Estudo mostra que descumprimento da proteção da reserva legal no Cerrado está concentrado nos latifúndios

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A devastação do Cerrado pela expansão da monocultura da soja é um dos principais agravadoras da crise hídrica no Brasil

Uma das chamadas “mentiras favoritas” que figuras ligadas ao governo Bolsonaro (por exemplo o agrônomo Evaristo Miranda e a ministra da Agricultura Tereza Cristina (DEM/MS)) gostam de propalar é que há um grande compromisso por parte dos grandes proprietários rurais com o desenvolvimento sustentável da agricultura de exportação do Brasil. 

Pois bem, um estudo realizado por pesquisadores do Serviço Florestal Brasileiro e da Universidade de Brasília e que acaba de ser publicado pela revista “Caminhos da Geografia” sob o título “Regularidade Ambiental das Áreas de Reserva Legal do Cerrado Brasileiro” mostra que a banda não toca como propalam os aliados do latifúndio agro-exportador. 

É que a partir de um exaustivo levantamento de dados dados do Cadastro Ambiental Rural, obtidos diretamente no banco de dados do Sistema de Cadastro Ambiental Rural (SICAR),  que compreendiam as informações públicas dos cadastros de imóveis rurais registrados no sistema em 31 de dezembro de 2019 acerca da situação dos imóveis rurais sobre situação do cadastro, perímetro do imóvel rural, área do imóvel rural e área de Reserva Legal em quaisquer de suas modalidades (“proposta”, “averbada” e “aprovada e não averbada”). 

Os resultados encontrados pelo estudo apontam que o “balanço entre o déficit e o superávit de Reserva Legal dentre os imóveis que delimitaram Reserva Legal no CAR resulta em um déficit de 2.562.332,44ha, demonstrando que o mecanismo de compensação de Reserva Legal é insuficiente para solucionar todo o déficit identificado”. E mais explicitamente que o principais causadores deste déficit são as grandes propriedades rurais que, apesar de serem em menor percentual, controlam mais de metade da terra (ver figura abaixo).

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Bioma Cerrado(Brasil): Distribuição do número de imóveis (a) que cumpriram o percentual mínimo de RL, bem como a área da RL correspondente (b), entre as pequenas, médias e grandes propriedades e posses rurais, 2020

Um dado que elucida os limites da falácia governamental de que a legislação existente já garante o funcionamento de uma agricultura “sustentável” é o que aponta para a existência de  déficit de 2.562.332,44ha nas áreas delimitadas com reserva legal, fato esse que demonstra que esse mecanismo de compensação é insuficiente para solucionar todo o déficit identificado. Em outras palavras, de sustentável essa agricultura baseada na devastação do bioma do Cerrado que estamos vendo não tem nada.

Chico Rodrigues, o senador do dinheiro na cueca, defende garimpos em terras indígenas e o fim da reserva legal

rodriguesPego com dinheiro na cueca, o senador Chico Rodrigues (DEM/RR) defende a liberação dos garimpos em terras indígenas e a extinção das reservas legais em propriedades rurais. Moreira Mariz/Agência Senado. Fonte: Agência Senado

Em uma prova de que não há acidente nas relações publicamente amáveis entre o presidente Jair Bolsonaro e o agora envergonhado senador Chico Rodrigues (DEM/RR), fontes confiáveis da área ambiental o apontam como um ardoroso militante das causas anti-ambiente, incluindo a defesa dos garimpos ilegais em terras indígenas e do avanço do desmatamento.

No vídeo abaixo produzido pela TV Senado, Rodrigues dá vazão às teses que negam a dimensão da catástrofe ambiental em curso na Amazônia, bem como utiliza o mesmo tipo de nacionalismo canhestro para negar o direito da comunidade internacional em se preocupar com as questões ambientais brasileiras.

Como se vê no vídeo, Chico Rodrigues é uma pessoa bastante articulada e que se posiciona de forma clara. Essa loquacidade serve para desmanchar qualquer propensão a tratar a apreensão de dinheiro nas partes íntimas do senador pela Polícia Federal como o resultado da ação destrambelhada de uma pessoa tosca.  Me desculpem pelo trocadilho infame, mas o buraco parece ser mais embaixo. Na verdade, Rodrigues tem sido um dos mais fiéis e ativos aliados do presidente Jair Bolsonaro e sua cruzada contra o meio ambiente e os povos indígenas na Amazônia. De tosco, na verdade, ele não tem nada. Ser apanhado com dinheiro nas partes íntimas posteriores foi apenas, digamos, um acidente de percurso.

Chico RodriguesO presidente Jair Bolsonaro e o senador Chico Rodrigues em um momento de congraçamento público

Mas uma coisa positiva nesse imbróglio lamentável será o enfraquecimento político de um adversário das causas ambientais na Amazônia.  Isso torna a ação da Polícia Federal um serviço inestimável não apenas ao combate à corrupção, mas também à defesa do meio ambiente na Amazônia.

Projeto de lei para extinção da reserva legal trará mais devastação ambiental

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Fim da reserva legal servirá para legalizar o que atualmente é crime.

No que se apresenta como mais um ataque ao sistema nacional de meio ambiente, a dupla formada pelos senador Flávio Bolsonaro (PSL/RJ) e Márcio Bittar (MDB/AC) apresentaram projeto de lei com o objetivo de revogar o quarto capítulo do Código Florestal, chamado de “Da área de reserva legal”.

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Se consumada a aprovação desse projeto de lei, o que teremos será uma ampliação desenfreada da devastação dos biomas florestais brasileiros, em especial o Amazõnico para onde convergem todos os interesses manifestos de exploração de seus recursos naturais.

A alegação por detrás desse atentado contra não apenas as nossas florestas, mas principalmente a biodiversidade que as mesmas possuem e os serviços ambientais que fornecem. Também sofrerão as duras consequências do que promete ser um avanço descontrolado do desmatamento as comunidades tradicionais e povos indígenas que dependem do que as florestas fornecem para garantir sua reprodução social e sobrevivência econômica.

Como estudioso do processo de desmatamento da Amazônia, com diversas publicações em revistas internacionais de alto impacto desde 1993, posso testemunhar que hoje há mais terra desmatada do que se necessita para cultivar ou plantar pastagens. A quantidade de terra desmatada que se tornou improdutiva é significativamente alta, e a remoção das florestas atende a outras interesses que não os alegados pelos dois senadores.

Um detalhe a mais que me faz ser totalmente contra esse projeto pró-desmatamento é o fato de ser junto com meus irmãos e irmã o co-proprietário de uma área de 17 ha de floresta ombrófilo mista que contém centenas de árvores de auracaria, e por onde passam 3 riachos que seguem fornecendo água para as propriedades vizinhas. Essa floresta só existe porque meu avô paterno cumpriu por mais de 70 anos as regras relacionadas à reserva legal.  E é nesse fragmento que ainda resistem inúmeras espécies de pássaros, serpentes, insetos e orquídeas.  E, apesar do custo anual com a manutenção de cercas e aceros, temos atualmente um início de retorno econômico com a apicultura, o que deverá ao menos subsidiar o o pagamento  desses serviços.  E isso tudo só é possível por causa da reserva legal que agora querem extinguir.

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Propriedade familiar que já foi uma reserva legal por mais de 70 anos: é esse tipo de estratégia de conservação que será exterminada pelo projeto de Flávio Bolsonaro e Márcio Bittar.

Venho dizendo e repito que todos esses ataques à proteção ambiental de ecossistemas e biomas nacionais ainda custará cara ao Brasil, e não me surpreenderei se houver a imposição de barreiras comerciais por causa da destruição que está sendo permitida ou engendrada pelo governo Bolsonaro. 

Aliás, a recente suspensão do jantar de entrega de um prêmio ao presidente Jair Bolsonaro nas dependências do Museu de História Natural se deveu justamente por causa dos ataques realizados contra a proteção ambiental na Amazônia.  Mas essa refrega não parece ter sido bem compreendida no âmbito dos apoiadores da destruição ambiental no Brasil. Disso certamente resultarão novas e mais dolorosas lições.