Wladimir torna facultativo o uso de máscaras faciais, enquanto no HGG papel higiênico e vasos sanitários estão em falta

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Sob aplausos animados do Sars-Cov-2,  o prefeito Wladimir Garotinho, aqui em um aperto de mão caloroso com o presidente Jair Bolsonaro, decretou o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras faciais em ambientes abertos e fechados

Movido sabe-se lá por qual tipo de orientação, o prefeito Wladimir Garotinho decretou o fim da obrigatoriedade do uso de máscaras em ambientes abertos e, pasmem, fechados (ver imagem abaixo). Essa decisão vai de encontro às orientações de pesquisadores como a pneumologista da Fiocruz, Margareth Dalcomo, que considera a abolição do uso de máscaras como prematura em função do quadro vacinal insuficiente em todo o Brasil.

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O fato é que ao decretar do fim do uso obrigatório do uso da máscara em um momento em que a pandemia ainda não passou para o estágio de epidemia é meio que brincar com a saúde alheia. Além disso, ao decretar o uso de máscaras, o prefeito de Campos dos Goytacazes dá um sinal errado em uma cidade em que, especialmente sob sua direção, nunca houve um real controle da situação.

O resultado mais provável é que ao subestimar a real situação sanitária da cidade que governa, Wladimir acabe tendo um rebote da pandemia, sendo obrigado a adotar atitudes que irão além de retomar a obrigatoriedade do uso de máscaras.

Por outro lado, se a rede municipal de saúde estivesse em boas condições até se poderia compreender essa volúpia anti-máscara do prefeito. Mas o que ouvi hoje de uma pessoa com parente internada no Hospital Geral de Guarus (HGG) é que naquela unidade hospitalar municipal está faltando até papel higiênico, o que se soma ao fato de que banheiros estão fora de operação, obrigando uso de baldes (sim, isso mesmo, baldes) para fornecer a água de descarga. Além disso, o serviço de limpeza é, no mínimo, escasso, deixando as áreas de internação em condições muito aquém do desejável.

Em  outras palavras, se uma nova onda de contaminações atingir a cidade, poderemos voltar aos piores momentos da pandemia na cidade de Campos dos Goytacazes, com o HGG operando nas condições descritas acima. E se isto ocorrer, já sabemos a quem dirigir as perguntas sobre quem orientou a decisão de relaxar o uso das máscaras faciais.

Finalmente, o incrível é lembrar que os gastos anuais com a Secretaria Municipal de Saúde estão nas centenas de milhões de reais. Todo esse dinheiro, aparentemente, passa longe do HGG.


Esta postagem foi atualizada às 20:43 para aperfeiçoar o relato das condições dentro do HGG.

Abrasco aponta como perigosa a suspensão precoce de máscaras em espaços fechados na cidade do Rio de Janeiro

Suspensão das máscaras em espaços fechados: medida intempestiva que nega a realidade da pandemia

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Foto da arte: Rovena Rosa/Agência Brasil

A Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) considera precoce e intempestiva a medida anunciada pela Prefeitura do Rio de janeiro de suspender a obrigatoriedade do uso de máscaras em espaços fechados.

O Brasil e o mundo ainda se encontram em uma situação de pandemia, com imensas desigualdades no acesso as vacinas dentro e fora do país. Além disto, ainda não temos a real magnitude do incremento de casos provocados pelas aglomerações do feriado de carnaval, o que exige prudência e precaução até que possamos ter uma avaliação mais sólida da situação da pandemia no município do Rio de Janeiro, bem como na região metropolitana.

Nenhum município é uma ilha. Análises e decisões devem considerar o contexto local, mas também regional. Além disso, com o início das atividades escolares, é fundamental que sejam exigidos passaportes vacinais em todas as escolas (públicas e privadas), principalmente as que envolvem os segmentos com faixas etárias de 5 a 11 anos, uma vez que apenas 8,4% destas crianças possuem esquema vacinal completo. O reforço vacinal (3ª dose), atingindo apenas 42,3% da população, também caminha muito lentamente, fazendo com que a eliminação das medidas de proteção físicas (máscaras, distanciamento social e lavagem de mãos) se torne um ato precoce.

Não será negando a realidade que o Brasil poderá voltar ao normal, senão, ao contrário, enfrentando com responsabilidade e maturidade seus desafios sociais e sanitários, tendo como base os princípios da equidade no acesso às vacinas e da precaução na adoção de medidas de proteção.

Rio de Janeiro, 08 de março de 2022

Abrasco – Associação Brasileira de Saúde Coletiva

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Este texto foi publicado inicialmente pela Abrasco [Aqui!].

A internet, os idiotas da aldeia e o debate sobre as condições mínimas necessárias para a volta das aulas presenciais na Uenf

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Ao receber o título de doutor honoris causa em Comunicação e Cultura, na Universidade de Turim, o escritor e filólogo italiano Umberto Eco vaticinou que o “drama da internet é que ela promoveu o idiota da aldeia a portador da verdade. Normalmente, eles [os imbecis] eram imediatamente calados, mas agora eles têm o mesmo direito à palavra de um Prêmio Nobel. Antes, os idiotas da aldeia tinham direito à palavra em um bar e depois de uma taça de vinho, sem prejudicar a coletividade“.  Morto em 2016, Eco nem chegou a ver a ascensão ao poder de figuras como Donald Trump e Jair Bolsonaro que bem representam o resultado político da internet sobre o sistema político e, pior, sobre a vida política cotidiana em um sistema capitalista cada vez mais anti-democrático e injusto.

A lembrança a Umberto Eco me veio à cabeça assim que li alguns comentários postados em redes sociais sobre um assunto que virou matéria jornalística na cidade de Campos dos Goytacazes a partir das ações da Associação dos Docentes da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Aduenf) para denunciar a falta de condições para um retorno seguro às atividades presenciais (incluindo aulas) naquela que Darcy Ribeiro gostava de chamar de “Universidade do Terceiro Milênio”.

O aparecimento do assunto na forma de matéria jornalística foi o que bastou para uma pequena legião de “idiotas da aldeia” se pusesse em movimento para atacar os professores da Uenf com adjetivos pouco lisonjeiros, a começar por “vagabundos”.   E o pior que alguns desses que se deram ao trabalho de dirigir esses ataques foram ou ainda são estudantes da instituição, o que evidencia que não estamos fazendo o nosso trabalho de criar os profissionais com consciência cidadã que Darcy Ribeiro tanto desejou que a universidade do Terceiro Milênio formasse.

A questão é que se esses “idiotas da aldeia” se dessem ao trabalho de minimamente se informar sobre o que aconteceu dentro da Uenf desde o início da pandemia da COVID-19, eles saberiam que ao contrário do que eles andaram escrevendo, os professores da Uenf ralaram muito para manter a instituição funcionando remotamente.  A quantidade de aulas dadas, o número de reuniões de realizadas, as bancas de mestrado e doutorado realizadas? Nada disso interessa aos “idiotas da aldeia”, pois nada disso lhes interessa, pois o que vale mesmo é descarregar sua ira para os que são percebidos como “vagabundos”.

Entretanto, não culpa os “idiotas da aldeia” por serem tão assim, digamos, idiotas. Na verdade, a culpa é dos professores da Uenf que bancaram com seus salários corroídos pela inflação os custos de energia elétrica e serviços de internet que, ressalte-se, são inexistentes dentro da Uenf. É que dentro do campus Leonel Brizola, o que continua existindo é uma rede interna que não passa de uma “lesma lerda” quando comparada com aquelas que os professores contrataram a custo pessoal para seguirem pesquisando, orientando e dando aulas desde as suas casas. Tivessem eles se recusando a bancar os custos de trabalhar em suas casas, o mais provável é que os idiotas da aldeia os rotulassem da mesma forma que estão agora. 

Finalmente, não me preocupam os ataques dos idiotas da aldeia, pois estes refletem o ambiente de hostilidade política criada pelos que comandam o Brasil neste momento, e que se revezam em ataques cotidianos a tudo que lhes parece diferente. O que me preocupa é que passados dois anos de pandemia, e com muito trabalho duro realizado, os professores da Uenf não tenham conseguido expor tudo o que foi feito para que a instituição possa voltar a ter aulas presenciais como se nada tivesse feito para evitar a descontinuidade de nossas atividades essenciais.

 

Campos dos Goytacazes: TJ suspende decisão pró-proprietários de escolas que autorizava aulas para crianças não vacinadas

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Em uma decisão que eu já esperava, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro cassou a liminar expedida pela justiça de Campos dos Goytacazes que autorizava o início das aulas para crianças ainda não vacinadas contra a COVID-19 (ver imagem abaixo).

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Um ponto que merece ser ressaltada é a observação pelo juiz Celso Luiz de Matos Peres é o que aponta para um fato elementar, qual seja, a “nítida pretensão por parte do Ministério Público no sentido de influenciar e ditar, não só as políticas municipais de saúde, bem como as políticas educacionais locais, sendo consistente e razoável a argumentação expendida pelo ente público recorrente“. Além disso, o meritíssimo observou outro aspecto elementar afirmando que “observo que as medidas prudenciais adotadas pelo agravante (i.e., a Prefeitura Municipal de Campos dos Goytacazes (PMCG))  se justificam plenamente, até porque não vislumbro prejuízo substancial ao ano letivo com a postergação do início das aulas para o dia 07/03/2022..”

Trocando em miúdos, o juiz Celso Luiz de Matos Peres assinalou a inapropriada interferência do Ministério Público em duas áreas de competência da PMCG, quais sejam, as políticas de saúde e educacionais; além de observar algo óbvio que não haverá prejuízo pedagógico substancial para a postergação do semestre letivo para depois do Carnaval.

Aos proprietários das escolas que se moveram para literalmente forçar a reabertura dos seus estabelecimentos em momento de franca expansão da variante “Ômicron” restará recorrer dessa decisão em instância superior ou reconhecer o óbvio para seguir a decisão em nome da saúde de seus empregados e clientes.

No enfrentamento da pandemia, os trânsfugas da esquerda são aliados preferenciais do negacionismo

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Em meio ao debate sobre a volta às aulas presenciais, em meio ao agravamento da disseminação da variante “ômicron” que é considerada como mais nociva às crianças e não vacinados, tenho visto posicionamentos vindos de dentro das fileiras acadêmicas que se assemelham muito ao que vejo saindo do interior da redes de robôs negacionistas que comandam a sabotagem contra os esforços para acabar com a pandemia da COVID-19 no Brasil.

Entre as pérolas ditas por esses “intelectuais” é uma que equivale  a ação dos sindicatos docentes que cobram a cobertura vacinal de docentes e estudantes como condição para a volta às aulas presenciais como um exemplo de preguiça sindical.  Além disso, como cobertura desse “bolo” ainda aparecem frases de efeito como “já passou a hora de voltarmos às aulas presenciais” que, não raramente, são ditas por profissionais cuja presença em sala de aula é, digamos, rara.

Como alguns desses membros das fileiras acadêmicas já tiveram alguma pretensão de serem de “esquerda”,  não posso deixar de considerar que muitos dessas figuras estão jogando o papel de trânsfugas em meio a uma guerra contra um vírus assassino, apenas para explicitar a sua ojeriza ao papel dos sindicatos na defesa da segurança de seus membros, mesmo que discursivamente adotem um tom crítico do status quo. Nesse sentido,  essas figuras acabam ocupando por opção própria o papel de colunas preferenciais de sustentação do negacionismo oficialista que continua jogando pesado contra o acesso às vacinas contra a COVID-19, seja pela disseminação de propagandas pagas com o dinheiro público para disseminar o medo e a negação, seja pela demora na compra e disseminação das mesmas.

A questão é que em minha experiência de mais de duas décadas como docente de uma universidade pública,  já vi várias vezes, esses mesmos trânsfugas ocupando a cabeça das filas que se formam para auferir os direitos conquistados pelas lutas organizadas pelos sindicatos e pelos “membros preguiçosos” da sua própria categoria. Penso que seria mais coerente que depois combater a ação organizada dos sindicatos, se negassem a receber o fruto das lutas organizadas por eles.  Entretanto, a partir do que vivenciei no meu próprio sindicato, parece mais fácil que esses trânsfugas, mesmo após atrasarem as mensalidades sindicais, continuem se refestelando com os frutos  da luta alheia.

Então qual é o moral da história? É que os pós-pandemia demandará um devido ajuste de contas com aqueles que escondidos pelo verniz acadêmico estão atuando para desmantelar os instrumentos de resistência da classe trabalhadora brasileira. Sem esse ajuste me parece que continuaremos a ter que conviver não apenas com os bolsonaristas raiz, mas com um séquito de ex-esquerdistas que com seus discursos bonitos dão sustentação ao Bolsonarismo.

Por que será que no pior momento da pandemia para as crianças, proprietários e MP querem reabrir escolas campistas?

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Venho assistindo com um misto de curiosidade e preocupação o movimento encabeçado por donos de escolas privadas e pelo Ministério Público para forçar o início das aulas para crianças não vacinadas em Campos dos Goytacazes. É que esse movimento opta por desconhecer um fato já apontado por pesquisadores e médicos: vivemos o pior momento da pandemia da COVID-19 para as crianças até 12 anos que fazem parte do grupo de não vacinados contra a infecção pelo novo coronavírus!

A razão para essa “pressa” não me parece estar ancorada em uma preocupação pedagógica, mas sim econômica. É que, por algum estranho motivo, não vi grandes movimentos por parte dos operadores do sistema privado de ensino para estabelecerem calendários que levem em conta os riscos que continuam postos não apenas para os profissionais que atuam nas escolas, mas principalmente para as crianças que estão sendo empurradas para escolas em meio a um agravamento da pandemia entre os mais jovens não vacinados.

Como está noticiado que foi proferida uma liminar em prol dessa demanda que me parece desfocada dos reais interesses das crianças, a minha expectativa é que o setor jurídico da Prefeitura Municipal de Campos dos Goytacazes aja para derrubá-la em instâncias superiores.

Finalmente, aos pais que estão neste momento, como eu, diante da decisão de recolocar seus filhos nas escolas sem que eles estejam vacinados, eu diria que deveriam se preocupar muito com o que pode acontecer caso os piores cenários de contaminação se confirmem. É que com UTIs em ritmo crescente de lotação, talvez seja melhor aguentar um pouco mais com as crianças em casa do que ceder aos apelos dos donos de escolas que,tudo indica, estão pensando nos cifrões primeiro do que na segurança de seus empregados e clientes.

Mortes por COVID-19 no Brasil, subnotificação é o teu nome

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Com um número “oficial” em torno de 628 mil mortes por COVID-19, o Brasil continua firme na posição de segundo país com mais mortes causadas pela doença gerada pela infecção com o novo coronavírus. O problema é que esse número está aquém do número real, visto a sabotagem governamental não apenas no combate à COVID-19, mas também na contagem dos contaminados e mortos. Há que se observar que subnotificação é uma característica do sistema de controle de doenças no Brasil. Apenas para se ter uma noção do problema, a intoxicação por agrotóxicos tem uma subnotificação de 50:1 (isto é, para cada caso notificado, outros 50 ficam sem ser devidamente registrados).

O interessante (na ausência de melhor palavra) é que existem poucas menções à deformação das estatísticas oficiais em torno da COVID-19. É como se os números precários divulgados pela mídia corporativa fossem os corretos, o que claramente não o é.  Apenas como referência, uma pesquisa do Datafolha em janeiro dá conta que os casos oficiais de contaminação por COVID-19 seriam apenas metade do que efetivamente aconteceu. Se isso for verdade, e a taxa de mortes seguir algo aproximado, chegaremos facilmente a 1 milhão de mortes que foi previsto pelo Imperial College de Londres logo no início da pandemia em 2020. O neurocientista Miguel Nicolelis, uma das poucas vozes que continuam alertando para a contínua gravidade da pandemia no Brasil, pontuou recentemente a possibilidade de que a subnotificação das mortes por COVID-19 “poderia ser alta” ( ver imagem abaixo).  Há ainda que se citar um estudo feito pela Fiocruz em 2021 justamente sobre as disparidades regionais dos impactos da pandemia.

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Da minha parte, considerando o espalhamento vertiginoso da variante “Ômicron” não tenho como deixar de deixar de apontar que não apenas a subnotificação de casos é alta, mas também a de mortos. As razões para essa consideração é que o processo de testagem no Brasil continua sendo precário, enquanto que o número de pessoas não vacinadas ou vacinadas de forma parcial continua sendo muito alto, o que possibilita a manutenção da pandemia em níveis graves, afetando especialmente os mais pobres em meio ao agravamento do processo de fome resultante das políticas ultraneoliberais do governo Bolsonaro.

Mas se olharmos para toda a movimentação político-partidária que está ocorrendo no âmbito das tratativas para alianças para as eleições que deverão ocorrer em 2022, o debate sobre continuidade da pandemia e seus efeitos devastadores sobre os brasileiros, especialmente os da classe trabalhadora, claramente não é uma das prioridades. A verdade é que essas articulações estão sendo feitas enquanto as lideranças políticas, incluindo aquelas que se dizem de esquerda, tropeçam sobre a multidão de cadáveres das vítimas das políticas negacionistas do governo Bolsonaro em relação à pandemia da COVID-19.  E é graças à omissão dessa situação que Jair Bolsonaro ainda continua sendo um candidato com chances viáveis de chegar ao segundo turno e até vencer as eleições presidenciais deste ano.

E é aí que a porca torce o rabo. Por que está se deixando passar a impressão de que a pandemia é uma etapa quase vencida no Brasil? Além disso, por que não está se discutindo os efeitos não apenas sanitários da pandemia, mas principalmente econômico sobre centenas de milhares de famílias que perderam seus provedores de renda não para o desemprego, mas para a COVID-19? Uma das principais consequências da característica etária dos mortos por esta doença é que um número considerável era de aposentados que eram o único aporte de renda para suas famílias. Ao não se fazer o debate sobre essa situação, o que se está  sinalizando é que as famílias atingidas serão deixadas ao léu por quem quer que seja que se eleja. E este me parece ser já o principal fato político desse início de corrida eleitoral.

À luz do que disse acima, me parece fundamental que a questão da subnotificação de contaminados e mortos pela COVID-19 seja colocado como elemento prioritária por aqueles que desejem que a corrida eleitoral tenha um mínimo de conexão com a realidade, sob pena de colaboração com o genocídio que está efetivamente em curso contra os brasileiros pobres.

Um breve relato pessoal sobre meu tour em uma sociedade pandêmica

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Em visita às Cataratas do Iguaçu, uma multidão aglomerada mas, felizmente, portando máscaras faciais

Após viver praticamente dois anos em um alto grau de isolamento por causa da pandemia da COVID-19, estou, por assim dizer, na estrada desde 21 de dezembro, tendo dirigido cerca de 4.000 km por três estados brasileiros, com direito uma breve visita ao Paraguai. Durante todo esse tempo, usei duas máscaras faciais (uma cirúrgica e outra de pano) e frequentei todo tipo de lugar superlotado. O detalhe é que sai de Campos dos Goytacazes tendo recebido 3 doses de vacinas contra a COVID-19.

Ao longo desse tempo, em que logrei não contrair o vírus visitei locais super lotados, incluindo hotéis, restaurantes e pontos turísticos. Antes, durante e depois de entrar em contato com um alto número de pessoas, higienizei as mãos e tomei banho após ir a locais especialmente lotados de pessoas, incluindo uma ida a Ciudad del Leste, onde inexistia qualquer controle na entrada e saída da fronteira brasileira. Afora isso, usei estratégias de distanciamento naqueles locais em que tive que retirar as máscaras que utilizava. Aliás, neste viagem trouxe um número alto de máscaras de pano e caixas de máscara cirúrgicas para poder trocar sempre a proteção, evitando que tenha de portar unidades que estejam “cansadas”.

Agora que apontei meus cuidados pessoais, quero compartilhar um pouco do que vi em relação às pessoas com quem interagi e os locais em que estive. A primeira coisa que me pareceu importante é que nos três estados que passei (Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná), há uma alta disposição das pessoas sobre portar máscaras faciais e utilizar produtos de higienização. Além disso, os trabalhadores com quem tive contato mostraram alto grau de disciplina sobre a necessidade de adotar padrões de segurança pessoal, tendo sido orientado sobre as medidas de higienização na maioria dos locais onde passei.  Nesse sentido, há que se reconhecer que a batalha da comunicação não foi tão perdida como é relatado pela mídia corporativa por “especialistas” convocados pelas grandes emissoras. Para mim, a coisa não está e não foi pior porque a maioria das pessoas já entendeu o risco de se estar contaminado com o coronavírus. Em um país com diferenças sociais colossais como é o caso do Brasil, isto não me parece pouca coisa.

Nomeando os que resistem contra as medidas de prevenção

wp-1642255524972Em um ônibus turístico lotado com pessoas portando máscaras houve quem preferisse ignorar os protocolos de segurança apresentados no início do trajeto

Um detalhe que me parece ser revelador acerca de onde está a resistência para enfrentarmos a pandemia é o comportamento de parte das pessoas, as quais não são em sua maioria os mais pobres. Nos locais que frequentei os que se recusavam a adotar a máscara facial eram sempre aqueles que portavam roupas de grife, com aquele jeitão inconfundível que os membros da classe média possuem.  A resistência ao cuidado coletivo não vem dos mais pobres como se parece acreditar, mas de pessoas que têm toda a condição de entender o impacto de suas ações individualistas, mas optam por não considerar o risco que causam para si e para os outros.

Por outro lado, a partir do que vi, considero que a falta de controle sobre grandes estabelecimentos e os operadores privados de locais públicos é um dos facilitadores da disseminação do coronavírus. É que quanto maior era o tamanho do empreendimento maior era o descontrole, incluindo pontos turísticos que continuavam aglomerando milhares de pessoas em meio ao início da disseminação da variante “ômicron”.  Nesse tipo de empreendimento a ausência quase completa da vigilância sanitária era óbvia, ficando os cuidados por conta “do cliente”.  Com isso, cai por terra qualquer argumento no sentido de que os capitalistas vão cuidar dos seus clientes, pois o que conta mesmo é a garantia do lucro instantâneo.

Duas rápidas observações sobre vacinas e testes

Notei que a maioria das pessoas com quem propositalmente interagi acerca das vacinas apoia a vacinação e estava vacinada.  Isso me mostra que todo o esforço do governo federal, principalmente do presidente Jair Bolsonaro, não logrou convencer uma parcela significativa da população.  Isso também explica porque em um estado que votou maciçamente em Jair Bolsonaro em 2018, o Paraná, não notei qualquer apoio público às manifestações anti vacina do presidente da república. 

Um detalhe é que fui perguntado em incontáveis vezes sobre a eficiência das vacinas e a importância de se completar o esquema vacinal.  Em todos esses casos havia dúvidas sobre a eficiência, mas nada que refletisse a postura negacionista de Jair Bolsonaro.

Além disso, verifiquei “in loco” que as pessoas estão acorrendo aos postos de testagens quando suspeitam que podem ter sido contaminadas pelo coronavírus, fato que explicita o grave equívoco que tem sido a não disponibilização de um amplo processo de testagem no Brasil. Tivéssemos tido testagem em massa, o mais provável é que não o Brasil não haveria alcançado o macabro número de mais de 620 mil mortos pela COVID-19.

Resumo da ópera

É forçoso reconhecer que estamos em meio a mais uma forte onda de contaminações do coronavírus no Brasil, muito em parte pelo alto grau de contágio propiciado pela variante ômicron. Entretanto, considero que a situação poderia ser ainda muito pior se uma parcela significativa da população não tivesse aderido aos parcos protocolos de segurança adotados no país.  

O importante é identificar que a grande parcela de culpa sobre o quadro assumido pela pandemia no Brasil deve recair sobre o presidente da república, um negacionista científico declarado, e de toda a sua equipe de governo que permitiu que ele agisse da forma que agiu e continua agindo. 

Mas não se pode desconhecer daquelas parcelas do capital que estão fortemente associadas ao governo Bolsonaro que se comportam de forma oportunista e irresponsável em meio à essa catástrofe humana que estamos vivenciando por causa da COVID-19.  Um necessário ajuste de contas terá que ser feito com esses segmentos, pois grandes e médios empresários ajudaram conscientemente a agravar a pandemia, apenas para manter seus lucros rolando.

Finalmente, considero que é importante ressaltar que a pandemia causou sim uma forma de aprendizagem sobre a importância do conhecimento científico e do Sistema Único de Saúde (SUS). Esse aprendizado poderá ser útil para a retomada dos direitos que os últimos anos de desmanche do estado brasileiro que foi o resultado mais objetivo do golpe parlamentar de 2016 contra a ex-presidente Dilma Rousseff. 

Antes que me esqueça, estou chegando em casa sem ter contraído o coronavírus. Considero isso o resultado da combinação de meus cuidados pessoais com o fato de ter completado meu esquema vacinal com a terceira dose antes de sair de Campos dos Goytacazes. Somado a isso, o fato de ter desafiado as estatísticas e não ter me contaminado nos locais onde tive de retirar as máscaras de proteção. Por isso tudo, recomendo que todos se vacinem e se mantenham disciplinados no tocante ao uso dos equipamentos de proteção.

Rastreando a próxima pandemia na Amazônia

Na floresta amazônica, cientistas estão procurando outros patógenos que podem se espalhar de animais para humanos

mosquitoOs mosquitos da febre amarela (Aedes aegypti) também podem transmitir o vírus Zika. Foto: dpa/AP/Felipe Dana

Por Norbert Suchanek para o “Neues Deutschland”

Desde o final do ano passado, a variante ômicron do Covid-19 vem se espalhando pelo mundo na velocidade da luz. Também no Brasil, onde as infecções voltaram a subir desde a virada do ano. Mas pesquisadores brasileiros alertaram no ano passado para outro vírus que pode ser transmitido de animais para humanos, o vírus Mayaro. Não é uma questão de saber se, mas quando outra epidemia vai eclodir.

Os virologistas consideram a floresta amazônica em particular, com sua riqueza de espécies, como um gigantesco reservatório de patógenos que podem desencadear zoonoses semelhantes à Covid-19. Desmatamento, invasão de estradas e assentamentos, mineração e garimpo ilegal de ouro, invasão agrícola e construção de barragens estão colocando um número cada vez maior de pessoas em contato com esses patógenos potenciais que circulam não apenas em morcegos, mas também em pássaros, macacos e outros animais vertebrados da região. floresta tropical.

O epidemiologista Felipe Gomes Naveca alertou no ano passado que o vírus Mayaro, ainda pouco estudado, é um candidato promissor para a próxima epidemia grave no Brasil e além. O vice-diretor de Pesquisa do Instituto Fiocruz Amazônia em Manaus e sua equipe na Amazônia estão no rastro de potenciais desencadeadores de pandemia.

O vírus Mayaro, que pertence aos alfavírus, circula na natureza principalmente em vertebrados arbóreos, como macacos, e até agora foi transmitido principalmente pelo mosquito hemagogo (Haemagogus janthinomys) encontrado nas florestas tropicais da América Central, Amazônia e Caribe. Outras espécies animais como roedores, marsupiais, pássaros e até jacarés também podem ser portadores do vírus.

Sabe-se desde 1954 que esse alfavírus pode infectar humanos e desencadear o que é conhecido como a febre Mayaro. Os cientistas descobriram o patógeno no sangue de trabalhadores florestais infectados na província de Mayaro, na ilha caribenha de Trinidad, e o nomearam em sua homenagem. Os doentes sofrem de sintomas semelhantes aos da gripe, como febre, erupções cutâneas, vômitos, diarréia, dor de cabeça, dores musculares e articulares, que podem durar várias semanas, em alguns casos até meses. Como o vírus Chikungunya ,  o Mayaro também pode causar doenças reumáticas.

No Brasil, o primeiro surto de febre Mayaro foi relatado em 1955 no estado do Pará (sudeste da Amazônia). Desde então, também foram registradas infecções pelo Mayaro na Guiana Francesa, Bolívia, Peru, Suriname, Argentina, Colômbia, Venezuela, Tobago e Haiti. Na capital amazônica de Manaus, mais de 30 pessoas adoeceram com o vírus Mayaro em 2011. Estudos recentes indicam que esse alfavírus também está se espalhando para regiões fora da Amazônia, pois já foram encontradas pessoas com o  Mayaro no sangue nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo.

Em 2019, um total de 901 infecções em seres humanos causadas pelo Mayaro foram relatadas na América Latina e no Caribe, segundo cientistas da Universidade George Washington e da Organização Pan-Americana da Saúde. As mortes não são conhecidas até o momento. No entanto, como a febre Mayaro é clinicamente indistinguível das doenças da dengue ou chikungunya, os pesquisadores assumem um número desconhecido de casos diagnosticados erroneamente e não relatados.

O vírus Mayaro é considerado particularmente perigoso porque possui uma alta taxa de mutação e notável flexibilidade genética. Isso aumenta a probabilidade de adaptação a novos hospedeiros. Por outro lado, experimentos de laboratório mostraram que outras espécies de mosquitos, em particular o mosquito da febre amarela urbana (Aedes aegypti) e o mosquito tigre asiático (Aedes albopictus) , também podem transmitir o alfavírus da Amazônia. Se isso realmente acontecer, seria um colapso epidêmico. Porque o vírus pode saltar de seu ciclo na floresta tropical para as cidades mesmo fora de sua área de distribuição anterior.

O mosquito da febre amarela, que provavelmente foi introduzido com o tráfico de escravos nos séculos XVI e XVII, hoje é encontrado em todas as cidades do Brasil e já provocou várias epidemias de Dengue, Zika e Chikungunya nas metrópoles do país. O mosquito tigre, originário da Ásia que está circulando no Brasil desde a década de 1980, também pode transmitir esses perigosos patógenos, mas prefere áreas rurais, subúrbios mais arborizados e parques urbanos. Caso o Aedes aegypti e o Aedes albopictus realmente se tornassem portadores do vírus Mayaro, milhões de pessoas estariam ameaçadas, não só no Brasil.

O Aedes aegypti, também conhecido como mosquito tigre egípcio, está agora distribuído mundialmente nos subtrópicos e trópicos e também atingiu o sul da Espanha, Grécia e Turquia. Originalmente restrito ao sul e sudeste da Ásia, o mosquito tigre asiático agora está difundido na África, nos EUA e no sul da Europa.

Até o momento, não há vacina, medicamento ou terapia preventiva para o vírus Mayaro. Evitar picadas de mosquito continua sendo a única prevenção. Em última análise, proteger os biomas brasileiros e frear o desmatamento da floresta amazônica é uma das medidas mais importantes para evitar novas pandemias, afirma a cientista da Fiocruz Alessandra Dales Nava, do Laboratório de Ecologia de Doenças Transmissíveis da Amazônia.

Algumas “boas” notícias, pelo menos para pessoas que já sobreviveram à chikungunya, vêm de um estudo em ratos de laboratório publicado em novembro passado. Os roedores infectados com chikungunya desenvolveram imunidade parcial ao vírus Mayaro. Mas quem quer contrair o chikungunya para ficar imune à febre Mayaro?

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Este texto foi escrito originalmente em alemão e publicado pelo jornal “Neues Deutschland” [Aqui!].

Agência Aids promove webinário “40 anos de Aids no mundo: o que fizemos, o que falta fazer?

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Amanhã – 1º de dezembro, no Dia Mundial de Combate à Aids, a Agência Aids reúne especialistas para discutir essas quatro décadas de enfrentamento da pandemia da Aids, no Brasil e no mundo, que infectou 37,6 milhões de pessoas ao redor do planeta.

“Considero muito importante promovermos a reflexão de profissionais e ativistas, um time de primeira linha, sobre os 40 anos da pandemia no Brasil e no mundo. Construímos sim muitos avanços, mas seguimos tendo complexos e presentes desafios”, diz Roseli Tardelli, fundadora da Agência e curadora do webinário.

O webinário, que mostra a mudança dos tempos e das nomenclaturas do HIV e Aids, abordará quatro temas:

9h30: Surgimento do HIV, os primeiros 10 anos…infectar-se com HIV: uma sentença de morte! Com Dra. Rosana Del Bianco (Médica infectologista do Emílio Ribas desde 1984 época do primeiro caso internado com Aids); Dra. Marinella Dela Negra (supervisora de equipe técnica do Instituto de Infectologia Emílio Ribas); e Dra. Glória Brunetti (Médica infectologista do Instituto de Infectologia Emílio Ribas).

Mediação: Américo Nunes Neto – fundador do Instituto Vida Nova, coordenador do Movimento Paulistano de Luta contra a Aids (Mopaids) e ex-presidente do Fórum das ONG/AIDS do Estado de São Paulo.

11h30 – Entrada dos antirretrovirais no cenário Global: o desafio da adesão tema presente nos 40 anos. Com Dra. Maria Clara Gianna (CRT Aids de SP); Veriano Terto (ABIA)

Mediação: Fabi Mesquita – monitora em incidência internacional da Rede Mundial de Pessoas Vivendo com HIV e representative of Peace Women Partners International Council of Leaders – representando Brazil e Myanmar.

14h30 – Ativismo no Brasil fundamental na construção da resposta brasileira. Com a participação de Rodrigo Pinheiro (Fórum Ongs Aids de SP); Javier Angonoa (consultor independente com trabalhos para Unaids/Unicef, GAPA Bahia); e Alessandra Nilo (Gestos Pernambuco).

Mediação: Marina Vergueiro – autora do livro “Exposta”, que dá voz às mulheres gordas e/ou que vivem com HIV e são sexualmente ativas.

16h30: Da Camisinha a PrEP: Novas tecnologias de prevenção e o estigma que persiste. Com: Drew Persí (Youtuber, coautor do Som das Décadas); Carué Contreiras (médico e ativista); e Dra. Adele Benzaken (membro do comitê de certificação da eliminação da sífilis e do HIV da OPAS-Organização Pan-Americana de Saúde e vice-presidente do comitê de especialistas da OMS).

Mediação: Juny Kraiczyk – diretora geral da ECOS e pesquisadora do Núcleo de Pesquisa em Direitos Humanos e Saúde LGBT da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.

O webinário 40 anos de Aids no mundo: o que fizemos, o que falta fazer?será apresentado pelo Youtube da Agência Aids – https://www.youtube.com/c/AgenciaAids

 

Webinário “40 anos de Aids no mundo: o que fizemos, o que falta fazer?”

Dia – 1º de dezembro    Horário – 9h30 às 18h

Canal do Youtube da Agência Aids –https://www.youtube.com/c/AgenciaAids

Fonte – Roseli Tardelli – fundadora da Agência Aids e curadora do webinário