Por Bernardo Galvão-Castro, Renato Sérgio Balão Cordeiro e Samuel Goldenberg*
Apesar da resistência dos cientistas brasileiros, a ciência no Brasil tem sido prejudicada por medidas implementadas pelo governo federal nos últimos 3 anos, como cortes crescentes no orçamento, ataques à autonomia das universidades e uma política geral de negação da ciência. Um recente corte de US$ 110 milhões no orçamento do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, além da retenção de US$ 490 milhões do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, não apenas representa um enorme impedimento para a realização de pesquisas em universidades e institutos de pesquisa, mas também prejudica o desenvolvimento científico futuro de um país.1
As consequências incluem uma fuga de cérebros de cientistas e desmoralização e descontentamento entre os pesquisadores científicos brasileiros. Além disso, os cientistas correm o risco de sanções indiretas se suas pesquisas contradizerem as posições sustentadas pelo governo Bolsonaro, como afirmar que a floresta amazônica não está queimando ou que a cloroquina ou a hidroxicloroquina podem ser usadas para tratar COVID-19 com segurança e eficácia.2
A recente demonstração de desrespeito aos cientistas foi um decreto federal, emitido em 5 de novembro de 2021, revogando o prêmio da Ordem Nacional do Mérito Científico concedido a dois cientistas, Adele Schwartz Benzaken e Marcus Vinicius Guimarães de Lacerda.
Em resposta a essa revogação, 200 ganhadores de prêmios anteriores escreveram uma carta expressando sua objeção, e 23 outros cientistas brasileiros atualmente indicados para este prêmio retiraram seus nomes em solidariedade a seus colegas injustamente desacreditados.3, 4
Esse ato também desencadeou uma reação imediata de várias sociedades acadêmicas e científicas brasileiras, incluindo a Academia Brasileira de Ciências e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). No início de 2020, pesquisa de Borba e colegas5 mostraram que doses mais elevadas de cloroquina não devem ser recomendadas para o tratamento de COVID-19 grave.
Benzaken era o ex-diretor do Departamento Brasileiro de DST / HIV-Aids e Hepatites Virais da Secretaria de Vigilância em Saúde (Ministério da Saúde), que foi demitido em janeiro de 2019.
Os ataques perpetrados pela atual administração federal não se limitam à ciência e aos cientistas e afetam a educação, a saúde pública, o meio ambiente e os programas culturais.6,7,8
Esperamos que o Brasil não continue a se pautar pela negação e evite a degradação da ciência.
Todos os autores são pesquisadores eméritos da Fundação Oswaldo Cruz. Declaramos não haver interesses conflitantes*.
Este texto foi escrito foi inicialmente em inglês e publicado pela revista “Lancet” [Aqui!].
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