EUA detêm imigrantes da Venezuela na base militar de Guantánamo

Os presos seriam integrantes da organização criminosa “Tren de Aragua”, mas nenhuma evidência apresentada. As famílias são privadas de informação e contacto

Entrada para o Camp Delta, Baía de Guantánamo, Fonte:Kathleen T. Rhem, 
Por Philipp Zimmermann para o Amerika21

Washington, D.C. O governo do presidente dos EUA, Donald Trump, aparentemente deteve pelo menos 100 migrantes venezuelanos no campo de detenção da Baía de Guantánamo. Os homens foram transferidos de uma prisão no estado do Texas para a notória base militar dos EUA em Cuba, relata o New York Times . Em uma reportagem recente, o portal Infobae fala até de 175 venezuelanos que foram levados para Guantánamo.

As pessoas em questão foram classificadas pelas autoridades como “imigrantes ilegais de alto risco”. A secretária de Segurança Interna de Trump, Kristi Noem, descreveu os prisioneiros levados para Guantánamo como “os piores dos piores”.

Sobre os próximos passos, Noem disse à imprensa que os presos receberão o “devido processo”.

No entanto, sua declaração de que “as instalações na Baía de Guantánamo serão uma vantagem para nós e nos permitirão continuar fazendo o que sempre fizemos lá” causou irritação. O campo de prisioneiros dos EUA na baía ocupada de Guantánamo, em Cuba, ganhou notoriedade no início dos anos 2000, quando centenas de prisioneiros muçulmanos foram mantidos e torturados ali durante anos em condições desumanas .

De acordo com relatos recentes, muitos dos prisioneiros atualmente detidos em Guantánamo estão sendo vigiados por militares em vez de autoridades de segurança civis. Isso apesar das garantias do governo Trump de que os detidos permaneceriam sob a jurisdição das autoridades civis de imigração. Alguns venezuelanos também estão alojados na mesma ala da prisão onde, até recentemente, eram mantidos prisioneiros suspeitos de pertencerem à Al-Qaeda.

Em alguns casos, as famílias dos detidos moveram ações judiciais contra sua transferência para Guantánamo . Juntamente com organizações de direitos humanos, eles denunciaram o fato de que os familiares não receberam nenhuma informação sobre as condições da prisão e não foram autorizados a ter contato com os prisioneiros. Como resultado, um tribunal no estado do Novo México bloqueou a transferência de mais três prisioneiros. Eles foram então levados para a Venezuela em voos diretos.

Também surgiu uma polêmica devido às acusações das autoridades norte-americanas de que os venezuelanos detidos supostamente pertencem à organização criminosa “Tren de Aragua”. Esta organização foi fundada há cerca de 15 anos em uma prisão no estado venezuelano de Aragua e expandiu suas atividades internacionalmente nos últimos anos. O grupo está envolvido em tráfico de drogas, extorsão e sequestro.

Enquanto isso, Jessica Myers Vosburgh, representante da organização de direitos humanos dos EUA Center for Constitutional Rights, alertou contra a atribuição precipitada de culpa. Em alguns casos, a acusação de que os migrantes pertenciam ao “Trem de Aragua” era infundada. A classificação geral como membros de gangues pelas autoridades norte-americanas representaria um risco para esses indivíduos, pois eles teriam que temer retaliações da organização criminosa.

A transferência de prisioneiros venezuelanos para a base naval ocupada pelos EUA em Cuba parece ser apenas o começo.

O presidente dos EUA, Trump, ordenou recentemente ao Departamento de Segurança Interna que preparasse a base militar para acomodar 30.000 detidos estrangeiros.

No final de janeiro, o Secretário de Defesa Pete Hegseth reiterou a crescente militarização da política migratória dos EUA: “Quando identificamos criminosos ilegais em nosso país, os militares vão em frente para ajudar a trazê-los para seus países de origem ou, enquanto isso, para outros países”, disse Hegseth. “Se eles não podem ir a lugar nenhum agora, podem ir para a Baía de Guantánamo”, ele ameaçou.

O governo cubano criticou duramente a detenção de migrantes na base dos EUA . “Muitas das pessoas que os Estados Unidos estão expulsando ou pretendem expulsar são vítimas das políticas de pilhagem do governo e atendem a necessidades de mão de obra que sempre existiram na agricultura, construção, indústria, serviços e vários setores da economia dos EUA”, disse o Departamento de Estado em um comunicado publicado em seu site.

Outros são resultado de uma entrada mais fácil nos Estados Unidos, “de regulamentações seletivas motivadas politicamente que os acolhem como refugiados”. A emigração deles “é também uma consequência dos danos socioeconômicos causados ​​por medidas coercitivas unilaterais”.

A instalação militar é conhecida internacionalmente, entre outras coisas, por “hospedar um centro de tortura e detenção indefinida que fica fora da jurisdição dos Estados Unidos e onde pessoas que nunca foram acusadas ou condenadas por um crime são mantidas por até 20 anos”.


Fonte: Amerika21

Assassinato de congolês no Rio de Janeiro por cobrar salários gera revolta e indignação

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A morte do imigrante congolês Moïse Kabamgabe, no Rio de Janeiro, gerou protestos neste final de semana no bairro da Barra da Tijuca, onde o fato aconteceu. Kabamgabe foi espancado por cinco homens em frente a um quiosque na orla da praia, segundo familiares.

A tragédia suscitou debates sobre racismo e xenofobia – dois crimes dos quais imigrantes são comumente vítimas –, embora o caso esteja sob investigação da Polícia Civil. De acordo com Jéssika Jonas, gerente do “Ven, Tú Puedes”, projeto da ONG Visão Mundial que trabalha como imigrantes e refugiados, especificamente os venezuelanos, “o Brasil conta hoje com um aparato legal para reger a política migratória e, por isso, é importante que, caso comprove-se motivação racial, cultural ou de nacionalidade, que os dispositivos existentes hoje em lei para esses crimes também sejam aplicados na prática”.

Recentemente, a Visão Mundial lançou uma iniciativa para ajudar venezuelanos que são vítimas de exploração de trabalho, uma realidade também na vida de estrangeiros de várias outras nacionalidades. O projeto “Ven, Tú Puedes!” é um projeto da ONG, apoiada pelos Estados Unidos, que, desde 2019, visa acolher os migrantes e refugiados venezuelanos em situação de vulnerabilidade social. O foco da iniciativa é promover a inserção no mercado de trabalho, garantindo renda para as famílias. São três eixos principais que estruturam o projeto: empregabilidade, empreendedorismo e envolvimento do setor privado. Contudo, para este ano, vai colocar em prática um novo eixo: o de proteção, para identificar casos de violações trabalhistas.

Marcado por ações importantes que promovem a integração social e econômica, o projeto atendeu 40 mil pessoas direta ou indiretamente no ano de 2021, formou mais de mil em Língua Portuguesa, ajudou na emissão de carteiras de trabalho, elaboração de currículos e no incentivo ao negócio próprio.

Sobre a Visão Mundial

A World Vision, conhecida no Brasil como Visão Mundial, é uma organização humanitária dedicada a trabalhar com crianças, famílias e suas comunidades para atingir todo o seu potencial, combatendo as causas da pobreza e da injustiça. A Visão Mundial serve a todas as pessoas, independentemente de religião, raça, etnia ou gênero. A organização está no Brasil desde 1975 atuando por meio de programas e projetos nas áreas de proteção, educação, advocacy e emergência, priorizando crianças e adolescentes que vivem em situações de vulnerabilidades.

Jair Bolsonaro comete erros estratégicos graves ao atacar imigrantes e parceiros comerciais na visita aos EUA

Jair Bolsonaro, durante entrevista à rede de TV conservadora Fox

A ultraconservadora FoxNews aponta para o apoio de Jair Bolsonaro a Donald Trump para que um muro seja construído na fronteira com o México.

Não sou muito afim de adotar a linha de indignação exacerbada com que articulistas de direita e de esquerda estão analisando os vários pronunciamentos (equivocados) que o presidente Jair Bolsonaro está proferindo em sua visita oficial aos EUA.  Prefiro apontar algo básico que é a inevitável consequência que tais pronunciamentos terão não sobre a imagem pública de Jair Bolsonaro, mas sobre os interesses econômicos e políticos do Brasil.

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Ao afirmar que a maioria dos imigrantes (incluindo aí os milhares de brasileiros que vivem nos EUA) desejam mal aos estadunidenses e atacar a França por uma suposta política permissiva em relação ao acolhimento de migrantes em seu território, Jair Bolsonaro consegue isolar o Brasil, justamente em um momento em que mais precisamos de inclusão.

E, pior, Jair Bolsonaro ainda está fazendo o jogo pedido pelo presidente estadunidense e ataca a China, país que hoje o principal parceiro comercial do Brasil e destino preferencial das nossas exportações de commodities agrícolas e minerais. A falta de sentido nesse ataque já está levantando sobrancelhas não apenas dentro do latifúndio agroexportador, mas também dentro dos setores mais conservadores da mídia brasileira que agora começam a apontar para o caráter destruidor de sua agenda política que, convenhamos,  na prática de uma receita heterodoxa de “nacionalismo entreguista”.

A questão que se apresenta aqui é que todos esses elementos não encontram apoio incondicional nem dentro dos EUA onde até a ultraconservadora rede de TV Fox News fez reportagem onde apontou para possíveis ligações da família Bolsonaro com as milícias no Rio de Janeiro  (ver clip logo abaixo), que dizer então de importantes parceiros comerciais brasileiros como a China, a Rússia e a própria França. 

Como sou geógrafo sempre tendo a buscar as implicações e consequências geopolíticas de determinadas ações que são adotadas pelos nossos governantes. No caso do que está ocorrendo neste momento com a visita do presidente Jair Bolsonaro, avalio que ela está sendo catastrófica para os interesses políticos e econômicos do Brasil. É que neste momento, os EUA estão afundados numa crise política e em dificuldades claras com o seu débito público. Por isso, ao se aliar de forma tão óbvia ao governo Trump, o que Jair Bolsonaro arrisca a fazer é colocar o Brasil para afundar junto com os EUA. E  em um mundo tão conturbado por realinhamentos estratégicos, esse não é certamente um cenário promissor.

Finalmente, eu fico me perguntando como estão se sentindo os imigrantes brasileiros que vivem nos EUA ao serem colocados na vala comum daqueles que “não têm boas intenções” ao irem para lá. É que, como se sabe, Jair Bolsonaro teve uma votação expressiva na comunidade de expatriados brasileiros que vivem nos EUA.