Estudo na Science mostra que ameaças na Amazônia vão muito além do desmatamento

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A área degradada do bioma (38%) é maior do que a desmatada (17 %). Somados, os dois índices indicam que mais da metade das florestas da Amazônia foram destruídas ou alteradas.

Os autores explicam que “durante o processo de degradação, o uso da terra pode ou não mudar, mas a cobertura do solo não muda (a floresta segue sendo floresta)”. O desmatamento significa a conversão total das florestas para outro tipo de uso do solo, como a agricultura ou a pecuária .

Mas, os pesquisadores avisam que é um erro pensar que a degradação causa danos insignificantes em comparação com o desmatamento. Baseando-se em dados de diversos estudos realizados entre 2001 e 2018, quantificando a acumulação de perturbações que alteraram o ecossistema e o funcionamento do bosque, afetando a sua capacidade de armazenar carbono e água.

“Não podemos falar de prevenir o desmatamento sem falar da degradação. O desmatamento zero não é uma meta otimista. Se requer reajustar a discussão sobre a conservação da Amazônia, o processo de degradação já não pode ser ignorado”.

Marcos Pedlowski, Universidad Estatal del Norte Fluminense, Rio de Janeiro

Segundo o estudo, as estimativas sobre emissão de CO 2 e gases de efeito estufa resultantes da perda gradual de vegetação situam-se entre 50 e 200 milhões de toneladas ao ano, um nível comparável à perda de carbono por desmatamento.

“A taxa de acúmulo de carbono pela floresta diminuiu cerca de 30% nos últimos 30 anos. Se continuarmos com este padrão, em mais ou menos 15 anos teremos uma Amazônia emitindo muito mais CO 2 do que absorve ”, afirmou à SciDev.Net David Lapola, ecólogo e líder do estudo.

Lapola, pesquisador do Centro de Investigações Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura da Universidade Estadual de Campinas, explica que o impacto sobre o estoque de carbono diminui a evapotranspiração da floresta, um processo que devolve a água à atmosfera por meio da transpiração das plantas .

“Quando aumenta o CO 2 , teoricamente a planta transpira menos, provocando menos chuva e umidfade. Com isso, podemos observar uma mudança de vegetação: as árvores com maior afinidade com climas úmidos estão desaparecendo e estão surgindo espécies mais resistentes ao clima seco”, revela.

O trabalho também sugere que a degradação ameaça a biodiversidade e provoca impactos socioeconômicos nas comunidades locais, como a ocorrência cada vez mais frequente de eventos extremos, por exemplo, as secas prolongadas anteriores às inundações recordes ocorridas em 2022 na Amazônia brasileira.

As perturbações na floresta podem ter diferentes origens mas danificam-na severamente, por vezes de forma irreversível. Crédito da imagem: Serfor-Peru, imagem de domínio público.

Ante este panorama, os pesquisadores da Amazônia consideram que se bem a meta de desmatamento zero para 2030 do governo brasileiro –mencionada no Foro Económico Mundial de Davos, Suíça, pela ministra de Meiio Ambiente e  Mudança Climática do Brasil, Marina Silva –é importante dentro da agenda ambiental global, falar apenas de ações para combater o desmatamento na região não é suficiente.

“As políticas públicas na Amazônia não podem cobrir apenas o desmatamento”, disse Marcos Pedlowski, geógrafo da Universidade Estadual do Norte Fluminense, ao SciDev.Net., no Rio de Janeiro, coautor de um dos primeiros estudos brasileiros , também publicado em Science , que chamou a atenção sobre o problema da degradação do bioma.

Para Pedlowski, as projeções das próximas décadas vão depender do modelo econômico e social que o Brasil vai adotar.

De acordo com o relatório do Painel Científico da Amazônia, entre os países da Pan Amazônia, o Brasil é responsável por mais da metade da produção de madeira (52%), seguido pelo Equador (11%), Peru (10%) e Bolívia (10%). Venezuela, Colômbia, Suriname e Guiana representam em conjunto o 17% restante.

Mais da metade da seleção extrativa de madeira dos países amazônicos está sendo realizada no Brasil. O país é seguido por Equador, Peru e Bolívia. Crédito da imagem: Serfor-Peru, imagem de domínio público

“Na Amazônia brasileira, a extração seletiva afeta uma grande área de floresta, sendo o segundo fator mais comum de degradação florestal, somente atrás dos chamados efeitos de borda”, destaca o informe.

“Toda essa suposta renda cria muito mais problemas e não gera tanto quanto as pessoas pensam. Os ganhos são superados pelos prejuízos”, garante Pedlowski.

E David Lapola acrescenta que “a degradação favorece alguns, mas oprime muitos”.

Os pesquisadores coincidem em recomendar o desenvolvimento de um sistema de monitoramento das perturbações florestais – imagens medianas de satélite combinadas com um escapamento laser de superfície – e de um modelo de “bosque inteligente”, com a instalação de dispositivos no bosque para monitorar o degradação, especialmente a tala seletiva.

Link para o resumo do estudo na Science


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Este artigo foi produzido pela edição de América Latina e Caribe de  SciDev.Net [Aqui! ].

Science: Ação humana pode afetar Amazônia milhares de vezes mais rápido que processos naturais

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As mudanças causadas pela ação humana na Amazônia são capazes de afetar todo o continente em questão de séculos ou décadas. São, portanto, centenas a milhares de vezes mais rápidas quando comparadas a processos climáticos e geológicos naturais, que se estendem por milhões a dezenas de milhões de anos. Os principais fatores de degradação do bioma relacionados à atividade humana são desmatamento, incêndios florestais, erosão do solo, represamento de rios e desertificação devido à mudança climática global. É o que afirmam cientistas de instituições nacionais e internacionais, como o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA) e a Universidade de Louisiana, nos Estados Unidos, em artigo publicado na revista “Science” nesta quinta (26).

O pesquisador Pedro Val, um dos autores do estudo, explica que os dados foram compilados a partir do primeiro Relatório de Avaliação da Amazônia, documento lançado em 2021 pela rede de cientistas do Painel Científico da Amazônia. O artigo complementa esse conhecimento com dados de estudos publicados mais recentemente sobre impactos ambientais na América do Sul e no mundo.

A transição da paisagem florestal para a paisagem agrícola por meio do desmatamento em larga escala ocorre de forma acelerada na Amazônia, explicam os autores. Isto é preocupante porque o bioma tem papel fundamental no ciclo hidrológico planetário, e as interferências humanas provocam a degradação do regime climático global. Essas transformações geram consequências múltiplas para o bem-estar humano, como insegurança no acesso à água e alimentos, o que pode provocar migrações em massa e instabilidade política.

O artigo alerta que gestores públicos devem agir imediatamente para proteger biodiversidade, população e serviços ecossistêmicos globais associados à Amazônia. “Dentre as principais medidas destacadas, estão a parada completa de desmatamento através de políticas e leis de conservação existentes. As políticas públicas devem desincentivar o desenvolvimento de novas hidroelétricas e de novas exportações de commodities que dependam do desmatamento da Amazônia, como as derivadas da agricultura e mineração. Na esfera global destaca-se a necessidade de migrar para fontes de energia limpa e eliminar o uso de fontes como derivados do petróleo. É necessário migrar para energia eólica e solar”, explica Val.


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Este texto foi originalmente publicado pela Agência Bori [Aqui!].

Mais de um terço da floresta amazônica sofre com degradação causada por humanos, aponta estudo

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Foto tirada em 2015 de uma floresta em chamas em Belterra, na Amazônia brasileira

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O processo de degradação da Amazônia é bem maior do que os cientistas acreditavam ser, segundo um estudo publicado nesta quinta-feira (26) na revista “Science” e assinado por 35 autores de instituições nacionais e internacionais, como Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Instituto de Pesquisas Ambientais da Amazônia (IPAM), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e Universidade de Lancaster, do Reino Unido. O artigo aponta que cerca de 38% do que resta da área de floresta sofre com algum tipo de degradação, o que provoca tanto ou mais emissões de carbono quanto o desmatamento.

O trabalho é fruto do projeto AIMES (Analysis, Integration and Modelling of the Earth System), ligado à iniciativa internacional Future Earth, que reúne cientistas e pesquisadores que estudam a sustentabilidade. As conclusões resultam de uma revisão analítica de dados científicos baseados em imagens de satélite e dados do chão já publicados anteriormente sobre mudanças na região amazônica entre 2001 e 2018. Os autores definem o conceito de degradação como sendo mudanças transitórias ou de longo prazo nas condições da floresta causadas por humanos. A degradação difere do desmatamento na medida em que este envolve mudanças na cobertura do solo – ou seja, no desmatamento, a floresta deixa de ser floresta.

Foram considerados quatro fatores principais de degradação: fogo na floresta, efeito de borda (as mudanças que acontecem em áreas de floresta ao lado das áreas desmatadas), extração seletiva (como desmatamento ilegal) e secas extremas. Diferentes áreas de florestas podem ser atingidas por um ou mais desses fatores, que têm diferentes origens. “Apesar da incerteza sobre o efeito total desses distúrbios, está claro que o efeito total pode ser tão importante como o efeito de desmatamento para emissões de carbono e a perda de biodiversidade”, diz Jos Barlow, pesquisador da Universidade de Lancaster, na Inglaterra, e coautor do estudo.

Além dos efeitos sobre o clima e das perdas de biodiversidade, os cientistas avaliam que a degradação da Amazônia tem impactos socioeconômicos significativos que devem ser investigados de forma mais profunda futuramente. “A degradação favorece poucos, mas leva fardos a muitos”, afirma David Lapola, pesquisador do CEPAGRI (Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura), da Unicamp e líder do estudo. “Poucas pessoas lucram com esse processo e muitas perdem em questões de saúde, de qualidade de vida, de se identificar com o lugar onde vivem”, completa Patricia Pinho, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e coautora do estudo.

Em uma projeção feita pela equipe para 2050, os quatro fatores de degradação continuarão sendo as principais fontes de emissão de carbono na atmosfera, independentemente do crescimento ou cessão do desmatamento da floresta. “Apesar de parecer óbvio, mesmo em um cenário otimista, quando não existe mais desmatamento, a degradação continua sendo fator de emissão de carbono, principalmente pelas mudanças climáticas”, diz Lapola. Para o cientista, impedir o avanço do desmatamento pode contribuir para que mais atenção seja direcionada a outros fatores de degradação da floresta.

Os autores do artigo propõem a criação de um sistema de monitoramento para a degradação, além de prevenção e coibição do corte ilegal de madeira e controle do uso do fogo. Uma das sugestões é o conceito de “smart forests” que, assim como na ideia de “smart cities” (cidades inteligentes), usaria diferentes tipos de tecnologias e de sensores para coletar dados úteis a fim de melhorar a qualidade do ambiente. “Ações e políticas públicas e privadas para coibir desmatamento não necessariamente vão resolver degradação também”, avalia Lapola. “É preciso apostar em estratégias inovadoras”, completa.

Síntese dos processos de degradação explicados pelo estudo. Fonte: os autores


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Este texto foi originalmente publicado pela Agência Bori [ Aqui!].

União Europeia chega a acordo para proibir produtos ligados ao desmatamento

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Uma área queimada da floresta amazônica é vista em Prainha, estado do Pará, Brasil, em 23 de novembro de 2019

Por Alice Tidey para a EuroNews  

Muitos produtos que contribuem para o desmatamento não serão mais importados e vendidos na União Europeia, de acordo com um acordo provisório firmado pelos legisladores da UE na manhã de terça-feira.

O acordo alcançado pelos representantes do Conselho e do Parlamento abrange óleo de palma, gado, soja, café, cacau, madeira e borracha, bem como produtos derivados como carne bovina, móveis, chocolate, papel impresso e derivados selecionados à base de óleo de palma.

Isso significa que as empresas agora terão que apresentar e emitir uma declaração de “due diligence” de que esses produtos colocados no mercado da UE não levaram ao desmatamento e à degradação florestal em nenhum lugar do mundo após 31 de dezembro de 2020.

“As novas regras visam garantir que, quando os consumidores compram esses produtos, eles não contribuam para degradar ainda mais os ecossistemas florestais. Proteger o meio ambiente em todo o mundo, incluindo florestas e florestas tropicais, é uma meta comum para todos os países e a UE está pronta para assumir sua responsabilidade”, disse Marian Jurečka, ministro tcheco do meio ambiente que liderou as negociações para o Conselho em um comunicado.

O acordo está sendo apresentado como uma grande vitória para o Parlamento, que acrescentou borracha, carvão e vários derivados de óleo de palma ao texto.

Os deputados também trabalharam em uma definição mais ampla de degradação florestal que inclui a conversão de florestas primárias ou florestas em regeneração natural em florestas plantadas ou em outras terras arborizadas e a conversão de florestas primárias em florestas plantadas.

A Comissão Europeia, entretanto, foi encarregada de avaliar se deve estender o escopo da legislação a outras terras arborizadas, bem como a outros ecossistemas e commodities nos próximos dois anos.

Também avaliará se as instituições financeiras da UE devem ser incluídas e proibidas de fornecer serviços aos clientes se houver risco de que esses serviços possam levar ao desmatamento. 

“Não foi fácil, mas alcançamos um resultado forte e ambicioso antes da conferência da biodiversidade COP15 em Montreal”, disse o relator Christophe Hansen (EPP, Luxemburgo) em um comunicado. 

“Esta importante nova ferramenta protegerá as florestas globalmente e cobrirá mais commodities e produtos como borracha, papel impresso e carvão. Além disso, garantimos que os direitos dos povos indígenas, nossos primeiros aliados no combate ao desmatamento, sejam efetivamente protegidos. Também garantimos uma forte definição de degradação florestal que abrangerá uma extensa área de floresta”, acrescentou.

O Greenpeace descreveu a nova legislação como um “grande avanço para as florestas e para as pessoas que as enfrentaram”.

“Não se engane, esta lei fará com que algumas motosserras se calem e impeça as empresas de lucrar com o desmatamento”, disse o porta-voz do Greenpeace na UE, John Hyland.

Mas a ONG criticou o que diz serem as inclusões dos governos da UE de “brechas para suas indústrias madeireiras e proteção frágil para os direitos dos povos indígenas que pagam com seu sangue para defender a natureza”.

Também deplorou a capacidade das empresas que se beneficiam do desmatamento de obter empréstimos de bancos europeus.

O WWF também deu as boas-vindas ao acordo com Anke Schulmeister-Oldenhove, oficial sênior de política florestal de seu escritório de política europeu, dizendo que “fizemos história com esta primeira lei mundial contra o desmatamento”.

“Como um grande bloco comercial, a UE não apenas mudará as regras do jogo para o consumo dentro de suas fronteiras, mas também criará um grande incentivo para que outros países que fomentam o desmatamento mudem suas políticas. A lei não é perfeita, mas inclui elementos fortes “, disse ela também.

Mas a ONG gostaria que outros ecossistemas já fossem incluídos, como as savanas, que segundo ela já estão sob imensa pressão da conversão agrícola e são importantes depósitos de carbono e refúgios para animais. Também vê a definição de degradação florestal como não “suficientemente ambiciosa”.

A legislação agora precisa ser formalmente aprovada pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho Europeu.


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Este texto escrito originalmente em inglês foi publicada pela EuroNews [Aqui!].

Amazônia perdeu 9,7% de sua vegetação natural em 37 anos

Os dados mais recentes do MapBiomas Amazônia reforçam a necessidade de uma ação internacional integrada para reverter a atual tendência de destruição que, se persistir, levará o bioma além de seu ponto sem retorno até o final desta década

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Em 1985, apenas 6% (cerca de 50 milhões de hectares) da Amazônia haviam sido transformados em áreas antrópicas, como pastagens, lavouras, garimpos ou áreas urbanas. Em 2021, essa área quase triplicou, chegando a 15% (quase 125 milhões de hectares) de toda a região. Foi uma perda líquida de quase 10% de sua vegetação natural em apenas 37 anos. A magnitude da destruição varia de um país para outro: no Suriname, na Guiana e na Guiana Francesa é de apenas 1,6%, mas no Brasil chega a 19%. Esse percentual está muito próximo do ponto de inflexão ou ponto sem retorno, calculado pelos cientistas na faixa entre 20% e 25% de perda da cobertura vegetal. Se a tendência atual verificada pelo MapBiomas Amazônia continuar, o bioma, que é um sumidouro de carbono de importância planetária, chegará a um ponto sem volta, afetando irreversivelmente seus serviços ecossistêmicos, e poderá se tornar uma savana.

As geleiras dos Andes amazônicos, que fornecem água para milhões de pessoas e alimentam as nascentes dos grandes rios da região, perderam 46% de seu gelo no período analisado. A atividade minerária expandiu-se 1107% (mais de 1.000 por cento, passando de 47 mil hectares em 1985 para mais de 570 mil hectares em 2021).

Como foi feita a medição em uma região tão heterogênea?

Os dados são resultado da Coleção MapBiomas Amazônia 4.0, iniciativa resultante da colaboração entre a RAISG (Rede Amazônica de Informações Socioambientais Georreferenciadas) e a Rede MapBiomas. A iniciativa mapeia com resolução de 30 metros a dinâmica, há mais de três décadas, de 18 classes diferentes de cobertura e uso do solo, como florestas, savanas, manguezais, áreas agrícolas, áreas urbanas, mineração e geleiras, dentro dos 8,4 milhões de km2 da região amazônica, que inclui a Cordilheira dos Andes, a planície amazônica e as transições com o Cerrado e o Pantanal.

Os resultados serão apresentados no dia 2 de dezembro no auditório da Embaixada do Brasil em Lima, com transmissão ao vivo pelo canal da RAISG no Youtube, às 9h. Peru, Equador e Colômbia; 10:00 Bolívia e Venezuela; 11:00 Brasil.

Transformação acelerada das florestas amazônicas

Os resultados das análises preliminares revelam uma transformação acelerada das florestas amazônicas. Segundo os autores, as perdas têm sido enormes, praticamente irreversíveis e sem perspectiva de reversão dessa tendência. Os dados acendem a luz amarela e dão um sentido de urgência à necessidade de uma ação internacional integrada, decisiva e contundente.

“A Coleção MapBiomas Amazônia 4.0 é inestimável para o entendimento da dinâmica de uso dos recursos naturais da região, além de contribuir para a modelagem climática e o cálculo das emissões e remoções de gases de efeito estufa devido às mudanças no uso do solo na região.” , disse Tasso Azevedo, Coordenador Geral do MapBiomas. Beto Ricardo, coordenador geral da RAISG, acrescenta que as informações geradas pelo MapBiomas Amazônia fortalecem a Rede com dados técnico-científicos, mensagens-chave sobre a importância da Amazônia, sua grande contribuição para o mundo na regulação do clima e armazenamento de carbono, ao tempo que alerta sobre as mudanças na cobertura natural causadas por diferentes atividades antrópicas realizadas entre 1985 e 2021. Ricardo destaca que essas atividades colocam em risco o equilíbrio natural dos ecossistemas e, com ele, a estabilidade do clima do planeta. “Publicar a Coleção 4.0 do MapBiomas Amazônia nos permite contribuir com o monitoramento da região com uma visão integral, ajudando-nos a construir e propor estratégias de conservação mais precisas com propostas e informações políticas compartilhadas entre outros países, bem como aspectos socioambientais da grande importância”.

Para María Olga Borja, coordenadora técnica do Equador, esses mapas representam uma grande contribuição para a região e para seu país: “O Equador não tem uma análise temporal tão detalhada. A periodicidade anual destes dados permite-nos medir o pulso das alterações que os ecossistemas estão sofrendo, algumas causadas diretamente pelas atividades humanas, como a conversão das florestas para a agricultura, mas outras que já apresentam sinais evidentes e mensuráveis ​​das alterações climáticas, como a redução de geleiras e a expansão de lagos devido ao degelo, entre outros”.

Os autores destacam o contraste entre a dinâmica acelerada de mudança do uso da terra ocorrida na Amazônia no período estudado, e particularmente nos últimos trinta anos, com a lentidão que caracteriza o ritmo das negociações climáticas, que nas quase três décadas desde a primeira cúpula do clima fizeram progressos modestos.

Para Harlem Mariño, coordenador de um projeto sobre mudanças climáticas liderado pela RAISG, a falta de acordos definitivos na COP27 sobre questões-chave para a mitigação das mudanças climáticas, como o abandono progressivo do uso de todos os combustíveis fósseis, terá repercussões na Amazônia: “Isso significa que as emissões de gases de efeito estufa provenientes do uso de combustíveis fósseis continuam pressionando os sumidouros de carbono, como a floresta amazônica. Além disso, essa falta de acordos pode implicar na continuidade do fomento às atividades de exploração de combustíveis fósseis na Amazônia, com a consequente redução da disponibilidade de sumidouros de carbono e o aumento das emissões de gases de efeito estufa decorrentes da mudança de uso da terra e a consequente queima desses combustíveis fósseis”, observa Mariño.

Sobre a Plataforma MapBiomas Amazônia 

A plataforma MapBiomas Amazônia é uma ferramenta que permite a qualquer pessoa com acesso à Internet entender as mudanças no uso da terra em toda a Amazônia e as pressões sobre suas florestas e ecossistemas naturais. A informação gerada é compatível para todos os países da região e permite conhecer a situação de 18 categorias de análise, denominadas “classes”, que incluem áreas cobertas por florestas, campos naturais, manguezais, agricultura e rios. As informações são gratuitas e estão disponíveis para download.

Ela permite explorar a mais recente coleção de mapas anuais, abrangendo o período entre 1985 e 2021, e identificar mudanças na cobertura e uso da terra em um local (regional, nacional e local) e um período (ano, quinquênio, décadas, etc.) determinado. A ferramenta também apresenta estatísticas em tabelas e gráficos dinâmicos, com as mudanças de uso no período que o usuário requer e permite entender a dinâmica das mudanças dentro e fora de um Território Indígena ou Área Protegida. A plataforma permite ainda explorar dados relacionados a vetores de pressão em coberturas naturais como concessões de mineração, lotes de petróleo, estradas e usinas hidrelétricas.

Sobre o MapBiomas Amazônia

MapBiomas Amazônia é uma iniciativa liderada pela RAISG com o apoio da Rede MapBiomas. A Primeira Coleção (2000 — 2017) foi publicada em 2019; 2020 trouxe a Segunda Coleção (1985 — 2018); em setembro de 2021 foi o lançamento da Terceira Coleção (1985 — 2020). A Quarta Coleção abrange o período de 1985 a 2021.

Inicialmente, a ferramenta de mapdeseamento de uso da terra foi desenvolvida pelo MapBiomas para ser aplicada no Brasil e foi necessário aprimorá-la com a contribuição de organizações associadas à RAISG para adequar os resultados e análises à geografia de cada país. Desta forma, o conhecimento existente a nível local permite melhorar a ferramenta e refinar a interpretação dos dados. O método utilizado nos permitiu padronizar os biomas incluídos na análise, de modo que os nove países amazônicos compartilham o Bioma Amazônia, enquanto Peru, Equador e Bolívia também compartilham o Bioma Andino.

MapBiomas Amazônia leva em consideração as variações altitudinais típicas da Amazônia andina, que vão desde as geleiras andinas até as formações florestais das planícies amazônicas.

Sobre a Raisg

A RAISG é a Rede de Informação Socioambiental Georreferenciada da Amazônia, um consórcio de organizações da sociedade civil de países amazônicos voltado para a sustentabilidade socioambiental da Amazônia, com o apoio da cooperação internacional. A RAISG gera e dissemina conhecimento, dados estatísticos e informações socioambientais geoespaciais sobre a Amazônia, elaboradas com protocolos comunitários para todos os países da região; facilita a visualização da Amazônia como um todo, bem como das ameaças e pressões que pesam sobre ela. A RAISG é resultado da cooperação de oito organizações da sociedade civil que atuam em seis países amazônicos: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela.

Sobre o MapBiomas

O MapBiomas surgiu no Brasil como uma iniciativa multiinstitucional que reúne universidades, ONGs e empresas de tecnologia que se unem para contribuir com o entendimento das transformações do território brasileiro a partir do mapa anual de cobertura e uso da terra no Brasil. Atualmente, esta rede reúne mais de 70 instituições da América Latina e Indonésia em 7 iniciativas e 14 países comprometidos com a geração de dados, métodos, ferramentas e informações que orientem a conservação e a tomada de decisões em torno dos recursos naturais. Em agosto de 2021, o MapBiomas publicou a Coleção 7 de mapas de cobertura e uso da terra de solo do Brasil de 1985 a 2021. As ferramentas desenvolvidas pela rede MapBiomas para todas as suas iniciativas apresentam informações geradas com resolução espacial de no mínimo 30 metros. Os dados são processados ​​usando algoritmos de classificação automática por meio das informações da nuvem do Google Earth Engine. Clique aqui para acessar o site do MapBiomas.

Estudo do Imazon mostra grande avanço do desmatamento e da degradação florestal na Amazônia

Apenas em agosto, foram derrubados 1.415 km². Além disso, a degradação florestal causada pela extração de madeira e pelas queimadas cresceu 54 vezes

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Sobrevoo do Greenpeace em julho mostrou queimada em Rondônia (Foto: Christian Braga/Greenpeace)

Por Imazon

O desmatamento acumulado na Amazônia já chegou a quase 8 mil km² apenas em oito meses, sendo o maior dos últimos 15 anos. Segundo dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), somente em agosto foram derrubados 1.415 km² de floresta, uma área quatro vezes maior do que Belo Horizonte.

Outro problema foi a degradação florestal causada pela extração de madeira e pelas queimadas, que cresceu 54 vezes na região em relação ao mesmo mês do ano passado. A área degradada passou de 18 km² em agosto de 2021 para 976 km² em agosto de 2022, uma alta de 5.322%.

Além de ameaçar diretamente a vida de povos e comunidades tradicionais e causar perdas na biodiversidade, esse aumento na destruição também afeta a camada de ozônio e contribui para o aquecimento global em um momento de emergência climática. Por isso, neste Dia Internacional para a Preservação da Camada de Ozônio, é importante olhar para a floresta em pé como uma das soluções para proteger as populações das consequências desse desequilíbrio do clima, entre elas a maior frequência e intensidade de eventos extremos como secas e tempestades.

“Já passamos da metade do ano e o que vem acontecendo são recorrentes recordes negativos de devastação da Amazônia, com o aumento no desmatamento e na degradação florestal. E infelizmente temos visto ações insuficientes para combater esse problema”, lamenta a pesquisadora Bianca Santos, do Imazon.

SITE SAD JAN AGO 2008 2022 - Desmatamento na Amazônia chega a quase 8 mil km² em 2022, pior acumulado em 15 anos

Monitoramento da degradação pode ajudar no combate ao desmatamento

O instituto classifica como desmatamento quando a vegetação foi totalmente removida, o chamado “corte raso”, e como degradação florestal quando parte da mata foi retirada por causa da extração de madeira ou afetada pelo fogo. Por isso, é comum que uma área classificada como degradada seja posteriormente desmatada.

“Em muitos casos de áreas que sofrem degradação florestal por exploração madeireira, após a retirada total das espécies de valor comercial, é feita a remoção completa das árvores para destinar aquela área a outros tipos de uso, como por exemplo a agropecuária ou até para a especulação imobiliária, no caso da grilagem”, explica Bianca.

É por isso que monitorar também a degradação, e não apenas o desmatamento, é muito importante para a Amazônia. “Se os órgãos ambientais agirem para proteger as áreas degradadas recentemente, podem evitar que elas sejam desmatadas nos meses seguintes”, completa a pesquisadora.

Pará lidera no desmatamento e Mato Grosso na degradação

Apesar da área destruída na Amazônia em agosto deste ano ter sido 12% menor do que no mesmo mês de 2021, quando foram desmatados 1.606 km², Bianca alerta que é extremamente cedo para comemorar. Isso porque a devastação de 2022 foi a terceira pior para o mês de agosto desde 2008, quando o instituto implantou seu Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD). O segundo pior ano foi 2020, quando 1.499 km² de floresta foram postos abaixo.

SITE SAD AGO 2008 2022 - Desmatamento na Amazônia chega a quase 8 mil km² em 2022, pior acumulado em 15 anos

Os estados que mais desmataram em agosto foram Pará (647 km²), Amazonas (289 km²) e Acre (173 km²), que registraram respectivamente 46%, 20% e 12% de toda a derrubada na Amazônia.

“Nesses três estados, assim como nos outros que compõem a região, estamos identificando o avanço do desmatamento nas florestas públicas não destinadas. São áreas pertencentes aos governos dos estados ou federal que ainda não tiveram um uso definido, cuja prioridade estabelecida em lei é para a criação de novas áreas protegidas, como terras indígenas ou quilombolas e unidades de conservação. Porém, por essa falta de destinação, essas terras acabam sendo as preferidas dos grileiros, que as invadem com a expectativa de obter a posse”, afirma a pesquisadora.

Já o estado que teve a maior área de floresta degradada em agosto foi Mato Grosso (657 km²), o que representa 67% do registrado em toda a Amazônia. Pará (240 km²) e Acre (28 km²) ficaram em segundo e em terceiro, com respectivamente 25% e 3% das áreas degradadas na região.

Clique aqui para ver todos os dados de agosto
Saiba mais sobre o SAD aqui


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Este texto foi inicialmente publicado pelo Imazon [Aqui!].

Com aumento de queimadas, degradação pode ser ameaça à Amazônia

Pesquisadora do Climate Policy Initiative (CPI/PUC-Rio), Clarissa Gandour, explica como focos de fogo, que devem se tornar ainda mais frequentes entre agosto e setembro, geram degradação ambiental

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  • O desmatamento não é o único dano ambiental que afeta a Amazônia brasileira. A degradação florestal – a perda gradual de vegetação – é uma uma ameaça relevante à preservação da floresta. Ela afeta uma área bem maior do que o desmatamento em corte raso. Entre 2017 e 2020, o sistema Sistema de Detecção de Desmatamentos em Tempo Real (DETER) emitiu uma média de 17.000 quilômetros quadrados de alertas de degradação florestal por ano. Isso é quase o dobro da área desmatada anualmente medida pelo Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (PRODES) neste mesmo período.
     
  • As queimadas são uma das principais causas de degradação florestal na Amazônia. Entre 2017 e 2020, os alertas referentes a áreas queimadas na Amazônia representaram 70% da área degradada detectada pelo DETER. A ocorrência de fogo na Amazônia é mais comum no período de seca, com auge nos meses de agosto e setembro. Os números são preocupantes. Só no mês passado, dados do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (Inpe) mostram que o número de focos de incêndio foi 8% maior em relação ao mesmo período do ano passado.
     
  • O fogo não é um fenômeno natural em florestas tropicais em razão da alta umidade desse ecossistema. Isso significa que o fogo em florestas úmidas, como a Amazônia, resulta da ação humana. Em áreas já desmatadas, ele é tipicamente usado para eliminar remanescentes de biomassa no terreno ou como técnica de manejo agropecuário. O fogo também pode atingir áreas de floresta tanto devido a práticas intencionais quanto a vazamentos acidentais de queimadas em áreas já desmatadas.
     
  • Como florestas tropicais são úmidas, elas não queimam facilmente de uma só vez. O primeiro contato com o fogo consome a vegetação mais frágil e compromete a resiliência da remanescente, que se torna mais vulnerável a queimadas subsequentes. Ou seja, o fogo produz estragos não só durante a sua ocorrência, mas também nos anos posteriores.
     
  • O fogo torna a floresta menos resiliente a danos futuros, contribui para a perda de biodiversidade e afeta a capacidade de a floresta absorver e estocar carbono. Os incêndios também contribuem para o agravamento da crise climática, ao liberar toneladas de gás carbônico para a atmosfera.
     

Ao longo do mês de agosto, o CPI/PUC-Rio realizará uma campanha em suas redes sociais para trazer mais informações sobre #fogoflorestal e #queimadas. Confira no Twitter (CPI_PUCRio), LinkedIn (Climate Policy Initiative/PUC-Rio) e Instagram ( CPI_PUCRio).

Estudo alerta para zoonoses emergentes associadas ao desmatamento no Brasil

zoonosis-Brasil-996x567A doença de Chagas, transmitida por insetos, é uma das zoonoses presentes no Brasil. Um estudo constatou que sete estados brasileiros apresentam alto risco de apresentar surtos de zoonoses. Crédito da imagem: Agência Brasília/Flickr , licenciada sob Creative Commons 2.0

  • Pesquisa no Brasil alerta para fatores de risco para surgimento de nova pandemia
  • Estudo avaliou o risco de zoonoses nos 27 estados do Brasil usando um novo método quantitativo
  • O estudo descobriu que sete estão em alto risco de sofrer surtos de zoonoses.

Esse é o alerta publicado no Science Advances por pesquisadores brasileiros e portugueses após avaliarem o risco de zoonoses —transmissão de doenças , de animais para pessoas— nos 27 estados do Brasil usando um novo método quantitativo.

“Mudanças no uso da terra causadas principalmente pela expansão de economias orientadas para commodities sobre áreas naturais, em particular os setores agrícola e pecuário, são os principais impulsionadores do desmatamento, perda de biodiversidade e urbanização não planejada nos trópicos. Esses também são os principais fatores do aparecimento de doenças zoonóticas”, disse Gisele Winck, principal autora do estudo , ao SciDev.Net .

Com base em um modelo matemático, o método reuniu dados registrados entre 2001 e 2019 sobre os principais fatores históricos, ambientais e socioeconômicos de nove zoonoses de notificação obrigatória: Chagas, febre amarela, febre maculosa, leishmaniose cutânea e visceral, hantavirose, leptospirose, malária e Fúria. Ele então os aplicou para rastrear áreas com maior risco de surtos de doenças.

Assim, constataram que sete estados apresentavam alto risco de ocorrência de surtos de zoonoses (Acre, Amapá, Amazonas, Rondônia, Roraima, Maranhão e Mato Grosso).

Entre eles, um denominador comum é a presença de altos níveis de cobertura vegetal, maior número e variedade de mamíferos silvestres e grande distância dos centros urbanos. Dos demais estados, oito apresentaram baixo risco de zoonoses e 12, risco moderado.

Em relação aos pontos geográficos mais vulneráveis ​​para uma nova pandemia, Winck afirma que “as regiões do bioma amazônico são as mais preocupantes, pois possuem maior número de cidades isoladas, com pouca ou nenhuma vegetação e altos índices de destruição de suas biodiversidade”.

Entre os mamíferos pesquisados ​​estavam o veado-do-pantanal, o corço vermelho e marrom (guazuncho), o veado de cauda branca, o javali, o tatu, o morcego marrom, o gambá, entre outros. Eles identificaram mamíferos selvagens cuja caça, segundo eles, deveria ser supervisionada para evitar uma nova pandemia

Winck, do Laboratório de Biologia e Parasitologia de Reservatórios de Mamíferos Silvestres do Instituto Oswaldo Cruz (Rio de Janeiro), destaca que a caça, além de promover o desequilíbrio dos ecossistemas naturais, propaga doenças porque seus produtos dispensam a fiscalização sanitária.

“Embora a atividade seja legalmente permitida apenas para populações tradicionais, estima-se que milhares de toneladas de animais silvestres sejam caçados ilegalmente e comercializados em mercados populares, mesmo nos grandes centros urbanos”, detalha Winck.

“No nosso artigo identificamos mamíferos associados a uma maior diversidade de parasitas e patogénicos que são frequentemente caçados porque são abundantes e se aproximam das zonas de residência rurais e urbanas”, acrescenta.

“A pergunta a nos fazer não é se uma nova pandemia vai acontecer, mas quando vai acontecer. Se olharmos para a taxa de desmatamento e degradação florestal na Amazônia, não ficaria surpreso se a próxima pandemia explodir nessa parte do Brasil.”

Marcos Pedlowski, Centro de Ciências do Homem da Universidade Estadual do Norte Fluminense, Rio de Janeiro

Os autores da pesquisa apontam que a atual crise no Brasil é caracterizada pelo descaso com as evidências científicas e ataques às organizações conservacionistas, a flexibilização das leis ambientais e a substituição de mecanismos de promoção da conservação da biodiversidade por meio de políticas ambientais destrutivas.

Eles também destacam que a tendência ascendente nas taxas de desmatamento da Amazônia, 182% acima da meta de 2020, representa uma ameaça global. No final daquele ano, quase um terço do Pantanal, a maior área úmida tropical do mundo, queimou devido a um aumento anual de 508% na ocorrência de incêndios, em comparação com a média de 2012-2019.

“A pergunta a nos fazer não é se uma nova pandemia vai acontecer, mas quando vai acontecer. Se olharmos para a taxa de desmatamento e degradação florestal na Amazônia, não me surpreenderia se a próxima pandemia estourasse nessa parte do Brasil. Acho que as observações do artigo da Science Advances devem ser levadas muito a sério”, diz Marcos Pedlowski, que não participou da pesquisa.

Pedlowski, do Centro de Ciências do Homem da Universidade Estadual do Norte Fluminense, no Rio de Janeiro, destaca que apesar da grande possibilidade de que o avanço do desmatamento em direção a regiões ainda virgens da Amazônia acabe liberando patógenos ainda mais letais que o SARS-COV-2, as autoridades governamentais não reagem.

“É como se estivéssemos flertando com um desastre iminente, voando às cegas. Mas é preciso enfatizar que, se algo pior acontecesse, não seria por falta de estudos científicos sérios que alertem que isso pode acontecer se as regulamentações atuais não forem modificadas”, acrescenta o especialista.

Link para artigo na Science Advances


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Este texto foi escrito inicialmente em espanhol e publicado pela SciDev [Aqui!].

Amazônia: degradação da floresta remanescente pode emitir tanto ou mais carbono que o desmatamento

degradação

Em decorrência da ação humana, a maior floresta tropical do mundo já perdeu 30% de sua capacidade de reter CO2. Tema foi debatido em webinário promovido pela Aciesp em homenagem aos 60 anos da FAPESP (foto: Vinícius Mendonça/Ibama)

José Tadeu Arantes | Agência FAPESP – Desde o início deste século, a Amazônia já perdeu cerca de 30% de sua capacidade de reter dióxido de carbono (CO2), um dos principais gases de efeito estufa. Se for mantida a atual política, que favorece ou até mesmo promove o desflorestamento e a degradação das áreas remanescentes, essa capacidade pode zerar até o final da próxima década, com a Amazônia deixando de ser um sumidouro para se tornar um emissor de carbono.

O alerta foi feito pelo pesquisador David Montenegro Lapola, do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura da Universidade Estadual de Campinas (Cepagri-Unicamp), no dia 6 de julho, em webinário promovido pela Academia de Ciências do Estado de São Paulo (Aciesp) para celebrar os 60 anos da FAPESP.

Além do desflorestamento, há um outro fator de impacto, menos conhecido, que é a degradação da floresta remanescente. “Considerando a degradação por seca, a degradação por fogo, a degradação por corte seletivo de madeira e a degradação pelo chamado efeito de borda, de 4% a 38% da floresta remanescente já se encontra degradada, com emissões de CO2 equivalentes ou até maiores do que as das áreas desmatadas”, disse Lapola, enfatizando a necessidade de um novo paradigma de desenvolvimento capaz de reverter o curso da destruição e salvar a floresta.

Em março deste ano, na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP26), o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, declarou que o governo brasileiro havia escolhido ir além das leis e políticas existentes e se comprometia a eliminar o desflorestamento ilegal da Amazônia até 2028. No entanto, dados divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) indicam que, apenas no primeiro semestre de 2022, 3.971 quilômetros quadrados (km2) da Amazônia Legal foram destruídos. O desmatamento registrado em junho deste ano foi o maior para o mês desde que o instituto iniciou o monitoramento, em agosto de 2015. Aproximadamente 90% desse desflorestamento é desmatamento ilegal.

Os estudos mais consistentes mostram que conter o aquecimento global abaixo de 2 oC, preferencialmente em até 1,5 oC, comparativamente aos níveis pré-industriais, é a única maneira de evitar a catástrofe climática. E essa orientação foi consignada pelo Acordo de Paris, que entrou em vigor no final de 2016. Passados mais de cinco anos, porém, os dados mostram que estamos indo para um aumento de 3 oC, com uma notável irresponsabilidade de vários governos e a indiferença de boa parte da população.

A implementação das metas acordadas em Paris depende das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, conforme as letras iniciais da expressão em inglês) de cada país signatário do acordo. Na primeira versão da NDC brasileira, ainda de 2015, o país assumiu a meta de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa (GEE) em 37% até 2025 e em 43% até 2030, tomando como base as emissões de 2005. Na revisão da NDC, publicada no final de 2020, esses percentuais foram mantidos, mas os valores considerados como base de cálculo foram mais altos do que os utilizados na NDC original. Ou seja, não apenas deixou-se de melhorar as metas, como seria desejável, mas também foi embutido, sob os números apresentados, um aumento real das emissões. A promessa feita pelo ministro na COP26, de reduzir em 50% as emissões de GEE até 2030, não encontra, portanto, respaldo em medidas concretas.

A maior ameaça da história

Intitulado “Mudanças climáticas globais: seus impactos e estratégias de mitigação e adaptação”, o webinário organizado pela Aciesp teve o objetivo de apresentar e discutir o segundo capítulo do livro FAPESP 60 Anos: A ciência no desenvolvimento nacional.

A abertura foi feita por Adriano Andricopulo, diretor-executivo da Aciesp, Luiz Eugênio Mello, diretor científico da FAPESP, e Paulo Artaxo, integrante do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), vice-presidente da Aciesp e membro da coordenação do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG).

Além de Lapola, participaram como palestrantes Gabriela Marques Di Giulio, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP); Pedro Leite da Silva Dias, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da USP; e Mercedes Bustamante, do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Brasília (ICB-UnB).

As dimensões humanas das mudanças climáticas foram objeto da intervenção de Di Giulio, que tratou de como as sociedades devem estruturar suas políticas públicas para responder aos riscos sociais em curso. “Há uma necessidade de mudanças transformativas em todas as dimensões – principalmente de uma urgente substituição desse modelo predatório de espoliação da natureza por um modelo baseado na solidariedade, no respeito à diversidade biológica e na justiça social”, afirmou a pesquisadora, lembrando que, atualmente, há quase 35 milhões de brasileiros sem acesso à água tratada e cerca de 100 milhões sem acesso à coleta de esgoto.

“Outro desafio é o da segurança alimentar, neste momento em que o Brasil volta com muita força a estar presente no mapa da fome da Organização das Nações Unidas (ONU). Há mais de 125 milhões de brasileiros e brasileiras em insegurança alimentar e mais de 33 milhões em situação de fome”, informou.

Silva Dias tratou dos desafios da modelagem diante da extrema complexidade do sistema climático e das influências antropogênicas. “Há duas formas principais para entender os mecanismos responsáveis pela variabilidade do clima e o potencial papel do homem: a modelagem climática de um sistema extremamente complexo e a análise observacional do período e de estimadores do clima passado, o paleoclima. Os dois são complementares e devem caminhar juntos”, falou, destacando que é preciso cotejar e selecionar os melhores modelos, que sejam capazes de reproduzir bem o clima atual.

Bustamante associou dois processos extremamente importantes em curso, as mudanças climáticas e o declínio da biodiversidade, ressaltando que a elevação de cada fração de grau implica a intensificação dos eventos climáticos extremos, com múltiplos riscos, e que os impactos serão enormes se o aquecimento global exceder 1,5 oC. “O aquecimento global representa a maior ameaça à diversidade biológica na história humana”, disse.

A pesquisadora lembrou que o Brasil possui extraordinários ativos ambientais, que deveriam ser a oportunidade para uma nova agenda de desenvolvimento. Bem o contrário do que está sendo feito.

O webinário “Mudanças climáticas globais: seus impactos e estratégias de mitigação e adaptação” pode ser assistido na íntegra em: www.youtube.com/watch?v=0XEw7wATBWs.


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Este texto foi inicialmente publicado pela Agência Fapesp [Aqui!].

Levantamento inédito do MapBiomas Amazônia mostra que perda de florestas desde 1985 equivale a um Chile

Especialistas alertam que a Amazônia poderá alcançar o ponto de ruptura ainda nesta década se o ritmo de destruição persistir

Sobrevoo no Pará (Foto Marizilda Cruppe/Amazônia Real/17/09/20

Entre 1985 e 2020, a Amazônia perdeu 52% de suas geleiras e 74,6 milhões de hectares de sua cobertura vegetal natural – uma área equivalente ao território do Chile. No mesmo período houve um crescimento de 656% na mineração, 130% na infraestrutura urbana e 151% na agricultura e pecuária. Estas são algumas das principais conclusões de um mapeamento inédito do MapBiomas Amazônia que será apresentado nesta quinta-feira, 30 de setembro, por meio da plataforma youtube.com/raisg às 9h do Peru, Equador e Colômbia; 10:00 da Bolívia e Venezuela; e 11:00 do Brasil. A Coleção 3.0 de Mapas Anuais de Cobertura e Uso do Solo da Amazônia incorpora todo o bioma, desde os Andes, passando pela planície amazônica e alcançando as transições com o Cerrado e o Pantanal.

O mapeamento temporal do uso e cobertura de solo do bioma mostrou que se em 1985 apenas 6% da Amazônia havia sido convertidos em áreas antrópicas, como pastagens, agricultura, mineração ou áreas urbanas, em 2020, esse percentual quase triplicou, chegando a 15% de toda a região. O processo varia consideravelmente entre os países, sendo apenas 1% para Suriname, Guiana e Guiana Francesa e, no outro extremo, 19% no Brasil. Estudos recentes sugerem que a perda de 20-25% da cobertura florestal da Amazônia pode significar o ‘ponto de inflexão’ (ponto de ruptura) para os serviços ecossistêmicos da Amazônia. Se a tendência atual verificada pela MapBiomas continuar, essa virada poderá ser alcançada ainda nesta década.

Gerada por técnicos e especialistas de cada um dos países que integram a Amazônia a partir de imagens de satélite, esta terceira coleção de dados inclui novas classes de uso, como Mineração e Infraestrutura Urbana, além de mapas e dados sobre os vetores de pressão nas florestas e outras coberturas, como concessões de mineração, blocos de petróleo, estradas e usinas hidrelétricas. O objetivo é contribuir para o conhecimento da situação atual da região amazônica de forma integral – tanto das mudanças no uso do solo em toda a Amazônia como das pressões sobre suas florestas e ecossistemas naturais.

“Reconstruir a história de nossa Amazônia olhando as mudanças ano a ano em suas coberturas naturais, identificando perdas de coberturas tão importantes como geleiras e florestas em geral, nos ajuda a construir e propor estratégias de conservação mais precisas”, destaca Beto Ricardo, coordenador geral da RAISG. “A Coleção 3.0 do MapBiomas Amazônia mostra uma antropização profunda e rápida em curso na região”, afirma Tasso Azevedo, coordenador geral da MapBiomas. “Nos atuais mapeamentos do MapBiomas em toda a América do Sul este é um padrão marcante. Os dados são inestimáveis ​​para o entendimento da dinâmica de uso dos recursos naturais da região, além de contribuir para a modelagem climática e o cálculo das emissões e remoções de gases de efeito estufa devido às mudanças e uso do solo na região”, completa.
 
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Sobre Mapbiomas Amazônia

MapBiomas Amazônia é uma iniciativa liderada pela Rede Amazônica de Informações Socioambientais Georreferenciadas (RAISG) com o apoio do MapBiomas. Em 2019, lançou a Primeira Coleção, abrangendo o período de 2000 a 2017; em 2020, a Segunda Coleção, que cobre 1985-2018. Agora, após intenso trabalho dos integrantes da (RAISG) e colaboração técnica da equipe da MapBiomas Brasil, a Terceira Coleção abrange os 36 anos entre 1985 e 2020: https://amazonia.mapbiomas.org

São mais de 3 décadas de história de Ocupação e Uso de solo da Amazônia em mapas anuais de 1985 a 2020 com resolução de 30 metros. As informações do mapeamento são de livre acesso e download e compatíveis para todos os países da região. A plataforma oferece a possibilidade de visualização dos mapas em nível regional, nacional e até local, identificando as áreas cobertas por florestas, campos naturais, manguezais, agricultura, rios, entre outros, permitindo conhecer a situação da cobertura vegetal, bem como tendências, na unidade que se deseja trabalhar. Permite também entender a dinâmica das mudanças de uso da terra segundo recortes fundiários, como dentro e fora de uma Terra Indígena ou Área Protegida, graças ao fato de que a plataforma oferece não só mapas, mas também estatísticas apresentadas em tabelas e gráficos dinâmicos com as mudanças de uso no período que o usuário necessita.

A ferramenta de mapeamento do uso do solo foi desenvolvida pelo MapBiomas para ser aplicada inicialmente no Brasil. Para a totalidade do bioma amazônico, foi aprimorada com a contribuição das organizações membros da RAISG para adequar os resultados e análises à geografia de cada um dos países. Em particular, foi necessário levar em consideração as variações altitudinais típicas da Amazônia andina. Atualmente, a ferramenta de mapeamento MapBiomas inclui 28 classes, que vão desde geleiras andinas a formações florestais nas planícies amazônicas.

Sobre a Raisg

RAISG é a Rede Amazônica de Informações Socioambientais Georreferenciadas, um consórcio de organizações da sociedade civil dos países amazônicos voltado para a sustentabilidade socioambiental da Amazônia, com o apoio da cooperação internacional. A RAISG gera e dissemina conhecimento, dados estatísticos e informações socioambientais geoespaciais da Amazônia, elaborados com protocolos comuns para todos os países da região; tornou possível visualizar a Amazônia como um todo, bem como as ameaças e pressões que pairam sobre ela. RAISG é o resultado da cooperação de oito organizações da sociedade civil que atuam em seis países amazônicos: Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela. https://www.amazoniasocioambiental.org/es/

Sobre Mapbiomas

O MapBiomas é uma iniciativa multi-institucional que reúne universidades, ONGs e empresas de tecnologia que se uniram para contribuir para a compreensão das transformações do território brasileiro a partir do mapeamento anual da ocupação e uso do solo no Brasil. Em agosto de 2021, foi publicada a Coleção 6 de MapBiomas com mapas de cobertura e uso do solo do Brasil de 1985 a 2020. A ferramenta desenvolvida pela MapBiomas para todas as suas iniciativas disponibiliza informações geradas com resolução espacial de 30 metros. Os dados são processados ​​usando algoritmos de classificação automática por meio de informações na nuvem do Google Earth Engine. https://mapbiomas.org/