A ciência brasileira está sob contínuo ataque

ciencia-sob-ataque

Por Bernardo Galvão-Castro,  Renato Sérgio Balão Cordeiro e Samuel Goldenberg*

Apesar da resistência dos cientistas brasileiros, a ciência no Brasil tem sido prejudicada por medidas implementadas pelo governo federal nos últimos 3 anos, como cortes crescentes no orçamento, ataques à autonomia das universidades e uma política geral de negação da ciência. Um recente corte de US$ 110 milhões no orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, além da retenção de US$ 490 milhões do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, não apenas representa um enorme impedimento para a realização de pesquisas em universidades e institutos de pesquisa, mas também prejudica o desenvolvimento científico futuro de um país.

As consequências incluem uma fuga de cérebros de cientistas e desmoralização e descontentamento entre os pesquisadores científicos brasileiros. Além disso, os cientistas correm o risco de sanções indiretas se suas pesquisas contradizerem as posições sustentadas pelo governo Bolsonaro, como afirmar que a floresta amazônica não está queimando ou que a cloroquina ou a hidroxicloroquina podem ser usadas para tratar COVID-19 com segurança e eficácia.

A recente demonstração de desrespeito aos cientistas foi um decreto federal, emitido em 5 de novembro de 2021, revogando o prêmio da Ordem Nacional do Mérito Científico concedido a dois cientistas, Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinicius Guimarães de Lacerda.

Em resposta a essa revogação, 200 ganhadores de prêmios anteriores escreveram uma carta expressando sua objeção, e 23 outros cientistas brasileiros atualmente indicados para este prêmio retiraram seus nomes em solidariedade a seus colegas injustamente desacreditados.

Esse ato também desencadeou uma reação imediata de várias sociedades acadêmicas e científicas brasileiras, incluindo a Academia Brasileira de Ciências e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). No início de 2020, pesquisa de Borba e colegasmostraram que doses mais elevadas de cloroquina não devem ser recomendadas para o tratamento de COVID-19 grave.

Benzaken era o ex-diretor do Departamento Brasileiro de DST / HIV-Aids e Hepatites Virais da Secretaria de Vigilância em Saúde (Ministério da Saúde), que foi demitido em janeiro de 2019.

Os ataques perpetrados pela atual administração federal não se limitam à ciência e aos cientistas e afetam a educação, a saúde pública, o meio ambiente e os programas culturais.,,

Esperamos que o Brasil não continue a se pautar pela negação e evite a degradação da ciência.

Todos os autores são pesquisadores eméritos da Fundação Oswaldo Cruz. Declaramos não haver interesses conflitantes*.

blue compass

Este texto foi escrito foi inicialmente em inglês e publicado pela revista “Lancet” [Aqui!].

The Lancet: 21 cientistas rejeitaram uma das maiores honrarias científicas do Brasil, depois que o presidente Bolsonaro vetar dois agraciados

ordem do mérito

Por Lise Alves de São Paulo

Um grupo de cientistas brasileiros agraciados com a Ordem Nacional do Mérito Científico decidiu recusar a homenagem, depois que o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, retirou dois de seus nomes da lista.

Um comunicado dos destinatários afirma: “Estamos extremamente honrados com a possibilidade de recebermos um dos maiores reconhecimentos que um cientista pode receber no nosso país. No entanto, a homenagem oferecida por um governo federal que não só ignora a ciência, mas boicota ativamente as recomendações da epidemiologia e da saúde coletiva, não condiz com nossa trajetória científica. Em solidariedade com os colegas que foram sumariamente excluídos da lista de destinatários, e em conformidade com a nossa postura ética, renunciamos coletivamente a esta nomeação. ”

O presidente Bolsonaro concedeu a 25 cientistas um dos maiores méritos científicos do país no dia 3 de novembro, apenas para excluir os nomes de Adele BenzakenSBP e Marcus Vinícius Lacerda da lista de homenageados 2 dias depois. Após o afastamento, 21 cientistas da lista divulgaram comunicado no qual renunciaram à homenagem. Eles também criticaram “a negação em geral, a perseguição a colegas cientistas e os recentes cortes nos orçamentos federais para ciência e tecnologia”, que dizem ter prejudicado avanços importantes da comunidade científica brasileira.

Um dos que renunciaram ao prêmio foi Cesar Victora, professor emérito da Universidade Federal de Pelotas (RS). Victora disse ao The Lancet que escreveu uma carta ao Ministro da Ciência e Tecnologia do Brasil renunciando à homenagem antes mesmo de tomar conhecimento da decisão do presidente de retirar o prêmio de Benzaken e Lacerda. “Como cientista e epidemiologista, tornei público por meio de palestras e artigos científicos minha completa oposição à forma como a pandemia de COVID-19 tem sido tratada por este governo”, disse Victora em sua carta.

Benzaken e Lacerda, ambos pesquisadores da Fiocruz-Amazônia, acham que sua retirada da lista se deve à divergência entre seu trabalho e a visão do governo Bolsonaro.

Benzaken, diretor da Fiocruz-Amazônia, se surpreendeu ao receber o prêmio em primeiro lugar. “Devo confessar que não pensei que o atual governo tivesse realmente me selecionado para esse prêmio”, disse Benzaken ao The Lancet . No entanto, ela criticou a remoção de seu nome. Benzaken foi demitido do Ministério da Saúde durante a primeira semana do governo Bolsonaro por publicar um panfleto que fornecia informações sobre saúde sexual para homens transexuais. Funcionários do Ministério da Saúde disseram que o panfleto continha linguagem vulgar e ofensiva. “Achei muito deselegante para o governo brasileiro. É como convidar alguém para uma festa e 2 dias depois não convidar ”, disse Benzaken, que passou a maior parte de sua vida profissional estudando, prevenindo e ajudando pessoas com HIV / AIDS.

Lacerda disse ao The Lancet que também ficou surpreso ao saber que estava na lista. “Causou um certo estranhamento porque o presidente e sua família já haviam falado coisas negativas sobre mim e espalhado notícias falsas sobre meu primeiro estudo com cloroquina e COVID-19 aqui em Manaus”, disse. Em março de 2021, Lacerda conduziu um estudo que concluiu que a cloroquina era ineficaz contra o COVID-19. O medicamento contra a malária foi promovido pela administração Bolsonaro como um medicamento milagroso para a COVID-19.

No momento em que se espalhou a notícia da retirada dos dois nomes da lista de premiados, a comunidade científica brasileira criticou a decisão. “Esse ato, inédito no país e típico de regimes autoritários, é mais um atentado à ciência, inovação e inteligência do país”, disse em nota Luiz Davidovich, presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC). “Ciência e inovação estão sendo fragilizadas por uma política econômica equivocada, que olha para o horizonte imediato, com medidas que prejudicam o futuro do Brasil. Atitudes de negação, com ataques irresponsáveis ​​às evidências científicas, prejudicam o desenvolvimento nacional e afetam diretamente a saúde da população ”.

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) também divulgou nota: “É evidente que o governo federal procedeu ao cancelamento ao saber que os dois renomados cientistas faziam pesquisas cujos resultados contradiziam os interesses das políticas governamentais, atuando como um censor da pesquisa, sem o devido respeito à verdade científica e à diversidade ”.

De acordo com a SBPC, todos os nomes para a premiação foram apresentados por uma comissão técnica formada por membros da SBPC e do ABC. O gabinete do presidente não deu uma razão para remover os nomes e não respondeu aos pedidos de comentários do The Lancet.

compass

Este texto foi escrito originalmente em inglês e publicado pela “The Lancet” [Aqui!].

A professora da UFAL que recusou homenagem de Bolsonaro

manuel onmc

Marília Goulart, professora da Ufal, disse que a renúncia à medalha foi uma atitude essencial e reconhecida nacional e mundialmente

Por Manuella Soares – jornalista

“Perde-se a honraria, não a honra!”. A fala é da professora Marília Goulart, do Instituto de Química e Biotecnologia da Ufal (IQB), parafraseando o presidente da SBPC, professor Renato Janine. Ela está na lista de condecorados com a Ordem Nacional do Mérito Científico, em decreto presidencial de 3 de novembro. Mas ela e outros 21 cientistas recusaram a comenda após novo decreto, em menos de 48 horas depois, excluindo os nomes de dois colegas pesquisadores.

Em Carta Aberta, os cientistas avaliaram a retirada dos nomes de Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda como “uma clara demonstração de perseguição a cientistas, configurando um novo passo do sistemático ataque à Ciência e à Tecnologia por parte do governo vigente”.

Marília deu apoio ao documento e ratificou: “Ser condecorada com a comenda da Ordem Nacional do Mérito Científico é uma honra máxima na carreira científica de qualquer pesquisador. O reconhecimento do valor de nossa trajetória é gratificante, emocionante e nos extasia. A escolha é meritória. Temos compromisso com a ética, a verdade e, principalmente, com a população, que precisa confiar em seus cientistas. A renúncia à medalha foi uma atitude essencial e reconhecida nacional e mundialmente. Temos muito orgulho de termos assinado a Carta, em companhia de ilustres colegas. Integridade, honra, solidariedade e indignação em favor da Ciência, em todos os seus aspectos. Isto nos move”.

O assunto repercutiu na imprensa nacional e mundial. Sites como o Le Monde (França), Deutsche Welle (Alemanha), NDTV (India) e BBC (Londres) destacaram a recusa da medalha em oposição ao presidente Jair Bolsonaro.

“A Ordem Nacional do Mérito Científico foi criada no Brasil em 1992 para reconhecer os autores das mais importantes contribuições para a ciência e a tecnologia. Receber esta homenagem, uma das mais altas do país, é uma honra”, frisou o Le Monde

O jornal alemão citou trechos da Carta Aberta e destacou que “o grupo reitera que a renúncia coletiva os entristece, mas expressa sua ‘indignação frente ao processo de destruição do sistema universitário e de ciência e tecnologia’”.

Motivação e apoio institucional

No documento que explica as motivações dos cientistas a renunciarem à medalha, eles contextualizam que a indicação da lista é feita por uma comissão formada por membros indicados pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTIC), pela Academia Brasileira de Ciências (ABC) e pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).

“Nossos nomes foram honrosamente indicados por essa comissão, reunida em 2019. O mérito científico foi o único parâmetro considerado para a inclusão de um nome na lista”, explicam e anunciam: “Em solidariedade aos colegas que foram sumariamente excluídos da lista de agraciados, e condizentes com nossa postura ética, renunciamos coletivamente a essa
indicação”.

O decreto presidencial excluindo os cientistas Adele Schwartz e Marcus Vinícius também foi duramente criticado por diversas instituições científicas. Os órgãos que indicaram a lista dos condecorados emitiram notas repudiando a ação do presidente.

“Fica evidente que o governo federal fez a cassação depois de saber que os dois cientistas renomados conduziam pesquisas cujos resultados contrariavam interesses de políticas governamentais, agindo como censor da pesquisa, sem o devido respeito à verdade científica e à diversidade”, diz a nota da SBPC.

“Esse ato, inédito no país e típico de regimes autoritários, é mais um ataque à ciência, à inovação e à inteligência do país”, frisa a nota da ABC contra a politização da Ordem Nacional do Mérito Científico (ONMC). E segue: “É inaceitável que se pratique o expurgo de cientistas que têm contribuído, com integridade e competência, para o desenvolvimento nacional e a saúde da população”.

Perseguição à ciência

Uma lista de 25 cientistas foi divulgada no dia 3 de novembro para receber a ONMC na classe de Comendador nas áreas de Ciências Biológicas; Biomédicas; da Engenharia; da Saúde, da qual apareciam os nomes de Adele e Marcus Vinícius; Ciências da Terra; Exatas e da Terra; Físicas; Ciências Químicas, com a única representante da Ufal, Marília Goulart; e Ciências Humanas.

A pesquisadora excluída da lista no dia 5, Adele Schwartz, é diretora da Fundação Oswaldo Cruz Amazônia (Fiocruz-AM), e Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda é pesquisador da Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado. Ele liderou um estudo conduzido no Amazonas que concluiu que a cloroquina não deve ser usada no tratamento da covid-19.

Na carta aberta de renúncia coletiva os pesquisadores ratificam que “a homenagem oferecida por um governo federal que não apenas ignora a ciência, mas ativamente boicota as recomendações da epidemiologia e da saúde coletiva, não é condizente com nossas trajetórias científicas”.

O professor da Ufal, Hilário Alencar, que já recebeu duas medalhas da Ordem Nacional do Mérito Científico, na classe Comendador (2005) e na classe Grã-Cruz (2010), mostrou indignação com o decreto presidencial: “Ficamos perplexos diante das exclusões arbitrárias da lista de agraciados. É preciso respeitar a ciência!”

A indicação da professora Marília representaria as mulheres nas Ciências Químicas. Este ano, apenas ela e Ângela de Luca (PUC-Rio) nessa área receberiam a honraria.

“Nos sentimos muito entristecidos por esta atitude inconsequente, pois o recebimento da comenda iria incentivar e inspirar muitos em Alagoas, que se encontra, inegavelmente, em região mais periférica no Brasil. A disparidade regional é um fato concreto, que necessita ser modificado”, finalizou a premiada docente da Ufal.

compass

Este texto foi inicialmente publicado pelo “Repórter Nordeste” [Aqui!].

Mais de 200 cientistas e personalidades membros da Ordem Nacional do Mérito Científico divulgam carta aberta

ordem do mérito

“Manifestamos nossa indignação e nosso veemente protesto em relação à exclusão arbitrária dos cientistas Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda da lista de agraciados com a Ordem Nacional do Mérito Científico de 2021, por meio de decreto presidencial de 05/11/2021”, protestam 

Mais de 200 cientistas e personalidades membros da Ordem Nacional do Mérito Científico divulgaram nesta quarta-feira, 10 de novembro, uma carta aberta em protesto à exclusão arbitrária dos cientistas Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda da lista de agraciados com a Ordem Nacional do Mérito Científico de 2021.

Os membros afirmam que o “ato de exclusão é o ápice de um processo de desvalorização e negacionismo em relação à ciência e de severas reduções orçamentárias, que têm afetado severamente o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, e que constituem uma grave ameaça à ciência brasileira e ao desenvolvimento do país”.

Os demais cientistas e personalidades membros da Ordem Nacional do Mérito Científico que quiserem assinar a manifestação escrevam, por gentileza, para: agraciadosomc@gmail.com.

Leia o documento na íntegra:

Carta aberta de cientistas e personalidades que são membros da Ordem  Nacional do Mérito Científico 

A Ordem Nacional do Mérito Científico (ONMC), criada em 1993, é um instrumento de Estado para reconhecer contribuições científicas e técnicas de personalidades brasileiras e estrangeiras. Não se trata, portanto, de uma honraria a ser usada com interesses políticos ou ideológicos particulares de eventuais governos. Os abaixo-assinados são cientistas e personalidades membros da Ordem Nacional do Mérito Científico, por terem sido admitidos nela ao longo das três últimas décadas e por governos diversos. Manifestamos nossa indignação e nosso veemente protesto em relação à exclusão arbitrária dos cientistas Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda da lista de agraciados com a Ordem Nacional do Mérito Científico de 2021, por meio de decreto presidencial de 05/11/2021.

Somos solidários e reconhecemos a dimensão ética da atitude adotada por colegas, que foram admitidos na Ordem Nacional do Mérito Científico em recente decreto presidencial, expressa na “Carta aberta dos cientistas condecorados com a Ordem Nacional do Mérito Científico em 03/11/2021”, e apoiamos os termos de sua manifestação. A ação de censura perpetrada pelo governo federal, com o expurgo dos dois colegas cientistas da ONMC, nos faz recordar tempos sombrios. Não aceitamos, assim como a comunidade científica e a grande maioria do povo brasileiro, o retorno do arbítrio e do autoritarismo. Este ato de exclusão é o ápice de um processo de desvalorização e negacionismo em relação à ciência e de severas reduções orçamentárias, que têm afetado severamente o Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, e que constituem uma grave ameaça à ciência brasileira e ao desenvolvimento do país.

Cientistas e personalidades que assinam a carta:

 Abílio Afonso Baeta Neves

Adalberto Fazzio

Adalberto Luis Val

Adalberto Ramon Vieyra

Ado Jório Vasconcelos

Adolpho José Melfi

Alaor Chaves

Alberto Laender

Alberto Passos Guimarães

Alberto Santoro

Alcides Lins Neto

Alcides N. Sial

Aldina Maria Prado Barral

Alexander Kellner

Alfredo Miguel Ozorio de Almeida

Alice Abreu

Álvaro Toubes Prata

Ana Lúcia Gazzolla

Ana Maria de Lauro Castrucci

Anibal Eugênio Vercesi

Antonio Galves

Antônio Gomes de Souza Filho

Antonio Marcus Nogueira Lima

Aquilino Senra

Aroldo Misi

Beatriz Barbuy

Betty Mindlin

Branca Vianna

Carlos Alberto Aragão

Carlos Alberto Lombardi Filgueiras

Carlos Alexandre Netto

Carlos Alfredo Joly

Carlos Américo Pacheco

Carlos Frederico Martins Menck

Carlos Henrique de Brito Cruz

Carlos Médicis Morel

Carlos Nobre

Carlos Ricardo Soccol

Carlos Rodrigues Brandão

Carlos Vogt

Celina Maria Turchi Martelli

Celso Amorim

Celso Barros de Gomes

Celso Lafer

Celso Pinto de Melo

Cesar Leopoldo Camacho Manco

Charles R. Clement

Claudia Maria Bauzer Medeiros

Claudio Landim

Cláudio Leonardo Lucchesi

Concepta Margaret McManus Pimentel

Constantino Tsallis

Cristovam Buarque

Débora Foguel

Diogenes de Almeida Campos

Diogo Onofre Gomes de Souza

Dora Selma Fix Ventura

Edgar Dutra Zanotto

Edson Watanabe

Eduardo Viveiros de Castro

Elibio Rech

Eliezer J. Barreiro

Elisa Reis

Enrique Pujals

Erney Plessmann de Camargo

Esper Cavalheiro

Etelvino José Henriques Bechara

Eugenius Kaszkurewicz

Fernando Galembeck

Fernando Rizzo

Flávio Rech Wagner

Francilene Procópio Garcia

Francisco César de Sá Barreto

Gervásio Annes Degrazia

Glaucius Oliva

Guilherme Suarez Kurtz

Helena Bonciani Nader

Helgio Trindade

Helio Waldman

Henrique Eisi Toma

Hernan Chaimovich

Hilário Alencar da Silva

Ildeu de Castro Moreira

Isaac Roitman

Israel Vainsencher

Jacob Palis Junior

Jacques Marcovitch

Jailson Bittencourt de Andrade

Jairton Dupont

Jean Pierre von der Weid

Jefferson Cardia Simões

Jerson Lima da Silva

João Calixto

João dos Anjos

João Fernando Gomes de Oliveira

João José Reis

João Luís Ribeiro Fragoso

João Moreira Salles

João Valdir Comasseto

Jorge Kalil

Jorge Luis Nicolas Audy

José Alexandre Felizola Diniz Filho

José Antunes Rodrigues

José Barbosa Filho

José Carlos Maldonado

José d’Albuquerque e Castro

José Ellis Ripper Filho

José Fernando Perez

José Fernando Thomé Jucá

Jose Galizia Tundisi

José Israel Vargas

José Luiz Lima Filho

José M. Riveros

José Murilo de Carvalho

Jose Reinaldo de Lima Lopes

Julio Cezar Melatti

Keti Tenenblat

Lauro Kubota

Léo Afraneo Hartmann

Liu Hsu

Lívio Amaral

Lucia Carvalho Pinto de Melo

Lucia Previato

Luís Eugênio de Araújo de Moraes Mello

Luís Manuel Rebelo Fernandes

Luiz Antonio Rodrigues Elias

Luiz Davidovich

Luiz Fernando Dias Duarte

Luiz Gylvan Meira Filho

Manoel Barral Netto

Marcello André Barcinski

Marcelo Gattass

Marcelo Knobel

Márcia Cristina Bernardes Barbosa

Marcio de Castro Silva Filho

Marcio G. Soares

Marco Antonio Chaer do Nascimento

Marco Aurelio De Paoli

Marcos Pimenta

Maria Aparecida Soares Ruas

Maria Aparecida Stallivieri Neves

Maria Hermínia Tavares de Almeida

Maria Julia Manso Alves

Maria Manuela Carneiro da Cunha

Maria Rita dos Santos e Passos-Bueno

Maria Vargas

Mariangela Hungria da Cunha

Mario Neto Borges

Mariza Peirano

Mayana Zatz

Mercedes Bustamente

Naercio Aquino Menezes Filho

Nelson Maculan

Nivio Ziviani

Otávio Guilherme Cardoso Alves Velho

Paolo Piccione

Paulo Arruda,

Paulo Domingos Cordaro

Paulo Eduardo Artaxo Netto

Paulo Suarez

Pedro Wongtschowski

Philip Fearnside

Rafael Linden

Raimundo Braz Filho

Ramayana Gazzinelli

Raúl A. Feijóo

Reinaldo Guimarães

Renato Janine Ribeiro

Roberto Amaral

Roberto Germano Costa

Roberto Kant de Lima

Roberto Lent

Rogério Cézar de Cerqueira Leite

Ronaldo Aloise Pilli

Ronaldo Mota

Ruben George Oliven

Rubens Belfort Jr

Said Najati Sidki

Samuel Goldenberg

Sandoval Carneiro Jr

Sara T. Olalla Saad

Sergio Adorno

Sérgio Bruni

Sergio Danilo Juno Pena

Sergio Machado Rezende

Sergio Miceli Pessoa de Barros

Shirley Schreier

Silvio Crestana

Silvio R. A. Salinas

Simon Schwartzman

Sylvio Canuto

Takeshi Kodama

Tomasz Kowaltowski

Ulpiano Toledo Bezerra de Meneses

Umberto Giuseppe Cordani

Vanderlan Bolzani

Vanderlei Salvador Bagnato

Virgilio Almeida

Virginia S.T. Ciminelli

Wagner F Gattaz

Walter Araujo Zin

Walter Colli

Wanderley de Souza

Wilson Suzigan

Wilson Teixeira

Wrana Maria Panizzi

Yuan Jinyun

Yvonne P. Mascarenhas

Em situação inédita, cientistas renunciam coletivamente à honraria concedida por Jair Bolsonaro

ordem do mérito

Em uma situação inédita na relação entre a comunidade científica brasileira e um governo federal em pleno exercício,  21 cientistas brasileiros que foram nominados por decreto presidencial do dia 03 de dezembro para receberem a “Ordem Nacional do Mérito Científico” emitiram hoje uma carta aberta onde renunciam coletivamente à referida honraria.

Entre as razões apresentadas pelos pesquisadors foram listados a perseguição cometida contra Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda que foram inicialmente agraciados com a concessão da “Ordem Nacional do Mérito Científico”, mas que foram posteriormente tiveram a honraria cassada por serem críticos da forma pela qual o governo Bolsonaro geriu a pandemia da COVID-19 no Brasil.

A carta dos cientistas também enfatiza que é inviável a aceitação de uma honraria científica concedida por parte de um governo que tem agido de forma negacionista em relação ao papel da ciência brasileira no desenvolvimento do Brasil, bem como os seguidos cortes orçamentários que “têm sido utilizados como ferramentas para fazer retroceder os importantes progressos alcançados pela comunidade científica brasileira nas últimas décadas“.

Ao longo da minha vivência acadêmica de mais de quatro décadas, considero que este documento é um dos mais agudos no sentido de apontar o fosso que separa a comunidade científica de um dado governo. Nesse sentido, essa renúncia coletiva é um momento singular que evidencia que o limite da paciência dos cientistas brasileiros com o negacionismo científico do governo comandado por Jair Bolsonaro foi alcançado.

Restará agora ao presidente Bolsonaro entregar para si mesmo e aos seus ministros a honraria científica a qual os cientistas estão renunciando. Idi Amin Dada nunca fez melhor! Enquanto isso, o espírito de Marlon Brando vive.

Abaixo publico a carta aberta dos “condecorados” em sua íntegra.

Carta aberta dos cientistas condecorados com a Ordem Nacional do Mérito  Científico em 03/11/2011

Os cientistas abaixo assinados, condecorados com a Ordem Nacional do Mérito Científico, em decreto presidencial de 3 de novembro de 2021, vêm a público declarar sua indignação, protesto e repúdio pela exclusão arbitrária dos colegas Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda da lista de agraciados, em novo decreto presidencial na data de 5 de novembro de 2021. Tal exclusão, inaceitável sob todos os aspectos, torna-se ainda mais condenável por ter ocorrido em menos de 48 horas após a publicação inicial, em mais uma clara demonstração de perseguição a cientistas, configurando um novo passo do sistemático ataque à Ciência e Tecnologia por parte do Governo vigente.

Enquanto cientistas, não compactuamos com a forma pela qual o negacionismo em geral, as perseguições a colegas cientistas e os recentes cortes nos orçamentos federais para a ciência e tecnologia têm sido utilizados como ferramentas para fazer retroceder os importantes progressos alcançados pela comunidade científica brasileira nas últimas décadas.

Como bem pontuaram a Academia Brasileira de Ciências e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em notas divulgadas no dia 5/11/2021, a Ordem Nacional do Mérito Científico, fundada em 1993, é um instrumento de Estado para reconhecer contribuições científicas e técnicas de personalidades brasileiras e estrangeiras. A indicação de membros agraciados é realizada por uma Comissão, formada por três membros indicados pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, três membros indicados pela Academia Brasileira de Ciências e três membros indicados pela SBPC. Nossos nomes foram honrosamente indicados por essa comissão, reunida em 2019. O mérito científico (como não poderia deixar de ser) foi o único parâmetro considerado para a inclusão de um nome na lista. Consideramos, portanto, gratificante nossa presença nessa lista, e ficamos extremamente honrados com a possibilidade de sermos agraciados com um dos maiores reconhecimentos que um cientista pode receber em nosso país. Entretanto, a homenagem oferecida por um Governo Federal que não apenas ignora a ciência, mas ativamente boicota as recomendações da epidemiologia e da saúde coletiva, não é condizente com nossas trajetórias científicas. Em solidariedade aos colegas que foram sumariamente excluídos da lista de agraciados, e condizentes com nossa postura ética, renunciamos coletivamente a essa indicação.

Outrossim, desejamos expressar nosso reconhecimento às indicações da Academia Brasileira de Ciências e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, entidades que têm respeito duradouro em defesa da Ciência, Tecnologia e Inovação na sociedade brasileira. Esse ato de renúncia, que nos entristece, expressa nossa indignação frente ao processo de destruição do sistema universitário e de Ciência e Tecnologia. Agimos conscientes no intuito de preservar as instituições universitárias e científicas brasileiras, na construção do processo civilizatório no Brasil.

Brasil, 6 de novembro de 2021

Assinam (em ordem alfabética)

Aldo Ângelo Moreira Lima (UFC)

Aldo José Gorgatti Zarbin (UFPR)

Alfredo Wagner Berno de Almeida (UEMA)

Anderson Stevens Leonidas Gomes (UFPE)

Angela De Luca Rebello Wagener (PUC-RJ)

Carlos Gustavo Tamm de Araujo Moreira (IMPA)

Cesar Gomes Victora (UFPel)

Claudio Landim (IMPA)

Fernando Garcia de Melo (UFRJ)

Fernando de Queiroz Cunha (USP)

João Candido Portinari (Projeto Portinari)

José Vicente Tavares dos Santos (UFRGS)

Luiz Antonio Martinelli (USP)

Maria Paula Cruz Schneider (UFPA)

Marília Oliveira Fonseca Goulart (UFAL)

Neusa Hamada (INPA)

Paulo Hilário Nascimento Saldiva (USP)

Paulo Sérgio Lacerda Beirão (UFMG)

Pedro Leite da Silva Dias (USP)

Regina Pekelmann Markus (USP)

Ronald Cintra Shellard (CBPF)

Por discordar da gestão da pandemia e da censura a críticos do governo federal, pesquisador recusa “ordem do mérito” concedida por Jair Bolsonaro

ema cloquina
Postura negacionista de Jair Bolsonaro em relação à pandemia da COVID-19 foi um dos motivos citados para recusa de epidemiologista em receber a Ordem Nacional do Mérito Científico
O professor emérito da Universidade Federal de Pelotas, o epidemiologista Cesar Victora, enviou no dia de hoje uma correspondência ao ministro da Ciência e Tecnologia, Marcos Ponte, dando conta de sua recusa em receber a “Ordem Nacional do Mérito Cientifico” que lhe foi concedido em decreto pelo presidente Jair Bolsonaro no última dia 03 de novembro (ver imagem abaixo).
carta cesar victora
Entre as razões alegadas pelo professor Victora, um pesquisador de renome internacional, está o fato de que a honraria está sendo concedida por “Tum governo federal que não apenas ignora, mas ativamente boicota as recomendações da epidemiologia e da saúde coletiva, não me parece pertinente”. Além disso, Victora enfatiza que “como cientista e epidemiologista, tenho tornado pública, através de palestras e artigos científicos, minha completa oposição à forma como a pandemia de COVID‐19 tem sido enfrentada por esse governo”.
Por outro lado, o professor Victora acrescentou que não conseguiria “compactuar com a forma pela qual o negacionismo em geral, as perseguições a colegas cientistas e em especial os recentes cortes nos orçamentos federais para a ciência têm sido utilizados como ferramentas para retroceder os importantes progressos alcançados pela comunidade científica brasileira nas últimas décadas”.
Para finalizar, Cesar Victora enfatizou que havia escrito a sua carta de recusa da “Ordem Nacional do Mérito Cientifico” antes “de ficar ciente de que as indicações de dois colegas cientistas (i.e., Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda) com posições críticas ao governo federal foram tornadas sem efeito, conforme o Diário Oficial de 5 de novembro”.

É interessante que no caso do protesto de Cesar Victora à retirada das medalhas de Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinícius Guimarães de Lacerda, já houve um pronunciamento da Academia Brasileira de Ciências (ABC), por meio do seu presidente, o físico Luiz Davidovich, protestando contra o que seria “o expurgo de cientistas que têm contribuído, com integridade e competência, para o desenvolvimento nacional e a saúde da população”. A mesma carta da ABC aponta que ” protestamos, como cientistas e cidadãos, contra essa escalada autoritária, que representa um ataque frontal ao espírito da Ordem Nacional do Mérito Científico” (ver imagem abaixo).

carta abc
Pelas informações que o “Blog do Pedlowski” recebeu é possível que outros agraciados por Jair Bolsonaro sigam o caminho trilhado por Cesar Victora e que outras associações científicas sigam a da ABC. Com isso, poderemos ter uma cerimônia de entrega de medalhas que exporá de forma ainda mais explícita a distância que separa a comunidade científica brasileira e o governo comandado por um presidente que se construiu como político negando o valor da Ciência nacional. O que o presidente deixou bastante explícito durante a ainda desastrosa gestão da pandemia da COVID-19 cujo resultado mais óbvio é a perda da vida de 600 mil brasileiros.
Finalmente, voltando à minha postagem original sobre a auto-concessão da “Ordem Nacional do Mérito Científico” por Jair Bolsonaro, tudo indica que o espírito de Marlon Brando pulsa firme em uma parte importante da comunidade científica brasileira. Melhor que seja sim.

Com o Brasil com sua ciência em estado comatoso, Jair Bolsonaro concede a si mesmo ordem nacional do mérito científico

bolsonaro-marcos-pontes-divulgacao-planalto
Após decreto de própria lavra, Jair Bolsonaro tornou-se Grão-Mestre da Ordem Nacional do Mérito Científico, e Marcos Pontes, chanceler. Enquanto isso, a ciência brasileira continua em estado comatoso
Pode-se dizer o que for do presidente Jair Bolsonaro, mas não se pode negar que ele seja capaz de produzir momentos do mais puro e fino cinismo. É que poucas semanas após o Ministério da Fazenda ter dado uma tesourada praticamente letal na ciência brasileira com um corte de R$ 600 milhões no orçamento da CAPES e do CNPq, hoje (04/11) o Diário Oficial da União trouxe a publicação de um Decreto que concede a chamada “Ordem Nacional do Mérito Científico” a ele próprio, ao dublê de ministro e astronauta, Marcos Pontes, um seleto grupo de políticos, e, finalmente, a pesquisadores que supostamente possuem alto mérito na sua produção científica.
Um fato ainda mais saliente é que, pela ordem, os ocupantes de postos chaves no governo federal que receberão esta Ordem, são os seguintes: a) Grão-Mestre: JAIR MESSIAS BOLSONARO, Presidente da República; b) Chanceler: MARCOS CESAR PONTES, Ministro de Estado da Ciência, Tecnologia e Inovações; e os membros do Conselho da Ordem Nacional do Mérito Científico: CARLOS ALBERTO FRANCO FRANÇA, Ministro de Estado das Relações Exteriores; PAULO ROBERTO NUNES GUEDES, Ministro de Estado da Economia; e MILTON RIBEIRO, Ministro de Estado da Educação.
ordem
O que me deixa curioso nessa situação toda é o que farão com suas medalhas os pesquisadores, alguns de inegável contribuição para o desenvolvimento da ciência brasileira, durante a cerimônia de entrega desta ordem. Vão lá aproveitar o rega-bofe que certamente será oferecido após a entrega de medalhas para se congraçar alegremente com Jair Bolsonaro, Marcos Pontes, Paulo Guedes e Milton Ribeiro, como não se fossem esses senhores responsáveis pela condição comatosa em que a ciência brasileira se encontra neste momento (situação comatosa em condição de agravamento, gostaria de frisar)?
Não sei por quê, mas desconfio que nesta cerimônia que será presidida pelo “Grão Mestre” Jair Bolsonaro não teremos um momento a la Marlon Brando, quando o ator estadunidense em uma cerimônia de entrega de um Oscar por sua atuação em “O Poderoso Chefão”, enviou uma ativista apache, Sacheen Littlefeather, para recusar o prêmio entregue a ele como forma protestar pela forma como os povos originários dos EUA eram retratados em Hollywood.
O problema, como já disse um dia Simone Beauvoir, o opressor não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os próprios oprimidos. E sirvam-se as medalhas, enquanto a fila dos aeroportos continuam empurrando os cientistas brasileiros para o exílio.