Açu, o porto das eternas promessas e dos direitos pisoteados

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Acompanho desde 2009 as idas e vindas do Porto do Açu, tendo já publicado diversos artigos científicos e orientado dissertações e uma tese que têm ou tiveram a obra iniciada pelo ex-bilionário Eike Batista, com muito, aliás muito mesmo, dinheiro público. Para os desavisados eu costumo dizer que o Porto do Açu, apesar do seu impressionante “merchandising” continua sendo muito mais espuma do que chopp.

Mas é sobre o merchandising que cerca o Porto do Açu que eu quero abordar nesta postagem. É que no dia de ontem (18/12), o jornal “O DIA” publicou mais uma daqueles artigos que, na prática, são um press release empresarial. Assinado pela jornalista Aline Macedo, o artigo traz como título “Conexão com Porto do Açu nos trilhos” e como subtítulo “Um dos maiores complexos portuários do país, o porto de São João da Barra ainda é subaproveitado” (ver imagem abaixo).

porto das promessas

Vou me ater aquilo ao título, pois o artigo/press release é uma espécie de anúncio de que mais um daqueles encontros público/privados teve como saldo a promessa de que serão investidos R$ 2,3 bilhões na construção de um ramal ferroviário entre o Porto do Açu e o município de Anchieta (ES), montante que deverá ser dividido entre a iniciativa privada (i.e., a Prumo Logísitica Global) e os governos do Rio e federal. Aí começa o problema, pois desconfio que a maior parte desse dinheiro será público, e deverá beneficiar os interesses dos proprietários privados do porto.

As promessas costumeiras, e nunca cumprida em mais de uma década, é que a construção desse ramal possibilitará a movimentação de de 13,5 milhões de toneladas até 2035, e deverá gerar R$ 460 milhões em impostos, 68 mil empregos diretos e indiretos e cerca de R$ 1 bilhão em salários para o Rio.  Como sempre são números fabulosos, mas que servem para explicitar o fato de que o Porto do Açu é uma espécie de sumidouro de dinheiro público, em que pese ser hoje controlado por um fundo multinacional de investimentos (o EIG Global Partners, sediado em Washington DC). Aliás, se fosse feita uma análise de tudo o que já foi investido pelo estado brasileiro no empreendimento, iríamos certamente verificar um forte desequilíbrio na relação custo/benefício para o Brasil.

Enquanto isso, as centenas de famílias que tiveram suas terras expropriadas para a suposto implantação de um natimorto distrito industrial em São João continuam sem receber qualquer tipo de ressarcimento por parte do governo do Rio de Janeiro. Aliás, também não se fala mais na salinização das águas continentais causadas pelo extravasamento de água salgada proveniente dos aterros construídos no Porto do Açu. Tampouco se fala mais na destruição da Praia do Açu, e do fechamento das áreas preferenciais de pesca aos habitantes do V Distrito de São João da Barra.

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Mas uma coisa que eu possa garantir é que se a mídia corporativa opta por ceder espaços para o merchandising do Porto do Açu, eu e meu grupo de pesquisa continuaremos a estudar os impactos do empreendimento. E posso garantir que ainda temos muita flecha para soltar, pois o Porto do Açu não passa de um imenso bambuzal.

Projetos de gás enfrentam graves problemas financeiros, mesmo com recuperação da pandemia

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A Global Energy Monitor divulgou hoje (24/06) os resultados de uma pesquisa mundial sobre projetos de terminais de gás natural liquefeito (GNL). O relatório, “Nervous Money: Global LNG Terminals Update 2021”, destaca que apesar da recuperação da pandemia estar se acelerando em partes do mundo, 38% do fornecimento total planejado de GNL está enfrentando atrasos nas decisões finais de investimento (FIDs) ou outras interrupções graves de projeto.

A notícia é preocupante para o Brasil. Fora da Ásia, o país é um hotspot de investimentos no setor, com 13 terminais de importação de GNL em construção ou pré-construção. E o governo federal está impulsionando a infraestrutura de gás e a criação de novas termelétricas, tanto pela lei do gás sancionada em abril (Lei 14.134/2021), como pelos jabutis infiltrados na Medida Provisória 1031/2021, que privatiza a Eletrobrás.

No ano passado, apenas um projeto de GNL chegou a uma decisão final de investimento no mundo – o terminal Costa Azul, no México. Os custos excedentes foram exacerbados pela COVID-19, uma vez que muitos recursos humanos não puderam realizar o trabalho. “O tamanho dos projetos expôs os investidores a perdas catastróficas”, disse Lydia Plante, a principal autora do relatório da GEM.

O cenário para o gás contrasta com o mercado de energias renováveis. Esta semana, a Agência Internacional para Energias Renováveis (IRENA) divulgou um relatório em que afirma que o percentual de renováveis que alcançaram custo inferior ao das energias fósseis mais competitivas dobrou em 2020. Foram 162 GW – ou 62% do total de geração adicionada no ano passado – com custo mais baixo que as opções fósseis mais baratas. O documento ressalta ainda uma tendência de redução sustentada de custos das renováveis, tanto para instalação, como para a manutenção.

Barreiras ao gás

As preocupações climáticas são o maior entrave do gás na Europa, mas regiões-chave para esse mercado, como os EUA, foram afetadas também pelo fornecimento barato de Qatar e Rússia, afirma o estudo. O relatório aponta ainda a vulnerabilidade dos terminais de gás em ambientes de instabilidade política, e cita como exemplo os ataques de insurgentes às instalações da Total em Moçambique , ainda em construção. A petroleira francesa declarou “força maior” para o encerramento do projeto de 20 bilhões de dólares financiado por um amplo consórcio, incluindo investidores privados, bancos públicos e instituições de crédito dos Estados Unidos, China, Japão e União Europeia.

Outro impacto negativo para o ambiente de investimentos em gás foi o inédito relatório net-zero da Agência Internacional de Energia (AIE) em maio. A agência vê a demanda de gás caindo significativamente nos próximos anos e uma mudança global para a descarbonização total do setor energético viabilizada pela energia renovável. De acordo com a AIE, o comércio interregional de GNL precisaria diminuir rapidamente após 2025 sob um cenário zero líquido em 2050.

“O GNL foi vendido aos formuladores de políticas e aos investidores como uma aposta limpa e segura”, afirma Plante. “Agora todos esses atributos se transformaram em responsabilidades. Os cenários recentes da AIE para 2050 mostram que o GNL não tem lugar num futuro energético seguro para o clima. A indústria perdeu sua auréola climática, e a única questão é se a Administração Biden irá desperdiçar capital político precioso para apoiar potenciais elefantes brancos”.

Para Ted Nace, diretor executivo da Global Energy Monitor, quem avalia o investimento em infraestrutura como “seguro” pode enfrentar percalços no setor de gás. “A oportunidade para a construção de mais capacidade de exportação se reduziu, e os projetos norte-americanos ficaram para trás por vários motivos. Eles são vistos com razão, especialmente pelos compradores europeus, como particularmente sujos, devido à sua dependência do fracking.”

Uma vez considerado como uma solução climática potencial, o setor de GNL é cada vez mais visto como um problema climático, particularmente para os compradores europeus. A América do Norte responde por 64% da capacidade global de exportação em construção ou pré-construção. A América do Norte também tem os projetos mais conturbados, com 11 dos 26 terminais de exportação de GNL relatando atrasos na FID ou outras perturbações graves.

A capacidade de importação de GNL continua em rápida expansão, com projetos suficientes em construção ou pré-construção para aumentar a capacidade global em 70%. Da capacidade em construção ou pré-construção, 32% está na China, 11% está na Índia e 7% está na Tailândia. Fora da Ásia, o Brasil é um hotspot com 13 terminais de importação de GNL em construção ou pré-construção.

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Leia o relatório aqui.
A metodologia usada no Global Fossil Infrastructure Tracker está aqui .

Contatos para entrevista:
Ted Nace, Global Energy Monitor, (510) 331-8743, ted.nace@globalenergymonitor.org
Lydia Plante, Global Energy Monitor, (504) 442-8145, lydia.plante@globalenergymonitor.org
James Browning, Global Energy Monitor, (215) 900-0869james.browning@globalenergymonitor.org

Sobre o Global Energy Monitor

Global Energy Monitor é uma rede de pesquisadores que desenvolve recursos informativos sobre combustíveis fósseis e alternativas energéticas.

Sobre o Global Fossil Infrastructure Tracker

O Global Fossil Infrastructure Tracker identifica, mapeia, descreve e categoriza os oleodutos e terminais existentes e propostos. Desenvolvido pelo grupo de pesquisa Global Energy Monitor, o rastreador utiliza fontes públicas para documentar cada projeto e é projetado para apoiar o monitoramento longitudinal.

Bitcoin se tornou refúgio para investidores em períodos críticos da pandemia

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Investir em Bitcoin deixou de ser algo para os investidores mais ousados. Segundo uma pesquisa da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV/ EAESP), a criptomoeda foi considerada um investimento seguro durante o período mais crítico da pandemia, se destacando, junto com o ouro, como um refúgio para investidores protegerem seus ativos. Essas conclusões foram publicadas na revista “Research in International Business and Finance”.

Os pesquisadores Eduardo H. Diniz e Natália Diniz-Maganini, que analisaram o comportamento dos investimentos em Bitcoin durante março e julho de 2020, mostraram que a criptomoeda foi considerada um investimento seguro (conhecido também pela expressão safe-haven), com índices comparáveis aos investimentos em ações ou em dólar.

A pesquisa foi realizada de maneira empírica, por meio de observações dos preços do Bitcoin para testar o seu potencial como investimento seguro durante o período mais crítico da pandemia para o mercado financeiro. “Analisamos as variações de preços do Bitcoin a cada cinco minutos, verificando se a criptomoeda foi um investimento seguro na comparação com o índice internacional Morgan Stanley (MCSI), utilizado no mercado de ações, e o índice dólar, usado para investimentos cambiais”, explica Diniz-Maganini.

Os pesquisadores ressaltam que o fato do Bitcoin se comportar como uma reserva segura para os investidores é uma grande novidade. “Até o início de 2020, ninguém diria com segurança que uma criptomoeda poderia ser um ativo para qual os investidores correriam em caso de uma crise financeira”, destaca Diniz. “Isso não quer dizer que o Bitcoin se tornou um investimento sem riscos de uma hora para outra, mas que o mercado de investidores já o considera como um investimento viável e com a liquidez necessária para momentos de grande incerteza”, complementa o pesquisador.

Um dos grandes diferenciais do Bitcoin na comparação com os outros ativos, segundo os pesquisadores, tem a ver com o fato de que, no mundo das criptomoedas ninguém tem informação privilegiada, porque o seu funcionamento é baseado em códigos que são públicos, conhecidos por todos de maneira igualitária. “Além disso, existem muitas outras criptomoedas que ainda são menos consolidadas que o Bitcoin, o que pode abrir muitas novas frentes de investimentos futuros — estudos neste campo, portanto, se tornam cada vez mais urgentes e necessários”, alertam os pesquisadores.

Os resultados da pesquisa confirmam as expectativas observadas ao longo de 2020 que consideravam a transformação do Bitcoin em um investimento mainstream, que poderá ser buscado por uma variedade maior de investidores. Para os pesquisadores, isso sinaliza que o Bitcoin deixa de ser um ativo procurado apenas por um grupo de especuladores para se tornar uma opção de investimento para uma ampla gama de empresas e investidores do mercado financeiro.

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Este texto foi originalmente publicado pela Agência Bori [Aqui!].

Países ricos não têm nenhum plano para cumprir suas promessas de financiamento climático, indica relatório

Membros do G7 anunciaram recuperação verde pós-pandemia em 2020, enquanto investiam

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US $190 bi em combustíveis fósseis, revela Tearfund Os planos de financiamento climático dos países desenvolvidos são fracos e imprevisíveis, alerta o relatório da CARE divulgado hoje (3/6) . O estudo “Compromissos Ocos” analisou 24 planos recentes anunciados pelos países ricos e afirma que nenhum deles forneceu informações sobre como e quando as promessas serão cumpridas. A pesquisa afirma também que os países não explicam de que forma seus novos compromissos contribuem com a meta de US $100 bilhões para o financiamento climático das nações pobres estabelecida na Conferência do Clima de Copenhague (COP15), em 2009, para o ano de 2020.

O tema deve estar na pauta do próximo encontro do G7, quando líderes de Reino Unido, Canadá, EUA, Alemanha, França, Japão e Itália se encontrarão na Cornualha, Inglaterra, entre 11-13 de junho. Coréia do Sul, Austrália, Índia e África do Sul também participarão do evento como convidadas.

A recuperação da economia após a COVID-19 também será assunto do G7. Enquanto as principais economias anunciavam em 2020 projetos para “reconstruir melhor”, com sustentabilidade e justiça social, os países do G7 injetaram quase US ﹩190 bilhões em combustíveis fósseis no mesmo período, revela um levantamento liderado pela Tearfund, uma agência internacional cristã de ajuda humanitária.

Segundo a pesquisa, carvão, petróleo e gás receberam US $189 bilhões em apoio, em comparação com US $147 bilhões para formas limpas de energia, desde o início da pandemia. Nos planos de recuperação, mais de 8 em cada 10 dólares foram comprometidos com combustíveis fósseis sem nenhuma contrapartida verde.

O histórico recente do Reino Unido destaca a tensão entre as ambições verdes do governo e as decisões de gastos reais do Tesouro: o país assumiu os maiores compromissos per capita com os combustíveis fósseis do G7, com apenas 4% deste apoio tendo qualquer critério de sustentabilidade associado. Por outro lado, o Reino Unido anunciou o fim do apoio público a projetos de combustíveis fósseis no exterior e a proibição em 2030 de novos carros a gasolina e diesel.

Além da Tearfund, colaboraram com a pesquisa o Instituto Internacional para o Desenvolvimento Sustentável ( IISD ) e a ODI , que trabalharam com organizações em cada país para analisar 517 políticas aprovadas desde o início da pandemia.

“Se cada um dos líderes do G7 não anunciar claramente em Cornualha, no dia 11, um aumento significativo no financiamento climático para cumprir e superar sua promessa de US $100 bilhões até 2020 e aumentar em trilhões de dólares as medidas de recuperação verde global, isso só pode ser interpretado como uma quebra maciça de confiança e responsabilidade”, avalia Tasneem Essop, diretora executiva da Climate Action Network.

Para Mohamed Adow, diretor do think tank Power Shift Africa, as descobertas dos dois estudos são “terríveis”. “O processo da ONU, e de qualquer negociação razoável, só funciona se uma das partes puder confiar na outra para fazer o que foi acordado, o que foi prometido. Os países mais ricos prometeram 100 bilhões de dólares até 2020 e ainda assim decidiram simplesmente não cumprir esta obrigação”, declarou.

A jovem ativista Vanessa Nakate, do Fridays For Future Uganda, afirmou que os países ricos têm “obrigação moral” de ajudar países pobres na transição dos combustíveis fósseis. “A demanda por eletricidade na África pode dobrar nos próximos dez anos e, com o atraso dos países ricos, o dinheiro está saindo de seus bancos para construir mais infraestrutura de combustíveis fósseis que nós não queremos.”

Diann Black-Layne, embaixadora de Antígua e Barbuda, comentou os resultados em evento da ONU, e afirmou em nome do grupo de países-ilha (AOSIS) que o financiamento climático não pode ser confundido com financiamento ao desenvolvimento. “O financiamento necessário para se recuperar após um furacão não é financiamento para o desenvolvimento. Sejamos claros: o financiamento climático paga pelo impacto da poluição de outros”.

A prioridade econômica do Brasil é gerar empregos, não manter a disciplina fiscal

filaPessoas desempregadas fazem fila para obter uma senha para participação em um evento de oportunidades de emprego no centro de São Paulo, Brasil, em 26 de março de 2019. Foto tirada em 26 de março de 2019. REUTERS / AMANDA PEROBELLI

Por Jamie McGeever e Leandra Camera para a Reuters

BRASÍLIA (Reuters) – O Brasil foi aplaudido por investidores por insistir que seu desafio econômico mais urgente é enfrentar um déficit recorde causado pela COVID-19, mas um número crescente de economistas afirma que a prioridade do governo é fazer com que milhões de brasileiros voltem ao trabalho.

Os números da semana passada mostraram o péssimo estado do mercado de trabalho no Brasil. As taxas de desemprego e subemprego são as mais altas já registradas; o mesmo acontece com o número de pessoas que desistiram de procurar trabalho e saíram da força de trabalho.

A folga resultante está sufocando a demanda do consumidor por bens e serviços, desencorajando as empresas de investir, e é um obstáculo de longo prazo ao crescimento econômico, dizem os economistas.

A economia brasileira de US$ 1,3 trilhão deve encolher um recorde de 5% este ano e crescerá apenas 3,5% no ano que vem, de acordo com a última previsão de uma pesquisa semanal do banco central com economistas.

Um relatório do Ministério da Economia na semana passada intitulado ‘Estratégia de Crescimento Econômico de Longo Prazo’ – publicado em resposta a uma crítica da mídia local sobre o manejo da economia – destacou onde está o foco do governo.

A palavra ‘fiscal’ apareceu seis vezes, e houve seis referências feitas à agenda de ‘reformas’ do governo. Não houve uma única menção a ‘empregos’, ‘emprego’ ou ‘trabalho’.

O Brasil não está sozinho em gastar muito para minimizar os problemas econômicos da pandemia. Mas um ponto de partida fiscal fraco significa que a dívida do governo está em vias de terminar este ano em torno de 95% do PIB, muito maior do que a média da América Latina e do Caribe de 59%, de acordo com a Fitch.

Poucos contestam que o déficit recorde deve ser revertido em algum momento. Os investidores estão cada vez mais nervosos e os mercados brasileiros cada vez mais pressionados.

Ainda assim, o Fundo Monetário Internacional (FMI) disse na segunda-feira que a prioridade da política de curto prazo do Brasil deveria ser “salvar vidas e meios de subsistência”. Uma consolidação fiscal foi necessária para reduzir a dívida no “médio prazo”, disse.

Um número crescente de economistas afirma que os desafios fiscais e de emprego estão relacionados: com a escassa demanda por bens e serviços, e que nenhum aperto de cinto do governo estimulará as empresas a investir e contratar.

“Não nego que o Brasil tenha um problema fiscal, mas o problema do Brasil não é fiscal”, disse José Francisco Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator em São Paulo.

“Se não houver esperança nem mesmo de baixo crescimento, o mercado de trabalho continuará extremamente fraco. Quem vai investir se a capacidade econômica não estiver sendo usada?”

O “mergulho” dos investimentos

Gonçalves disse que as empresas investem se estiverem confiantes de que a demanda e os lucros vão aumentar, o que normalmente depende de um mercado de trabalho saudável.

Mas o investimento empresarial no Brasil está fraco há muito tempo. No segundo trimestre, o investimento fixo bruto ajustado sazonalmente caiu para seu nível mais baixo desde 2006.

FIXEDINVESTMENTEvolução do investimento fixo no Brasil

Mesmo antes da pandemia, a economia brasileira estava desacelerando e o desemprego aumentando.

E com as transferências de ajuda emergencial para os pobres programadas para expirar no final de dezembro e um esquema de substituição ainda a ser determinado, as perspectivas econômicas para milhões de famílias são incertas.

“Perdi meu sustento. Não tenho casa; não tenho emprego”, disse Maria Lucia Spolzino Porto, 56, divorciada do Rio de Janeiro, que foi morar com o filho depois de perder seu trabalho em uma clínica de beleza.

Algumas métricas do mercado de trabalho melhoraram recentemente. O número de empregos formais aumentou por dois meses consecutivos e os pedidos de seguro-desemprego vêm caindo há semanas.

Mas o desemprego é um indicador defasado, o que significa que é lento para responder às mudanças nas condições econômicas. A taxa de desemprego – que atingiu 13,8% em julho – pode subir por meses, mesmo com a recuperação da economia.

O retorno às taxas de desemprego anteriores à pandemia, aos níveis de emprego, ao tamanho da força de trabalho e à parcela da força de trabalho ocupada poderia levar anos, em vez de meses, sem a ajuda do governo.

Eduardo Zylberstajn, economista e consultor da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), olha o problema do outro lado: o governo não pode enfrentar o desemprego de maneira significativa se estiver carregado de déficit e dívidas recordes.

“Você não pode ajudar no emprego se não tiver espaço fiscal. Às vezes, a melhor ajuda que você pode oferecer é a disciplina fiscal, pois isso reduz as taxas de juros, aumenta o crédito e incentiva o investimento”, disse Zylberstajn.

12 milhões de desempregados

O problema é que as perspectivas de emprego no Brasil não eram tão boas, mesmo antes da pandemia, apesar das taxas de juros historicamente baixas, do mercado de ações em alta recorde e do otimismo entre os investidores de que a agenda de reformas amigáveis ​​ao mercado do governo estava no caminho certo.

Enquanto o número de brasileiros em idade produtiva que estão trabalhando é  de  apenas 47,1%, de acordo com o IBGE, mesmo antes do coronavírus atacar em fevereiro já era de apenas  54,5%.

Esse foi aproximadamente o mesmo nível que esteve desde 2016 e confortavelmente abaixo dos picos da série acima de 57% em 2012 e 2013.

DESEMPREGO1

Taxa de pessoas empregadas/ população em idade ativa no Brasil

O número de brasileiros trabalhando caiu  para 82 milhões, o representa um total de 12 milhões de desempregados. Mesmo o recorde de 94 milhões de pessoas trabalhando antes da pandemia mal acompanhava o crescimento geral da população desde o início da série do IBGE em 2012.

DESEMPREGO2Total de pessoas empregadas no Brasil

“Onde estão esses 12 milhões de pessoas que estavam empregadas no início do ano? A maioria delas terá que voltar para encontrar trabalho e  isso vai aumentar o desemprego”, disse João Sabóia, professor emérito do Universidade Federal do Rio de Janeiro.

“Vai ser uma recuperação muito lenta.”

(Reportagem de (Reportagem de Jamie McGeever em Brasília; reportagem adicional de Leandra Camera no Rio de Janeiro; edição de Daniel Flynn e Richard Pullin) no Rio de Janeiro; edição de Daniel Flynn e Richard Pullin)

Este artigo foi escrito originalmente em inglês e publicado pela agência Reuters [Aqui!]

Devastação da Amazônia já afasta investimentos, alerta presidente da Ramboll

Engenheiro Ambiental PhD e executivo enfatiza destruição da floresta Amazônica, fragilidade da fiscalização, relaxamento em exigências de proteção, ameaças à população indígena , a consequente redução de investimentos externos

incendioamazonia-640x426O Governo de Rondônia lançou a Operação Jequitibá de prevenção e combate aos focos de incêndios no Estado (Foto: Esio Mendes)

Eugenio Singer, presidente da Ramboll Brasil, subsidiária de uma das maiores consultorias ambientais do mundo, e do Conselho de Administração do Instituto Pharos, organização dedicada à defesa dos recursos naturais, salienta que a agenda ambiental torna-se decisiva para a retomada das atividades econômicas pós-pandemia da COVID-19. “No Brasil, porém, os graves impactos do desmatamento na Amazônia colocam o País na contramão dessa irreversível tendência”.

O especialista pondera que, no momento em que a crise deflagrada pela expansão do novo coronavírus cria gravíssimo impacto planetário de múltiplas consequências, alguns fatos de especial relevância causam inédita preocupação pelo poder que têm em interferir nos já difíceis e imprevisíveis rumos do desenvolvimento humano, social e econômico global no futuro pós-pandemia.

Dentre tais fatores, ele aponta a maneira como distintas dimensões da crise entrelaçam-se no Brasil, fazendo convergir problemas anteriores e aqueles deflagrados pela COVID-19. Isso tem repercussões ambientais e sociais de alto risco para o País, seu povo e instituições, bem como para a humanidade. “Afinal, é inegável que o Brasil, por suas características geopolíticas, diversidade cultural e incomparável patrimônio ambiental, é um dos pilares para o turning-point que aponta cada vez mais, em escala global, para uma renovação estruturante dos conceitos de desenvolvimento prevalentes até o momento. Estes precisam ser reinventados com urgência, visando garantir até mesmo a vida na Terra, como alertam diariamente os efeitos dramáticos das mudanças climáticas, da perda de biodiversidade e da decrescente disponibilidade de água”, ressalta.

Eugênio Singer destaca que autoridades públicas dos distintos níveis de responsabilidade, centros de pesquisa, universidades, comunidade de saúde e sociedade civil empenham-se em atender às urgências da pandemia e, ao mesmo tempo, em preservar a capacidade do Brasil de se recuperar com a minimização possível de danos. “Porém, é preciso alertar sobre alguns pontos que podem ter efeitos desastrosos no futuro próximo do País e na sua inserção nos esforços globais de soerguimento, cada vez mais comprometidos com o desenvolvimento sustentável e a defesa dos direitos humanos”, observa, apontando cinco questões prioritárias:

1) Assim como grupos empresariais de diferentes nações, vinculados a diversos ramos de atividade econômica, manifestaram seu desconforto com os rumos que vem tomando a destruição da Floresta Amazônica, com aumento expressivo do ritmo e do volume do desmatamento, não poderíamos deixar de apresentar nosso ponto de vista. Nossa posição é lastreada pela presença de corporações estrangeiras no Brasil, especificamente da Europa, América do Norte e Ásia, em setores importantes, como os da agricultura, infraestrutura, transporte, mineração, saúde, telecomunicações, energia, petróleo e gás, automotivo, farmacêutico e alimentos. Vemos com crescente mal-estar a fragilização das condições de investimento no País. Este problema decorre das sinalizações efetivas, dadas por instituições e personalidades de governo, por meio de palavras, ações e omissões, de um afastamento dos preceitos ecológicos. Trata-se de postura em sentido contrário dos protocolos de ação consolidados no mundo inteiro, que reconhecem a necessidade – e, mais do que isso, a urgência inarredável – de respeitar e defender o meio ambiente como bem estratégico de uso coletivo, a ser planejado e utilizado como tal, e não mais como objeto de uso predatório e centrado em interesses produtivos mais imediatos. Fazemos parte da parcela crescente da sociedade global que, finalmente, reconhece na conservação rigorosa e de base científica dos recursos naturais e dos bens da natureza um ativo de imenso valor, preponderante para o crescimento econômico sustentável. É este o fator que garantirá às empresas uma inserção mais acolhedora e sensível nas questões sociais e culturais, imprescindíveis para um avanço civilizatório capaz de preservar, inclusive, nossos interesses e capitais. Tais movimentos transformadores são inadiáveis.

2) A pandemia atual e seus efeitos devastadores mostram-nos que a retomada das atividades e das esperanças individuais não deve pretender apenas recompor o desenho previamente existente no qual espelhávamos nossas vidas, nossas sociedades, nossa economia e nossas interações locais, nacionais e globais. A recuperação exige pensamento estratégico. É decisivo dar um passo à frente, dialogar com as reflexões e respostas positivas e inovadoras hoje gestadas no mundo todo. Dessa forma, é incompreensível e causa perplexidade que o Brasil não se dedique a inserir fortemente a Amazônia preservada como parte fundamental de seu cacife para a conjuntura necessariamente diferenciada que surgirá da crise da COVID-19. Mas, não é o que vemos. Ao contrário, observa-se o aumento expressivo e persistente do desmatamento, a fragilização dos órgãos de fiscalização com expertise na área ambiental e a redução significativa das punições impostas aos infratores, a despeito de novos arranjos institucionais formalmente destinados à proteção da Floresta Amazônica.

3) Ao mesmo tempo, causa-nos profundo pesar constatar a situação de risco extremo a que estão submetidos os povos indígenas em todo o País, sobretudo na Amazônia. À escalada da pressão de atividades ilegais de mineração e desmatamento em suas terras, mesmo as já demarcadas, soma-se agora a ação devastadora do novo coronavírus. Mesmo diante de tais ameaças concretas, esses brasileiros não vêm recebendo a atenção diferenciada que sua situação de maior vulnerabilidade exige. Em contraste com o esforço voluntário da sociedade civil brasileira e internacional para socorrê-los, é nítida a participação tímida dos órgãos governamentais destinados à proteção indígena, mesmo diante dos números que indicam um impacto que pode ser fatal para várias etnias.

4) Entendemos ser indissociáveis as duas questões aqui destacadas, ou seja, a proteção ao meio ambiente e os direitos indígenas. A destruição de uma acarretará graves danos à outra e vice-versa. E ambas são conquistas que estão na base do pensamento crítico e analítico que nos leva, desde o século passado, a rever padrões de valores que fundamentam a vida em sociedade e, principalmente, a arejar o pensamento empresarial sobre seus compromissos para além da realização econômica. Hoje, de maneira nítida e abrangente, tais princípios passam a fazer parte intrínseca da vida das empresas, dos critérios de mercado, de investimentos e de viabilidade de parcerias. E não há como ser diferente, dadas as duras lições que a humanidade tem aprendido sobre o uso predatório dos recursos naturais e sobre a desconsideração de direitos humanos, sociais e culturais básicos. Embora ainda não possamos afirmar a hegemonia desses novos parâmetros, sabemos que é um caminho sem volta, no qual países, corporações e indivíduos engajam-se cada vez mais. Afinal, não se trata de ideologia, mas de constatar, o que temos feito com frequência e bom senso, o efeito virtuoso de tal atitude, inclusive para os resultados da produção econômica. Trata-se, enfim, de trazer o futuro para os cálculos do presente e de não destruí-lo.

5) Assim, ao mesmo tempo em que reconhecemos no Brasil um tradicional ambiente propício a investimentos, não podemos ignorar e deixar de nos manifestar a respeito da insegurança atual quanto aos fatores aqui expostos. Ao mesmo tempo em que vemos o país como potência ambiental capaz de participar de maneira decisiva da recomposição planetária pós-pandemia, reconhecemos num possível estigma antiambiental e contrário aos direitos indígenas o poder de afastá-lo da interlocução global e do fluxo de capitais, para os quais este é um ponto de difícil superação. E, certamente, a política ambiental atual, com um nível ponderável de relaxamento dos protocolos básicos de licenciamento, controle e garantia de transparência dos dados sobre desmatamento, aliada ao insuficiente apoio às comunidades indígenas, não é um caminho que possa dar suporte a parcerias duradouras com corporações, instituições e fundos globais.

Investimentos em CT&I: enquanto Brasil diminui, China aumenta

Para entender como estão as chances do Brasil em se tornar um país mais avançado não é preciso ir longe. Basta ver o que anda acontecendo com os investimentos em ciência, tecnologia e inovação ao longo do tempo.  

Nesse sentido, o gráfico produzido pela revista Nature sobre a evolução dos investimentos das principais economias mundiais em ciência, tecnologia e inovação que vai logo abaixo. É que enquanto o Brasil nem aparece no gráfico, a China salta para o segundo lugar nesse tipo de alocação de recursos públicos.

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A decorrência disso é que a China, que em 2016 aumentou em 70% o orçamento do ministério da Ciência, já planeja sair da fase da exportação de manufaturados para a de produtos científicos de ponta.

Já o Brasil não apenas acabou com o seu ministério de ciência, tecnologia e inovação, juntando o que sobrou com uma estapafúrdia mistura com as comunicações, como também continua incapaz de entregar as verbas já alocadas para ações estratégicas como os dos institutos nacionais de tecnologia.

Os resultados desse tipo de comportamento inverso entre Brasil e China no tocante aos investimentos em CT&I não tardarão a aparecer.  E lamentavelmente, continuaremos a regredir para o Século XVI, bem ao gosto das elites que dominam o nosso país desde a chegada dos conquistadores portugueses.

Pátria educadora? Está mais para pátria dos bancos!

O governo Dilma anda nos bombardeando com uma campanha publicitária sobre uma tal “Pátria educadora”. Mas como para saber para quem e qual finalidade se governo basta olhar o orçamento de um dado governo, mostra a figura abaixo com a distribuição orçamentária de 2014 para pagamento da dívida pública e de investimento em educação.

orçamento

Esses números mostram que estamos mais para a pátria dos bancos (o HSBC das contas secretas na Suíça incluso) do que para a da educação.

Em suma, a coalizão PT/PMDB, como já fizeram os tucanos, adora mesmo é pagar juros bancários e tem o maior medo de investir em educação. Afinal, povo educado, já mostraram os islandeses, deixam os bancos quebrarem e investem em escolas de excelência para todos.