Ciência a serviço dos poderosos: associação de sojeiros do MT colheu amostras para estudo na Unicamp sobre agrotóxicos

Segundo processo disciplinar ainda em curso na universidade, Associação dos Produtores de Soja e Milho do Mato Grosso selecionou trabalhadores rurais, indicou laboratórios responsáveis pela coleta de amostras de urina de pessoas expostas a agrotóxicos e cuidou até do envio do material à Unicamp

Por Hélen Freitas/ Edição de Juliano Barros para a “Repórter Brasil” 

Um processo disciplinar aberto para investigar a conduta de um professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) revela como uma importante entidade do agronegócio do Mato Grosso, principal polo produtor de grãos do país, atuou na realização de estudos científicos sobre os impactos causados pelo próprio setor. 

Documentos obtidos com exclusividade pela Repórter Brasil detalham como a Aprosoja-MT (Associação dos Produtores de Soja e Milho) participou diretamente de etapas cruciais de pesquisas sobre a exposição de trabalhadores rurais a dois agrotóxicos bastante populares: o glifosato e o paraquate.

Os estudos foram iniciados em 2016, quando a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) reavaliava a venda no mercado brasileiro dos dois herbicidas, amplamente usados no controle de plantas daninhas em lavouras. Na época, ambos figuravam entre os dez agrotóxicos mais utilizados no país.  

Além de financiar o projeto, a Aprosoja-MT acompanhou de perto todas as etapas das pesquisas. Depoimentos e documentos consultados pela reportagem revelam como a associação selecionou trabalhadores rurais para o estudo, indicou laboratórios responsáveis pela coleta de amostras de urina em campo e cuidou até da logística para envio do material à Unicamp.

Em 2019, a Anvisa decidiu manter o glifosato em circulação, mas impôs mudanças na rotulagem e na classificação toxicológica, além de exigir novas medidas de segurança para o manuseio do herbicida.

Um ano antes, a Iarc (Agência Internacional de Pesquisa em Câncer), órgão da Organização Mundial da Saúde, já havia classificado o glifosato como “provavelmente cancerígeno” para humanos. A substância também é associada ao desenvolvimento de doenças como depressão, Alzheimer e Parkinson.

Já o paraquate teve destino diferente. Em 2017, a Anvisa deu início ao processo de banimento do herbicida devido a riscos à saúde, incluindo possível relação com doenças neurodegenerativas, como o Parkinson. A decisão previa um período de transição, em que o agrotóxico ainda poderia ser utilizado, até a proibição definitiva a partir de 22 de setembro de 2020. Desde então, o registro do paraquate está cancelado no Brasil.

Foi durante o período de transição que associações do agronegócio organizaram uma força-tarefa para tentar reverter a decisão da Anvisa, argumentando que novas pesquisas poderiam comprovar a segurança do paraquate.

O principal estudo utilizado para embasar esse movimento era justamente o conduzido na Unicamp. No entanto, após denúncia da Repórter Brasilsobre conflito de interesses, a pesquisa foi suspensa pelo Comitê de Ética da universidade, em julho de 2020.

Cinco anos depois, a Repórter Brasil enfim teve acesso aos documentos do processo disciplinar, ainda em curso na universidade, sobre a conduta do professor Paulo César Pires Rosa. Atual coordenador da graduação em Farmácia, ele participou das pesquisas orientando uma aluna sobre os impactos do glifosato e do paraquate na saúde de trabalhadores rurais. 

Os arquivos revelam também como a Aprosoja-MT atuou de cabo a rabo nos estudos, encomendados na tentativa de manter a comercialização dos agrotóxicos no país. Uma das principais representantes do agro nacional, a entidade já foi dirigida por produtores investigados por envolvimento com os atos golpistas de 08 de janeiro de 2023

Procurada, a assessoria de imprensa da Aprosoja-MT não se posicionou até o fechamento desta reportagem.

Antônio Galvan (à esq.), ex-presidente da Aprosoja-MT, foi investigado por envolvimento na tentativa de golpe em 8 janeiro de 2023 (Foto: Divulgação/Aprosoja)

Unicamp analisa se atuação de professor em instituto de pesquisa foi irregular

A rigor, o processo disciplinar tem como objetivo avaliar se o professor Paulo César Pires Rosa teria quebrado seu contrato de dedicação exclusiva à Unicamp, ao prestar serviços ao Inpes (Instituto de Pesquisas e Educação em Saúde), entidade criada por um docente aposentado da universidade. O Inpes foi o responsável por angariar os recursos para o estudo sobre a presença de paraquate no organismo de trabalhadores rurais do Mato Grosso.       

Em 2023, após três anos de investigação, uma comissão da Unicamp concluiu que Rosa teria atuado sem autorização como diretor científico do Inpes, entre 2018 e 2020. Além de uma suspensão de 15 dias, o parecer do órgão recomendou a devolução aos cofres da universidade de parte do salário recebido pelo docente no período. Segundo cálculos feito pela reportagem, o valor pode chegar a R$ 200 mil.

Ainda de acordo com o relatório da comissão, a Faculdade de Ciências Farmacêuticas recebeu uma proposta de convênio para realização dos estudos, com financiamento da Aprosoja-MT e intermediação do Inpes. O projeto chegou a ser aprovado pela Comissão de Pesquisa e Extensão, mas acabou vetado pela Comissão de Governança. Por essa razão, nunca foi efetivamente formalizado. Mesmo assim, a pesquisa seguiu em frente, até ser barrada em julho de 2020, após matéria da Repórter Brasil.

Durante a apuração, Rosa também foi investigado por uma possível utilização indevida da infraestrutura da universidade para as pesquisas sobre os agrotóxicos. A comissão, no entanto, concluiu que não havia provas de uso irregular dos laboratórios, nem de pagamentos diretos da Aprosoja-MT ao professor.

As amostras de urina coletadas dos trabalhadores rurais do Mato Grosso permanecem lacradas e armazenadas nas dependências da universidade, de acordo com a assessoria de imprensa da Unicamp. “Não há nenhuma possibilidade de retomada da pesquisa”, informou por telefone um coordenador de comunicação da universidade.

Atualmente, o caso está sob análise do Conselho Universitário, instância máxima da instituição. Durante reunião do órgão realizada em abril deste ano e disponível no Youtube, Fernanda Silvado, procuradora-chefe da Unicamp, disse haver “um claro conflito de interesses na pesquisa”. Em sua avaliação, a Aprosoja-MT era “financiadora e interessada na pesquisa, e ela também escolhia os trabalhadores, os laboratórios que faziam as análises clínicas das amostras”. 

Ao longo do processo disciplinar, Rosa sempre negou quaisquer irregularidades. Por Whatsapp, o professor afirmou à reportagem que não era o responsável pelos estudos, embora tenha atuado para captar com entidades públicas de fomento à pesquisa cerca de R$ 67 mil em bolsas de mestrado e doutorado, dentre outros recursos, segundo relatório de atividades encaminhado por ele próprio à universidade. 

“As pesquisas não foram sobre [sic] minha coordenação, era do prof Ângelo”, informou Rosa na troca de mensagens por Whatsapp, em referência a Ângelo Trapé, médico, ex-professor da Unicamp e fundador do Inpes — o instituto responsável pela intermediação da pesquisa sobre o paraquate, em 2018.  

Pesquisa com trabalhadores rurais que aplicam paraquate na soja foi suspensa pela Unicamp após revelações de conflito de interesse (Foto: Pedro Biondi/Repórter Brasil)

Procurada, a assessoria de imprensa da reitoria da Unicamp afirmou que “o ex-professor Ângelo Trapé se aposentou em 2017 e, desde então, não possui vínculo formal com a universidade”. Trapé não respondeu ao pedido de entrevista.   

Rosa inicialmente respondeu à reportagem por Whatsapp, mas depois preferiu não conceder entrevistaSeus advogados, no entanto, enviaram uma nota. 

“Como o processo disciplinar ainda está em andamento, entendemos que não é o momento adequado para manifestação em matéria jornalística, a fim de não comprometer a imparcialidade dos julgadores e publicizar uma situação que está sendo devidamente apurada pelos órgãos competentes, a Universidade”, diz o texto. 
Os advogados ainda afirmaram que vão solicitar apuração pelos órgãos competentes sobre os documentos obtidos pela Repórter Brasil. “Entendemos que houve o vazamento de informações que são consideradas sigilosas, e protegidas pela Lei Geral de Proteção de Dados”, prossegue o texto. Leia a resposta na íntegra.

Aprosoja-MT escolheu laboratórios; amostras já haviam sido coletadas

Em um dos depoimentos que aparecem nos autos do processo acessado pela reportagem, uma estudante de doutorado, orientanda do professor Rosa, afirma que os trabalhadores rurais participantes da pesquisa teriam sido selecionados pela Aprosoja e pelo Inpes. 

“Quando a depoente e o indiciado [Rosa] chegaram ao Mato Grosso, os laboratórios já estavam definidos e já havia amostras coletadas previamente”, diz um trecho do relatório final da comissão responsável pela apuração do caso.

Durante audiência no Comitê de Ética da Unicamp, Ângelo Trapé confirmou que a escolha dos trabalhadores partiu, de fato, da Aprosoja-MT. Segundo o fundador do Inpes, a associação dos produtores rurais também indicou fazendas e participou diretamente do recrutamento dos participantes. 

“No projeto submetido ao CEP [Comitê de Ética em Pesquisa] da Pós-Graduação constava que seria o indiciado e a aluna quem selecionariam os participantes, mas que, posteriormente, constatou-se uma participação da Aprosoja nessa seleção”, diz um trecho da ata do depoimento de Trapé. Ele também relatou que o envio das análises à Unicamp foi feito pela própria associação. A conclusão do comitê foi a de que as práticas configuravam “conflito de interesses”.

Os autos do processo disciplinar também trazem a defesa de Rosa. “Embora a Aprosoja tenha participado da escolha dos trabalhadores e laboratórios envolvidos nos estudos, não houve sequer uma ingerência sobre o trabalho realizado, e isso não restou comprovado nos autos deste procedimento”, afirmou o professor em recurso apresentado à universidade.

Estudo aponta o glifosato, agrotóxico mais vendido no Brasil, como uma das substâncias mais frequentemente associadas a abortos espontâneos (Foto: Vitor Dutra Kaosnoff/Pixabay)
Autos do processo disciplinar revelam que os trabalhadores rurais participantes da pesquisa teriam sido selecionados pela Aprosoja e pelo Inpes (Foto: Vitor Dutra Kaosnoff/Pixabay)

Segundo Rosa, os trabalhadores teriam sido indicados com base em critérios técnicos, como o contato efetivo com o herbicida paraquate. Já os laboratórios teriam sido selecionados levando em conta os locais onde as coletas foram realizadas.

Em fevereiro de 2018, no mestrado sobre impactos do glifosato defendido por uma aluna do professor Rosa, a estudante demonstra gratidão não só a seu orientador, mas também ao fundador do Inpes e à própria entidade do agronegócio. 

“Agradeço à Associação dos Produtores Rurais de Soja e Milho (Aprosoja) do estado do Mato Grosso, pela parceria, apoio financeiro e contribuição na seleção e na realização das coletas das amostras dos voluntários incluídos neste estudo”, escreveu.

Em agosto de 2018, Rosa detalhou em um evento da Aprosoja como se deu a participação da associação dos produtores. “A Aprosoja arcou com os custos de reagentes e materiais para analisar essas amostras. E o sindicato rural indicou os trabalhadores, segundo os nossos critérios de inclusão e exclusão”, relatou o professor. 

Na época, o processo de reavaliação do glifosato pela Anvisa estava na reta final. Uma decisão judicial chegou a suspender o registro de produtos à base da substância no país. Dois meses depois, a medida foi derrubada e o uso do herbicida voltou a ser permitido.

Em nota, a Anvisa nega que pesquisas financiadas pela entidade ruralista tenham influenciado no resultado do processo. “Nenhum resultado de reavaliação de ingredientes ativos de agrotóxicos pode ser atribuído a um único estudo ou uma única fonte de dados. Trata-se de uma análise complexa e sistematizada”, afirma o texto. Leia a resposta completa.


Fonte: Repórter Brasil

Estudo traça perfil dos poluentes encontrados em uma das principais bacias hidrográficas de São Paulo

50062O rio Camanducaia é um dos que formam a bacia PCJ (foto: Cassiana Carolina Montagner/Unicamp)

Por José Tadeu Arantes | Agência FAPESP

 A bacia hidrográfica dos rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí – também chamada de “bacia PCJ” – estende-se por 76 municípios do Estado de São Paulo e atende a mais de 5,8 milhões de pessoas. Com uma área de drenagem superior a 14 mil quilômetros quadrados, suas águas são muito demandadas pela agricultura, pela indústria e pelo consumo da população. Em função disso, e no contexto da crise climática global, a bacia sofre atualmente com escassez hídrica. Mas esse não é o único nem o maior dos problemas: o grande conjunto de rios, riachos e córregos que compõem a bacia encontra-se também fortemente contaminado por efluentes agrícolas, industriais e domésticos.

As expressões visíveis dessa poluição já foram objeto de várias reportagens da mídia. Mas faltava um estudo em profundidade que identificasse as principais áreas contaminadas e a natureza dos contaminantes individuais e das misturas de contaminantes; que calculasse sua concentração, frequência e toxicidade; e que apontasse seus potenciais riscos para humanos e organismos aquáticos. Esse estudo foi feito agora por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e parceiros de outras instituições do país e do exterior.

O trabalho foi apoiado pela FAPESP por meio de três projetos (14/50951-421/12484-9 e 20/14988-1). Artigo relatando os resultados foi publicado no periódico Chemosphere.

“Além de contaminantes tradicionais, já bastante conhecidos e sujeitos à legislação, encontramos também contaminantes emergentes, ainda não legislados, que apresentam toxicidade em condições de exposição crônica. Nossa pesquisa forneceu o primeiro retrato da ocorrência de compostos do grupo dos PFAS em rios do Estado de São Paulo”, diz Cassiana Carolina Montagner, professora do Instituto de Química da Unicamp e coordenadora do estudo.

Os PFAS são um grupo com milhares de compostos químicos sintéticos, perfluoroalquilados, utilizados pela indústria em uma grande variedade de produtos com o objetivo de torná-los antiaderentes, impermeáveis e resistentes a manchas. A utilização mais conhecida ocorre nos utensílios antiaderentes recobertos por teflon.

Informe da United States Environmental Protection Agency (Usepa, a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos) lista vários problemas de saúde humana comprovadamente associados à exposição a PFAS. Entre eles, o aumento do risco de alguns tipos de câncer, incluindo de rim, próstata e testículo. “A ocorrência de sete PFAS em diferentes rios do Estado de São Paulo foi relatada pela primeira vez em nosso estudo”, afirma Montagner.

Mas isso não é tudo. “Detectamos também muitos outros contaminantes, compondo um total de 45. Os agrotóxicos atrazina, carbendazim, tebutiurom e 2,4-D foram os que apresentaram a maior frequência de detecção, tendo sido encontrados em 100% das amostras coletadas. A mesma frequência, de 100%, foi detectada também para a cafeína e o bisfenol A [BPA], levados aos rios pelos esgotos domésticos”, acrescenta a pesquisadora.

Aqui é importante dizer que, embora bem tolerada pelos humanos, a cafeína pode ser bastante prejudicial para a biota aquática, como ressalta Montagner. Já o bisfenol A é uma substância química orgânica, o 2,2-bis(4-hidroxifenil) propano, utilizada na fabricação de polímeros e revestimentos de alto desempenho. Plásticos empregados em eletrodomésticos, computadores, brinquedos, talheres descartáveis, mamadeiras, revestimentos de latas de comida e bebida e resinas epóxi contêm BPA. Ele aparece também como componente do PVC maleável em papéis térmicos, como os extratos bancários e os comprovantes de pagamento liberados por caixas eletrônicos e máquinas para leitura de cartões.

Para avaliar a dimensão dos impactos causados por todos esses contaminantes, é preciso considerar que a região servida pela bacia PCJ é um importante polo agrícola e industrial e também a sede de cidades de grande porte. A área responde por 5,3% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Destaques são a produção de cana-de-açúcar no município de Piracicaba, a indústria têxtil no município de Americana e a grande concentração populacional no município de Campinas.

“Além de ser a principal fonte de água potável de toda a área, a bacia do PCJ fornece água para irrigação, que não recebe nenhum tratamento antes de ser utilizada nos campos agrícolas. Ao mesmo tempo, a região abriga muitas cidades pequenas que lançam esgoto quase in natura nos rios”, informa Montagner.

A pesquisadora enfatiza que contaminantes emergentes, como pesticidas, hormônios, produtos farmacêuticos, produtos químicos industriais e PFAS, estão sendo liberados na bacia do PCJ, sem que a atual legislação brasileira exija o seu monitoramento.

“Em nosso estudo, coletamos amostras em 15 pontos diferentes da bacia. E avaliamos os contaminantes presentes considerando três fatores: concentração, frequência e toxicidade. Além das altas frequências já mencionadas, obtivemos elevados quocientes de risco para os herbicidas diuron e atrazina, além do inseticida imidacloprido”, conta.

E conclui: “Além de velhos problemas de poluição não resolvidos, como a contaminação por coliformes fecais, por exemplo, há novos problemas agora causados pela presença dos contaminantes emergentes, que são produzidos para garantir a qualidade de vida moderna, mas chegam ao ambiente devido à má gestão dos resíduos sólidos e saneamento ineficiente. Nosso estudo sugere que é necessário estabelecer um programa de monitoramento abrangente para garantir a proteção da vida aquática e da saúde humana”.

Monitoramento

Procurada pela reportagem, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) informou em nota que, atualmente, são feitas medições trimestrais em 519 pontos de amostragem, dos quais 91 estão distribuídos na bacia PCJ. Além de parâmetros tradicionais, como matéria orgânica, nutrientes, coliformes e metais, a Cetesb faz medições de agrotóxicos e de alguns compostos emergentes, quantificados indiretamente por meio de dois ensaios: um que mede atividade estrogênica, para a detecção de compostos do tipo interferentes endócrinos (que mimetizam os hormônios femininos, como o BPA); e outro que mensura a atividade de glicorticoides, para a detecção de medicamentos da classe dos anti-inflamatórios.

O texto afirma ainda que os agrotóxicos (42 diferentes ativos) são medidos pela Cetesb desde 2017, em trechos de rios localizados em bacias com uso do solo predominantemente agrícola.

“Na bacia hidrográfica do PCJ, os agrotóxicos são monitorados desde 2018 no trecho de cabeceira do rio Corumbataí […], município de Analândia, com cerca de 65% da área da bacia destinada ao uso agrícola. Os agrotóxicos mais frequentemente detectados nesse trecho do rio Corumbataí no período de 2018 a 2022 foram o inseticida imidacloprida [bastante frequente também nas amostras analisadas na Unicamp] e o herbicida tebutiurom [este encontrado em 100% das amostras do estudo]. As concentrações de imidacloprida estiveram frequentemente acima do limite de ecotoxicidade crônico para invertebrados aquáticos da Usepa [Office of Pesticides Program, OPP], que é de 10 ng/L [nanograma por litro]. Nesse mesmo período, não foram detectados nesse trecho os agrotóxicos 2,4 D e atrazina [ambos detectados em 100% das amostras analisadas na Unicamp], que são contemplados com padrões de qualidade para a proteção da vida aquática pela Resolução Federal [Resolução Conama n.o357/2005].”

Por último, a Cetesb informa que não há valores legislados para a atividade estrogênica e os glicocorticoides. “Os resultados desses dois ensaios, obtidos ao longo dos últimos cinco anos na bacia hidrográfica do PCJ, indicaram valores, em ambos os ensaios, considerados baixos ou de baixa relevância, com base nos estudos já realizados e na experiência internacional.”

O artigo Uncovering the impact of agricultural activities and urbanization on rivers from the Piracicaba, Capivari, and Jundiaí basin in São Paulo, Brazil: A survey of pesticides, hormones, pharmaceuticals, industrial chemicals, and PFAS pode ser acessado em: www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0045653523022233?via%3Dihub.


color compass

Este estudo foi originalmente publicado pela Agência Fapesp [Aqui!].

Agrotóxicos são detectados em cera e mel de abelha em estudo da Unicamp

Mortandade de inseto despertou interesse de pesquisadora pelo tema 

abelha florAs abelhas são responsáveis pela polinização de 70% de todas as plantas do planeta

Por Liana Coll,  Fotos: Felipe Bezerra, Edição de imagem: Paulo Cavalheri | Alex Calixto

Desde o início dos anos 2000, mais de 1 bilhão de abelhas morreram no Brasil. As causas estão relacionadas à expansão das monoculturas, que utilizam massivamente os agrotóxicos. Os impactos da mortandade são preocupantes, pois esses insetos polinizam cerca de 70% de todas as plantas do planeta e, também, facilitam a produção agrícola, sendo até mesmo indispensáveis para alguns cultivos, como o de mamão. Tendo em vista a importância das abelhas para o equilíbrio do ecossistema, a química e pesquisadora Ana Paula de Souza, do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA) da Unicamp, analisou a presença dos agrotóxicos no mel e na cera, em sua tese de doutorado, defendida na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA).

Os produtos apícolas, segundo a pesquisadora, são bioindicadores da contaminação. Analisar diretamente as abelhas é difícil devido ao seu pequeno tamanho — elas pesam cerca de um décimo de grama.

Das 40 amostras de mel analisadas, seis apresentaram resíduos do herbicida glifosato acima do limite legal permitido. Nas ceras, foram detectados um ou mais agrotóxicos em 90% das amostras. O pior resultado nas ceras, diz Souza, está associado à reutilização deste produto. “As abelhas produzem a cera, que é, posteriormente, reciclada. De tempos em tempos, o apicultor a tira, monta o pente [parte da base da colmeia] e o coloca em novas colmeias. Se essa cera está contaminada, a contaminação vai progredindo ao longo dos anos e expondo as abelhas”, explica.

A pesquisa foi realizada com o mel e a cera das abelhas Apis mellifera L., conhecidas como abelhas africanizadas ou abelhas comuns. O orientador foi o professor da FEA Felix Reyes, com coorientação da coordenadora da Divisão de Química Analítica do CPQBA, Nadia Rodrigues.

A coordenadora da Divisão de Química Analítica do CPQBA e coorientadora da pesquisa, Nadia Rodrigues: falta de legislação específica apontando os limites toleráveis para os níveis de defensivos agrícolas nos alimentos infantis é preocupante

A coordenadora da Divisão de Química Analítica do CPQBA e coorientadora da pesquisa, Nadia Rodrigues: falta de legislação específica apontando os limites toleráveis para os níveis de defensivos agrícolas nos alimentos infantis é preocupante

O interesse pelo tema surgiu frente à preocupação com a morte massiva das abelhas no Brasil, fenômeno que também ocorre na Europa e nos Estados Unidos, bem como pela relevância desses insetos na polinização de plantações. “Tem havido a mortandade de abelhas, e elas têm um papel muito importante para a produção agrícola. Precisamos entender o que está acontecendo, porque normalmente é em decorrência dos casos de contaminação por agrotóxicos”, afirma Rodrigues.

A pesquisadora destaca também que o mel é um alimento saudável, bastante utilizado na alimentação de crianças e na composição de xaropes. Diante disso, determinar se há contaminação torna-se, ainda, mais importante. O fato de não haver uma legislação específica apontando os limites toleráveis para os níveis de defensivos agrícolas nos alimentos infantis, segundo Rodrigues, é preocupante. “Todo mundo acha [o mel] um alimento super saudável, natural. Então, surgiu daí a intenção de realmente saber se há ou não contaminação.”

Já no caso das ceras, as pesquisadoras destacam que elas são muito utilizadas na indústria de cosméticos, como em batons e cremes faciais.

Análise buscou 160 agrotóxicos

Para detectar os herbicidas e inseticidas, foram utilizadas duas técnicas analíticas, a cromatografia líquida e a cromatografia gasosa, que são métodos de separação de substâncias, associadas à espectrometria de massa, que detecta as moléculas a partir do peso da sua massa e por fluorescência. As análises ocorreram no CPQBA, no Laboratório de Toxicologia de Alimentos da FEA e no Laboratório Europeu de Referência em Frutas e Hortaliças, da Universidade de Almería, Espanha, onde Souza realizou um estágio doutoral, sob a supervisão do professor Amadeo Fernández-Alba.

O estudo buscou 160 agrotóxicos, entre os quais o glifosato, nas ceras e no mel. “O glifosato é o herbicida mais utilizado, e doses pequenas têm efeitos nos neurônios e no comportamento das abelhas, conforme já apontam alguns artigos. O produto, que foi encontrado no mel acima de limites aceitáveis para a comercialização, pode afetar a memória associativa, fazendo com que os insetos saiam da colmeia e não consigam voltar, o que acarreta sua morte”, observa.

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A autora da tese, Ana Paula de Souza: contaminação pode ocorrer por diversas vias

A contaminação, sugere Souza, pode ocorrer por diversas vias.“As abelhas provavelmente estão em campo e vão trazendo os agrotóxicos no corpo, nos pelinhos, que, dessa forma, vão sendo depositados nas colmeias. Também pode ocorrer a contaminação pelas correntes de vento ou pela água.” Esse processo tem como consequência a mortandade dos insetos e desequilíbrios no ecossistema, algo que tem sido documentado. Os prejuízos podem se estender também à produção de alimentos, dado o papel fundamental das abelhas na polinização.

Para evitar que os agrotóxicos permaneçam afetando a população de abelhas e a biodiversidade, a pesquisadora recomenda que as práticas agrícolas sejam submetidas a um controle mais adequado quanto ao uso desses produtos. Ela também se preocupa com a liberação, no mercado, de outros defensivos agrícolas, resultantes de novas combinações de substâncias. “Nos últimos anos, aumentaram muito as combinações e formulações novas, e não sabemos ainda bem quais serão as consequências.”

 


Este texto foi originalmente publicado pelo “Jornal da Unicamp” [Aqui!].

Evento online discute a desnaturalização dos desastres, com foco no caso de Petrópolis

Webinário acontece nesta quinta, dia 10/3, com transmissão aberta via YouTube

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Nesta quinta-feira, dia 10, às 18h30, será realizado o webinário “Desnaturalizando os Desastres: o caso de Petrópolis/RJ” . O objetivo é discutir a necessidade de desnaturalização dos desastres, com foco no caso recente ocorrido no município de Petrópolis (RJ), no último dia 15 de fevereiro, que fez mais de 230 vítimas e já está entre as maiores tragédias do País. De acordo com os organizadores, sob a perspectiva da desnaturalização de desastres, não há nada de “natural” nessas catástrofes – e isso se verifica pelo histórico desses eventos na cidade e seus nexos sócio-históricos. 

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Além da abertura às 18h30, estão previstas duas rodas de debates com pesquisadores, especialistas, ativistas da área e comunidade petropolitana. Confira a programação completa  (Aqui!). A transmissão aberta acontece pelo canal da plataforma AirCentre no YouTube (Aqui!). 

Na ocasião, será lançado o 45º volume da Revista Ciência & Trópico. A revista é resultado do “II Seminário de Desnaturalização de Desastres e Mobilização Comunitária: crises ampliadas, redes e resistências”. Em sua última edição, ocorrida de 4 a 8 de outubro de 2021, o seminário abordou temas ligados à desnaturalização de desastres sob diversas perspectivas – sempre com vistas à defesa da vida humana e da preservação ambiental – desde o aspecto da mídia, das mobilizações comunitárias, das questões de gênero e dos desafios da gestão. 

O webinário e a revista são uma iniciativa conjunta de pesquisadores da Fundação Oswaldo Cruz (RJ); do Núcleo de Estudos e Pesquisas Sociais em Desastres (NEPED) do Departamento de Ciências Ambientais (DCAm) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR); do Núcleo de Pesquisas e Estudos Socioambientais (NESA) da Universidade Federal Fluminense (UFF – Campos); da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); da Pós-Graduação em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social do Instituto de Psicologia – Programa EICOS, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); e da Fundação Joaquim Nabuco (FUNDAJ); e conta também com o apoio da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj). 

Mais informações podem ser acessadas neste documento: [Aqui!].

Delta exige intervalo mais curto entre doses de vacina, sugere estudo

delta vacinaFoto: JEFFERSON PEIXOTO / SECOM – SALVADOR

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Em regiões de prevalência da variante delta do novo coronavírus, o intervalo entre doses de vacina de Covid-19 precisa ser mais curto do que doze semanas para que se tenha um controle efetivo da pandemia. É o que sugere modelo matemático desenvolvido pelo Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria (CeMEAI) a partir de dados preliminares da eficácia da vacina para a variante delta. A ferramenta está descrita em artigo publicado na PNAS na quinta (18).

A tecnologia, criada pelo grupo ModCovid-19 com pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), da Fundação Getulio Vargas (FGV) e da Universidade de São Paulo (USP) projeta tempo seguro e ideal entre doses para controle da pandemia, a partir de dados de eficácia de vacinas. Ele mostra que vacinas com menos de 50% de eficácia na primeira dose precisam de um intervalo menor de aplicação do que vacinas com taxas de eficácia maiores. Alimentada com estudos prévios sobre eficácia dos imunizantes, a tecnologia indica quando é possível adiar as doses e quando se atinge o máximo possível de proteção.

“O próprio algoritmo decide quando é melhor aplicar a segunda dose, levando em conta a primeira, de maneira a controlar o mais rápido possível a pandemia”, explica Paulo José da Silva e Silva, co-autor do estudo. Por isso, a ferramenta, que está disponível on-line, pode ajudar nas tomadas de decisão durante o processo de imunização da população brasileira e de outros países.

Paulo lembra que quando o artigo foi escrito, em fevereiro desse ano, a principal pergunta era se valeria a pena adiar a segunda dose e qual a maneira mais segura de se fazer isso, em virtude da quantidade limitada de doses. Nesse sentido, o estudo teve como base a fabricante Astrazeneca e concluiu que o percentual de eficácia entre a primeira dose e segunda era muito pequeno e por isso, comprovadamente, valeria a pena esperar e vacinar mais gente com 1ª dose.

Agora, com o avanço da variante delta em algumas regiões do Brasil e do mundo, as estratégias de vacinação podem ser revistas a partir deste modelo.  “Se você está em um lugar onde ela é a variante prevalente, a eficácia da primeira dose, pelas primeiras estimativas que estão saindo agora, é muito menor do que era com a alfa, então muda a relação da eficácia entre primeira e segunda dose. Essas análises confirmam que a decisão é delicada e que tem que ser feita de maneira sistemática”, observa Paulo.

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Este texto foi originalmente publicado pela Agência Bori [Aqui!].

Leonid Schneider destrincha “escritório da integridade em pesquisa” proposto em campanha eleitoral na UNICAMP

“Criaremos na Unicamp um escritório permanente de integridade em pesquisa para proteger a sociedade e o pesquisador”, afirma Mario Saad

Mario “Fakenews” Saad está entrando em um segundo turno para se tornar reitor  da Unicamp. O homem responsável por grandes fraudes em pesquisas e 18 retratações faz o papel de vítima de uma “cultura do cancelamento”. Saad também anuncia a criação de um “Escritório de Integridade de Pesquisa”, para legalizar a má conduta e punir quem denunciar.

Por Leonid Schneider para o “For Better Science”

Mario Jose Abdalla Saad é um mentiroso controverso e tóxico, um infame falsificador de dados que poluiu a pesquisa do diabetes com dados falsos por décadas, e mesmo assim continua sendo professor da Universidade Estadual de Campinas em SP (Universidade Estadual de Campinas, UNICAMP). Ele foi desmascarado anos atrás por Paul S. Brookes e, no meio tempo, tem DEZOITO retratações. Saad e seus colegas brasileiros José CarvalheiraCláudio De Souza Lício Velloso conseguiram reciclar o mesmo western blot nada menos que 15 vezes (leia minhas reportagens anteriores aqui aqui). Saad tem quase 50 documentos sinalizados no Pubpeer, todos por manipulação ultrajante de dados.

Mas o professor Saad acredita que tudo não passa de fakenews e tenta agora se eleger reitor da UNICAMP. Ele ficou em segundo lugar no primeiro turno das eleições (porque a maioria da administração votou nele) e agora vai para o segundo turno.

Saad conseguiu republicar seus artigos retratados em outras revistas menos exigentes e foi recentemente barrado em pelo menos 12 investigações de má conduta de pesquisa por sua universidade ridiculamente corrupta. Ele agora se autorretrata como uma vítima da “Cultura de Cancelamento” e continua a tagarelar sobre “fakenews”.

A seguir está minha versão copiada (trocadilho intencional), ilustrada pelo PubPeer, de seu anúncio de 4 de janeiro de 2021 sobre criar um escritório para integridade de pesquisa na UNICAMP, uma espécie de ‘Ministério da Verdade Orwelliano’. Sua tarefa seria defender fraudadores de pesquisa como Saad, ao mesmo tempo em que reprime impiedosamente os denunciantes, como o anúncio admite abertamente.

Depois disso, cito um e-mail paranoico que Saad enviou para toda a universidade em 18 de março de 2021, em que afirma ser um futuro vencedor do Prêmio Nobel, mais uma vez defende a fraude de pesquisa e ataca seus críticos.

Image: Saad’s campaign page

“Criaremos na Unicamp um escritório permanente de integridade em pesquisa para proteger a sociedade e o pesquisador”, afirma Mario Saad

Por Mário e Zezzi 4 de janeiro de 2021

Com o objetivo de oferecer suporte e subsídio às políticas de integridade em pesquisa e de acesso aberto, aprovadas recentemente pelo Conselho Universitário da Unicamp, o pré-candidato à Reitoria da Unicamp, Mario Saad, afirma que a sua gestão poderá incrementar essas políticas, criando um escritório permanente para esse setor, com funções educativas e pedagógicas. “A criação das políticas é o primeiro passo nesse sentido, mas a iniciativa ainda é tímida”, afirma.

Same western blot reused 15 times for utterly different experiments

Saad, que anos atrás foi levianamente acusado por manipulação de imagens em alguns de seus artigos, em função da indolência institucional, demorou cerca de quatro anos para provar que todas as acusações – e ele grifa TODAS as acusações – eram infundadas, conseguindo atestar, assim, a integridade ética de seu trabalho. “Senti na pele o que hoje chamam de Cultura do Cancelamento”, comenta o pesquisador, afirmando ser fundamental o respaldo perene e ágil da Unicamp aos membros de sua comunidade científica, tanto do ponto de vista acadêmico e jurídico, como também de comunicação.

Western blot, reused after digital manipulation for different experiments

“Depois de quase quatro anos lutando para provar a integridade e o profissionalismo do meu trabalho e da minha equipe, conseguindo republicar trabalhos injustamente retratados e retomar todos os financiamentos previamente aprovados, entendi que posso contribuir para que pesquisadores que enfrentam esse mesmo tipo de situação possam fazer isso com franqueza, dignidade e cabeça erguida”

Fake western blots, digitally fabricated for reuse.

Recentemente, Mario Saad foi listado pelo Journal Plos Biology entre os 100 mil cientistas mais influentes do mundo. Todavia, nem o impacto de seu nome na produção científica mundial, o eximiu anos antes de travar uma luta com periódicos científicos, isoladamente e sem respaldo institucional, quando falsas acusações sobre possíveis manipulações de imagens em suas publicações bateram à porta dessas revistas.

Fake western blots, digitally fabricated for reuse.

No contexto atual de combate às fakenews em ciência, Mario Saad reforça a necessidade de suporte à comunidade científica da Unicamp no que se refere à condução de processos e procedimentos que visam o acolhimento, a avaliação e o encaminhamento de casos suspeitos de má-conduta científica. Condução que deve tramitar com segurança, livre de pressões midiáticas e políticas e das que o próprio pesquisador denomina como “fábricas de fakenews”.

Western blot, reused after digital manipulation for different experiments

“É preciso resguardar o pesquisador que enfrenta processos dessa magnitude até que todas as investigações sejam concluídas. Não para esquivá-lo de suas responsabilidades, mas de preservá-lo de ataques precipitados à reputação acadêmica, algo que para nós, cientistas, é crucial”, explica Saad.

Mesmo enfrentando mais de uma dezena de comissões processantes ao longo dos últimos anos, Mario Saad continuou a publicar e a atuar como revisor e membro do conselho editorial de importantes periódicos científicos internacionais, dentre os quais, o  American Journal of Physiology e o Metabolism.

Same blot, different antibodies, different samples, different papers.

“Muito cedo se aprende que na vida acadêmica é necessário ser resiliente. Passada a tormenta e restabelecida a justiça, sigo realizando com afinco o que aprendi a fazer: desenvolver ciência, cuidar dos meus pacientes, dar aulas e estudar”, comenta.

Entenda

Em meados de 2015, as revistas Diabetes, PlosOne, PlosBiology, CriticalCare e Diabetologia receberam denúncias anônimas sobre possíveis manipulações de imagens nos manuscritos do professor Mario Saad, docente da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. À época, Saad contava com cerca de 250 manuscritos publicados nesses e em outros periódicos.

Frankenstein blot faked in Photoshop and recycled in two papers

“Aparentemente, todos os meus artigos foram checados pelos denunciantes. Chegaram quase a criar um dossiê de erros de editoração dos meus artigos. Falsas acusações eram então enviadas ininterruptamente às revistas, alegando manipulação de imagens e solicitando que providências fossem tomadas”, explica Saad.

Em resposta ao questionamento das revistas, Mario Saad enviou os dados originais de seus estudos, atestando que as denúncias eram falsas e que pouquíssimos casos tratavam, na verdade, de erros de editoração eletrônica. Saad reconheceu, nesses casos, que os erros haviam ocorrido inadvertidamente e que, ainda assim, não interferiam no resultado de seus achados, bem como na interpretação final destes.

Western blot, reused after digital manipulation for different experiments

De forma anônima, as denúncias contra o professor Saad continuavam a chegar às revistas, pretendendo transformar os pequenos erros de editoração em manipulação intencional de imagens. Pressionadas, as revistas solicitaram que a Unicamp investigasse os estudos denunciados.

Atendendo a solicitação das revistas, a Unicamp instaurou a primeira de uma série de sindicâncias, a partir de 2016, inclusive, com a participação de pesquisadores externos à universidade e também do exterior.

Different experiments, different samples, same blots

“A conclusão também foi a de que os poucos erros apresentados nos artigos escritos por mim eram involuntários e não afetavam o resultado dos estudos, e que poderiam ser facilmente corrigidos por meio de erratas. Atestavam ainda que as denúncias eram completamente falsas”, reitera o pesquisador.

A despeito do parecer da Unicamp, a revista Diabetes não acatou a proposta de correção dos erros de editoração em dois manuscritos e, de maneira unilateral, acabou retratando não apenas dois, mas três artigos do professor Saad, desprezando a conclusão e o parecer das sindicâncias instauradas pela Universidade Estadual de Campinas.

Cloned gel bands in a fake gel. Pereira-da-Silva et al Endocrinology 2003

A partir da decisão unilateral da Diabetes, as revistas PlosBiology, Diabetologia e Critical Care, que já haviam aceitado fazer as erratas, voltaram atrás e também decidiram retratar os artigos questionados.

“O texto dessas retratações e novas denúncias anônimas, sem provas, foram juntadas em novos processos pela Unicamp. Às vésperas da eleição para novo reitor, no início de 2017, recebi a notícia de que enfrentaria 12 novas Comissões Processantes no âmbito da universidade”, comenta Saad. .

Western blot, reused after digital manipulation for different experiments

Saad destaca que, até então, todas as denúncias já haviam sido investigadas em três sindicâncias internas, realizadas pela Faculdade de Ciências Médicas e pela própria Reitoria, em que concluíam que nunca houve má conduta em suas pesquisas e que as denúncias eram falsas.

Em 2018, todos os relatórios finais de todas as 12 CPPs concluíam que nunca houvera má fé ou má conduta científica por parte de Mario Saad em seus manuscritos. Tais pareceres foram encaminhados à Fapesp, que demorou mais um ano para analisá-los. No início de 2020, todos os financiamentos da Fundação, previamente aprovados, foram retomados. Os trabalhos retratados mais relevantes foram republicados. Além de inocentado em todas as investigações, os resultados originais de seu laboratório de pesquisa voltaram para a literatura científica.

Western blots, reused after digital manipulation for different experiments

“Creio que as conquistas de uma vida dedicada integralmente à Universidade e os resultados desse escrutínio completo em minha vida profissional – que demonstraram que minha atuação sempre foi honesta e baseada em trabalho duro, e que também comprovaram a validade e a relevância de minha produção cientifica – permitem claramente que eu retome plenitude minha vida acadêmica com plenitude, contribuindo com meu trabalho para o engrandecimento da Universidade e da ciência no Brasil”, conclui.

Western blot, reused after digital manipulation for different experiments

There was also this email sent by “Mario Saad and Marco Zezzi  <divulga@marioezezzi.com.br>” on 18 March 2021:


Falsidade Eleitoreira

Fake western blots made in Photoshop from recycled gel bands. Rocha et al Clin Cancer Res 2011

Há alguns anos, o professor Mario Saad foi levianamente acusado de más condutas científicas, todas esclarecidas e desmentidas a seu tempo. Agora, entretanto, o ataque volta à tona, desta vez, na forma vil de fake news covardes e eleitoreiras, em sites sensacionalistas, as quais, uma vez mais, repudiamos com veemência.

A única verdade sobre essas acusações é que elas permitiram diagnosticar com precisão a indolência institucional da Unicamp à época, que permitiu que essas falsidades prosperassem, a despeito de não haver quaisquer provas documentais.

Western blot, reused after digital manipulation for different experiments Girasol et al PLOS One 2009

Reiteramos que o Prof. Mário foi absolvido de todas as acusações que lhe foram feitas. A prova mais cabal disso está à mão de qualquer um que se dê ao trabalho de verificar, antes de atacar: os artigos sob suspeição foram republicados, e os seus dados repostos integralmente na literatura científica da área.

A despeito disso, talvez valha a pena esclarecer o que sejam os tais plágios ou más praticas científicas alegados: diziam respeito ao fato de que, após 15 anos da publicação original, cerca de 5% dos seus dados não podiam ser recuperados de um computador, por uma questão meramente tecnológica de acesso a eles. Nunca, em nenhuma ocasião, quaisquer resultados ou conclusões dos trabalhos foram postos em dúvida.

Western blot, reused after digital manipulation for different experiments

Talvez esse tempo de horror em que, dentro da própria Universidade, haja quem não tenha vergonha de utilizar expedientes torpes para ganhar eleição na mentira, sirva também de ocasião para que os docentes, servidores e alunos conheçam a luta solitária e vitoriosa que teve de empreender o Prof. Mario Saad em defesa da sua reputação como pesquisador brasileiro.

É nosso mais sincero desejo que isso nunca mais venha acontecer com algum docente desta Universidade.

A rigor, a Unicamp precisa se orgulhar de ter nos seus quadros um pesquisador como o Prof. Mario Saad, que apresenta 21.858 citações pelo Google Scholar. O seu reconhecimento internacional é manifesto, tanto que foi listado pela revista Plos Biology, ao lado de outros colegas da Unicamp, entre os pesquisadores mais influentes do mundo. Além disso, é um dos poucos cientistas mundiais, na área de Medicina, que são consultores selecionados pelo Comitê do Prêmio Nobel para indicação de futuros premiados. Todos que atuam na área acadêmica sabem que carreiras assim são construídas com muita dedicação, trabalho e integridade cientifica.

Apenas o fisiologismo mais baixo e eleitoreiro pode se ressentir diante de tão notáveis feitos acadêmicos.

Western blot, reused after digital manipulation for different experiments Calisto et al PLOS One 2010

Apoiadores do Prof. Mario Saad. 
Leia também
 
Um ensaio clínico sobre fake news, por Mario Saad: https://www.fcm.unicamp.br/fcm/relacoes-publicas/saladeimprensa/um-ensaio-clinico-sobre-fake-news-por-mario-saad

Fake western blots, made in Photoshop from recycled gel bands Weissmann et al Diabetes 2014

“Criaremos na Unicamp, um escritório permanente de integridade em pesquisa para proteger a sociedade e o pesquisador”, afirma Mario Saad:https://marioezezzi.com.br/criaremos-na-unicamp-um-escritorio-permanente-de-integridade-em-pesquisa-para-proteger-a-sociedade-e-o-pesquisador-afirma-mario-saad/
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fecho

Este texto foi originalmente publicado no blog “For Better Science” [Aqui!].

Unicamp gerou impacto de R$ 13,8 bi na região de Campinas em 2019

unicampFOTO: ANTONINHO PERRI / UNICAMP

A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) gera um impacto social e econômico significativo nas regiões onde está instalada por meio de empregos qualificados e receita. Em 2019, o impacto total da universidade na região de Campinas foi de R$13,8 bilhões em termos de Produto Interno Bruto (PIB). Essa foi a conclusão de estudo realizado pela Coordenadoria Geral da Universidade (CGU), em parceria com os institutos de economia e de química da universidade. O relatório está antecipado à imprensa pela Bori e será apresentado na quarta (24).

Os dados evidenciaram que os desdobramentos socioeconômicos associados apenas às despesas da Unicamp com servidores, investimentos e compras de bens e serviços e ao consumo dos alunos geraram um impacto de R$ 6,4 bilhões – o equivalente a 9,8% de todo o PIB de Campinas em 2019.

As atividades da universidade resultaram na criação de 100 mil vagas de emprego geradas, de forma direta e indireta, pela instituição em 2019. O número leva em conta o impacto das 717 empresas-filhas da Unicamp atualmente ativas no mercado. Criadas por egressos, ex-alunos e ex-docentes da universidade, essas empresas geraram mais de 30 mil empregos diretos e R$8 bilhões em receita em 2019.

“Um dos grandes achados do estudo foi evidenciar a importância da universidade na geração de emprego e renda. É toda uma cadeia de renda/consumo e produção que se espraia pela sociedade e vai promovendo o desenvolvimento”, aponta Teresa Dib Zambon Atvars, uma das coordenadoras do estudo.

Matriz-insumo

O estudo estimou o impacto socioeconômico da atividade da Unicamp por meio da análise da chamada matriz insumo-produto, que identifica as conexões de uma atividade sobre os demais setores da economia. A partir da descrição da origem e do destino da produção de cada área, esse instrumento permite conhecer os fluxos de bens e serviços produzidos a partir de determinado setor da economia e medir, assim, os impactos das mudanças na economia.

“No caso da universidade, os professores, funcionários e suas famílias, assim como os alunos, adquirem bens e serviços: compram comida no mercado, alugam imóveis, buscam entretenimento etc. Isso leva a uma série de atividades em uma cadeia produtiva, pois outros setores econômicos são acionados – desde a produção do insumo até seu transporte e comércio. E esse complexo processo acaba gerando mais emprego e mais renda”, explica Mariano Laplane, economista da Unicamp, um dos autores do estudo.

A pesquisa também avaliou o “efeito-diploma” na região, ou seja, ao aumento das oportunidades de emprego e dos rendimentos de trabalhadores com ensino superior completo. “Os dados mostram claramente que os profissionais que possuem graduação têm uma renda maior do que aqueles que possuem apenas o ensino médio. E essa renda aumenta ainda mais com uma pós-graduação. Então o estudo também mostra que a universidade, entre muitas outras contribuições, colabora também para melhorar a renda e, consequentemente, a qualidade de vida”, diz Atvars.

fecho

Este texto foi produzido e originalmente publicado pela Agência Bori [Aqui!].

Coletivo “Cientistas Engajados” envia carta a João Dória cobrando mudanças no PL 529

cientistas engajados

O Coletivo “Cientistas Engajados” enviou ontem uma correspondência assinada por 510 pesquisadores  ao governador de São Paulo, João Paulo Dória (PSDB), mostrando os problemas que serão causados pelo Projeto de Lei 529 (PL 529), que contém um conjunto de providências relacionadas à gestão pública do Estado que são consideradas como potenciais causadoras de mais problemas do que soluções.

O documento aponta que, especialmente no que diz respeito à infraestrutura de Assistência Social e de Ciência e Tecnologia, o PL 529 ao retirar das universidades estaduais paulistas (USP, UNESP e Unicamp) e da FAPESP recursos que servem para
garantir a estabilidade do financiamento à pesquisa,  ataca não apenas a autonomia financeira mas, também a capacidade do Estado de reagir à crise sanitária e econômica.

Em sua correspondência, os “Cientistas Engajados” apontam ainda que serão necessários investimentos ainda maiores no próximo período, pois não será possível contar com o governo federal que neste de profunda necessidade do conhecimento científico é presidido por um indivíduo que rejeita a ciência e os cientistas.

Quem desejar ler a íntegra do documento enviado a João Paulo Dória pelos “Cientistas Engajados”, basta clicar [Aqui!]

Para assinar esta carta preencha o formulário: https://forms.gle/v2XjDYvriPcrGbGCA

Siga os Cientistas Engajados nas redes sociais:  Facebook: @CientistasE Twitter: @CientisasE Instagram: @cientistasengajados

 

Comitê de Ética da Unicamp suspende pesquisa que seria usada por lobby Pró-Paraquate

Unicamp suspende pesquisa que poderia liberar agrotóxico letal

Unicamp suspende pesquisa que poderia liberar agrotóxico letal

Após denúncia da Repórter Brasil e Agência Pública, Comitê de Ética da universidade suspendeu pesquisa financiada por produtores de soja que visava reverter a proibição do paraquate

Por Ana Aranha – Repórter Brasil/Agência Pública 

Após revelações em matéria da Repórter Brasil e da Agência Pública, o comitê de Ética da Unicamp suspendeu pesquisa conduzida em laboratório da Faculdade de Ciências Farmacêuticas que estava sendo usada para liberar o uso de agrotóxico letal. A reportagem denunciou que, antes mesmo de ser concluída, a pesquisa era peça central do lobby para reverter a proibição do paraquate, classificado como “extremamente tóxico” e um dos agrotóxicos mais usados no Brasil. O produto está com data marcada para ser banido em setembro deste ano, segundo decisão tomada pela Anvisa em 2017 com base em evidências de que ele pode gerar mutações genéticas e a doença de Parkinson nos trabalhadores rurais. 

A poucos meses da proibição, porém, o lobby pressionava a Anvisa pela reversão do veto usando como argumento um controverso estudo financiado pela Associação Brasileira de Produtores de Soja (Aprosoja) – que representa o setor que mais usa o paraquate. A pesquisa determinaria se o produto pode ser encontrado na urina dos trabalhadores que o aplicam dentro de tratores de cabine fechada no Mato Grosso. Entre as muitas falhas apontadas na metodologia, ela não incluiu outras pessoas que também são expostas ao produto, como os trabalhadores que fazem o transporte e o tratamento dos grãos, as comunidades do entorno e os trabalhadores de fazendas onde não há tratores com cabine fechada.

Revelando seu entusiasmo pela segurança do uso do agrotóxico, as declarações dadas pelo médico e professor aposentado da Unicamp Ângelo Trapé para a reportagem geraram questionamentos entre pesquisadores da instituição. “O contato do trabalhador que faz a pulverização é nulo. É tudo mecanizado, trator fechado, vedado”, afirmou Trapé, que questionou a proibição do produto antes mesmo de concluir a sua pesquisa.

Dois dias após a publicação da reportagem, o departamento de Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, onde Trapé foi professor, publicou uma nota de repúdio afirmando que já foi “bem estabelecida a associação do agrotóxico com diversas doenças relacionadas ao trabalho como fibrose pulmonar, insuficiência renal, Doença de Parkinson e danos genéticos”. A nota manifesta ainda “indignação” pelo uso da pesquisa para reverter a proibição do paraquate e afirma que a citação de Trapé como professor aposentado da universidade caracteriza “abuso do uso de imagem da Unicamp, em busca de algum grau de legitimidade para estudos que claramente colidem com os interesses da saúde coletiva”.

A nota foi posteriormente endossada pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas, onde fica o laboratório em que a pesquisa estava sendo conduzida. O texto reforça a preocupação da instituição com o fato de que o “paraquate, comprovadamente, causa graves intoxicações ocupacionais e acidentais aos trabalhadores rurais”.

Por fim, o Comitê de Ética da universidade colocou o assunto em pauta e decidiu, nesta quarta dia 29, pela “suspensão da autorização da pesquisa em questão “por haver indícios de omissão de informações por parte dos envolvidos”. O órgão não detalhou quais são essas informações (leia nota completa).  

De acordo com resolução da Anvisa, publicada em 2017, o paraquate será banido em setembro deste ano no Brasil (Foto: Alam Ramírez Zelaya)

A reportagem apurou que uma pesquisa parecida com a de Trapé fora reprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa  (Conep) no fim de 2019, meses antes da submissão da pesquisa à Unicamp. A versão rejeitada pela Conep continha informações que foram cortadas da versão apresentada à universidade paulista.

A rejeição da pesquisa pela Conep foi pauta de reunião que ocorreu na Anvisa em 23 de outubro, quando o coordenador geral da comissão Jorge Venâncio foi chamado pelo diretor Renato Porto para esclarecer o motivo da reprovação. A intenção do encontro era entender quais as falhas da pesquisa para que um outro projeto pudesse ser apresentado.

No dia 5 de novembro, o mesmo diretor da agência reguladora recebeu outro membro do Conep para discutir a pesquisa. Desta vez, também participaram do encontro representantes da Frente Parlamentar Agropecuária, a bancada ruralista.

Pouco mais de um mês depois, em 11 de dezembro, a pesquisa de Angelo Trapé era aprovada pelo Comitê de Ética da Unicamp. “Imagino que eles não conseguiram resolver os problemas apontados,  então fizeram um projeto mais simples da mesma pesquisa para passar na Unicamp”, afirma uma fonte que teve acesso às informações sobre todo o processo de reprovação na Conep.

Trapé confirmou que sua pesquisa é uma versão de um projeto anteriormente rejeitado pela Conep. Ainda durante a apuração da matéria sobre o lobby, ele explicou à reportagem que a Aprosoja lhe procurou no fim do ano passado, depois que a pesquisa fora rejeitada pela Conep. A intenção era de que ele tentasse aprovar o projeto pela Unicamp, o que de fato ele conseguiu.

Após a publicação da matéria, o Comitê de Ética da Unicamp entrou em contato com a Conep e obteve os motivos pelos quais a pesquisa fora reprovada. Essas informações não foram reveladas nem pela Conep ou pela Unicamp. Pesquisadores que tiveram acesso à pesquisa e que não podem se identificar afirmam que são muitas as falhas, elas vão desde a metodologia até os procedimentos de segurança com as amostras colhidas.

Procurados pela reportagem, Ângelo Trapé não respondeu ao novo contato. A Aprosoja manteve a mesma posição manifestada anteriormente e afirmou que não vai se pronunciar sobre a suspensão da pesquisa que financiou.

Anvisa segue tentando votar o adiamento da proibição

As reuniões na Anvisa para tratar sobre a pesquisa são um breve episódio de uma longa sequência de encontros promovidos pelo lobby pró paraquate desde que sua proibição foi publicada. Desde 2017, foram mais de vinte reuniões na agência reguladora com as maiores multinacionais do setor, como a Syngenta, e representantes dos maiores exportadores do Brasil, como a Aprosoja. A agenda foi compilada pela Repórter Brasil e Agência Pública.

paraquate 1

Veja a íntegra do levantamento sobre a agenda da Anvisa.

Um dos períodos de maior intensidade nas reuniões foi justamente durante os meses em que a pesquisa foi submetida e reprovada pelo Conep. Foram seis reuniões na agenda oficial dos diretores da agência com o tema do paraquate em outubro e novembro de 2019.

Os encontros sobre o produto voltaram a acontecer neste ano, com a Syngenta e a bancada ruralista em fevereiro e março. Em 31 de março, uma possível revisão do prazo de proibição devido à pesquisa entrou oficialmente na pauta da agência, soando o alerta do Ministério Público Federal.

O procurador federal Marco Antônio Delfino de Almeida, que atua no Mato Grosso do Sul, teve acesso às informações preliminares sobre a pesquisa e conseguiu uma liminar na justiça proibindo a Anvisa de fazer mudanças na data de proibição antes que os resultados da pesquisa fossem entregues.

Mas a Anvisa continua recorrendo da decisão e conseguiu, no dia 17 de julho, derrubar a liminar do MPF. Ou seja, a agência reguladora disputa na justiça o direito de adiar a proibição do paraquate mesmo antes que novas conclusões sejam apresentadas.

Além da pesquisa de Angelo Trapé, o lobby financia outro estudo sobre o Paraquate na Inglaterra. As produtoras de agrotóxicos se juntaram no que chamam oficialmente de Força-Tarefa Paraquate, grupo que reúne 12 fabricantes do produto. A Força-Tarefa financia pesquisa que vai testar a capacidade do produto provocar mutação nos genes de ratos. O estudo está sendo conduzido em um laboratório privado inglês, o Covance Laboratory.

Assim como a pesquisa de Trapé, os resultados só devem ficar prontos depois de setembro, data da proibição no Brasil. O atraso é o argumento central do lobby para adiar a proibição e a Anvisa está, atualmente, desimpedida pela justiça de tomar essa decisão.

fecho

Este texto foi originalmente publicado pela Repórter Brasil [Aqui!].

Brasileiros não sabem quais agrotóxicos estão na água que consomem

água

Estudos científicos apontam para crescente contaminação da água usada para consumo humano por resíduos de agrotóxicos.

Por Nadine Nascimento para o jornal Brasil de Fato

A produção agrícola responde por nada menos do que 70% do consumo mundial de água. Mas, ao mesmo tempo que depende desse recurso vital, a atividade também contribui para sua degradação. A poluição hídrica causada por práticas agrícolas insustentáveis, marcadas pelo abuso de​ agrotóxicos que escoam para rios, lagos e reservas subterrâneas, é um problema crescente em todo o mundo.

O Brasil, uma potência em agricultura industrial, é um dos maiores consumidores de agrotóxicos no mundo. Só em 2017, cerca de 540 mil toneladas de ingredientes ativos desses produtos foram consumidas.

Hoje (22) é Dia Mundial da Água. Água potável segura é um direito humano, o que inclui o direito de as pessoas saberem o que tem na água que estão bebendo. A legislação brasileira define que os fornecedores de água – sejam eles empresas estatais, privadas ou governos municipais – são responsáveis por testar 27 agrotóxicos específicos, a cada seis meses, nos sistemas que gerenciam e devem relatar esses resultados ao governo federal.

Para a professora da Faculdade de Tecnologia da Unicamp, Gisela de Aragão Umbuzeiro, “a quantidade de agrotóxicos que hoje consta nesta portaria é pequena e não é representativa dos agrotóxicos que estão sendo usados no Brasil e poderiam causar algum efeito adverso”, levando em conta que o número de ingredientes ativos registrados no Brasil, 306, é 11 vezes maior do que os 27 analisados na água para consumo.

Outro ponto importante é a periodicidade dessas análises que ocorrem semestralmente, “elas são feitas muitas vezes fora ou distante da época do uso do agrotóxico na cultura, isso pode contribuir para que os resultados encontrados não correspondam à real situação da presença de agrotóxico na água”, acredita a médica sanitarista Telma Nery.

atrazina está banida da União Europeia desde 2004, mas aqui é o sexto pesticida mais comercializado com quase 29 mil toneladas, apenas em 2017. Ela também é o contaminador mais comumente encontrado na água. “A atrazina tem um importante efeito no sistema hormonal do ser humano, como também nos sistemas endócrino, reprodutor e neurológico. Quando em uma exposição crônica, ela pode trazer efeitos [negativos] nesses sistemas”, diz Nery.

Resistência

Um desafio complexo como a poluição hídrica pela agricultura requer múltiplas respostas. Segundo a FAO, organização ligada a Nações Unidas, em sua publicação “Mais pessoas, mais alimentos, água pior?”, a maneira mais eficaz de reduzir a pressão sobre ecossistemas aquáticos é atenuar a poluição na fonte.

São apontadas políticas de instrumentos regulatórios tradicionais, como padrões de qualidade da água, licenças de descarga de poluição, avaliações de impacto ambiental para certas atividades agrícolas e limites à comercialização e venda de produtos perigosos, entre outras intervenções.

“As grandes corporações são as que mais consomem água. Todo mundo sabe que quase 70% de toda a água disponível é usada para o agronegócio, e a contrapartida do ponto de vista de geração de emprego, de garantia de alimentos saudáveis é inversamente proporcional”, comenta Edson Aparecido da Silva, secretário executivo do Observatório Nacional dos Direitos a Água e ao Saneamento (ONDAS) e assessor de Saneamento da Fundação Nacional dos Urbanitários (FNU).

avião

Uso intensivo e indiscriminado de agrotóxicos potencializa contaminação de corpos aquáticos e do lençol freatico.

Silva esteve presente no Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA), criado em 2018, que reuniu organizações e movimentos sociais que lutam mundialmente em defesa da água como direito elementar à vida. Este Fórum se contrapõe ao autodenominado Fórum Mundial da Água (FMA), um encontro promovido pelos grandes grupos econômicos que defendem a privatização das fontes naturais e dos serviços públicos de água. Entre as corporações interessadas na apropriação desse recurso e que patrocinaram o evento, estavam Ambev, Nestlé e Coca-Cola.

“Esse modelo de desenvolvimento da lógica do capital se sobrepõe a lógica da garantia dos direitos humanos e da preservação dos bens comuns. As articulações dos movimentos populares dos atingidos por grandes empreendimentos, como o caso do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), ou da luta do Movimentos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que garantem uma produção sustentável sem agrotóxico e que dá condições dignas de vida para a população do campo, têm que ser cada vez mais fortalecidos”, afirmou Aparecido da Silva.


Este artigo foi originalmente publicado pelo jornal “Brasil de Fato” [Aqui!]