Jair Bolsonaro em sua peculiar visita ao interior de uma residência na comunidade de São Sebastião na periferia de Brasília
Desde que eclodiu a crise envolvendo a declaração questionável (para dizer o mínimo) do presidente Jair Bolsonaro sobre o encontro com duas adolescentes venezuelanas na comunidade periférica de São Sebastião, a mídia corporativa vem fazendo um tipo de cobertura que não vai a nenhum lugar.
Como geógrafo, me pus a pensar sobre algumas questões nunca perguntadas (e por isso não respondidas) envolvendo essa peculiar visita de um presidente em exercício a uma comunidade que fica a 30 Km (ou cerca de 24 minutos de carro) do Palácio do Planalto (ver figura abaixo).
A coisa começa esquisita por um fato básico: São Sebastião é uma comunidade cuja feição mais notória é a vizinhança com o Presídio da Papuda, além de ser fruto de um processo de expansão que fugiu do padrão idealizado por Oscar Niemeyer e Lúcio Costa no momento da criação do Distrito Federal.
Segundo um colega que trabalha na Universidade de Brasília (UnB), São Sebastião é mais um daqueles locais em que as camadas mais pobres vão ocupar quando outras áreas se tornam valorizadas demais, e empurram para regiões distantes os que não podem pagar nelas. Isso explica a distância entre São Sebastião e o chamado Plano Piloto, como é mostrado na figura acima.
Pois bem, o que teria levado a que o presidente da república decidisse “dar um passeio” matinal em uma área periférica de Brasília? Afora as excentricidades que são atribuídas a Jair Bolsonaro, não me parece acidental que ele tenha encontrado acidentalmente justamente crianças venezuelanas em São Sebastião. Toda essa situação aparenta ter algum nível de intencionalidade, sem que fica claro qual.
O que não me parece factível é que Jair Bolsonaro tenha acordado em um sábado de manhã, e incontinente, tenha convocado parte de sua segurança palaciana para dar um rolé despretensioso em comunidade periférica que fica a pelo menos 30 km das comodidades oferecidas pela residência oficial da presidência da república, onde então acabaria encontrando as adolescentes venezuelanas.
A mídia está agora noticiando que a ex-ministra e senadora eleita Damares Alves e a esposa de Jair Bolsonaro, Michelle, tiveram um encontro com as duas adolescentes com o qual o presidente da república disse “ter pintado um clima”. Neste caso, a intenção parece óbvia, qual seja, livrar a cara de Jair Bolsonaro que está perdendo votos por causa de uma declaração que até os mais aguerridos dos bolsonaristas sabe que foi muito estranha.
Mas será que, finalmente, algum jornalista vai se ocupar de fazer a pergunta que realmente importa, qual seja, o que foi Jair Bolsonaro fazer em São Sebastião em um sábado de manhã?