Reciclagem ‘agrava problema dos microplásticos’

A Changing Markets Foundation revela que o poliéster reciclado gera 55% mais poluição por microplásticos.
Imagem do site da Patagonia. 
Por Brendan Montague para “The Ecologist”

Uma nova investigação revelou que a estratégia ambiental do setor da moda está agravando a poluição por microplásticos.

Mais de cem marcas afirmam que o poliéster reciclado proveniente de garrafas de plástico descartadas pode ajudar a reduzir a poluição e outros problemas ambientais. Adidas, H&M, Puma e Patagonia substituíram quase todo o poliéster virgem por poliéster reciclado em suas linhas de produção por motivos de sustentabilidade.

Mas uma nova pesquisa laboratorial , publicada hoje pela organização sem fins lucrativos Changing Markets Foundation , descobriu que o poliéster reciclado cria, em média, 55% mais partículas de poluição microplástica durante a lavagem do que o poliéster virgem, que é menos quebradiço. 

Organismos

Constatou-se também que as partículas eram quase 20% menores, o que as tornava mais capazes de se espalhar no ambiente e causar danos. 

Urska Trunk, gerente sênior de campanhas da Changing Markets Foundation, afirmou: “A indústria da moda vem vendendo poliéster reciclado como uma solução ecológica, mas nossas descobertas mostram que isso está agravando o problema da poluição por microplásticos. 

“Isso expõe o poliéster reciclado pelo que ele é: uma cortina de fumaça da sustentabilidade que encobre a crescente dependência da moda em relação aos materiais sintéticos.” 

“Ajustes de design mais inteligentes e correções pontuais apenas arranharão a superfície. Soluções reais significam desacelerar e eliminar gradualmente a produção de fibras sintéticas e interromper o desvio de garrafas plásticas para a fabricação de roupas descartáveis.”

Um único ciclo de lavagem pode liberar até 900.000 fibras de microplástico. Os microplásticos estão tão disseminados que são encontrados nos locais mais extremos e circulam em todos os ambientes: solo, ar, água e organismos vivos. Foram encontrados em diversos órgãos humanos e estão associados a um número crescente de problemas de saúde.

Vestuário

O poliéster reciclado é uma cortina de fumaça da sustentabilidade que encobre a crescente dependência da moda em relação aos materiais sintéticos. 

O estudo focou em um número relativamente pequeno de peças de roupa de cinco grandes marcas, e os resultados fornecem apenas uma indicação das prováveis ​​taxas de poluição. Camisetas, blusas, vestidos e shorts vendidos pela Adidas, H&M, Nike, Shein e Zara foram testados. 

O estudo é o primeiro a comparar marcas em relação à poluição por microplásticos, segundo a Changing Markets. As marcas estão entre as maiores produtoras e usuárias de tecidos sintéticos do mundo da moda, de acordo com uma pesquisa recente da Changing Markets . 

As roupas de poliéster da Nike foram consideradas as mais poluentes, tanto para tecido virgem quanto para tecido reciclado. O poliéster reciclado da marca liberou, em média, mais de 30.000 fibras por grama de amostra de roupa, quase quatro vezes a média da H&M e mais de sete vezes a média da Zara.

As roupas da Shein também se destacaram. Suas peças de poliéster reciclado liberam microplásticos em uma taxa semelhante à das roupas de poliéster virgem.

Superprodução

Mesmo antes das descobertas de hoje, ambientalistas já haviam concluído que a campanha da indústria da moda em prol do poliéster reciclado era, em grande parte, uma estratégia de marketing verde. 

Os sistemas de reciclagem de roupas de poliéster são considerados “ importantes ”, mas também “em desenvolvimento”, sendo capazes de processar apenas “cerca de dois por cento de todo o poliéster reciclado”. Em contrapartida, o setor de bebidas pode reutilizar repetidamente garrafas plásticas descartadas, mas agora precisa competir com as marcas de moda por elas. 

Entretanto, o uso de poliéster virgem na moda está crescendo tão rapidamente que a participação do poliéster reciclado no ano passado chegou a cair . O baixo custo dos tecidos sintéticos, agora produzidos em níveis recordes , impulsionou uma enorme superprodução, superconsumo e desperdício.

Um porta-voz da Puma disse: “Os resultados dos nossos testes de liberação de fibras em tecidos 100% poliéster reciclado e 100% poliéster virgem mostram que o poliéster reciclado não libera consistentemente mais ou menos microfibras do que o poliéster virgem.”

Um porta-voz da H&M disse ao The Ecologist : “Acreditamos que as microfibras precisam ser abordadas em várias etapas de nossa cadeia de valor, incluindo design, produção, uso e descarte, e é por isso que cooperamos com outras partes interessadas para encontrar soluções eficazes.”

O Ecologist entrou em contato com a Adidas e a Patagonia para obter um posicionamento.

Este autor

Brendan Montague é editor da revista The Ecologist.


Fonte: The Ecologist

Relatório revela que as taxas globais de reciclagem caíram pelo oitavo ano consecutivo

Pesquisadores pedem investimento em ‘soluções circulares’ à medida que o consumo cresce mais rápido do que o crescimento populacional

Um homem limpando um contêiner cercado por reciclagem de plástico

O aumento do uso de materiais reciclados na indústria foi superado pelo crescimento do uso de materiais virgens. Fotografia: Yves Herman/Reuters

Por Damien Gayle para o “The Guardian” 

As taxas globais de reciclagem não estão conseguindo acompanhar uma cultura focada no crescimento econômico infinito e no consumismo, com a proporção de materiais reciclados que retornam às cadeias de suprimentos caindo pelo oitavo ano consecutivo, de acordo com um novo relatório.

Apenas 6,9% das 106 bilhões de toneladas de materiais usados ​​anualmente pela economia global vieram de fontes recicladas, uma queda de 2,2 pontos percentuais desde 2015, descobriram pesquisadores do thinktank Circle Economy.

O problema é sistêmico, dizem eles: o aumento do consumo é ainda mais rápido do que o crescimento da população global e, embora algumas empresas estejam aumentando a quantidade de material reciclado que utilizam, a maioria ignora a questão sem consequências aparentes. Isso significa que as sociedades geram mais resíduos do que os sistemas de reciclagem conseguem processar.

Mesmo que todos os produtos recicláveis ​​fossem reciclados, o que é improvável, já que muitos produtos são simplesmente muito difíceis ou caros para reciclar, as taxas globais de reciclagem atingiriam apenas 25%, o que significa que o consumo deve ser reduzido para enfrentar a crescente crise global de resíduos.

Ivonne Bojoh, diretora executiva da Circle Economy, afirmou: “Nossa análise é clara: mesmo no mundo ideal, não podemos resolver a tripla crise planetária apenas com reciclagem. A mudança sistêmica tão necessária exige uma mudança fundamental.”

“Isso significa liberar o potencial circular em ações como edifícios e infraestrutura, gerenciar a biomassa de forma sustentável e parar de enviar materiais perfeitamente renováveis ​​para aterros sanitários.

Essa mudança não acontece fora de nós. Todos precisamos fazer escolhas diferentes, ser ousados ​​e investir para implementar soluções circulares em todas as cadeias de valor.

Como muitos consumidores podem atestar, os níveis de reciclagem têm aumentado nos últimos anos. De 2018 a 2021, o uso de materiais reciclados na indústria também aumentou em 200 milhões de toneladas, graças à conscientização crescente. Mas esse aumento foi superado pelo crescimento do uso de materiais virgens, descobriram os pesquisadores.

Eles citaram números que mostram que a extração global de matérias-primas mais que triplicou no último meio século, atingindo recentemente 100 bilhões de toneladas por ano — um número que deverá aumentar em mais 60% até 2060, a menos que medidas sejam tomadas.

O consumo global per capita cresceu de 8,4 toneladas em 1970 para 12,2 toneladas em 2020, mas esse aumento não foi distribuído uniformemente, com cidadãos de países de renda mais alta consumindo seis vezes mais do que aqueles de países de renda mais baixa — 24 toneladas em comparação com 4 toneladas.

Isso leva a uma desigualdade gritante, com a União Europeia e os EUA consumindo sozinhos mais da metade dos materiais do mundo, apesar de representarem apenas 10% da população mundial juntos.

O relatório defende o estabelecimento de metas globais de economia circular para reduzir o uso de materiais e a demanda de energia, além de aumentar as taxas de reciclagem. Também defende a criação de uma “Agência Internacional de Materiais”, nos moldes da Agência Internacional de Energia, para orientar os governos na mensuração e no monitoramento do uso sustentável de recursos e do progresso da economia circular.

“A mudança para uma economia circular não pode acontecer sem o ambiente político certo e ações governamentais que eliminem gradualmente práticas de desperdício e promovam e apoiem maneiras mais inteligentes de atender às necessidades das pessoas”, diz o relatório.


Fonte: The Guardian

Anunciando a Conferência internacional de educação transformadora para e com catadores e catadoras de materiais recicláveis

As ações realizadas diariamente de forma praticamente invisível e desassistida pelo Estado por milhares de catadores e catadoras oferecem uma forma de serviço extraordinariamente valiosa para a sociedade brasileira.  Entender esse processo de forma a valorizar e empoderar politicamente os trabalhadores que realizam essa atividade é fundamental, pois como vimos recentemente no decreto que autorizava a importação lixo (que terminou sendo revogado), só a ação organizada é capaz de impedir este tipo de retrocesso.

Eis que hoje me chegou a notícia de que ocorrerá na Câmara Municipal de São Paulo, nos dias 16 e 17 de maio, a Conferência internacional de educação transformadora para e com catadores e catadoras de materiais recicláveis que é produto de um longo processo de cooperação entre universidades canadenses e sul americanas, e ainda a organização não-governamental “Pimp my Carroça”.

O evento é voltado para catadores(as) de materiais recicláveis, movimentos Sociais, organizações
comunitárias, gestores públicos, comunidade acadêmica, e público em geral.

Para quem estiver interessado, a programação completa da conferência pode ser baixado [Aqui!].

Governo Lula libera importação de lixo e desfere golpe duro no movimento de catadores

Atlas aponta defasagem em dados brasileiros sobre reciclagem

Movimento de catadores faz trabalho hercúleo em prol da reciclagem de resíduos sólidos, sem o devido apoio de todas as esferas de governo no Brasil

O Brasil é um país que recicla em torno de 4% dos resíduos sólidos gerados pelo processo de produção, consumo e descarte de bens, um valor abaixo dos 19% da média global. Estes dados são da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente) a partir de dados do SNIS (Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento) para o ano de 2023.

Mas esse valor baixo não se dá por causa da ausência de um verdadeiro exército de trabalhadores que atuam para recolher, tratar e entregar para que sejam retornados às cadeias produtivas.  Em uma visita que realizei a uma cooperativa de catadores no município de São Leopoldo (RS), pude ver de perto como esse esforço é prejudicado pela ausência de políticas públicas que apoiem e fortaleçam esse segmento dos trabalhadores brasileiros.

Apesar disso, todos os dias, os catadores espalhados pelo Brasil realizam um trabalho hercúleo que tem baixo retorno econômico, e que muitas vezes é sabotado no plano local quando prefeituras firmam contratos com grandes empresas que optam por dificultar em vez de facilitar a organização de associações e cooperativas de catadores.  Um exemplo se dá aqui mesmo em Campos dos Goytacazes, onde em vez de apoiar e financiar o trabalho de coleta feito pelos catadores, a Prefeitura fez o caminho contrário.

Pois bem, como no Brasil, aquilo que está ruim sempre pode piorar, o governo Lula fez publicar na última terça-feira (22/04), o Decreto Nº 12.438, de 17 de abril de 2025 que, pasmemos todos, liberou a importação de diversos tipos de resíduos sólidos, sob a desculpa de facilitar a atividade industrial.

Em um toque irônico (ou seria sádico) , o artigo 2o. do Decreto Nº 12.438 afirma que “a indústria que utiliza resíduos como insumos industriais dará preferência aos resíduos existentes no mercado interno que beneficiem cooperativas, associações e outras formas de organização popular de catadoras e catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis, de modo a aprimorar os sistemas de logística reversa e a implementação da economia circular.

Ora bolas, se fosse intenção realmente apoiar a atividade de associações e cooperativas, o caminho correto seria aumentar o nível de financiamento a atuação delas, em vez de liberar a importação de lixo que, na prática, servirá como um incentivo negativo para o uso de material coletado dentro do país. O pior é que  temos exemplos passados de que o lixo trazido dos países centrais nem sempre se restringe ao que foi autorizado, visto que o grau de controle nos pontos de entrada nem sempre é o melhor.

Quem ganha com isso são os países centrais que estão com lixo soltando pelo ladrão e com dificuldades para encontrar um destino para todo o que é produzido pelas formas perdulárias de consumo que existem entre as camadas mais ricas da população.

Lixo eletrônico: a cara feia da tecnologia que assombra a América Latina

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O mundo está afogado em lixo eletrônico e o continente americano não é exceção. Só em 2022, gerará 14 bilhões de Kg. Crédito da imagem: Basel Action Network/Flickr , sob licença Creative Commons CC BY-ND 2.0 Deed.

Os aterros de resíduos eletrônicos representam um risco de contaminação não só para as pessoas que neles trabalham ou vivem perto deles, mas para todos os seres humanos e para o ambiente , porque geralmente contêm micropartículas potencialmente tóxicas ou cancerígenas, ou os chamados poluentes orgânicos persistentes (COP).

De acordo com o Global E-waste Monitor 2024 , em 2022 (última medição disponível), o mundo gerou 62 mil milhões de kg de lixo eletrônico, uma média de 7,8 kg per capita. Apenas 22,3 por cento (13,8 mil milhões de kg) do lixo eletrônico gerado foi documentado como devidamente recolhido e reciclado.

As Américas ocupam o terceiro lugar na geração desses resíduos no mundo: 14 bilhões de kg. E a América do Norte, região que mais exporta lixo eletrônico para o resto do continente, especialmente para a América Central, detalha o relatório.

Em 2019 (última medição), o número de resíduos eletrônicos enviados da América do Norte para a América Central e do Sul foi de 92.913 toneladas, afirma Kees Baldé, um de seus autores, em entrevista ao SciDev.Net.

Aponta que os Estados Unidos são o maior produtor desse lixo, com 7,2 bilhões de quilos, seguido pelo Brasil com 2.400 e em terceiro lugar o México com 1.500.

No entanto, apenas 3% do lixo eletrônico na América Latina é tratado de forma ecologicamente correta, segundo a ONU . O destino dos 97% restantes é desconhecido.

Uma das irregularidades encontradas pela equipe de Baldé foram contêineres que atravessam fronteiras como produtos eletrônicos de segunda mão.

Neles, superficialmente você pode ver dispositivos que continuam funcionando, porém, “quanto mais fundo você vai, mais lixo você encontra. Além disso, esses embarques ocorrem em grande escala e é muito difícil para a alfândega fiscalizá-los […] vira uma agulha no palheiro”, afirma Baldé.

A desmontagem de equipamentos eletrônicos requer equipamentos de proteção especiais, incluindo luvas de proteção, respiradores e espaços ventilados. Crédito da imagem: Cortesia de Ecoazteca para SciDev.Net

O relatório aponta ainda que estes movimentos de resíduos eletrônicos normalmente partem de países desenvolvidos com capacidades de gestão de resíduos perigosos, para nações com rendimentos médios ou baixos e com menor capacidade de reciclagem . Isto significa que muitas vezes é o sector informal o responsável pelo processamento destes resíduos.

Isto acontece, por exemplo, no bairro Renovación da prefeitura de Iztapalapa, na Cidade do México, onde existem muitos negócios informais que compram lixo eletrônico que é desmontado a céu aberto para extrair seus valiosos componentes.

“Eles ganham um pouco mais do que ganhariam se não tivessem esse emprego, mas aos poucos estão se matando fazendo isso”, diz Baldé.

Heberto Ferreira, engenheiro de sistemas computacionais do Instituto de Pesquisa de Ecossistemas e Sustentabilidade do México, alerta que, quando expostos às intempéries, “esses equipamentos geram lixiviados que eventualmente permeiam o lençol freático. E talvez em pouco tempo isso possa contaminar nossos corpos d’ água . E seria irreversível.”

Retardadores de chama bromados, ainda mais perigosos

Marcos Vieira Fagundes, gestor de resíduos eletrônicos em Vitória, capital do Espírito Santo, estado do sudeste do Brasil, afirma que mesmo no processo formal de gerenciamento de resíduos eletrônicos existe o perigo de contaminação, apesar de serem tomados cuidados, como o uso de equipamentos de proteção individual equipamento.

“Todas as etapas precisam de atenção, desde a separação de resíduos até a segregação de metais e plásticos rígidos”, disse ele ao SciDev.Net .

Mesmo tomando todos os cuidados, existe um risco latente de contaminação no manuseio de resíduos eletroeletrônicos. Crédito da imagem: Cortesia de Marcos Vieira Fagundes para SciDev.Net

Vieira Fagundes está muito preocupado com um composto tóxico em particular: os retardadores de chama bromados, dos quais o nosso continente emite anualmente 9 milhões de quilos na atmosfera, segundo o relatório Gobal E-Waste.

São misturas de produtos químicos artificiais que são adicionados a uma ampla gama de produtos para torná-los menos inflamáveis, por isso são amplamente utilizados em equipamentos elétricos ou eletrônicos. São muito resistentes à degradação e acumulam-se na cadeia alimentar. Além disso, representam um grave risco para a saúde dos trabalhadores que os recolhem e reciclam.

Além da União Europeia, os Estados Unidos e a China promulgaram regulamentos para restringir a produção e o uso destas substâncias.

O lixo eletrônico contém compostos tóxicos ou poluentes orgânicos persistentes, invisíveis aos olhos, mas potencialmente prejudiciais. No entanto, às vezes eles são deixados ao ar livre. Crédito da imagem: Victorgrigas/Wikimedia Commons , licenciado sob Creative Commons CC BY-SA 3.0 Deed .

Um estudo recente realizado em uma cooperativa de Sorocaba, São Paulo, Brasil, descobriu que as concentrações desse composto em peças eletrônicas ultrapassavam 1.000 miligramas por quilograma de resíduo, limite máximo estabelecido pela União Europeia no momento da análise [atualmente é 500 mg/quilo]. A medida europeia serviu de referência porque o Brasil não estabelece limites para essas substâncias em resíduos plásticos.

Nas 36 peças de computador analisadas, o valor médio da concentração foi de 2.240 mg/quilo. Em televisores de tubo [modelos mais antigos], 8.700 mg/quilo.

Fagundes lembra que muitos trabalhadores tiveram problemas de saúde . “Sempre acreditamos que alguns sintomas poderiam estar relacionados ao manejo dos catadores. Mas associamos a algum tipo de bactéria com a qual eles tiveram contato no lixo”, afirma.

Hugo Olivares Rubio, da Unidade Acadêmica de Processos Oceânicos e Costeiros do Instituto de Ciências Marinhas e Limnologia da Universidade Nacional Autônoma do México, acredita que é extremamente viável realizar testes toxicológicos utilizando linhagens celulares humanas, em nível bioquímico ou molecular , para determinar a presença desses retardadores na população e não apenas entre aqueles que estão diretamente expostos.

É autor de uma revisão bibliográfica sobre retardadores de chama bromados no México que constatou a presença desses compostos em costas, solos, aterros, lagoas costeiras e efluentes de estações de tratamento de águas residuais, bem como no sangue de habitantes de alguns estados. país, e até nos ovos do falcão aplomado e na pele do tubarão-baleia.

Embora admita que para conhecer a gravidade da contaminação por estes retardantes no seu país “é necessário fazer monitorização em vários locais e ambientes”, salienta que “há estudos que podem sugerir que a situação é grave em alguns locais .”

Espécime de tubarão-baleia nadando com outros peixes. Traços de retardadores de chama bromados foram encontrados na pele de alguns desses espécimes no México. Crédito da imagem: Schützenhofer Christoph/Wikimedia Commons , licenciado sob Creative Commons CC BY-SA 3.0 Deed .

“Esses compostos foram detectados em duas estações de tratamento de águas residuais em Chihuahua, em sedimentos marinhos na costa nordeste da Baixa Califórnia, e em diferentes solos na área metropolitana de Monterrey e San Luis Potosí, e em lixiviados e lodos de o aterro Bordo Poniente que fica na Região Metropolitana do Vale do México”, detalha.

E acrescenta: “a concentração destes contaminantes no sangue das crianças que vivem em Ciudad Juárez e Guadalajara foi tão elevada como nos registos mais elevados a nível mundial”.

Apesar disso, destaca que o panorama “é limitado e convida a investigação científica a continuar monitorizando estes contaminantes nos habitantes do México e em diversos ambientes”.

Legislação em sintonia com os tempos

André Henrique Rosa, professor do Departamento de Engenharia Ambiental da Universidade Estadual Paulista de Sorocaba, e um dos autores do estudo realizado naquela cidade, citado acima, diz ao SciDev.Net que “no Brasil falta um legislação adequada para regular e controlar “Esses contaminantes presentes no lixo eletrônico, para que saibamos se os materiais podem ser reciclados ou se devem ter outro destino, como a incineração”.

O Ministério do Meio Ambiente e Clima do Brasil preparou uma proposta de regulamentação para estabelecer limites para essas substâncias em eletrônicos, de acordo com os padrões internacionais. Fontes ministeriais informaram ao SciDev.Net que o respectivo documento foi enviado em março passado ao Grupo de Trabalho da Comissão Nacional de Segurança Química (Conasq), aguardando-se sua resposta.

No Peru, um dos países da região que possui legislação e regulamentação específica sobre resíduos eletrônicos, até o final de 2022 foram avaliadas mais de 14.700 toneladas desses componentes e havia 19 planos de gestão em nível nacional, que incluíam a coleta , estratégias de divulgação e sensibilização dos clientes e informação sobre os operadores com quem irão gerir os resíduos.

No entanto, todos os pedidos ao Ministério do Ambiente para obter números actualizados não foram respondidos, embora tenha sido comunicado oficiosamente que se tratava dos dados mais recentes disponíveis.

“Na Argentina, começamos a trabalhar na identificação de plásticos com retardadores de chama bromados, o que permitirá a rastreabilidade futura desses plásticos, evitando que acabem na reciclagem e sejam utilizados para fins que possam afetar a saúde das pessoas ou mesmo o meio ambiente quando são reciclados incorretamente”,  disse  María Candela Nassi, assessora da Subsecretaria de Meio Ambiente da Nação, ao SciDev.Net .

Ele acrescenta que os retardadores de chama bromados “devem ser geridos como resíduos perigosos”.

Salienta que embora nos últimos anos tenham sido apresentados diferentes projetos relativos a resíduos de equipamentos elétricos e eletrónicos (REEE), nenhum prosperou. No entanto, existem leis que os regulam, no âmbito dos chamados resíduos domésticos (plásticos e carcaças, entre outros) e resíduos perigosos (poluentes orgânicos persistentes ou POP).

Nassi, que também é Coordenador Nacional do Projeto regional de Resíduos Eletrônicos da América Latina (PREAL), do qual participam 13 países da América Latina e do Caribe [Ver infográfico nº 3], destaca que os próximos passos planejados são a criação de um programa nacional que considere as particularidades das diferentes jurisdições e permita um tratamento adequado e diferenciado.

Da mesma forma, avançar na gestão dos REEE do Estado Nacional, considerado um dos maiores geradores deste tipo de resíduo.

Esquema de gestão responsável de resíduos eletrônicos. Crédito: Fedaro/Wikimedia Commons , licenciado sob Creative Commons CC BY-SA 3.0 Deed .

O papel da ciência

Mas, para além da legislação adequada por país e a nível regional, a comunidade científica tem um papel a desempenhar.

Para o pesquisador e médico Hermano Albuquerque de Castro, vice-presidente de Meio Ambiente, Cuidado e Promoção da Saúde da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) do Brasil, a defesa dos interesses da indústria em detrimento da saúde humana deve ser sempre questionada, pois ocorreu no debate que envolveu ciência e sociedade e que levou à proibição do uso do amianto em seu país, no qual o pesquisador foi um dos principais expoentes.

“Não podemos continuar com esse modelo passageiro, que obedece aos interesses da indústria. Para que a tecnologia funcione, é necessário incorporar um conjunto de materiais tóxicos, que levarão séculos para desaparecer do meio ambiente. É por isso que é preciso haver limites e controle”, disse ele ao SciDev.Net .

André Henrique Rosa, concorda. “Os avanços tecnológicos são importantes, mas esses compostos devem ser usados ​​com moderação”, afirma.

“Acho preocupante que estes tipos de contaminantes não estejam recebendo a atenção que merecem, apesar dos seus efeitos tóxicos bem documentados”, diz o mexicano Olivares.

“É tarefa da atividade científica medir a concentração destes contaminantes, publicar os seus resultados e divulgá-los ao público em geral. Só assim se pode construir uma percepção de risco em toda a população”, acrescenta.


color compass

Fonte: SciDev.Net

O papel do desenvolvimento urbano sustentável na diminuição dos efeitos das mudanças climáticas

Para além da preservação de áreas verdes, a discussão sobre mudanças climáticas também deve abranger as metrópoles e a construção civil
jardim vertical
Segundo dados divulgados pela Associação Brasileira de Reciclagem de Resíduos (Abrecon), em 2022, a construção civil produziu no país cerca de 120 milhões de toneladas de entulho. Desse número, 70% dos resíduos foram descartados de forma inadequada, afetando diretamente a poluição do ar e da terra. À medida que o desenvolvimento urbano avança sem integrar práticas sustentáveis, os efeitos das mudanças climáticas não só colocam em risco as populações humanas, mas também comprometem a estrutura de cidades, exigindo a implementação de medidas de adaptação para lidar com eventos extremos.

Para a geógrafa, especialista em gestão ambiental e fundadora da Singular Ambiental, Susi Uhren, o desenvolvimento urbano sustentável é imprescindível. Isso porque o avanço da urbanização, somado às mudanças climáticas, interfere diretamente no clima das metrópoles. Embora também haja influência do aquecimento global, a impermeabilização do solo e altas taxas de emissões atmosféricas são determinantes para a promoção de ilhas de calor.

Esse fenômeno ocorre, sobretudo, em regiões metropolitanas. A especialista explica que

 “A urbanização pode alterar os padrões naturais de precipitação, resultando em maior escorrimento superficial, devido a impermeabilização do solo, e menor infiltração de água, isso pode levar a enchentes repentinas, erosão do solo, contaminação da água e destruição de habitats naturais, exacerbando os impactos das chuvas intensas e das tempestades”. 

De modo geral, a urbanização desempenha um papel significativo na amplificação dos efeitos das mudanças climáticas, criando condições que intensificam os efeitos negativos sobre o meio ambiente e sobre as próprias comunidades urbanas. De acordo com dados divulgados pela ONU, os espaços urbanos aglomeram cerca de 70% das emissões globais de dióxido de carbono e aproximadamente dois terços do consumo de energia. O dado chama atenção para a necessidade de cidades mais verdes e que utilizem, por exemplo, energia renovável, programas de gerenciamento de resíduos, reutilização da água e controle de poluentes. 

Ao implementar essas e outras práticas sustentáveis por meio de adaptações na infraestrutura, os municípios podem apresentar uma redução de cerca de 30% no consumo de energia e emissões de carbono. Essas ações contribuem no combate das mudanças climáticas, problema discutido mundialmente, e por consequência, na melhoria da qualidade de vida, o que reforça ainda mais a busca de empresas de construção civil por uma produção sustentável. A preservação de áreas verdes e a proteção de recursos hídricos são exemplos para possíveis reduções. 

Susi também aponta algumas adaptações em áreas urbanas que podem ser feitas a fim de minimizar os efeitos da emissão de carbono na urbanização, diminuir as temperaturas locais e melhorar a qualidade do ar:

  • Investir em telhados, paredes verdes e pavimentação permeável para a absorção da água da chuva, reduzir inundações e fornecer isolamento térmico;
  • Desenvolver sistemas de drenagem que possam lidar com as chuvas intensas e evitar inundações;
  • Implementar programas de reciclagem eficazes e reduzir o desperdício capazes diminuir a produção de resíduos e reduzir a necessidade por recursos naturais;
  • Criação de praças, jardins e áreas verdes;

Município catarinense lidera ranking de cidades médias em total de associações de catadores de recicláveis

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Chapecó tem 14 associações de catadores de recicláveis, como a Associação de Catadores de Materiais Recicláveis Nova Vida, na foto. Fonte: Fundação Auri Bondanese

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O município catarinense de Chapecó, localizado a cerca de 500 quilômetros da capital Florianópolis, lidera o ranking de cidades brasileiras, com população estimada entre 200 mil e 300 mil, em número de associações e de catadores de materiais recicláveis associados. São 14 associações de reciclagem e cerca de 121 associados, segundo destaca artigo científico de pesquisadores da Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó) publicado na sexta (29) na revista “Desenvolvimento e Meio Ambiente”.

O trabalho realizou um levantamento da quantidade de cooperativas e associações comunitárias de catadores de recicláveis de cidades, com população entre 200 e 300 mil habitantes, a partir de dados de 2020 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Anuário de Reciclagem. Ele faz parte da tese de doutorado de Rosane Villanova Borges apresentada à Unochapecó.

De 60 cidades, 53 têm entre zero e quatro associações. Chapecó lidera o ranking, com 14 associações, seguida de São Leopoldo (RS), com onze associações, Colombo (PR) e Passo Fundo (RS), com sete. A pesquisadora buscou entender quais condições fizeram com que Chapecó se destacasse no número de associações do tipo, a partir de entrevistas com os presidentes dessas entidades.

A análise destaca alguns fatores que podem explicar o crescimento de associações de catadores de materiais recicláveis na cidade catarinense. Em primeiro lugar, segundo o estudo, esse crescimento estaria ligado a políticas locais e remonta à história do fechamento do lixão, na década de 1990, que fez com que os catadores passassem a se dirigir ao recolhimento de materiais no centro de Chapecó. Por força de uma legislação municipal (Lei nº 4.898, de 2005), eles foram impedidos de circular com carroças de tração animal e carrinhos de tração humana, o que motivou uma mobilização da categoria para pressionar o poder público exigindo o direito de continuar trabalhando na atividade.

“Segundo relato de catadores, muitos passaram fome com essa proibição’’, diz Borges. Em acordo com a prefeitura, os catadores aceitaram se organizar em associações, em troca de receberem materiais de coleta seletiva. Em 2015, a cidade possuía seis associações de catadores cadastradas, entre elas, a Astrarosc – Associação dos Trabalhadores no Serviço de Reciclagem e Similares de Chapecó e Região Oeste de Santa Catarina, com seis núcleos, segundo dados do município. Após falência desta entidade, seus núcleos se constituíram em novas associações.

O apoio da prefeitura e da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares da Unochapecó foi outro fator que contribuiu para fortalecer as associações. “O apoio da prefeitura envolveu a doação de terrenos, de equipamentos, a manutenção de despesas, de água e energia elétrica, a construção de galpões para essas associações, entre outras iniciativas”, enumera Borges. Ele veio, especialmente, após a implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, em 2010, que prevê o gerenciamento integrado do lixo como responsabilidade da prefeitura — e incentiva a inclusão de catadores no processo de reciclagem.

Embora considere os avanços das associações de catadores, o artigo enfatiza os limites delas enquanto economia solidária. Apesar de garantirem renda e trabalho, essas entidades não garantem os direitos trabalhistas e condições de trabalho dignas aos associados. “Ainda temos um longo caminho a percorrer para o reconhecimento da profissão de catador, que no cenário da crise ambiental e climática, assume importância vital para nossa sobrevivência comum’’, finaliza a pesquisadora.


Fonte: Agência Bori

‘Eles mentiram’: fabricantes de plásticos enganaram o público sobre reciclagem, revela relatório

As empresas sabiam há décadas que a reciclagem não era viável, mas promoveram-na mesmo assim, conclui o estudo do Center for Climate Integrity

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O relatório diz que as grandes empresas podem ter infringido leis destinadas a proteger o público do marketing enganoso e da poluição. Fotografia: Clemens Bilan/EPA

Por Dharna Noor para o “The Guardian”

Os fabricantes de plástico sabem há mais de 30 anos que a reciclagem não é uma solução de gestão de resíduos de plástico economicamente ou tecnicamente viável. Isso não os impediu de promovê-lo, de acordo com um novo relatório.

“As empresas mentiram”, disse Richard Wiles, presidente do grupo de defesa da responsabilização dos combustíveis fósseis, o Centro para a Integridade Climática (CCI), que publicou o relatório. “É hora de responsabilizá-los pelos danos que causaram.”

O plástico, feito de petróleo e gás, é notoriamente difícil de reciclar. Fazer isso requer uma triagem meticulosa, uma vez que a maioria dos milhares de variedades quimicamente distintas de plástico não pode ser reciclada em conjunto. Isso torna um processo já caro ainda mais caro. Outro desafio: o material degrada-se cada vez que é reutilizado, o que significa que geralmente só pode ser reutilizado uma ou duas vezes.

A indústria sabe há décadas destes desafios existenciais, mas obscureceu essa informação nas suas campanhas de marketing, mostra o relatório .

A investigação baseia-se em investigações anteriores , bem como em documentos internos recentemente revelados que ilustram a extensão desta campanha de décadas.

Nas últimas décadas, os membros da indústria referiram-se à reciclagem de plástico como “antieconómica”, disseram que “não pode ser considerada uma solução permanente para resíduos sólidos” e que “não pode continuar indefinidamente”, mostram as revelações.

Os autores dizem que as evidências demonstram que as empresas petrolíferas e petroquímicas, bem como as suas associações comerciais, podem ter infringido leis destinadas a proteger o público do marketing enganoso e da poluição.

Plásticos descartáveis

Na década de 1950, os produtores de plástico tiveram uma ideia para garantir um mercado em constante crescimento para os seus produtos: a descartabilidade.

“Eles sabiam que se se concentrassem em [plásticos] de utilização única, as pessoas comprariam, comprariam e comprariam”, disse Davis Allen, investigador investigativo do CCI e principal autor do relatório.

Numa conferência industrial em 1956, a Sociedade da Indústria de Plásticos, um grupo comercial, disse aos produtores para se concentrarem em “baixo custo, grande volume” e “dispensabilidade” e para procurarem que os materiais acabem “no vagão do lixo”.

A Sociedade de Plásticos é agora conhecida como Associação da Indústria de Plásticos. “Como é típico, em vez de trabalharem juntos em busca de soluções reais para lidar com os resíduos plásticos, grupos como o CCI optam por lançar ataques políticos em vez de soluções construtivas”, disse Matt Seaholm, presidente e CEO do grupo comercial, em resposta por e-mail ao relatório. .

Nas décadas seguintes, a indústria disse ao público que os plásticos podem ser facilmente jogados em aterros sanitários ou queimados em incineradores de lixo. Mas na década de 1980, quando os municípios começaram a considerar a proibição de sacos de compras e outros produtos plásticos , a indústria começou a promover uma nova solução: a reciclagem.

Campanhas de reciclagem

A indústria sabe há muito tempo que a reciclagem de plásticos não é viável do ponto de vista económico ou prático, mostra o relatório. Um relatório interno de 1986 da associação comercial Vinyl Institute observou que “a reciclagem não pode ser considerada uma solução permanente de resíduos sólidos [para plásticos], pois apenas prolonga o tempo até que um item seja eliminado”.

Em 1989, o diretor fundador do Instituto do Vinil disse aos participantes de uma conferência comercial: “A reciclagem não pode continuar indefinidamente e não resolve o problema dos resíduos sólidos”.

Apesar deste conhecimento, a Sociedade da Indústria do Plástico criou a Fundação para a Reciclagem de Plásticos em 1984, reunindo empresas petroquímicas e engarrafadoras, e lançou uma campanha focada no compromisso do setor com a reciclagem.

Em 1988, o grupo comercial lançou as “flechas de perseguição” – o símbolo amplamente reconhecido do plástico reciclável – e começou a utilizá-lo nas embalagens. Os especialistas há muito dizem que o símbolo é altamente enganoso e, recentemente, os reguladores federais expressaram as suas preocupações.

A Sociedade da Indústria de Plásticos também estabeleceu um centro de pesquisa em reciclagem de plásticos na Universidade Rutgers, em Nova Jersey, em 1985, um ano depois que os legisladores estaduais aprovaram uma lei de reciclagem obrigatória. Em 1988, o grupo industrial Council for Solid Waste Solutions criou um projecto-piloto de reciclagem em St Paul, Minnesota, onde o conselho municipal acabara de votar pela proibição do plástico poliestireno, ou isopor.

E no início da década de 1990, outro grupo industrial publicou anúncios no Ladies’ Home Journal proclamando: “Uma garrafa pode voltar a ser uma garrafa, uma e outra vez”.

Ao mesmo tempo, a portas fechadas, os líderes da indústria sustentavam que a reciclagem não era uma solução real.

Em 1994, um representante da Eastman Chemical falou numa conferência da indústria sobre a necessidade de uma infra-estrutura adequada para a reciclagem de plástico. “Embora algum dia isso possa ser uma realidade”, disse ele, “é mais provável que acordemos e percebamos que não vamos reciclar para sair da questão dos resíduos sólidos”. Nesse mesmo ano, um funcionário da Exxon disse aos funcionários do Conselho Americano de Plásticos: “Estamos comprometidos com as atividades [de reciclagem de plásticos], mas não com os resultados”.

“É claramente uma fraude em que eles estão envolvidos”, disse Wiles.

O relatório não alega que as empresas violaram leis específicas. Mas Alyssa Johl, coautora e advogada do relatório, disse suspeitar que eles violaram as proteções contra incômodo público, extorsão e fraude ao consumidor.

A má conduta da indústria continua até hoje, alega o relatório. Ao longo dos últimos anos, grupos de pressão da indústria promoveram a chamada reciclagem química, que decompõe os polímeros plásticos em pequenas moléculas para produzir novos plásticos, combustíveis sintéticos e outros produtos. Mas o processo cria poluição e consome ainda mais energia do que a reciclagem tradicional de plástico.

O setor dos plásticos sabe há muito tempo que a reciclagem química também não é uma verdadeira solução para os resíduos plásticos, afirma o relatório. Numa reunião comercial em 1994, o vice-presidente da Exxon Chemical, Irwin Levowitz, chamou uma forma comum de reciclagem química de “processo fundamentalmente antieconómico”. E em 2003, um consultor comercial de longa data criticou a indústria por promover a reciclagem de produtos químicos, chamando-a de “mais um exemplo de como a não-ciência entrou nas mentes tanto da indústria como dos activistas ambientais”.

Seaholm, da Associação da Indústria de Plásticos, disse que o relatório “foi criado por uma organização ativista anti-reciclagem e desconsidera os incríveis investimentos em tecnologias de reciclagem feitos pela nossa indústria.

“Infelizmente, eles usam informações desatualizadas e alegações falsas para continuar a enganar o público sobre a reciclagem”, acrescentou. Ele não detalhou quais afirmações eram desatualizadas ou falsas.

O relatório surge num momento em que a indústria do plástico e a reciclagem enfrentam um crescente escrutínio público. Há dois anos, o procurador-geral da Califórnia, Rob Bonta, lançou publicamente uma investigação sobre os produtores de combustíveis fósseis e petroquímicos “pelo seu papel na causa e exacerbação da crise global de poluição por plásticos”.

Um descarrilamento de um comboio tóxico na Palestina Oriental, Ohio, em Fevereiro passado, também catalisou um movimento que exigia a proibição do cloreto de vinilo, um agente cancerígeno utilizado no fabrico de plástico. No mês passado, a EPA anunciou uma revisão da saúde do produto químico – o primeiro passo em direção a uma potencial proibição .

Em 2023, o estado de Nova Iorque também abriu um processo contra a PepsiCo, alegando que os seus plásticos descartáveis ​​violam as leis de perturbação pública e que a empresa enganou os consumidores sobre a eficácia da reciclagem.

O público também está cada vez mais preocupado com o impacto climático da produção e eliminação de plástico, que representa 3,4% de todas as emissões globais de gases com efeito de estufa. Nos últimos anos, duas dezenas de cidades e estados processaram a indústria petrolífera por encobrir os perigos da crise climática. Da mesma forma, levar as indústrias petrolífera e petroquímica a tribunal por “enganar conscientemente” o público, disse Wiles, poderia forçá-las a mudar os seus modelos de negócio.

“Acho que o primeiro passo para resolver o problema é responsabilizar as empresas”, disse ele.

Judith Enck, ex-administradora regional da Agência de Proteção Ambiental e fundadora do grupo de defesa Beyond Plastics, classificou a análise como “muito sólida”.

“O relatório deve ser lido por todos os procuradores-gerais do país e pela Comissão Federal de Comércio”, disse ela.

Brian Frosh, ex-procurador-geral do estado de Maryland, disse que o relatório inclui o tipo de evidência que ele normalmente não esperaria ver até que um processo já tenha passado por um processo de descoberta.

“Se eu fosse procurador-geral, com base no que li no relatório da CCI, sentir-me-ia confortável em pressionar por uma investigação e um processo judicial”, disse ele.


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Este texto escrito originalmente em inglês foi publicado pelo jornal “The Guardian” [Aqui!].

América Latina pede que os EUA reduzam as exportações de lixo plástico para a região

Estudo revela que as exportações para a região dobraram em 2020 com a previsão de crescimento da prática, já que os EUA investem em usinas de reciclagem

plastic trashDilúvio de lixo plástico’: os EUA são o maior poluidor de plástico do mundo

Por Joe Parkin Daniels para o “The Guardian”

Organizações ambientais em toda a América Latina pediram aos EUA que reduzissem as exportações de resíduos plásticos para a região, depois que um relatório descobriu que os EUA dobraram as exportações para alguns países da região durante os primeiros sete meses de 2020.

Os Estados Unidos são o maior exportador de lixo plástico do mundo , embora tenham reduzido drasticamente a quantidade total que exporta desde 2015, quando a China – anteriormente o maior importador – disse que “não queria mais ser o depósito de lixo do mundo” e começou a impor restrições. Em outras partes do mundo, as importações estão aumentando, e não menos na América Latina, com sua mão de obra barata e sua proximidade com os EUA.

Mais de 75% das importações da região chegam ao México, que recebeu mais de 32.650 toneladas (29.620 toneladas) de resíduos plásticos dos Estados Unidos entre janeiro e agosto de 2020. El Salvador ficou em segundo lugar, com 4.054 toneladas, e Equador em terceiro, com 3.665 toneladas, de acordo com pesquisa realizada pelo Last Beach Cleanup, um grupo de defesa do meio ambiente com sede na Califórnia.

Embora as importações de resíduos perigosos estejam sujeitas a tarifas e restrições, raramente são aplicadas e os resíduos de plástico destinados à reciclagem – que até janeiro deste ano não eram considerados perigosos pela legislação internacional – que entram nos países importadores podem muitas vezes acabar como aterros, segundo pesquisadores com a Global Alliance for Incinerator Alternatives (Gaia).

Um relatório da Gaia publicado em julho também previu um maior crescimento no setor de resíduos plásticos na América Latina devido a empresas nos EUA e na China investindo em fábricas e usinas de reciclagem em toda a região para processar as exportações de plástico dos EUA.

Alguns veem a prática como uma forma de colonialismo ambiental. “O comércio transfronteiriço de resíduos plásticos é talvez uma das expressões mais nefastas da comercialização de bens comuns e da ocupação colonial de territórios do sul geopolítico para transformá-los em zonas de sacrifício”, disse Fernanda Solíz, diretora da área de saúde do Universidade Simón Bolívar do Equador .

“A América Latina e o Caribe não ficam atrás dos Estados Unidos”, disse Soliz. “Somos territórios soberanos e exigimos o respeito pelos direitos da natureza e dos nossos povos”.

A maioria dos países do mundo concordou em maio de 2019 em conter o fluxo de lixo plástico das nações desenvolvidas do norte global para os mais pobres do sul global. Conhecido como a emenda dos plásticos à Convenção da Basiléia, o acordo proibia a exportação de resíduos plásticos de entidades privadas nos Estados Unidos para países em desenvolvimento sem a permissão dos governos locais.

Mas, criticamente, os Estados Unidos não ratificaram o acordo e foram acusados ​​de continuar a canalizar seus resíduos para países ao redor do mundo, incluindo na África, sudeste da Ásia e América Latina.

“Os governos regionais falham em dois aspectos: o primeiro é a fiscalização na alfândega porque não sabemos realmente o que entra no país sob o pretexto da reciclagem, e também falham em seus compromissos com acordos internacionais como a convenção de Basileia.” disse Camila Aguilera, porta-voz de Gaia. “E aqui é importante ver o que vem sob os tipos de reciclagem, porque a reciclagem é vista como uma coisa boa.”

“Os países do norte global veem a reciclagem como algo para se orgulhar, esquecendo-se de redesenhar os produtos e reduzir o desperdício”, disse Aguilera. “É muito difícil para os governos tratar o plástico como lixo tóxico, mas é isso o que é.”

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Este texto foi escrito originalmente em inglês e publicado pelo jornal “The Guardian” [Aqui!].

Plataforma Videocamp e Deusdará Filmes disponibilizam o documentário “Descarte” no dia 11 de março

Com criação e direção de Leonardo Brant, filme aborda a reciclagem por meio da reutilização de recursos em forma de design, inovação e arte

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Segundo dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento do Governo Federal (SNIS), em 2019, foram coletados 65,11 milhões de toneladas de resíduos no Brasil, sendo que somente 1,6% de resíduos recicláveis secos foram recuperados. Para mostrar que existem ações que podem fazer a diferença, transformando muitos dos recursos descartados em obras de arte, o Videocamp, em parceria com a Deusdará Filmes, disponibiliza, a partir do dia 11 de março, o documentário ” Descarte ” para ser assistido como, onde e quando quiser, durante os próximos três meses.

Criado e dirigido por Leonardo Brant, “Descarte” retrata histórias inspiradoras de artistas, designer e artesãos, de diferentes partes do país, que transformam materiais recicláveis com inovação e sensibilidade. O filme tem como pano de fundo o drama social do lixo no Brasil e traz ao centro da discussão os 10 anos da Política Nacional de Resíduos Sólidos (lei 12.305/10), que organiza a forma com que o Brasil lida com o lixo, exigindo dos setores públicos e privados transparência no gerenciamento de seus resíduos.

O documentário, que é baseado em histórias reais, é uma forma de conscientizar o público sobre a cultura da reciclagem, através de uma narrativa didática, retratando novas possibilidades de destino para tudo o que é consumido. Por meio de entrevistas com especialistas, ativistas e gestores de resíduos, o diretor busca refletir sobre a relação do lixo com as cidades, os lixões e os catadores.

“Como a Deusdará Filmes é uma produtora de documentários de impacto, o Videocamp é um parceiro fundamental para atingirmos os nossos objetivos, levando conteúdos inovadores a um público engajado, que luta por melhores condições de vida para as pessoas e o planeta. Nosso objetivo é pautar a questão dos resíduos sólidos a partir da ação de pessoas inspiradoras, ao mesmo tempo em que apresentamos a complexidade do assunto de maneira acessível”, conta Leonardo Brant, diretor associado da Deusdará Filmes.

No site do filme é possível encontrar conteúdos e ações gerados durante as filmagens, como uma temporada de um podcast para falar da pesquisa e do processo criativo do filme, debates virtuais com convidados e textos temáticos sobre os temas do documentário editados pelo jornalista Sérgio Rizzo. O filme está disponível no catálogo do Videocamp e na seção ” Assista Agora “, para assistir não é necessário o agendamento prévio, basta se cadastrar na plataforma.

Sobre o Videocamp

O Videocamp é uma plataforma online que reúne filmes com potencial de impacto que podem ser exibidos por qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo e de forma gratuita. A missão do Videocamp é criar caminhos para democratizar o acesso à cultura e à informação, que são direitos universais. Para os realizadores, a plataforma potencializa a formação de público e atua como ferramenta de promoção dentro da estratégia de lançamento do filme.