As ações do governo Bolsonaro confirmam que estamos diante de um executivo federal que está fortemente determinado a colocar o Brasil em um curso de irreversível recolonização, sendo os EUA o candidato favorito a ser a nossa nova metrópole tuteladora. Só assim para se entender a recusa em aceitar cerca de R$ 90 millhões oferecidos pelo G-7 para auxiliar no combate aos incêndios devastadores que estão hoje ameaçando áreas inteiras da Amazônia inteira.
O interessante é que o mesmo governo que trabalha para nos transformar em uma espécie de neocolônia estadunidense age para fazer parecer que a recusa do auxílio financeiro (pequeno e claramente insuficiente, diga-se de passagem) seria uma espécie de ato em defesa da soberania nacional que estaria ameaçada pelo presidente da França, Emmanuel Macron.
Nessa versão rocambolesca daquilo que eu já rotulei de “pirosoberania”, tivemos de ouvir o porta-voz da presidência da república, o general da reserva Otávio Santana do Rêgo Barros, que afirmou que sobre a Amazônia “falam os brasileiros e as Forças Armadas”. A afirmação do general porta-voz seria reconfortante se o exército brasileiro não estivesse ponderando liberar 25.000 recrutas por falta de recursos financeiros.
Mais expressiva dessa versão de defesa da soberania em relação às manifestações de Emmanuel Macron são os insistentes discursos do presidente Jair Bolsonaro no sentido de abrir a Amazônia para ser explorada diretamente pelos EUA. Aparentemente a intromissão na soberania só aparece mesmo quando a discussão gira em torno da proteção do meio ambiente e dos povos indígenas.
O problema para Jair Bolsonaro é que nem nos EUA a devastação da Amazônia tem apoio completo, com setores importantes se mobilizando neste momento para denunciar a devastação causada na região por uma combinação de omissão estatal que propiciou a ação livre de madeireiros, garimpeiros e grileiros. Pior ainda será a situação se o presidente Donald Trump for apeado do poder nas eleições presidenciais que ocorrerão em 2020 e for substituído por um democrata que se alinhe mais com a visão que emanada da maioria dos líderes do G-7.
Por isso, todos os arroubos discursivos que estão sendo cometidos por Jair Bolsonaro e seus ministros contra as posições enunciadas por Emmanuel Macron podem até ser apresentados como defesa da soberania nacional, mas não resolvem a questão essencial que é o fato de que o controle sobre a Amazônia, caso a devastação em curso continue sendo tolerada, passará inevitavelmente por um debate sobre os mecanismos de controle internacional.
Mas antes disso é possível que assistamos ao recrudescimento dos pedidos de boicote às commodities brasileiras vindas das áreas desmatadas na Amazônia. Quando isso acontecer, e vai acontecer, vamos ver como ficarão os membros do governo Bolsonaro que hoje posam de valentes e recusam a ajuda externa para combater a devastação que suas políticas anti-ambientais trataram de acelerar.
Finalmente, quero notar aqui o massacre sofrido pelo ministro (ou seria anti-ministro) do Meio Ambiente, Ricardo Salles, no programa Roda Viva que ocorreu no dia de ontem (26/08). A clara incapacidade de Salles em responder a questões básicas levantadas pela competente bancada de jornalistas e a insistência de se comportar como um “Rolando Lero” são a melhor expressão da eficiência das políticas anti-ambientais existentes no Brasil. Mas, mesmo assim, não deixa de ser lamentável notar a que ponto chegamos graças à presença de um personagem como esse à frente de uma área tão estratégica para o destino do Brasil.