oferecida por Wyllys é benvinda, na medida em que muitos identitários o têm no alto da escada daqueles que podem ou merecem ser ouvidos.

O problema é que na mesma entrevista, Wyllys chamou a atenção para supostos setores do PT e do PSOL que não se importariam e até se oporiam às lutas setoriais que estão ligadas à determinadas identidades. Aqui é que a porca torce o rabo. É que o próprio Wyllys já reconheceu que enquanto esteve dentro do PSOL ele não se ocupava de falar para dentro do partido, mas principalmente para fora em uma busca de suposto diálogo com os movimentos sociais, com entidades da sociedade civil, instituições democráticas, com a academia, com os artistas, pois ele (nas suas próprias palavras) não se importava com a luta interna. Em outras palavras, o PSOL para ele não passava de um pouso temporário (ou seria um palco?), na medida é que não havia interesse de dialogar com outras pessoas e suas posições divergentes, o que ainda é a única forma de se conseguir evolução organizacional.

Por outro lado é interessante lembrar que em uma questão bem específica, Jean Wyllys objetivamente se alinhou ao estado de Israel que se encontra em guerra contínua contra o povo palestino em função de um grau de liberdade maior que os gays israelenses desfrutam em uma sociedade que seria, por isso, mais democrática. Como nunca li ou ouvi uma autocrítica por fortalecido a imagem construída pelo estado israelense (aliás, Wyllys só criticou quem o criticou), fica óbvio qual opção de identidade ele resolveu dar preferência naquele caso.

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Wyllys como símbolo dos limites das identidades

Sempre que leio ou ouço Jean Wyllys falar raramente ouço críticas ao sistema político, cultural e econômico que é peculiar ao capitalismo. Se espremermos bem o suco, veremos que a crítica de Wyllys é sempre às discriminações, que resvalam sempre em um  suposto arrivismo da esquerda contra as pautas identitárias, não sobrando as acusações de que os partidos de esquerda são, de alguma forma, portadores de elementos racistas e homofóbicos

Criticar o capitalismo enquanto sistema hegemônico e que se mantém tendo o uso da violência contra todos os que se tornam problema para manutenção da ordem eu sinceramente nunca ouvi Wyllys expressar algo sequer próximo disso. Em sua defesa é importante dizer que raros são os ativistas identitários que procuram ligações para fora de seu próprio campo de identidade. 

Essa indisposição para formular uma crítica ao sistema em si explica ainda toda a indisposição com a esquerda que se pauta pela identidade que galvaniza todas as outras, que é a de classe.  Aos que insistem em manter como a “meta identidade” sobram rótulos manjados de “esquerdo machos”. Por isso, são habituais os ataques à esquerda classista, muitas vezes em grau mais virulento do que aqueles oferecidos, por exemplo, à extrema direita.

Isso tudo, especialmente em um momento de graves ataques aos trabalhadores (sejam gays ou não), contribui para um fracionamento indesejável de energias, pois na hora em que se precisa estar unido sob uma só bandeira, as múltiplas pautas identitárias geram fragmentação.

Jean Wyllys já disse mais de uma vez que se o ex-presidente Lula vencer as eleições ele sairá de seu autoexílio em Barcelona e voltará ao Brasil.  Para aqueles que como eu comemos o osso e vimos milhões de brasileiros só tendo osso para comer, a questão que fica sobre qual mudança qualitativa que Wyllys imagina que essa vitória trará, inclusive, para os milhões de gays pobres que hoje vivem sob o tacão de uma sociedade empobrecida e cada vez mais violenta.

Finalmente, uma propaganda grátis para Jean Wyllys. Na entrevista que citei no início desta postagem ele nos informou que está lançando um livro que é uma espécie de memória do exílio em colaboração com outra autoexilada a filósofa Márcia Tiburi. Como alguém que viveu fora do Brasil por mais de sete anos, fico curioso com o que saiu das cartas trocadas entre um que estava em Barcelona e outra que estava em Paris. Mas a despeito da minha própria curiosidade, fica a dica.

 

MPF recomenda à deputada federal que comprove sua postagem discriminatória com estudos científicos

Chris Tonietto teria relacionado a pedofilia ao movimento LGBT+ e à ideologia de gênero

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O Ministério Público Federal(MPF), por meio dos procuradores da República Sérgio Suiama, Ana Padilha e Renato Machado, expediu recomendação à deputada federal Chris Tonietto (PSL/RJ). O objetivo do documento é apurar uma possível irregularidade praticada por ela em uma postagem em sua rede social. Na ocasião, Christiane teria relacionado a pedofilia ao movimento LGBT+ e à ideologia de gênero.

O MPF considerou que a Constituição Federal de 1988 prevê a construção de uma sociedade livre, justa, solidária e sem preconceitos. Além disso, reflete que a expressão “ideologia de gênero” foi utilizada de forma vaga, imprecisa e descontextualizada a fim de obstacularizar o reconhecimento de direitos sexuais e equidade de gênero como consequência da dignidade da pessoa humana.

Foi considerado também que, conforme estudos, na maioria dos casos de violência sexual infanto-juvenil notificados no Brasil, o agressor é um familiar ou pessoa integrante do ambiente doméstico. Para mais, em sua publicação Chris induz falsamente a opinião pública a acreditar que todo o grupo de pessoas LGBT+ seria propenso a cometer os graves crimes que giram em torno da pedofilia, gerando preconceitos e reforçando estigmas.

Diante do exposto, o MPF resolve notificar a deputada federal para que a mesma preste explicações e apresente os estudos científicos em que se baseou para disseminar as conclusões de sua postagem, explicado ainda de forma clara qual autor relaciona o ensino de gênero nas escolas à pedofilia.

Caso Christiane não consiga comprovar seu relato, recomendou-se que ela se retrate da informação falsa divulgada em seu Facebook com o mesmo destaque da postagem anterior. Foi estabelecido o prazo de 30 dias para que a destinatária apresente as informações e esclareça as providências adotadas em relação ao seu cumprimento.

Clique aqui e leia a recomendação. 

MPF obtém condenação de internauta por discurso de ódio em postagem homofóbica em rede social

Gustavo Canuto Bezerra terá que pagar indenização de R$ 5 mil por postagem em que ofendia homossexuais

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Em ação civil pública do Ministério Público Federal (MPF), a Justiça Federal em Duque de Caxias (RJ) condenou Gustavo Canuto Bezerra por postar conteúdo em que promovia discurso discriminatório contra a comunidade LGBT por meio de publicação no Facebook. Ele utilizou o seu perfil na rede social para postar conteúdo homofóbico. Pela prática, ele deverá pagar indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 5 mil.

Na ação, o MPF argumenta que a conduta de Gustavo Bezerra reproduz e reforça o preconceito que, historicamente, submete toda a comunidade LGBT a uma situação de vulnerabilidade social, de modo que a violação de seus direitos fundamentais constitui prática rotineira na cultura do país. Ao MPF, ele teria alegado tratar-se de “brincadeira com um amigo sem a intenção de ofendê-lo ou prejudicá-lo”, tendo apagado a mensagem, se desculpado, e se comprometido a não reiterar o comportamento. O MPF pediu também a retratação do réu, porém o juízo não acolheu o pedido.

Porém,  o MPF sustenta que o comentário proferido ultrapassa a esfera protegida pela liberdade de expressão, porque invade o plano da honra e da dignidade alheias, produzindo efeitos lesivos à população LGBT e à reputação do grupo frente à sociedade brasileira, constituindo, inclusive, ameaça à própria segurança desses cidadãos. Assim, constitui ato ilegal que gera, consequentemente, dano moral passível de indenização.

Na decisão, a Justiça Federal considerou que o “discurso vilipendia e agride frontalmente a dignidade daqueles que se identificam com a minoria homossexual ou possuem entes queridos nessa categoria, historicamente discriminada, ao se deparar com tal post nas redes sociais, agride, também, todos aqueles que tenham qualquer apreço pelos valores básicos da humanidade, consagrados em diversos tratados internacionais de Direitos Humanos dos quais o Brasil faz parte”. Por isso mesmo, na decisão, o juiz considerou que o caso “não é brincadeira, muito menos exercício de liberdade de expressão, já que ninguém tem direito a se exprimir de forma a fomentar o ódio a minorias e agredir a Constituição. O discurso de ódio é extremamente sério, e inclusive levou a grandes tragédias da humanidade, como o holocausto dos judeus durante a 2a Guerra Mundial. É tão grave, portanto, que o Supremo decidiu pelo enquadramento da homofobia e da transfobia como tipo penal definido na Lei do Racismo (Lei 7.716/1989)”.

Clique aqui e leia a decisão.

Assessoria de Comunicação Social

Procuradoria da República no Rio de Janeiro

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Atendimento à imprensa: prrj-ascom@mpf.mp.br 

Regina Duarte inova e diz que homofobia de Jair Bolsonaro é “da boca para fora”

Eu já li muita coisa esquisita na atual campanha presidencial, mas a entrevista dada pela atriz e latifundiária Regina Duarte ao jornalão que difunde as ideias das elites mais conservadores de São Paulo acaba de ganhar o prêmio de esquisitice mór.  É que Regina Duarte afirmou que “as declarações consideradas homofóbicas e racistas do candidato como frutos de um homem com um “humor brincalhão típico dos anos 1950, que faz brincadeiras homofóbicas, mas que são da boca pra fora, coisas de uma cultura envelhecida, ultrapassada” [1] (ver imagem abaixo).

dabocaparafora

Mas o que realmente me intriga nessa fala de Regina Duarte tem a ver com o fato que ela afirma que a homofobia de Jair Bolsonaro seria “só da boca para fora”.  É que até segunda ordem, não há como um ser humano emitir opiniões sem que elas sejam inicialmente processadas e sintetizadas pelo seu cérebro. Isto torna inviável a afirmação de que todas as afirmações estapafúrdias são algo que ocorrem apenas da “boca para fora”. 

Entretanto, se assim fosse, o que Regina Duarte estaria afirmando é que não se deve levar a sério o que é dito por Jair Bolsonaro. Isto é muito estranho para quem está apoiando o referido candidato, pois se inaugura uma nova forma de decidir votos: voto naquele em quem não acredita no que fala.

Alguém com um mínimo de discernimento adotaria o sistema decisório proposto por Regina Duarte? É óbvio que não! Eu gostaria é que ela tivesse a coragem de ir visitar as famílias daqueles que, por causa de sua orientação sexual, já sofreram violências e até perderam as suas vidas nas mãos dos eleitores que levam a sério as coisas que são ditadas por Jair Bolsonaro.


[1] https://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,homofobia-de-bolsonaro-e-da-boca-para-fora-diz-regina-duarte,70002564696